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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 225

seu trabalho, e o meu amigo o sr. marquez de Sabugosa procurou se este adverbio gostosamente era relativo á pena de morte. Não, não póde ser.

Eu faço justiça a todos, porque procuro sempre que tambem me façam justiça a mira. E desde que desejo justiça para mim, não a devo negar aos outros.

A commissão disse que vinha gostosamente dar conta do resultado das suas meditações. Este gostosamente, de certo não é por entender que se deve restabelecer a pena de morte, mas sim pôr julgar necessaria a promulgação de um codigo penal militar, e d'esta opinião tambem eu sou; não ha duvida que o nosso codigo militar está inexequivel, não é possivel dirigir a disciplina do exercito pelas ordenanças do conde de Lippe, mas não é possivel tambem vir sanccionar na nossa legislação o que aquella tinha de barbara, e, que não está em uso, porque aos costumes e á consciencia publica repugna.

Sr. presidente, talvez que os argumentos que se hão de apresentar para combater a abolição da pena de morte (e permitta-me a camara que eu antecipe a resposta) sejam os que o governo apresentou na outra casa do parlamento; disse-se ali, por parte do governo, que este codigo não era seu, que a pena de morte já estava estabelecida na legislação vigente para os militares, e não sei se tambem se disse que o sr. marquez de Sá da Bandeira dissera que havia necessidade de um codigo de justiça militar para conservar a disciplina do exercito.

Eu ponho tudo isto de parte, porque não me parece que seja uma argumentação seria. Um governo não se escuda em opiniões alheias para dar força á sua falta de opinião; um governo não se escuda no que está na legislação que vae abolir, para manter o que na pratica está obsoleto. Um governo não se escuda com o que os outros teem deixado de fazer, quando de mais a mais esse proceder dos governos transactos é a justificação da abolição da pena de morte, pois que não era outra cousa do que dar espaço de tempo sufficiente para confirmar com a pratica a reforma.

Sr. presidente, a commissão especial no seu parecer diz que tinha meditado sobre a necessidade que ha de reformar a legislação criminal do exercito, e não diz nem uma palavra sobre a pena de morte. Eu não attribuo á commissão que ella não visse o artigo 9.° do codigo, e entendo que a commissão fez o que com palavras mais eloquentes fez ha pouco tempo a commissão que examinou o codigo militar italiano. Sabe a camara qual foi o parecer daquella commissão sobre a pena de morte? A commissão vem dar conta da ardua missão de que a encarregastes, e entende que a pena de morte póde votar-se mas não póde discutir-se.

Este é o parecer da nossa commissão; tambem nem podia ser outro, porque os membros da commissão sabem que não ha rasões superiores aos direitos da humanidade, e que não deviam dizer que a pena de morte era o unico meio efficaz para evitar a indisciplina dos exercitos; e note-se que a commissão que deu parecer ácerca do codigo criminal italiano está n'outras circumstancias, pois que está sujeita ao trabalho difficil da unificação da monarchia.

O rei de Italia, sr. presidente, depois da derrota de umas poucas de monarchias, unificou no reino de Italia aspirações constantes de todas as grandes intelligencias d'aquelle imperio das artes, d'aquelle mimoso e privilegiado paiz d'onde veiu sempre a civilisação ao mundo; isto foi feito pela influencia do maior homem d'este seculo, o grande Cavour, que acabou com as exigencias da aristocracia, do poder pontificio e de todos os poderes politicos que então dominavam aquelle paiz.

O governo de Italia, que é o symbolo da civilisação moderna, se abolisse a pena de morte, podia ser applaudido pelos philosophos, mas podia pôr em risco a unidade italiana; todos os povos d'aquella peninsula anciavam pela unificação da Italia e pela sua liberdade, mas todos tinham legislações differentes, e como estas têem por fundamento os costumes, era necessario respeita-los na unificação de seu codigo.

Ainda existia em Roma a pena de morte, Turim tinha a pena de morte, Veneza tambem, e essa pena, que muitos homens politicos tambem consideravam como um elemento necessario para manter a boa ordem na sociedade, achava-se apenas abolida na Toscana; a philosophia aconselharia a que aquella disposição se generalisasse a todo o reino, permittia o porventura a prudencia politica? Ninguem ousaria affirma-lo; uma tal alteração, quasi geralmente mal recebida ha maior parte dos estados que hoje compõem o reino de Italia, podia pôr em risco a unificação.

Nós felizmente estamos n'outras circumstancias; nós podemos e devemos discutir a pena de morte.

Um homem que se senta nos bancos do governo, o sr. ministro da justiça, cuja ausencia já fiz sentir, foi apostolo da abolição da pena de morte. Nos bancos da universidade, onde o seu talento brilhou tão explendidamente, e no fôro, onde como advogado augmentou o lustre do seu nome, sustentou sempre que a pena de morte era iniqua, ainda mesmo quando teve de defender réus accusados de crimes os mais horrorosos, e quando chegou ao governo o que fez? Apresentou uma proposta de lei que consagrava esses nobilissimos principio?.

Permitta-me a camara que lhe leia alguns periodos do relatorio de s. exa., em que com argumentos eloquentes e muito mais fortes do que aquelles que eu podia apresentar, pugna pela abolição da pena de morte.

"Avulta entre todas as medidas apresentadas pelo governo a que supprime á pena de morte nos crimes civis. Largo tem decorrido o pleito disputado entre os defensores das garantias sociaes, que naquella extrema e sangrenta punição julgam ver assegurada a ordem e defendida a sociedade, e os zelosos propugnadores da inviolabilidade da vida humana, que amaldiçoam como desnecessaria e criminosa a pena que paga o sangue com sangue, que mata mas não corrige, que vinga mas não melhora, e que, usurpando a Deus as prerogativas da vida, e fechando a porta ao arrependimento, apaga no coração do condemnado toda a esperança de redempção, e oppõe á falibidade da justiça humana as trevas de uma punição irreparavel. Desde Beccaria até Mittermayer com varia sorte tem corrido o certame. Fôra longa a reprodução dos argumentos com que, em abono de ambas as opiniões, se ha, ora defendido, ora oppugnado a necessidade e legitimidade da pena de morte. Levantada á altura de um grande problema social, as nações e os governos, os philosophos e os estadistas consagram-lhe particulares cuidados e procuram reconciliar em racional solução os direitos da humanidade com as garantias indispensaveis á segurança e á ordem publica. "

E mais abaixo diz:

"Em meu pensar a pena de morte seria ligitima se a justificasse a lei da proporcionalidade da pena ao delicto, e individualmente a reclamasse a necessidade social."

E mais abaixo diz:

"Com o desenvolvimento da civilisação dilata-se a força dos governos, armam-se de novas faculdades os poderes publicos, derrama-se a moralidade, diffunde-se a instrucção, alarga-se a publicidade, e por tal arte cresce e se levanta o poder da sociedade, que pareceria estranha fraqueza declinar para a jurisdicção do algoz a decisão do conflicto travado entre a innocencia e o crime. Que a sociedade se defenda rasão é, mas que, podendo defender-se sem immolar á sua conservação a vida dos delinquentes, imponha desnecessariamente a pena de morte, não o explica facilmente a sciencia penal dos nossos dias.

"E aqui associa-se a voz da humanidade e do sentimento a confirmar os dictames da sciencia e as tendencias da civilisação. Levantam-se as assembléas legislativas contra o