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N.º 33

SESSÃO DE 7 DE MARÇO DE 1879

Presidencia do exmo. sr. Duque d'Avila e de Bolama

Secretarios - os dignos pares

Visconde de Soares Franco
Eduardo Montufar Barreiros

Ás duas horas da tarde, sendo presentes 21 dignos pares, o sr. presidente declarou aberta a sessão.

Lida a acta da sessão precedente, julgou-se approvada, na conformidade do regimento, por não haver reclamação em contrario.

Não houve correspondencia.

(Estava presente o sr. ministro da marinha.)

O sr. Presidente: - Como foi resolvido na ultima sessão, vamos entrar já na ordem do dia.

O sr. Vaz Preto: - Peço a v. exa. que me dê a palavra antes de se entrar na ordem do dia.

O sr. Presidente: - A camara resolveu que hoje, em vista da solemnidade do dia, que daria logar, na fórma do costume, a levantar a sessão mais cedo, depois de lida a correspondencia se entrasse logo na ordem do dia.

O sr. Vaz Preto: - N'esse caso peco a palavra sobre a ordem, porque o meu fim é pedir uns esclarecimentos com relação ao projecto dado para a ordem do dia.

O sr. Presidente: - Em se entrando na ordem do dia, darei a palavra ao digno par sobre a ordem.

Passa-se á ordem do dia, que é a discussão do parecer n.° 8.

ORDEM DO DIA

Leu-se na mesa e poz-se em discussão na sua generalidade, o parecer n.° 8.

O sr. Vaz Preto: - Tinha pedido a palavra antes da ordem do dia para pedir certos e determinados esclarecimentos que viessem instruir a camara, porque este projecto vem destituido, de todas as informações que são necessarias para se votar com pleno conhecimento, e depois de maduro exame; porém, como a camara resolveu que se entrasse já na discussão do projecto, farei n'esta occasião o pedido que tencionava fazer antes dó se encetar o debate, e direi á camara que, se ella adiar a discussão até que venham os esclarecimentos que vou pedir, e que julgo de absoluta necessidade, para se tratar do assumpto, ella obrará muito prudentemente, exigindo o documento que vou pedir, pois sem elle não poderemos formar um juizo inteiramente seguro da questão. Este documento é importantissimo.

Vou ler á camara tres telegrammas do governador geral de Cabo Verde, e por elles decidirá a camara se tenho, ou não, rasão em querer que se não discuta o projecto sem termos presente o documento a que me refiro, e que é o officio de 25 de janeiro, enviado ao governo pelo governador de Cabo Verde. O primeiro telegramma é de 1 de fevereiro.

(Leu.)

"Espero solução ao officio de 25 de janeiro". Estas phrases são expressivas, e muito principalmente assegurando o governador que não fazia cousa alguma sem resposta áquelle officio.

Já se vê que este officio de 25 de janeiro é um documento importantissimo, no qual o governador geral de Cabo Verde indica providencias a tomar no caso sujeito, e considerações serias ácerca da colonia. Portanto, é de absoluta necessidade que venha com toda a urgencia a esta camara o mencionado officio.

Os outros dois telegrammas dizem assim:

(Leu.)

N'estes dois telegrammas diz o governador, que não dá tropa sem chegar o seu officio, e no outro pede attenção para esse officio.

É claro que o governador geral não daria tão grande importancia áquelle officio, se não entendesse que elle resolve a questão; e, por consequencia, devendo ser de grande valia para esclarecimento do assumpto que vae entrar em debate, nós não podemos prescindir d'elle, nem entrar na discussão, sem o conhecermos.

Direi mais, que um projecto da ordem d'este que vamos discutir nunca devia vir ao parlamento desacompanhado de documentos e esclarecimentos essenciaes, que podessem elucidar a camara e os dignos pares que estudam estas questões.

Requeiro, pois com a maxima urgencia a remessa do officio a que se referem os telegrammas de que acabo de fazer leitura á camara, officio que devia estar junto aos documentos que se mandaram imprimir e que já nos foram distribuidos. Este meu pedido é tanto mais rasoavel, quanto o sr. ministro da marinha se comprometteu n'esta casa a não trazer aqui medida alguma que dependesse da sua iniciativa, sem ser acompanhada de todos os documentos que podessem instruir a camara.

Assim, pois, pelo seu compromisso, espero que s. exa. concordará na conveniencia de se não encetar a discussão do projecto sem termos presente o officio de 25 de janeiro do governador geral de Cabo Verde, visto que esse documento deve ser de grande importancia para o debate, uma vez que aquella auctoridade para elle chama particularmente a attenção do governo.

O sr. Presidente: - Queira o digno par mandar para a mesa o seu requerimento.

O sr. Ministro da Marinha (Thomás Ribeiro): - Se v. exa. quizer dispensar o digno par de escrever o seu requerimento, eu tomo nota d'elle. O digno par e toda a camara sabem que eu não costumo deixar de apresentar ao parlamento todos os documentos que me são pedidos, e ainda até hoje não ficou por satisfazer um unico d'esses pedidos.

Mandei para aqui os documentos que foram requeridos pelo meu antigo amigo o sr. conde do Casal Ribeiro; apresentei tambem no seio das commissões reunidas aquelles que ali me foram pedidos, e li esses documentos ás commissões, que podem dar d'isso testemunho. Depois disse-se que era conveniente que taes documentos fossem impressos para poderem ser devidamente apreciados pelos dignos pares. Mandei publicar esses documentos, bem como outro, que é mais volumoso.

Se alguns dignos pares me tivessem prevenido a tempo, eu teria trazido o officio a que se referiu o sr. Vaz Preto. Não tenho duvida alguma em o trazer; e posso afiançar á camara, comquanto não me recorde de todas as indicações que elle contem, que não contraria em cousa alguma o pensamento do governo.

Devo tambem dizer á camara, que não venho aqui mostrar a pressa da discussão d'este projecto sem uma grande rasão de ser.

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Sr. presidente, tanto v. exa. como a camara sabem perfeitamente que o tempo é um grande elemento, principalmente nos paizes tropicaes onde ha monções certas o definidas; por isso tenho receio do não poder conservar ali forças europeas, nem navios suficientemente equipados para ter reforçada aquella posição, se a não queremos perder, ou não nos queremos sujeitar a outro desaire, como o que ultimamente se deu.

Eis aqui o motivo por que disse que considerava urgente este projecto.

Os dignos pares saberá a importante questão que se está discutindo na outra casa do parlamento, á qual eu tinha desejo de assistir; e comquanto o governo esteja ali devidamente representado, e por isso não seja necessaria a minha presença, eu assistiria comtudo aquella discussão se não fôra a urgencia d'este projecto.

Peço, pois, ao meu amigo o sr. Vaz Preto, que não insista no adiamento d'esta discussão. E desde já me comprometto a trazer na primeira, occasião o documento a que s. exa. se referia. Tenho pena de não o ter agora commigo; mas eu não podia prever quaes seriam os documentos que haviam do ser pedidos.

Concluindo, repito, que considero urgentissimo este projecto, mas qualquer que seja a decisão da camara hei de acatal-a. A demora porém, da discussão, poderá causar grandes transtornos, de que não poderei ter a responsabilidade, como, por exemplo, o de ter de retirar as forças que lá estão actualmente, não dispondo de outras para mandar, e que por esto projecto espero que estejam promptas para marchar para aquellas paragens.

(O orador não reviu os seus discursos na presente, sessão.)

O sr. Vaz Preto: - Mando para a mesa o meu requerimento.

(Leu.)

Ouvi com toda a attenção o sr. ministro da marinha, e confesso francamente que as rasões que s. exa. apresentou não mo demoveram da minha convicção.

A camara deseja, e com muita rasão, trata? com o maximo cuidado e com maduro exame todos os negocios importantes que lhe sejam submettidos.

O parecer relativo á Guiné foi apresentado na ultima sessão e dado para ordem do dia de hoje, e conjunctamente foram distribuidos os documentos que o acompanhavam.

Tanto eu, como muitos outros dignos pares, só então podemos analysar o projecto e avaliar os documentos que o acompanham, e só então podemos reconhecer a falta d'esse importantissimo documento, que eu julguei necessario e indispensavel. pedir para elucidar a camara, e principalmente aquelles que quizerem entrar no debate.

N'este presupposto a arguição que o sr. ministro da marinha nos fez por não termos pedido antecipadamente os documentos de que careciamos, não podo ser acceita; é destituida de fundamento; não tem rasão de ser.

Nós não pertencemos á commissão, onde foram dadas explicação, e por isso não podiamos avaliar a questão senão pelos documentos que nos fossem presente?, e esses documentos só nos foram distribuidor na ultima sessão. Como quer o illustre ministro que se pedisse este documento se não houve outra sessão ainda antes d'aquella em que o parecer fui dado para ordem do dia? Como queria, pois, s. exa. que fossem pedidos com antecipação os documentos que se julgassem necessarios o de que a cara ara devia ter conhecimento, como é, por exemplo, o officio do governador geral de Cabo Verde dirigido ao governo?

A arguição do sr. ministro vae directamente a s. exa., parque s. exa. é que deveria instruir este processo de todas as peças, de todos os elementos necessarios, e este que eu pedi é essencial.

Sr. presidente, quando a fazenda publica está em tão graves circumstancias, quando ha um deficit de quatro mil e tantos contos, quando existe uma divida fluctuante de mais de 11.000:000$000 réis, não creio que seja a occasião mais propria para os poderes publicos votarem esta medida sem um estudo maduro, e sem um exame profundo que os convença da necessidade d'essa votação.

Portanto, não acho justificada a pressa com que se pretendo tratar de um negocio desta importancia, tanto mais que faltam absolutamente os documentos essenciaes para elle poder ser apreciado.

Não julgo tambem que seja ponderosa a rasão allegada pelo sr. ministro, de que precisa tomar estas providencias em um praso breve, digo que não julgo ponderosa esta rasão, porque o juiz mais competente n'este caso, que e o proprio governador geral de Cabo Verde, diz que não lhe mande força por ora, porque não precisa d'ella, e pede só resposta ao seu officio.

Sr. presidente, eu pronunciei-me o anno passado, e nos annos anteriores, contra este systema de querer votar os projectos, sem deixar aos dignos pares o tempo necessario para os estudar; o pronuncio-me tambem hoje contra esse mesmo systema, e muito mais acentuadamente, porque o governo, e por consequencia o sr. ministro da marinha, tem a responsabilidade do facto de, camara dos senhores deputados levar mais de um mez a constituir-se, deixando assim a camara dos pares sem ter nada que fazer durante um largo espaço de tempo.

Agora é que vem a pressa, e pretende-se fazer approvar um projecto que augmenta a despeza, não só por um anno, mas permanentemente; e, portanto, alem dos encargos permanentes, traz outros que successivamente vão apparecendo.

Espero que me seja enviado o documento, que tive a honra de requerer, e quaesquer outros que tenham sido remettidos ao ministerio da marinha ácerca dos acontecimentos de Bolor, depois d'este, se os houver.

Concluo, pedindo á camara que não consinta que o governo faça votar os projectos quasi sem discussão, como tem pretendido nos annos anteriores; e estou certo que os dignos pares, pela sua elevada intelligencia, e pelo amor que consagram aos principios constitucionaes, hão de apoiar o meu pedido, evitando assim que esta casa do parlamento se converta n'uma simples chancella, prestes sempre a accedor á vontade do governo.

O sr. Presidente: - Antes de conceder a palavra ao sr. conde do Casal Ribeiro, vae ser lido na mesa o requerimento do sr. Vaz Preto.

Leu-se na mesa e é do teor seguinte:

Requerimento

Requeiro que, pelo ministerio da marinha, soja mandada copia do officio de 20 do janeiro, do governador geral de Cabo Verde. = Vaz Preto.

O sr. Presidente: - O digno par, n'este requerimento, não propõe o adiamento do projecto, mas naturalmente é essa a sua intenção.

O sr. Vaz Preto: - Como v. exa. muito bem acaba de dizer, é essa a minha intenção; mas eu não podia propor o adiamento, porque esperava, que o sr. ministro da marinha, reconhecendo a justeza das minhas considerações, fosse o primeiro a declarar que mandaria o documento requerido, e a pedir que ámanhã, ou na segunda feira, começasse a discussão do parecer, porque não era a demora de mais um ou dois dias que podia prejudicar o andamento do projecto.

Por esta rasão é que eu não apresentei nenhuma proposta de adiamento, e tambem porque não quero fazer d'este assumpto uma questão politica. Assumptos que dizem respeito ao desenvolvimento das colonias, são sempre do maximo interesse, e por isso devem ser tratados tanto pelos governos como pelos parlamentos, com a maxima circumspecção e com toda a madureza.

Eu n'esta conjunctura, e tratando d'este assumpto, quero afastar de mim toda a idéa de opposição parcial, toda a idéa de opposição, que escolhe meios impeditivos para que

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o governo não dê um passo. Longe de mim essa idéa, longe de mim esse systema, embora não tenha absoluta confiança no governo, embora julgue perniciosa e funesta a sua administração. Mas quando se trata do levantar a bandeira portugueza, quando se pretende que as quinas abatidas e humilhadas tremulem outra vez respeitadas e temidas n'aquellas regiões longinquas, não ha opposição, ha só portuguezes.

N'este intuito, pois, tratarei o assumpto e discutirei o projecto, simplesmente como uma questão de administração, muito importante para o paiz. Eu pertenço á opposição, e como não queria que a minha proposta fosse considerada de caracter politico, por isso não a formulei, e dirigi-mo ao sr. ministro da marinha para que s. exa., no interesse do publico e do systema representativo, acceitasse adiamento do projecto. Confiei na lealdade com que o sr. ministro discute, e por isso entendo, que devia ser elle o primeiro a não querer que se discutisse o projecto som estar publicado o documento a que me refiro: e convenci me tanto mais que assim deveria ser, quanto existe já de ha muito uma promessa do sr. ministro para com a camará, que os negocios do seu ministerio seriam devidamente instruidos.

O sr. Ministro da. Marinha: - Visto o que disse o digno par, eu não peco a v. exa. que consulte a camara, porque eu estou prompto a acceitar, se por qualquer fórma v. exa. manifestar essa vontade, o adiamento; mas digo, e repito, que julgo urgente a discussão e votação d'este projecto, seja qual for o resultado, porque o que eu receio é a responsabilidade de, passado muito tempo, eu não poder de fórma alguma applicar os meios que julgo necessarios para a Guiné; por consequencia não é preciso outra cousa senão a manifestação da vontade de v. exa. para eu acceitar o adiamento.

O sr. Presidente: - Parece-me que o sr. ministro da marinha declarou que na primeira sessão apresentaria o documento pedido pelo sr. Vaz Preto, e emquanto ao requerimento do digno par não póde deixar de ficar em discussão conjunctamente com a generalidade do projecto.

É claro que a camara, approvando o projecto na sua generalidade, antes de se terem recebido os documentos requeridos pelo sr. Vaz Preto, não rejeita o requerimento do digno par, mas declara que deseja occupar se do assumpto, embora esses documentos não estejam já sobre a mesa; comtudo eu vou dar a palavra ao sr. conde do Casal Ribeiro, e depois a camara resolverá o que entender quanto ao requerimento do digno par o sr. Vaz Preto.

O sr. Conde do Casal Ribeiro: - Eu não tinha pedido a palavra sobre a materia, mas sobre o incidente do adiamento, senão proposto, de alguma maneira indicado pelo sr. Vaz Preto.

Entende o meu illustre amigo, e entende perfeitamente, que devem vir á camara todos os documentos; mas eu pela minha parte pediria ao digno par, só ha difficuldade do governo em que se sobreesteja na discussão até que venham esses documentos, que não insista em que se adie a discussão do projecto.

O documento provavelmente virá, e virá a tempo ainda de ser aproveitado durante a discussão. O sr. ministro da marinha invocou o testemunho das commissões; eu não o negarei.

Nas commissões o illustre ministro apresentou todos os documentos que ali lhe foram pedidos. Entretanto é certo que o documento a que se referiu o sr. Vaz Preto estava comprehendido no requerimento que tinha sido aqui apresentado por mim, e que n'esta parte não foi satisfeito. Eu fiz primeiramente um requerimento que comprehendia unicamente as communicações officiaes ácerca dos acontecimentos de Bolor; mas depois requeri todos os documentos attinentes á questão de Bolor, e que podessem esclarecer e ter referencia com ella. A este segundo requerimento respondeu-se unicamente com os dois primeiros documentos que estão impressos. Não faço censura ao governo; exponhos os factos como na realidade se deram. Esto requerimento comprehendia genericamente todo os documentos concernentes á questão, e por consequencia incluia o officio a que se referem os telegrammas do governador geral de Cabo Verde.

Isto vem para expor os factos como elles na realidade são; não tem por fim, de maneira nenhuma, induzir a camara a que vote o adiamento, se o governo se oppõe a que o haja.

Pela minha parte declaro-me habilitado a entrar na discussão, ainda que não vinha hoje premunido com os apontamentos que tomei sobre a materia, porque estava longe de esperar a agradabilissima surpreza de ver aqui o sr. ministro da marinha.

Achando-se pendente na outra casa do parlamento uma discussão importante, que diz respeito á muito notavel concessão feita pelo seu ministerio, concessão que já fui por nós largamente discutida, não posso senão agradecer ao sr. ministro a preferencia que nos dá.

Não o censuro por esta extrema benevolencia, por esta extrema attenção que tem para comnosco, nem o devo censurar, porque sei que o projecto lido agora na mesa estava dado para ordem do dia.

Eu suppunha que se trataria hoje da interpellação do meu amigo o sr. Carlos Bento ao sr. ministro da fazenda sobre a questão bancaria; mas passámos primeiro a tratar da Guiné; pois passemos.

Entretanto, visto que o sr. ministro, sobre a questão do adiamento, fallou na urgencia do projecto, o que eu pedia a s. exa. era que se pozesse do accordo com o digne relator da commissão; era que nos declarassem, um e outro, debaixo de que ponto de vista consideram este projecto: se elle trata de uma questão urgente ou de uma questão ordinaria de administração colonial.

Estes, dois pontos de vista são absolutamente diversos, os dois relatorios dizem exactamente o opposto um ao outro.

O projecto do governo foi trazido no parlamento como negocio de urgencia, como determinado pelos acontecimentos que tiveram logar na Guiné portugueza, particularmente no presidio ou feitoria de Bolor.

Assim o declara o sr. ministro da marinha no seu relatorio por estes termo:

"Os ultimos acontecimentos da Guiné tornam urgentes medidas que o governo já tencionava submetter á vossa illustrada consideração, etc."

Logo a rasão determinante d'este projecto foram os ultimos acontecimentos da Guiné.

Mas o illustre relator da commissão é meu antigo amigo, o sr. general Palmeirim, cavalheiro que muito estimo, que ha bastante tenho o gosto de conhecer nas lides parlamentares, e que é extremamente habil, formulo o seu relatorio de um modo admiravel. Absteve-se cuidadosamente de dar ao projecto a qualificação de urgente. Para o digno par não ha urgencia alguma, não se trata dos acontecimentos da Guiné.

S. exa. diz apenas que esta possessão está até certo ponto hoje, descurada. Parece que não houve mortos, parece que não houve feridos, parece que não correu sangue portuguez e que não foi deslustrada a nossa bandeira por uma peior que gravissima imprudencia de quem mandou Lá áquella pequena força militar. Parece que não houve nada d'isto, e que unicamente a nossa possessão da Guiné está até certo ponto um pouco descurada; e como está um pouco descurada, vamos então acudir-lhe com um governador vencendo grande ordenado, e com 200:000$000 réis para despender não sei em que.

Eis-aqui o que é o projecto. É uma cousa para o governo, outra cousa para a maioria das commissões que deram parecer sobre o mesmo projecto.

O governo entende que a medida é urgente, e quer que ella passe depressa. N'isto está a seu ver a salvação dá

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Guiné, embora não haja aqui cousa alguma que faça crer que por este meio se consiga o fim que o governo diz ter em vista. As medidas que se propõem n'este projecto não servem de nada, absolutamente de nada para esse fim. A unica providencia que tem um caracter accentuado a esse respeito, essa mesma era escusado trazer-se ao parlamento, porque estava perfeitamente nas attribuições do governo, e até nas do governador geral da provincia, que podia muito bem no uso d'essas attribuições transferir de Cabo Verde para a Guiné o batalhão de caçadores n.°1; e tanto que já mandou para ali uma parte d'aquelle corpo.

Portanto, não sei o que hei de votar a respeito de adiamento. Não desejo votal-o, porque de modo nenhum, quero ter a apparencia de empregar qualquer meio que se julgue impeditivo de uma discussão, embora me pareça extemporaneo, inopportuno, e em nada conveniente para o que se tem em mira, o projecto sobre que essa discussão vae recaír. O que desejo é que o illustre relator se ponha de accordo com o sr. ministro da marinha, de modo que saibamos sob que ponto de vista se ha do votar o projecto.

Para que vem aqui, que nos importa a monção propria para uma expedição? Pois não nos diz no parecer o sr. relator, que este projecto é unicamente para levantar um pouco a nossa possessão da Guiné, que está hoje até certo ponto descurada, acudindo-lhe com muito dinheiro, e com um governador mais bem retribuido? É isto e só para isto que serve o projecto, e para se gastar muito dinheiro, e não para se fazer o que era mister com relação aos factos que ultimamente succederam na Guiné, factos deploraveis, que não direi que envergonhassem o nome portuguez, que não póde ser envergonhado pelos abusos, pela incuria, pela fraqueza, pela inhabilidade de alguem, mas aos quaes se devia ter prestado mais severa attenção.

O governo devia, dentro das suas proprias attribuições, ter tomado medidas immediatas, sobretudo para que os processos fossem logo instaurados. Era este o seu primeiro dever, dever que não cumpriu, porque não bastava uma syndicancia. Era uma obrigação, que resulta evidentemente dos documentos que tenho presentes, o mandar immediatamente instaurar o competente processo criminal no fôro militar.

A este respeito foram dirigidas perguntas na commissão ao sr. ministro da marinha; e a essas perguntas respondeu-se muito vagamente. Eu pelo menos não comprehendi a sua resposta.

O que consta do officio que foi expedido á mesa d'esta camara, satisfazendo a um requerimento meu, é que até á data d'esse officio se não havia ordenado que fosse o processo instaurado; o sr. ministro da marinha esperava o resultado da syndicancia para o mandar instaurar.

Não sei se posteriormente s. exa. deu ordem para isso; estimaria que a tivesse dado, e que se haja effectuado agora, o que desde logo se devia ter feito. Desejava muito ouvir qualquer informação explicita do sr. ministro sobre este ponto.

Sr. presidente, não quero entrar na materia, nem estamos ainda na sua discussão. Não desejo obstar a que os meus collegas entrem n'ella, se o entenderem dever fazer. Isto não quer dizer que mais tarde não tome parte no debate que se vae encetar sobre este projecto; tenciono fa-zel-o, por mais ou menos habilitado que esteja, porém mais tardo, porque tenho de examinar papeis, que não trouxe, nem mesmo vim prevenido de apontamentos curiosos que deixei em casa, porquanto não esperava que se discutisse hoje este assumpto, se bem que reconheça que o sr. ministro da marinha, estava no seu direito stricto de vir hoje aqui, abandonando a camara dos senhores deputados, preferindo a Guiné á Zambezia, essa Guiné que está um pouco descurada hoje, como diz o illustre relator, e para a qual vamos fazer lei, com a qual o governo julga restaurar o prestigio da nossa bandeira, n'aquella colonia, porque vae proporcionar os meios de nos desaffrontarmos, castigando os pobres pretos que nos offenderam, aos quaes é necessario inflingir uma lição, que talvez se deveria inflingir primeiro, e inflingir severa ao branco, porque a culpa foi mais do branco que do preto.

Portanto, sr. presidente, concluindo, direi que se o sr. ministro da marinha acceita o parecer e as expressões do sr. relator da commissão, não vejo inconveniente em que este projecto se reserve para a sessão de ámanhã, ou para quando vierem os documentos que foram pedidos. Mas se ha inconveniente n'esse adiamento, e a camara o não approva, não entrarei desde já na discussão, reservando-me, comtudo, para em logar competente expender as minhas idéas sobre o assumpto.

(Entra o sr. ministro da justiça).

O sr. Ministro da Marinha: - Sr. presidente, posso desde já responder ao digno par, que tenho noticia ds se ter mandado instaurar processo na Guiné. Por consequencia, parece-me que estão satisfeitos os votos do digno par n'este ponto.

Devo tambem dizer a s. exa., que eu pela minha parte já não espero nenhuma manifestação da camara para acceitar o adiamento do projecto. Não desejo de fórma alguma que o digno par deixe de ter todos as seus apontamentos para poder defender as suas opiniões e combater as do governo.

Quanto ás rasões por que tenho necessidade d'este projecto, repito e mantenho tudo quanto disse.

Com relação a estar o governo de accordo com a commissão ou com o seu relator, parece-me que não ha dificuldade nenhuma.

No projecto ha duas necessidades que estão previstas: a primeira é que vamos desde já, e o mais depressa possivel, collocar na Guiné a imposição de obstar a que hoje, ámanhã ou depois nos seja inflingida uma affronta como a que ha pouco recebemos; e a segunda é a idéa de se constituir na Guiné um governo definitivo, como ás commissões pareceu conveniente.

As expressões do preambulo do parecer, a que o digno par se referiu, não têem nada absolutamente com as palavras que precedem o projecto do governo, porque os intuitos d'este são substituir a actual administração da Guiné. E se o governo veiu com mais pressa pedir esta auctorisação, foi porque um acontecimento excepcional o obrigou a isso.

Por consequencia, não ha paridade alguma entre uma o outra cousa.

Termino desde já as minhas observações a este respeito, porque o projecto não está em discussão, declarando ao mesmo tempo que não tenho duvida em acceitar o adiamento proposto pelo digno par.

O que peço, porem, é que s. exa. e a camara se occupem do assumpto o mais breve possivel.

Quanto á advertencia que se dignou fazer-me o sr. condo do Casal Ribeiro, devo dizer que nas questões da Zambezia, a respeito das quaes está empenhada agora uma discussão na outra casa do parlamento, a que tenho assistido, entendi dever perguntar á minha consciencia o que seria de maior obrigação para mim, se assistir ali, onde o governo está devidamente representado, e respondendo pela sua responsabilidade solidaria, e onde eu já respondi a tudo quanto me foi perguntado, ou se devia vir aqui, onde só começava a discutir um projecto, cuja necessidade mo parece instante.

Vim aqui, disse-me a consciencia que viesse aqui, vim.

Agradeço muito as lições sempre cortezes dos dignos pares, mas não foi sem pensar que tomei a resolução. Ponderando que maior dever me corria, se o de vir defendei o projecto n'esta camara, se o demorar-me na camara dos senhores deputados, onde o governo está competentemente representado; a consciencia disse-me que viesse, e por isso me apresentei aqui.

O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, confesso que é para

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mim sempre desagradavel o entrar em uma discussão, em que tenha de contradizer o sr. ministro da marinha.

S. exa. apresenta-se sempre tão cavalheirosamente, e inspira-me tanta consideração pelo seu modo franco, que o meu desejo era o poder ser-lhe agradavel.

A direcção d'este negocio está confiada ao sr. presidente, e n'essa parte estou perfeitamente descansado, pois tenho, como todos nós, a maior confiança em s. exa. No entanto permitta-se-me o observar, que pelas rasões apresentadas pelo sr. conde do Casal Ribeiro, e por outras que occorrem ao meu espirito, estou convencido de que não ha necessidade nenhuma de sermos precipitados. O que é necessario é mandar quanto antes forças para a Guiné; já foi uma parte de um regimento, e a outra deve ir brevemente.

N'esta providencia é que está a urgencia, e não na ida de um governador geral com mais um ou dois empregados perfeitamente remunerados. Não dependerá de certo da urgencia em se enviarem estes funccionarios o fazer-se respeitar a nossa bandeira na Guiné.

Portanto, não julgo de necessidade absoluta o tratar-se precipitadamente d'este projecto, antes pelo contrario acho mais conveniente para a camara, para o governo e para todos nós, que venham os documentos pedidos, para depois poder ser devidamente estudado o assumpto.

Eu declaro francamente que não tenho o menor desejo de impedir que este projecto se discuta, empregando qualquer meio de estorvar o governo do seu intento, mas tenho tão sómente em vista que o assumpto seja devidamente esclarecido.

Visto, porém, que é v. exa. que tem de resolver, eu confio plenamente que o ha de fazer o mais sensatamente possivel.

O sr. Presidente: - Eu agradeço ao digno, par as expressões benevolas que pronunciou a meu respeito, mas parece-me que depois das declarações do sr. ministro da marinha, e das observações que acabam de ser feitas pelo sr. Vaz Preto, esta discussão poderá ficar adiada para ámanhã, apresentando o sr. ministro os documentos que lhe foram pedidos.

Estão inscriptos os srs. Costa Lobo, e Barros e Sá. Vou dar a palavra aos dignos pares, e depois consultarei a camara.

Tem a palavra o sr. Costa Lobo.

O sr. Costa Lobo: - Eu pedi a palavra sobre a materia; portanto, não desejo usar d'ella sem a camara se ter pronunciado sobre o adiamento.

O sr. Barros e Sá: - Sr. presidente, no estado em que a questão está collocada, limito-me a declarar que já pedi os documentos a que o sr. Vaz Preto se referiu, e pedi tambem ao sr. ministro da marinha para mandar uma informação á camara das gratificações que se tem mandado abonar aos empregados do ultramar, gratificações que são importantes, masque não estão auctorisadas competente mente.

Este meu requerimento póde servir muito para esclarecer á camara sobre as despezas que se farão na organisação que se quer dar á provincia da Guiné.

Tambem desejava que s. exa. o sr. relator da commissão informasse a camara sobre se o batalhão que este projecto manda organisar, é para ir para a Guiné unicamente, ou se é o mesmo quarto batalhão que a lei permitte que se organise, quando circumstancias, como as d'este caso, que e um caso de guerra, por assim dizer, o exijam; e se elle vae substituir o que de Cabo Verde para ali foi.

N'este ultimo caso escusava o batalhão de vir incluido, porque a despeza feita com elle não tem de ser incluida na despeza que ha a fazer com a nova provincia, porque essa despeza já está auctorisada na lei que creou o regimento do ultramar.

Agora, se é um novo batalhão, creado expressamente para aquella provincia, então a despeza cresce seguramente.

Eu tencionava propor o adiamento d'esta questão, porque é necessario que essas despezas com a nova organisação da provincia estejam determinadas, e mesmo porque entendo que a camara não está em nada habilitada a resolver qualquer cousa a este respeito.

Como agora não se trata ainda de ponto algum d'esta reorganisação, por isso termino, prevenindo o sr. ministro da minha intenção de propor amanhã o adiamento, se na camara não estiverem todos os esclarecimentos que julgo indispensaveis.

O sr. Palmeirim (relator): - Em reposta ao digno par, o sr. Barros e Sá, direi: que se s. exa. deseja saber quaes são as despezas que ha a fazer, ellas lá se acham detalhadas no projecto.

Vozes: - Não estão.

O sr. Barros e Sá: - Não está detalhada a despeza a fazer com o batalhão.

O sr. Palmeirim: - Mas essa despeza já está por assim dizer auctorisada e conhecida pela que se faz com os batalhões que estão em Macau, na India e em Moçambique; e está tambem auctorisada a creação de um quarto batalhão. Alem d'isso, pela organisação da força do ultramar podem ser transferidas forças de Angola para Cabo Verde, de Cabo Verde para Angola e para outros pontos; é a lei de 1869.

Como, porém, e este um dos casos que auctorisam a creação de um quarto batalhão, por isso se entendeu que a organisação se podia já incluir n'esta lei.

O sr. Barros e Sá: - Sr. presidente, com relação ao documento, que o sr. Vaz Preto pediu que fosse presente á camara, o officio do sr. governador de Cabo Verde, devo eu tambem dizer que julgo esse documento muito necessario para podermos entrar na discussão d'este projecto; mesmo porque o governador de Cabo Verde diz no seu telegramma.

(Leu.)

Em tres telegrammas consecutivos o governador de Cabo Verde pediu que se tivesse toda a consideração sobre o seu officio de 25 de janeiro. Ora, o officio não está cá, não veiu a esta camara do certo por esquecimento do sr. ministro da marinha, pois estou convencidissimo de que s. exa. o não pretendia occultar, no entanto é necessario que venha, para que possamos ter conhecimento d'elle.

Quanto ao que disse o sr. relator, devo observar que é certo que a lei auctorisa que, em circumstancias excepcionaes e extraordinarias, se organise um quarto batalhão para o ultramar, mas relativamente á despeza nada diz. Ora, creando-se um quarto batalhão para guarnecer a ilha de Cabo Verde, não se trata de um simples destacamento, mas de uma força permanente, e, portanto, de uma despeza tambem permanente que se cria. Segundo todas as probabilidades a despeza deverá ser de cincoenta e tantos contos, e não me parece que a camara possa prescindir de ser esclarecida sobre este assumpto, por isso peço ao illustre relator da commissão, que tem conhecimentos especiaes sobre a materia, que informe a camara devidamente.

O sr. Costa Lobo: - Sr. presidente, eu peço licença para observar que todo este assumpto requer maduro exame.

O sr. ministro vem aqui dizer que quer este projecto approvado com a maior urgencia.

O sr. Ministro da Marinha: - Peço perdão a .v. exas. não disse que quero o projecto approvado com urgencia.

O Orador: - Mas deseja que se discuta com urgencia, o que equivale ao mesmo.

S. exa. tem rasão em uma parte do seu pedido; a monção doentia começa d'aqui a dois mezes, e, portanto é necessario retirar os soldados do reino, que s. exa. para lá mandou.

Mas, perguntarei eu - de quem será a culpa se este projecto se protrahir? Creio que é do governo, e de mais ninguem.

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Se se pedissam unicamente providencias de momento, todos as votariam, das que necessidade havia de vir intercallar com essas providencias a organisação de uma provincia independente?

Porque se não desdobrou o projecto, para que podessemos tratar d'esta segunda parte com a devida attenção?

Eu pela minha parte estava, e estou prompto a entrar na materia, mas sempre me pareceu, que não devem deixar do examinar-se todos os documentos que possam dar luz sobre este assumpto.

Por este systema de urgencias tem o governo na sua mão o fazer votar todos os projectos que quizer.

Porque se não dividiu este projecto em duas parte; como já disse?

Se s. exa. tivesse apresentado um projecto especial, já estaria votado; mas para que introduziu n'elle a nova organisação da provincia, pedindo-nos tanta urgencia para um assumpto, que devo ser devidamente meditado?

O sr. Ministro da Marinha: - Se v. exa. me dá licença, eu já disse que acceitava o adiamento.

O Orador: - S. exa. acceitou o adiamento até ámanhã, mas s. exa. acceita o adiamento, querendo lançar as responsabilidades para a camara.

Eu comprehendo a idéa, do sr. ministro. S. exa. acceita o adiamento, porque pretende imputar á camara toda a responsabilidade das desgraças que possa produzi? a insalubridade do clima africano, todo o odioso de adiar um projecto de lei, que diz ser necessario para que não se sacrifiquem mais vidas.

N'estes termos, não aceito o aditamento, ainda que o achava perfeitamente justificado por falta de esclarecimentos que deviam ser presentes a camara.

Aproveito a occasião para fazer uma pergunta ao sr. ministro da marinha.

Tem s. exa. preparado o orçamento das provincias ultramarinas, e tenciona apresental-o com brevidade ao parlamento?

O sr. Ministro da Marinha: - Eu creio que deve estar muito adiantada a impressão do orçamento das nossa provincias ultramarinas, e tão depressa esteja concluida apresental o hei ao corpo legislativo.

O sr. Palmeirim: - Não é por obsequio, mas em cumprimento de um dever, que me proponho responder ao sr. Barres o Sr, conde do Casal Ribeiro e outros dignos pares que têem usado da palavra; todavia, estando aliada a questão, entendo que me devo reservar para quando ella se discutir.

O sr. Vaz Preto: - Eu não pretendo usar de meios impeditivos, mas sim concorrer para que a discussão só realise de modo que a e camara possa apreciar devidamente o assumpto.

Com este intuito é que eu peço ao sr. ministro da marinha que se digne a enviar todos os documento que possam elucidar tão importante materia.

Pede-se uma summa de 200:000$000 réis para levar a effeito um certo plano, e por isso eu desejo, não só que s. exa. apresento um orçamento, em que mostro como tenciona empregar esta quantia, mas tambem um orçamento ácerca da Guiné desde que seja elevada a governo independente.

Desejo, enfim, que venham esclarecimentos que elucidem a camara a respeito das despezas que vão pesar agora sobre a provincia Cabo Verde, e bem assim todos os esclarecimentos das despezas que se hão de fazer em virtude d'esta nova organisação que se pretende dar á Guine portuguesa.

Sei que o sr. ministro não procedeu senão com elementos.

Ora, devendo existir os esclarecimentos precisos para demonstrar a conveniencia do projecto, peço o insto com o sr. ministro para que os remetia para a camara antes de começar a discussão.

O governo não deve querer ser precipitado.

O governa para proceder n'este caso deve ter todo o melindre e todo o cuidado, porque a responsabilidade é grande; grande, sim, a responsabilidade moral, porque de outra não se arreceiam os srs. ministros, porque estão costumados a fazer tudo o que querem, sem se importarem com os gritos da opinião publica.

O sr. Ministro da Marinha: - Eu peço com muita instancia aos dignos pares que pedem documentos, que reduzam a escripto os seus pedidos, porque tenho todo o empenho em satisfazel-os.

O sr. Barros e Sá fez uns poucos de pedidos, o e possivel que me esqueça de algum...

O sr. Barros de Sá: - Os meus pedidos já estão reduzidos a requerimento.

O sr. Ministro da Marinha: - O sr. Vaz Preto pediu um orçamento das despezas que vão fazer-se na Guiné, mas...

O sr. Vaz Preto: - O que eu desejo é o orçamento da despeza e da receita da Guiné elevada a governo independente, o bem assim um orçamentoo ácerca dos 200:000$000 réis que se vão gastar.

O sr. Ministro da Marinha: - Eu hei de dizer a s. exa. tudo aquillo que entendo que é preciso gastar, mas tenha já a certeza de que não posso apresentar um orçamento que satisfaça a s. exa., nem a qualquer dos dignos pares que quizerem achar differença nas verbas; entretanto, para ser agradavel ao sr. Vaz Preto, procurarei satisfazer o melhor possivel o pedido de s. exa.

O sr. presidente: - Vou perguntar a camara se concorda que o discussão d'este projecto fica adiada para ámanhã.

Os dignos pares que são d'esta opinião, tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O sr. Conde do Casal Ribeiro: - Como não está presente o sr. ministro da fazenda, e por consequencia não podemos passar á interpellação que estava annunciada, permita-me v. exa. que eu aproveito esta occasião para dirigir, na > uma interpellação, porque o assumpto não se presta a isso, mas uma simples pergunta, ou indicação, ao sr. ministro da justiça.

Eu creio que s. exa. apresentou na camara dos senhores deputados na uma proposta tendente e prorogar o praso para o registo dos fóros e onus reaes. Este assumpto é de toda a urgencia.

O praso está quase a acabar, e póde-se entrar em duvida, se elle não for prorogado a tempo, se ha uma interrupção.

O assumpto é de tal simplicidade, que eu creio que o nobre ministro, meu amigo [...] facilmente na outra casa o prompto aditamento do projecto, e quando viesse aqui, suponho que não encontraria difficuldade nenhuma, e em qualquer intervallo do uma sessão seria votado.

Lembrava, portanto, ao sr. ministro da justiça a urgencia d'este assumpto, porque na realidade este negocio é de uma grande simplicidade e de uma grande urgencia.

Por esta occasião seja-me permittido perguntar a v. exa. se a commissão de legislação já se acha installada, porque ha mais do um projecto remettido áquella commissão; ha o projecto do sr. marquez de Sabugosa, ácerca das concessões feitas ao sr. Paiva de Andrade; e outro que está na commissão de fazenda, e que tem de ser discutido tambem na commissão de legislação.

Parece-me que a commissão de legislação ainda não se acha installada, e eu julgo de grande conveniencia que ella se constitua quanto antes. Da certo que aos membros d'esta commissão não escapa esta necessidade.

Referindo-me ainda ao projecto da prorogação do praso para o registo dos fóros, eu não sei bem os termos em que elle está redigido, mas supponho que são uma simples e pura prorogação como as anteriores.

Eu estou disposto a votar esse projecto; entretanto lem-

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braria ao sr. ministro da justiça uma cousa, e é que temos caminhado de prorogação em prorogação, e creio que, teremos de continuar n'essas prorogações se alguma medida mais não se tomar.

Não queria que essa medida fosse tomada precisamente na occasião de tratar d'este projecto, antes applaudiria que fosse em separado, e não se confundisse a materia urgente com qualquer providencia que o sr. ministro entenda dever propor para não haver mais necessidade d'essa prorogação.

Essa providencia póde e deve ser mais detidamente tratada.

Não ha conveniencia nenhuma em discutir conjuntamente as duas materias era assim que devia ter procedido na questão da Guiné, Fazendo a separação de assumptos como acaba de observar o sr. Costa Lobo. Acho preferivel este systema.

Entendo que agora nos devemos occupar da questão urgente, mas não nos devemos limitar a isso.

É preciso tambem que se saiba se o governo tenciona apresentar alguma proposta tendente a remover as difficuldades que tem obrigado as prorogações successivas do praso para o registo dos fóros.

Effectivamente ha difficuldades na execução do codigo e essas difficuldades hão de continuar a existir, porque para o registo dos fóros de pequeno valor a despeza a fazer com os emolumentos de tal maneira grande que todos adiam essa despeza, fiados, como estão, na prorogação successiva do praso para o registo dos fóros.

Portanto, convido o sr. ministro da justiça, meu antigo amigo, a pensar n'uma medida apropriada a que o registo do fóros de pequenos valores se possa fazer de maneira mais convidativa.

Eu chamo a attenção do illustre ministro para esto ponto, que não lhe é desconhecido; bem pelo contrario elle conhece este negocio perfeitamente, como conhece todo9s os objectos da repartição a que preside.

Se ao sr. ministro da justiça fosse possivel ainda n'esta sessão apresentar uma medida no sentido de tornar dentro de novo praso exequivel a lei em relação ao registo dos fóros de pequeno valor, seria isto de grande vantagem e utilidade, tanto para a fazenda como para os particulares.

O sr. Ministro da Justiça ( Couto Monteiro): - Cumpre-me responder ao meu particular amigo, o sr. Conde do Casal Ribeiro, que n'uma das ultimas sessões do mez passado tive a honra de apresentar na camara dos senhores deputados uma proposta de lei para a prorogação dos prasos do registo dos fóros e onus reaes.

Hesitei por algum tempo sobre-se deveria, ou não, trazer proposta ao parlamento, porque não considero util o expediente de ir prorogando successivamente, e todos
annos, o praso que está marcado no codigo civil, e porque me parece de grande inconveniencia não pôr em plena execução uma idéa que julgo indispensavel que quanto antes se realise totalmente, refiro-me á da publicidade todos os encargos da propriedade.

No entanto tem havido rasões de interesse publico que aconselham a prorogação a que me refiro; e eu, seguindo o que já se tem efeito por mais do uma vez, apresentei a minha proposta, pedi a sua urgencia, e solicitei da commissão de legislação que tratasse quanto antes de dar parecer sobre ella.

A commissão prestou-se da melhor vontade a satisfazer o meu desejo, e creio que, no dia seguinte áquelle em que lhe foi commettido este negocio, se reuniu para o examinar. Entendeu ella que a prorogação em vez de se fazer só por um anno se deveria fazer por dois.

Concordei com esta indicação, em vista das rasões expostas pela commissão, e que realmente me pareceram muito attendiveis.

O digno par conhece perfeitamente as difficuldades que se têem oposto aos fóros. A rasão principal d'essas difficuldades é a que s. exa. acaba de apontar, a exiguidade dos fóros. Mas, quanto mais pequeno é o fôro, tanto maior é de ordinario e laudemio.

Tem-se proposto differentes alvitres para occorrer as indicadas difficuldades, entre elles o de se dispensar o registo dos fóros de quantias insignificantes,
Mas d'esta maneira é evidente ou ficavam prejudicados os senhorios uo o sytema da publicidade dos encargos prediaes.

No entanto apresentei, como já disse, a proposta para se prorogar o praso de registo e separei-a de outra qualquer materia que podesse embaraçar a sua discussão e demorar por mais tempo a publicação da lei.

O proprio digno par acaba de advertir, que o praso que está correndo termina no dia 22 d'este mez, e que não é conveniente deixar intervallo algum entre o termo do mesmo praso e o começo da nova prorogação. Por isso, quando projectos identicos têem vindo da camara dos senhores deputados com algum retardamento, de modo que não é possivel deixar de haver intervallo entre a prorogação que a finda e a que vae principiar, esta camara costuma inserir na proposta de um additamento, em que se declara a lei começa logo a vigorar, independentemente de decorrer os dias marcados na lei de 1841.

Portanto, n'esta parte estou de accordo com o sr. conde de Casal Ribeiro.

A commissão de legislação da outra casa do parlamento deu o seu parecer sobre a proposta de estuo fallando; já pedi ao digno presidente d'aquelle corpo legislativo que o designasse para a ordem do dia, e creio que dentro em pouco será ali discutido e aprovado, Porque naturalmente não se levantarão embaraços a esta medida, que em geral se considera hoje de grande importancia.

A Falta de novo praso para é registo dos fóros seria de grande prejuizo para as corporações a que o estado deve Protecção e não menos para fazenda nacional.

Encontram-se grandes difficuldades no registo d'estes fóros por ser em muitos casos impossivel individuar e demarcar os terrenos que constituem os prazos. Pela minha mão tem passado grande numero de representações, n'esse sentido, dos escrivão da fazenda e delegados do tesouro.

Convem effectivamente tomar alguma providencia que torne desnecessaria a repetição d'estas prorogações, porque é possivel que não bastem dois annos para se fazerem todos registos que ainda estão por fazer. Mas essa providencia deve ser objecto de um lei especial accudindo-se agora ao mais urgente.

Creio que é esta tambem a opinião do meu particular amigo o sr. Conde de Casal Ribeiro. Os meus desejos são, pois os mesmos de s. exa.

O SR. Presidente: - Como não está presente o sr. ministro da fazenda, não pode ter logar a interpellação do digno par o sr. Carlos Bento.

Portanto o que resta e dar a ordem do dia para a seguinte sessão, que terá logar ámanhã (8 do corrente). A ordem do dia será a mesma que estava dada para hoje: primeiro a discussão sobre o projecto da Guiné, e depois se houver tempo, a interpellação do sr. Carlos Bento ao sr. ministro da fazenda.

Está levantada a sessão.

Eram tres horas e meia.

Dignos pares presentes na sessão (le 7 de março de 1879)

Exmos. srs.: Duque d'Avila e de Bolama; João Baptista da Silva Ferrão Carvalho Mártens, Duque de Palmella; Marquezes, de Ficalho, de Fronteira, de Sabugosa, de Vallada, de Vianna, de Penafiel; Condes, do Bomfim, do Ca-

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sal Ribeiro, da Fonte Nova, de Paraty, de PortoCovo; Bispo de Vizeu; Viscondes, de Bivar, de Monforte, de Porto-carrero, da Praia Grande, de Sagres, de Seabra, da Silva Carvalho, de Soares Franco; D. Affonso de Serpa, Ornellas, Barros e Sá, D. Antonio de Mello, Couto Monteiro, Serpa Pimentel, Costa Lobo, Xavier da Silva, Palmeirim, Carlos Bento, Montufar Barreiros, Maldonado, Mamede, Pestana, Martel, Braamcamp, Pinto Bastos, Reis e Vasconcellos, Camara Leme, Vaz Preto, Franzini, Cantro e Castro, Dantas.

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