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SESSÃO N.º 34 DE 29 DE MARÇO DE 1892

O sr. Presidente: - Como este projecto tem um só artigo, está em discussão na generalidade e especialidade.

O sr. Conde de Thomar: - Sr. presidente, eu desejava tomar parte na discussão d'este projecto na parte que diz respeito ao ministerio dos negocios estrangeiros, mas infelizmente os documentos que por aquelle ministerio pedi ha bastante tempo, ainda não foram enviados a esta camara. Estou certo de que as ordens do nobre ministro dos estrangeiros não foram cumpridas, por conseguinte não posso entrar na discussão do projecto, mas aproveito o ensejo de estar com a palavra para levantar algumas palavras do discurso pronunciado hontem n'esta casa pelo digno par o sr. Augusto José da Cunha.

Sr. presidente, eu confesso a v. exa. que fiquei assombrado com as idéas apresentadas pelo distincto parlamentar e fiquei ainda mais assombrado quando vi que da parte dos homens publicos que têem occupado aquellas cadeiras não houvesse uma unica reflexão ás observações apresentadas por s. exa.

Eu lamento que o digno par não esteja presente, mas entendo que não devo perder esta occasião para me referir a tão extraordinarias declarações.

Como a camara deve estar lembrada, o sr. Augusto José da Cunha fez a exposição historica da sua gerencia como ministro da fazenda na parte que diz respeito aos adiantamentos feitos a bancos e companhias

S. exa., com uma grande lucidez, com uma palavra levantada, disse, entre outras cousas, o seguinte; "que sabia que as direcções d'essas emprezas haviam commettido toda a especie de irregularidades, lançando-se de olhos fechados e coração leve no caminho de aventuras compromettendo os capitães dos accionistas que n'ellas confiaram, arriscando-os em jogo de bolsa e transacções defezas, e depois, como essas transacções não dessem o resultado desejado, soccorreram-se de escripturações engenhosas, etc."

Sr. presidente, pois o digno par, ministro da fazenda, fiscal da lei, tem conhecimento de que um banco dá dividendos ficticios, e tem differentes escripturações, e esse cavalheiro, rogado, supplicado, instado pelas direcções d'esses bancos e companhias, e conhecendo o estado d'ellas, vem dizer em pleno parlamento que não teve duvida alguma em dar dos cofres do thesouro quantias avultadissimas em auxilio d'esses estabelecimentos?

Isto é simplesmente monstruoso.

Ainda mais.

S. exa., querendo declinar de cima de si a responsabilidade de ter feito estes adiantamentos, vem trazer-nos á memoria o caso de Fontes Pereira de Mello ter feito em 1876 adiantamentos a alguns bancos do Porto que se achavam na maior difficuldade.

Mas, sr. presidente, que paridade ha entre a situação dos bancos do Porto em 1876, e a situação do banco lusitano em 1891?

Sabe v. exa. qual é a differença?

E que Fontes Pereira de Mello, e eu sinto que os homens que o acompanharam no ministerio não tivessem uma palavra ao menos para levantar aquella asserção, emprestou aos bancos do Porto, e os bancos do Porto pagaram real a real o adiantamento que receberam, emquanto que o banco lusitano poucos mezes depois de receber os adiantamentos, os seus directores eram mettidos na cadeia.

Eu não sei se foi justa ou injustamente; = mas o que é facto é que os nossos tribunaes entenderam que deviam metter na cadeia os directores d'esses bancos, que tinham tido força sufficiente, influencia bastante, para levar o ministro da fazenda a fazer esses adiantamentos.

Portanto, o que s. exa. disse não se diz no parlamento.

Como a camara sabe, não ha ainda muitos dias que um digno par, que tambem não vejo presente, veiu em romaria a Lisboa com os directores dos bancos do Porto, servindo-lhes de Cyreneu, pedir ao governo auxilio para esses bancos.

Honra seja feita ao governo pela maneira como procedeu então.

O que é que se dizia n'aquella occasião, caso o governo não d'esse o auxilio que se lhe pedia?

Dizia-se que se fechariam as fabricas d'aquella cidade, e que a industria ficaria paralysada.

O que é verdade, porém, é que o governo entendeu que não devia amedrontar-se com os perigos que se dizia estarem imminentes.

Que fez então o governo?

Delegou tres directores do banco de Portugal para irem ao Porto verificar qual o estado d'esses bancos, e o que se soube é que os bancos não auxiliavam ha muito tempo a industria, e o que queriam era que o governo lhes fizesse adiantamentos para os livrar de difficuldades.

O governo, porém, não lhes fez nenhum adiantamento; deu-lhes unicamente o apoio moral, apoio que serviu de alguma cousa, porque se traduziu em verificar o estado d'esses bancos.

Se o resultado da investigação a que procederam os directores do banco de Portugal fosse de que os bancos não estavam em boas condições, e que a industria do Porto precisava do auxilio do governo, de certo que o governo não deixaria de auxiliar essas industrias.

Se o governo, de que fez parte o sr. Augusto José da Cunha, fizesse o mesmo, isto é, se mandasse verificar qual o estado dos bancos a que fez os adiantamentos, certamente que esses adiantamentos não se teriam feito.

E, sr. presidente, não me venham dizer que os bancos, a que o governo fez adiantamentos, deram ao governo certos penhores, certas garantias, ao dinheiro que receberam.

Pergunto eu: que penhores foram esses?

Onde estão as cotações d'esses valores?

Não ha muito tive eu occasião de ver alguns documentos que ao digno par sr. marquez de Vallada foram, enviados pelo ministerio da fazenda.

N'esses documentos havia uma relação de muitas acções de companhias, de muitas obrigações de bancos, mas nenhum d'esses valores creio tem cotação.

Se ámanhã o governo quizesse realisar os 2:000 contos de réis do penhor, talvez que nem podesse obter 200 contos de réis.

Nós atravessâmos, sr. presidente, uma epocha extraordinaria.

O sr. Augusto José da Cunha fez esses adiantamentos, tendo perfeito conhecimento disso todos os seus collegas. Foi s. exa. quem o disse.

Facto curioso: S. exa. dá conhecimento d'esse facto aos seus collegas, e saem todos do ministerio, ficando apenas o sr. presidente do conselho, que vae presidir ao ministerio seguinte. Então o novo ministro da fazenda, ao contrario do que praticara o sr. Augusto José da Cunha, faz tambem adiantamentos sem prevenir os seus collegas, e resolvem exonerar-se todos, accusando perante o parlamento o ministro da fazenda, que deixaram amarrado ao pelourinho da opinião publica. Faça-se justiça: tão culpado era o ministro da fazenda do primeiro d'estes ministerios, como era o ministro da fazenda do segundo;

Repito, o facto era o mesmo. Apraz-me render justiça a todos. Se alguma cousa tenho dito em que mostro não partilhar das idéas do sr. Marianno de Carvalho, entendo tambem que as culpas são identicas; a differença está apenas em que um deu conhecimento aos seus collegas do acto que praticara e o outro não deu.

Levantou-se um sr. deputado para propor a accusação do sr. Marianno de Carvalho, e a respectiva camara julgou improcedente essa accusação. Ora pergunto o que é que succede nos tribunaes ordinarios quando alguem que accusa não póde provar a accusação? É condemnado nas custas e nos sêllos.

No caso presente quem paga as custas? Quem é o juiz?