O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

326 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

imprensa, ou sejam a lei de 7 de julho de 1898, a lei de 21 de julho de 1869 e o decreto de 7 de dezembro de 1904.

Estes diplomas, da exclusiva responsabilidade politica do partido progressista, bastavam para occorrer ás exigencias do presente momento historico.

Aggravar, portanto, as disposições legaes vigentes, que aliás não peccam por brandura, é mero alarde de força opperessora e furor de perseguição.

Salvo algum caso restricto sobre que fosse conveniente prover, a legislação vigente estava bem.

Ora reformar o que está bem, é mais imprudente ainda do que conservar o que está mal.

O unico argumento com que o illustre Ministro da Justiça tentou, hontem, demonstrar a necessidade de uma nova lei de imprensa, foi o de a appensação dos projectos obstar ao julgamento de qualquer periodico.

Mas, se assim é, bastaria então fazer uma lei que contivesse apenas o artigo 28.° d'este projecto. E tudo estava sanado.

Não seria preciso estatuir tantas disposições inconvenientes e liberticidas, como as já apreciadas por diversos oradores, e outras que analysarei.

A inanidade de tal argumento por parte do Governo é a justificação da moção que apresento.

E depois, se a imprensa tem commettido alguns excessos n'estes ultimos tempos, a culpa d'isso pertence menos a ella do que aos acontecimentos, que não fez, e ainda a quem, se não directa ao menos indirectamente, a convidei á valsa da licença.

E ninguem diga que a lei vigente e inefficaz, porque a verdade é que essa lei nunca foi pontualmente cumprida nunca foi executada por completo.

Como n'este paiz se governa! Desfazem-se as leis sem previamente serem experimentadas! E desfá-las com a connivencia do Parlamento quem propositadamente não quiz cumpri-las.

Antes de expor as minhas divergencias do projecto, direi que não adopto, nem em direito constituido, nem em direito constituendo, a opinião d'aquelles que entendem que não pode haver delictos de imprensa.

Em direito constituido basta ler o artigo 140.°, § 3.°, da Carta Constitucional, para se rejeitar este parecer.

E em direito constituendo direi que a calumnia, a diffamação, a offensa e a injuria serão sempre injuria, offensa, diffamação e calumnia, seja quem for que as pratique.

A circumstancia de a imprensa não poder ser punida por ellas produziria uma irresponsabilidade unica e incomprehensivel no actual regimen, onde até pelos actos do Rei irresponsavel respondem os Ministros de Estado.

Mas, pondo de parte theorias mais ou menos aventurosas, cumpre analysar o projecto em discussão.

O artigo 1.° contém uma affirmação de principios sobre liberdade de imprensa. Nada de caução previa, nada de censura previa, cada de auctorização ou habilitação previas.

Bello portico, sem duvida, para um soberbo edificio.

Assim lhe correspondesse o resto da estructura.

Mas não corresponde, porque, aparte essa affirmação de principios e pouco mais, o resto do projecto é um codigo penal da imprensa, tão draconiano que chega a ser perseguição, como demonstrarei.

Mas a caução previa já não existia desde a lei de 17 de maio de 1866; que aboliu todas as cauções e restricções para a imprensa, o que foi mantido no decreto de 29 de março de 1890 e na lei de 7 de junho de 1898.

Mas a censura previa não existia tambem, porque a prohibiu o artigo 145.°, § 3.°, da Carta Constitucional.

E a respeito do habilitação ou auctorização prévia deve reconhecer-se que a lei de 7 de junho de 1898 a tinha reduzido já no artigo 10.° a uma bagatela.

Sim. Não ha censura previa. Mas se ella, a pretexto de qualquer cousa, se converter n'um facto brutal, qual é a pena que lhe corresponde?

Não o diz o projecto, e não parece que seja applicavel o artigo 301.°, n.° 1.°, do Codigo Penal.

Essa pena deve ser a de demissão, accumulando se-lhe uma forte multa.

É preciso garantir por este lado a liberdade contra os excessos do poder.

Nos artigos 2.° e 7.° e outros do projecto o editor é substituido nos periodicos, para os effeitos da responsabilidade legal, pelo director ou redactor principal.

Se, porem, o periodico tiver director e redactor principal, qual dos dois responde?

Não o diz o projecto e deverá dizê-lo.

Entre o editor e o director ou redactor principal opto pelo editor para as responsabilidades legaes do periodico, por ser essa a nossa tradição legal, que nem as circumstancias, nem uma forte corrente de opinião, mostram que deva ser desrespeitada ou não continuada.

E em materia de legislação é preferivel o conservantismo, um pouco ferrenho mesmo, ao reformismo irrequieto.

Alem d'isto, a imprensa é o mais energico meio de opposição e resistencia aos Governos, por ser ella quem principalmente faz a opinião.

D'ahi a má vontade que elles lhe teem quasi sempre.

O poder julga-se de ordinario omnisciente e omnipotente.

Entende que, quando elle pensa, todos os outros se devem abster de pensar, curvando-se perante a sua omnipotencia, e que, quando elle age, todos devem pôr-se de cócoras perante a sua omnipotencia.

Quem assim não proceder é por elle tido como um revoltado.

Ora, como na imprensa politica ha sempre jornalistas que não deixam o poder á vontade para fazer o que quizer, que affrontam as suas audacias, que o flagellam pelos seus abusos e até se riem dos seus ridiculos, é logico que o poder se proponha perseguir a parte dirigente e mais intelligente da imprensa, que é constituida pelo director e pelo redactor principal, de preferencia ao editor.

Tão logico como natural é que por parte dos que desejarem garantias contra excessos do poder se prefira o editor para as responsabilidades legaes da imprensa, poupando os combatentes mais esforçados.

Estou effectivamente com estes ultimos.

No § 4.° da artigo 2.° e no § 1.° do artigo 9.° de projecto leva-se a ansia de responsaveis, de muitos responsaveis, pelos delictos de imprensa, até aos vendedores ambulantes, nos casos figurados em taes disposições. Responsabilidade pela transgressão de que fala aquelle § 4.°, responsabilidade civil e criminal até como auctores do impresso incriminado.

De modo que o projecto, que se apresenta com pretensões de acabar com os testas de ferro para dignificar a imprensa, desce tanto que até chega a lançar mão do garoto dos jornaes como auctor do impresso, que elle vende ahi pelas ruas, sem saber o que vende, a todos os que passam. Considerar o garoto dos jornaes como auctor do impresso ... é forte.

A lei de 7 de julho de 1898 é mais reflectida, porque só admitte a responsabilidade do vendedor ambulante como contraventor apenas, e jamais como auctor, no caso unico do artigo 14.°, quando a venda é feita depois da suspensão do impresso.

Talvez se devesse modificar a lei vigente no sentido de só chamar á responsabilidade, como contraventores, o vendedor, distribuidor e affixador de qualquer impresso, quando se mostrasse que elles tinham conhecimento da suspensão ou prohibição do mesmo impresso. Mas levar tão longe a responsabilidade d'estas pobres criaturas como faz o projecto, é demasiado furor de perseguição.

Relativamente ao § 5.° do artigo 2.°