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466 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

davia, ainda n'este tempo a brandura dos nossos costumes se apresentava como um principio de evolução.

Em materia eleitoral o sr. presidente do conselho lembrara-se bem d'aquellas sessões tempestuosas, por causa do governador civil da celebre mócada. Lembra-se tambem das tempestades que houve por causa de um simples rapto parlamentar, e por causa de 2:000 libras dadas a um intermediario de um emprestimo; quando agora não ha intermediario nenhum que passe pela vergonha de pedir e acceitar 2:000 libras. 2:000 libras! Que ninharia para os tempos modernos.

A imprensa politica do nosso paiz é o echo do que se diz hoje no parlamento.

Quantas vezes não se tem visto um deputado ou par da opposição flagellar um ministro com insinuações que lhe maculam a honradez e honestidade de caracter? A camara não, mas o paiz julga que isto é serio, quando a final não passa de comedia, porque no fim da sessão aggressor e aggredido comprimentam-se amavelmente, como se nada tivesse havido.

Ora, estes factos não são de molde a dar ás nossas instituições o prestigio que lhes pertence. D'estes factos, das relações intimas entre aggressores e aggredidos, tira-se a conclusão de que tudo isto não é serio.

E o publico tira outra conclusão: é que tão bons são uns como os outros.

O que o orador tem dito na imprensa é o mesmo que póde dizer dos comicios, das associações. Os politicos introduzem-se n'essas aggremações, desviando-as dos seus intuitos,

O orador traz isto só para dizer que são os politicos que têem causado este mal, e são agora elles que vão remediar, como? Pela prohibição dos comicios, pela rolha da imprensa, pela censura? Todos estes meios serão inefficazes, ainda assim o mal tem raizes fundas que se não extirpam facilmente. E ninguem se illuda.

Mas haverá verdadeiro remedio contra o grande mal? Onde está elle? No parlamento não. Salvo uma hypothese: se todos accordassem n'uma dictadura, a dictadura do exemplo, de maneira que elle descesse da sua maior altura até ás mais infimas profundezas. Era preciso que todos se arrependessem, e deviam arrepender-se em beneficio do prestigio e da existencia de umas instituições, que ainda são necessarias á prosperidade do paiz.

Não é do Carmo nem da Boa Hora que ha de vir o respeito ás instituições.

Não ha poder nenhum que se imponha só pela força.

Já Rodrigues Sampaio escrevera, que se neste paiz ainda havia força, essa força era a de El-Rei. O assumpto é delicado, e o orador chegou ao ponto o mais grave da dictadura, pelas explicações que o sr. presidente do conselho deu para a justificar.

S. exa. na outra camara, enumerando as difficuldades que herdara da situação passada, acrescentara mais uma, que vem como consequencia da morte do senhor D. Luiz.

Essa difficuldade estava em ter herdado o throno, em consequencia d'esse successo, um rei moço e inexperiente. Desde que para a discussão vem a mocidade e a inexperiencia de El-Rei, desde que o primeiro ministro de um paiz põe a descoberto o representante das instituições monarchicas que nos regem, assiste ao orador o direito de protestar contra esta inconveniencia.

Não o faz para elogiar El-Rei, porque, como individuo, não precisa d'elle, mas como cidadão portuguez e representante do paiz, deseja que se não amesquinhe o prestigio devido a tão alto personagem, justamente no momento em que elle concede uma dictadura para manter a ordem e eliminar a propaganda republicana.

Não era no momento em que se assumiam funcções legislativas que o sr. presidente do conselho devia declarar á camara que El-Rei era moço e inexperiente.

Moço, sim; inexperiente, nunca. E se esta camara não fosse uma sombra vã e aviltada do que deveria ser, no dia seguinte a esta declaração já s. exa. não seria ministro.

Não deduzirá as conclusões que se podem tirar d'esta declaração, porque quer attribuil-a a s. exa. não ter pensado na conveniencia de a fazer n'esse momento.

Por El-Rei ser inexperiente é que concedeu uma dictadura illmitada, e é que se formou essa organisação ministerial naquelle momento solerane. E depois ainda se cansam os amigos do governo em dizer que o governo, não só tinha a força para manter a ordem, mas era mister mostrar que a tinha. O que era necessario era mostrar que se tinha a confiança da corôa.

No momento era que era necessario mostrar que se tinha a confiança da corôa, vir dizer que essa confiança promanava de um Rei inexperiente, é pelo menos desprestigiar ou enfraquecer a auctoridade real.

O paiz hoje não se dirige ao parlamento. O paiz que ainda ha poucos annos se dirigia a esta camara, considerando-a o palladio das liberdades, já hoje não sabe o caminho que a ella conduz. Já não tem confiança na sua acção e predominio; porque, em virtude da sua reforma e das dictaduras dos governos, já não tem a importancia que devia ter.

O paiz dirige-se a El-Rei, e El-Rei manda responder por um camarista.

O orador não censura este procedimento, desde que já não lha n'este paiz as forças chamadas constitucionaes. Mas ha n'isto um perigo que póde ter consequencias fataes. No momento de uma crise nacional, em que ás dificuldades policicas se alliem as difficuldades financeiras; no momento em que já não haja pão, embora haja kermesses, póde-se pedir responsabilidades a quem não se deviam pedir.

O orador não espera que haja revolução, mas sim degeneração, e esta já existe.

No momento de uma crise, se porventura houver algum facto politico, como já houve, receia que não haja então força capaz de resistir, não ao impulso violento, mas ao tumulto e confusão que são proprios de taes movimentos.

E não se conte com a força publica, porque ella ha de ser a primeira victima. E infelizmente o orador não vê no paiz um homem com auctoridade bastante para resistir a esse movimento.

Esse perigo é grande, e cada vez se approximará mais, desde que se continue no rumo que se está seguindo.

Já disse que não precisa de El-Rei para nada, como individuo, mas como cidadão portuguez, membro desta camara, e como monarchico sincero, como sempre tem sido, precisa muito d'elle.

Vae terminar, mas não o fará sem pedir ao governo e aos seus amigos que não continuem a dizer que se quiz explorar o sentimento patriotico.

Para que o dizem?

E o supplemento da Gazeta de Portugal?

Não foi elle que deu o exemplo, abrindo a porta ás explorações d'esse sentimento, se as houve?

Não foi elle que quando caiu a situação progressista, disse abaixo os ladrões e os traidores á patria?

Então isto não será exploração politica?

E depois como queriam os actuaes srs. ministros que o exemplo não fosse seguido?

Por isso o orador pedia que não se apresentasse como justificação da dictadura esta exploração.

O supplemento da Gazeta de Portugal, quer queiram, quer são queiram, ha de passar para a historia, como um padrão de verdadeira exploração politica.

Não combatendo nem defendendo a dictadura, e acceitando-a como um symptoma da grave enfermidade que affecta as instituições, não quiz o orador melindrar ninguem; tudo o que disse foi unicamente no intuito de cumprir um dever da sua consciencia.

E não queria por modo nenhum seguir o caminho d'aquelle que querem considerar a dictadura como um attentado