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334 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

batendo as minhas affirmações, exigem sem duvida alguma a minha comparencia na tribuna.

Não quero fazer um discurso politico, não quero nem pretendo discutir outra vez os factos que parecem reclamar um projecto de lei repressivo da liberdade de imprensa. Não foram elles contestados pelo silencio, ou pelas ligeiras referencias que lhes fez o Sr. relator.

Tratarei simplesmente de mostrar que todos os meus argumentos idearam de pé, em todos os seus pontos, não podendo S. Exa. conseguir, já não digo destruil-os, mas nem mesmo attenual-os no seu significado, e deixando o projecto sem defesa, seguramente por que a não tem.

Começou o illustre relator por classificar o meu discurso como melhor lhe agradou. Eu não classifico o de S. Exa., senão nos termos em que o ordena a boa cortezia parlamentar.

Foi o discurso do illustre relator da commissão a manifestação do seu bello talento e da sua brilhante eloquencia.

É esta a classificação que lhe dou.

Phrases escolares, na classificação das obras alheias, nunca as empreguei no decurso da minha vida politica, e nunca as empregarei no futuro, não porque sejam desprimorosas, mas porque entendo que realmente o não são, mas ha termos que eu não uso na tribuna parlamentar, porque, apesar de ser mais velho do que S. Exa., ainda me não julgo com auctoridade para tanto.

O Sr. Luciano Monteiro: - Fossem quaes fossem as classificações que applicasse ao discurso do Digno Par, a verdade é que sempre me inspirei na consideração e respeito que tributo aos elevados talentos de S. Exa. e aos seus excepcionaes dotes politicos.

O Orador: - Agradeço a V. Exa. a sua interrupção e como ao pronunciar estas phrases quiz apenas justificar-me, e não atacar alguem, continuo na minha ordem de ideias.

A verdade é esta, tanto eu como S. Exa. já não estamos em idade de dar lições de escola, não reconhecemos professores que as valorizem, nem corpo cathedratico que as classifique.

Ambos temos já a pratica e a educação sufficientes para não trocarmos phrases que não estejam verdadeiramente á altura da tribuna parlamentar.

Ponhamos, pois, de parte as questões; dos queixumes, e outras equivalentes, e vamos ao que mais importa, que é o assumpto em discussão.

Exige a praxe parlamentar que eu comece restabelecendo a argumentação do Digno Par que antes de mim combateu o projecto d'este lado da Camara.

E assim vou demonstrar que o illustre relator não apresentou uma unica razão de valor juridico contra a impugnação feita pelo Digno Par o Sr. Medeiros.

Refiro-me, já se vê. aos pontos em que estou de acordo, porque alguns houve com que não posso concordar, o que não admira, porque não tenho a honra de ser partidario de S. Exa.

O Digno Par o Sr. Medeiros sustentou a necessidade do corpo de delicto nos processos de liberdade de imprensa, e n'este ponto defendeu a lei de 1898, da responsabilidade do Sr. Beirão. Estou de acordo com S. Exa., pois que tambem defendo, n'este ponto, as disposições da lei de 1898, e aqui tem S. Exa. uma das consequencias da minha original situação politica n'esta Camara, e é que, encontrando-me absolutamente isolado de todos os partidos e grupos, defendo, sem faltar a compromissos de nenhuma especie, as ideias que supponho justas, ou adequadas ás circumstancias, sem attender ás origens de onde partiram.

A disposição da lei do Sr. Beirão é necessaria como garantia indispensavel para a boa defesa dos incriminados na lei de liberdade de imprensa.

Diz o Sr. relator da commissão que a suppressão do corpo de delicto foi um favor que este projecto fez aos jornalistas. Creio que foi esta a afirmação de S. Exa.

Se eu não interpretar em qualquer das minhas referencias as palavras do Sr. relator, dar-me-ha S. Exa. muito prazer interrompendo-me, para restabelecer a exactidão do seu pensamento.

Nunca me habituei a adulterar o pensamento de ninguem para, sobre essa adulteração, fundamentar um ataque, ou construir um argumento de defesa.

Foi este o pensamento claramente manifestado pelo illustre relator da commissão, mas a elle respondo em primeiro logar que, longe de ser um favor a eliminação do corpo de delicto, foi, pelo contrario, uma violencia, porque o corpo de delicto, averiguando os elementos essenciaes do crime, é o primeiro elemento da defesa para o accusado; admittir o crime sem esse preliminar do processo, e por mera presumpção, é roubar-lhe o direito á improcedencia da accusação, que pode resultar logo do corpo de delicto.

Em segundo logar, se no parecer do Sr. relator isso pudesse reputar-se um favor, poderia tambem S. Exa. considerar como favores todas as restricções que se encontram no projecto.

O Digno Par poderia disser tambem que se supprimiu o recurso do despacho do juiz que decretou a accusação, substituindo-o pela simples interposição do aggravo no acto do processo, não para fazer mal á imprensa, mas para a favorecer, porque a appellação ou o aggravo de petição representam incommodos e despesas para o accusado.

Poderia tambem dizer que foi um favor eliminar a citação pessoal, e substituil-a por uma citação postal, porque é sempre um vexame receber uma citação pessoal e assignar o mandado do juiz, ao passo que, recebida a citação pelo correio e sem testemunhas, poupa-se á vergonha de ser publicamente citado o agente do delicto.

E poderia ainda, na mesma sequencia de ideias, continuar a demonstrar que era tambem um favor a negação de deprecadas, porque citações fora da comarca são despesas para o accusado, e incommodos para as testemunhas.

Ainda poderia dizer que era um favor que o projecto fazia ao accusado o não lhe permittir que no acto do julgamento pudesse requerer o adiamento para o dia seguinte com o fundamento de falta de testemunhas, porque lhe prolongava a incerteza da sua situação, dando-lhe mais um dia de cuidados, e perturbando o socego das testemunhas que não tinham comparecido no dia fixado.

E por este processo, o illustre relator, com a habil exposição que sempre sabe fazer, poderia convencer-nos de que, onde existe verdadeira repressão e restricção ao exercicio do direito de defesa, não ha, no fim de tudo, senão favores para agradecer.

O illustre relator faz-me lembrar n'este ponto o que se conta d'aquelle que acompanhou ao cadafalso Carlos I, de Inglaterra.

Foi-lhe dizendo pelo caminho: Acceite, acceite que isto é um favor, acceite que isto é para seu bem.

É exactamente o que succede em face d'este projecto: estabelecem-se restricções, castigam-se os jornalistas e, ao mesmo tempo, ainda se lhes diz que tudo devem acceitar, porque á para seu bem.

Sobre a repressão da liberdade, a irrisão dos que a reprimem!

Mas isto não é tudo.

O que mais me admirou da parte do illustre relator da commissão foi a sua theoria juridica acêrca do que é o corpo de delicio nos crimes de liberdade de imprensa.

Dizia S. Exa.: no corpo de delicto averigua-se se a phrase injuriosa está ou não comprehendida na disposição da lei penal, se a phrase tem ou não os requisitos necessarios para se poder considerar delictuosa.

(Interrupção do Sr. Luciano Monteiro que se não ouviu).

No corpo de delicto, segundo a lei, não se averigua se a phrase é ou não injuriosa.