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302 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

dever não só averiguar o fundamento que ellas podiam ter, mas preparar-se para tomar immediatamente quaesquer providencias que se julgassem necessarias para o caso era que taes boatos tomassem incremento.

Actualmente, em Macau, devemos ter, alem da guarnição ordinaria da cidade, o contingente que vão render a força que ali está destacada, contingente que, se não chegou, deve brevemente chegar a Macau, ficando assim augmentadas as nossas forças da terra, emquanto que o navio que leva essas tropas vae augmentar as forças navaes, collocando aquella nossa possessão em condições muito mais vantajosas para facilmente podermos resistir a qualquer aggressão.

Ainda no caso de qualquer eventualidade, não será difficil mandar para Macau as forças navaes que estão fazendo serviço em Moçambique.

Comtudo, repito, creio que por emquanto não ha fundamento para receios, o que não obsta a que prestemos toda a attenção ao que se está passando no imperio da China, e póde s. exa. ter a certeza de que o governo ha de procurar estar sempre ao facto de tudo que succeda com respeito a Macau, e tomar as providencias que d'elle dependerem para prevenir alguma surpreza, e para evitar qualquer desaire á nossa bandeira.

O digno par referiu-se tambem ao tratado com a China, e na verdade não é possivel deixar de reconhecer a grande conveniencia de nos collocarmos, em tudo que diz respeito ás nossas relações com aquelle imperio, n'uma posição tal, que firme a nossa posse e ponha termo, para o futuro, ás pretensões que mais de uma vez a China tem levantado ácerca de Macau, e este resultado só poderemos obter por meio de um tratado. D'este assumpto tenho-me occiipado com desvelo.

Mandei proceder ao exame de todos os documentos existentes, tanto na secretaria de marinha como na torre do Tombo, mas esses documentos pouco adiantam. Todavia, acredite o digno par que continuarei a empregar todas as diligencias para poder realisar um tratado com a China que nos colloque, pelo menos, em posição igual á das outras nações que mantêem relações do commercio com o celeste imperio.

Creio ter assim respondido ás perguntas que me dirigiu o digno par e meu amigo, o sr. Andrade Corvo, e se, porventura, deixei algum ponto sem resposta, s. exa. terá a bondade de me indicar, para eu satisfazer como poder a qualquer observação da sua parte.

O sr. Andrade Corvo: - Começarei por agradecer ao sr. presidente do conselho de ministros a benevolencia, das suas informações, e por me mostrar satisfeito com as explicações que deu cobre o assumpto das interpellações que tiveram logar no parlamento hespanhol, assumpto que s. exa. mostrou ser apenas da natureza d'aquelles que mais de uma vez tem occupado a attenção dos govrenos portuguez e hespanhol, em rasão dos conflicios suscitados nas fronteiras maritimas e terrestres entre os povos vizinhos dos dois paizes. É deploravel que esses conflictos se dêem; mas não está na mão de ninguem evital-os completamente. O que é necenaario e curial é que da parte dos governos dos dois estados se comprehendam bem as causas que podem motivar esses conflictos, a fim de procurar os meios de os prevenir quanto possivel no futuro. É isso o que vejo se tem tratado de fazer, e, portanto, estou satisfeito n'esta parte.

Não direi o mesmo, porém, ácerca da questão de Macau. Afigura-se-me que esta questão póde complicar-se. Desde muito o imperio da China parece occupar-se deste negocio de soberania ou não soberania no territorio portuguez. Falla-se em armamentos da parte d'aquelle estado; diz-se, porém, que esses armamentos não são destinados para hostilisar aquella nossa colonia. É de esperar que assim seja; mas ha um facto que não póde passar desapercebido, e não passou de certo aos olhos do governo que é a visita, essa prova de extrema deferencia, essa excepção extraordinaria feita nos usos e costumes tradicionacs da China, do governador do Cantão a Macau, a uma hora que não parece muito propria, e por fórma não antes usada, e pouco regular.

Sei muito bem que os governadores chinezes têem muitas vezes modos arrevezados (permita-se-me a palavra) de proceder; mas sei tambem que de tudo sabem fazer pretexto para ver se chegam aos seus fins, traduzindo, todas as vezes que podem, a favor da sua politica e das suas intenções qualquer incidente que succede. Portanto, é bom estarmos sempre attentos, e não esquecer que actos que parecem de benevola deferencia, podem ser traduzidos por elles como representando outras idéas e devendo ter outras consequencias.

Mas para evitar essas consequencias e tornar irrealisaveis essas idéas, é necessario ter força. Se nós quisermos manter a integridade do nosso territorio, é preciso termos ali força, é necessario haver energia para evitar qualquer invasão por parte dos chinas.

Por consequencia, não devemos deixar passar desapercedido o facto, e o sr. presidente do conselho, que se tem occupado d'este assumpto, deve necessariamente ter-se preparado para qualquer eventualidade que possa, ter logar, a fim de que se não busque pretexto em um facto qualquer para se repetirem exigencias, que sempre têem sido por nós repellidas.

Quanto ao tratado, julgo de toda a conveniencia que se possa tornar bem clara, por um acto diplomatico, a nessa posse sobre o territorio de Macau. Esse assumpto ha muitos annos que se debate, mas tem havido sempre difficuldade em o encaminhar, não se chegando ainda a um accordo definitivo.

Eu occupei-me d'elle por mais de uma vez, e para isso li todos os documentos existentes no ministerio dos estrangeiros a tal respeito, o que não é trabalho de pouca, importancia. Ha um defeito fundamental, que dá em resultado não se ter podido ainda realisar esse tratado.

Ha quem considero Macau, debaixo do ponto de vista de ser nosso, como um territorio estrangeiro encravado no territorio chinez, e a China considera que aquelle é seu, e quer ter ali uma auctoridade que domine os chinas. Por outro lado, ha quem considere que aquelle territorio é nosso e não dos chinas.

Incontestavelmente Macau é nosso, a nossa soberania ali está assegurada, mas faltam certas formalidades, que é preciso obter, embora isso não seja muito facil. Nós temos consules no territorio chinez, e por isso devemos admittir, como principio de reciprocidade, que os chinas têem direito a ter consules no territorio portuguez.

Eu sei, que onde os chinezos entram põem o pé, e em seguida estendem a mão para agarrarem alguma cousa, e, portanto tem havido receio que os seus consules venham a dar os mesmos resultados que deram em outro tompo os mandarins.

Eu entendo que é necessario permittir os consules, mas só como consules, fazendo-se para isso quaeaquer convenções com estes funccionarios, como fazem outros paizes.

Isto foi apenas um incidente, por ter ouvido dizer ao sr. presidente do conselho que se tem occupado do tratado. Esta questão, repito, tem tido sempre difficuldade em se resolver, por causa da referencia á soberania do territorio portuguez sobre Macau. Uma das cousas que me parecia mais conveniente era, que esse tratado, em legar de ser traduzido em duas linguas, o fosse em uma só, que tivesse fé e auctoridade official, para que se não desse o facto dos chinas lerem uma cousa e traduzirem outra, como já succedeu, e quando se chegou a, conhecer que não dizam o mesmo, os chinas recusaram-se a cumpril-o. Depois approximou-se mais da applicação.

Era então governador em Macau um homem de caracter rispido e duro, ainda que de alta probidade, o qual me pa-