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SESSÃO N.° 34 DE 4 DE MARÇO DE 1907 337

nassem as palavras que, por meio de publicidade, envolvam odio ou desprezo da sua pessoa inviolavel.

N'isso estou de accordo, e isso seria mais que sufficiente para anteparar de ataques absolutamente condemnaveis.

Então não se fala do Rei senão para lhe fazer elogios?

Quem nos diz mesmo que n'esses elogios não possa haver ironias, e como destrinçar o elogio sincero d'aquelle que encobre um sentimento de malicia?

Eu sei que na lei actual existe a mesma disposição, mas sei tambem que, se o Ministerio Publico quizesse querelar de alguem por este motivo, consultaria precisamente o Governo, que attenderia sempre á qualidade das pessoas, á occasião em que as palavras foram proferidas, á intenção que pudessem ter e a todos os elementos de apreciação do delicto, não deixando formar o processo senão quando a isso o aconselhasse a conveniencia publica e o prestigio das instituições.

Que acontece agora?

Agora o processo é obrigatorio, porque esta conferencia que se reune uma vez por semana examina tudo, e quando encontra uma simples phrase, que de longe possa representar uma falta de respeito, chama immediatamente aos tribunaes o seu auctor, ainda que elle pela sua situação social esteja acima de qualquer suspeita.

Não deve isto ser eliminado do projecto?

Eu appello para a consciencia dos que me ouvem.

A verdadeira opposição ao projecto não sou eu que a faço, nem aquelles que o combatem: a sua condemnação está nas proprias disposições d'elle.

O que devemos fazer é votar o projecto o mais depressa possivel, porque se fôr executado, como o deve ser, creia V. Exa. que dentro de pouco tempo, haverá uma profunda agitação no paiz. Será levantada a questão religiosa e a questão politica, e só lucrarão com isso os inimigos das instituições.

Ha de chegar então o tempo, embora tarde, em que me hão de dar razão. O futuro virá mostrar mais uma vez quem são os inimigos da monarchia, se aquelles que a querem ver estribada no amor do paiz, ou se aquelles que julgam mante-la por meio de medidas repressivas.

Aqui está o fermento da questão religiosa.

Por mais de uma vez os membros do episcopado, sem excluir o Cardeal Patriarcha, se teem dirigido ao Governo, chamando a sua attenção para escriptos que julgam attentatorios do dogma do culto, ou da pureza do regimen catholico. Por mais de uma vez tambem os Governos portuguezes lhes teem mostrado as inconveniencias de se instaurarem processos sobre taes escriptos, pois poderiam, em vista dos sentimentos liberaes da maioria do paiz, perturbar a ordem e o socego da familia portugueza.

Sabe a Camara o que ha de acontecer, logo que este projecto seja convertido em lei?

Os bispos, no pleno uso do seu direito, visto que tal direito está consignado na lei, tanto no continente do reino como nas ilhas adjacentes, não permittirão a menor referencia na imprensa a assumptos de ordem religiosa.

Basta para isso dirigirem a sua queixa ao Ministerio Publico, juntando o numero do jornal que contém o que elles consideram por delictuoso, o Ministerio Publico immediatamente dará seguimento ao processo, porque, se o não fizer, incorrerá em graves penas, desde a multa, até á suspensão e demissão.

No estado em que se acha a sociedade portugueza; sendo absolutamente exacto tudo o que foi expresso pela palavra eloquente do illustre relator da commissão, que disse, e muito bem, que se ha cousa que interessa a nação é a liberdade de pensamento religioso, diga-me V. Exa. se não teremos logo uma manifestação collossal do partido liberal, e com ella a perturbação da ordem publica, tão necessaria em todas as occasiões, e maiormente hoje, em que tão sensivel está, que o menor boato, a mais leve discussão, a agita e commove.

Executem a lei. Será essa a minha vingança contra os ataques que os jornaes catholicos me teem dirigido; será essa tambem a mais plena prova da razão que encerram as criticas feitas ao projecto.

Executem a lei.

Encham o tribunal de processos religiosas; não consintam que ninguem propague o protestantismo; não permittam que nas das se vendam biblias, jornaes ou livros heterodoxos; façam tudo isso e esperem o resultado.

(Interrupção do Sr. Luciano Monteiro).

O regimen actual em delictos de ordem religiosa é exactamente o mesmo, certamente, e eu já o disse, mas as attribuições do Ministerio Publico para os delictos que lhe são participados é que não são as mesmas.

Pode o Patriarcha substituir as suas vestes cardinalicias pela béca do Ministerio Publico. Pois não diz o projecto que a parte, quando o Ministerio Publico não procede, pode collocar-se na situação d'elle, e com todas as suas regalias?

Ahi temos os bispos queixosos promovendo directamente nos tribunaes a accusação dos delictos.

Ainda em relação ao artigo 5.° do projecto. Diz elle que os crimes de offensas previstos no Codigo Penal consistem na publicação de materias em que haja falta de respeito devido ao Rei, aos membros da familia real, soberanos, chefes e representantes de nações estrangeiras.

Este artigo tem em vista tambem defender os agentes diplomaticos, contra os ataques da imprensa, pois até n'este ponto foi infeliz a sua redacção.

Onde está aqui o representante da Santa Só?

O Nuncio não é representante de uma nação estrangeira, e somente d'elles trata o projecto.

Consideral-o como tal, pode vir dar motivo a uma reclamação por parte do Governo de Italia.

Ou o nuncio é excluido das prerogativas concedidas aos outros agentes diplomaticos, e não ha razão legal para isso, ou está aqui reconhecido o poder temporal do Papa.

Recommendo ao Si. Ministro da Justiça, que tambem é Ministro dos Negocios Ecclesiasticos, que ao menos se não esqueça de esclarecer este ponto, emendando o projecto, e incluindo o nuncio na disposição geral que abrange os agentes diplomaticos acreditados junto do Governo Portuguez.

Qual é a origem d'este erro? É manifesto.

A nossa legislação antiga considerava tambem o nuncio como representante de uma nação estrangeira, e assim era, realmente, emquanto o Papa foi um soberano temporal; mudou a situação- do mesmo Pontifice pela unificação da Italia e pela lei das garantias, mas o que não mudou foi a redacção da lei, que aqui apparece como se o Papa continuasse a ser rei de uma nação estrangeira!

São estes e outros erros que resaltam aos olhos de todos que tornam este projecto a mais completa manifestação de leviandade que tem apparecido no Parlamento Portuguez.

Tratemos agora da apprehensão dos jornaes.

Eu combati as apprehensões. Não admitto apprehensões de jornaes, nem de quaesquer publicações em caso nenhum.

O que me respondeu o illustre relator da commissão a este respeito?

Respondeu S. Exa. por acaso á objecção que eu tinha apresentado?

Não respondeu.

Pois o que diz o artigo?

Diz simplesmente que o impresso ou jornal será apprehendido e presos os seus distribuidores; depois um e outros serão enviados ao poder judicial.

Enviados ao poder judicial para quê?

Desejava que me respondessem.

Aqui é que eu desejava ver brilhar, como brilhou em todo o seu discurso, o talento do Sr. relator da commissão.