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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 287

momento opportuno o governo ha de deixar estas cadeiras; mas não ha de succumbir em face do vozear desordenado dos agentes da opposição, e dos insultos e assuadas ás auctoridades legalmente constituidas.

O governo não se conservará aqui nem mais um minuto alem d’aquelle em que se convencer que lhe faltem os elementos constitucionaes indispensaveis para exercer a sua missão com proveito publico. Mas tambem não havemos de fugir miseravelmente diante de gritos sediciosos, diante de intimações turbulentas, diante das arruaças e das agitações promovidas por aquelles que nos cubicam as pastas.

Sr. presidente, a voz de um paiz faz-se ouvir pelos meios legaes.

Nós não supprimimos nenhum dos orgãos, pelos quaes póde e deve fallar a opinião. Acatãmos as suas indicações, e não seremos nem cegos, nem surdos, quando ellas se fizerem ouvir claras, inequivocas, eloquentes na implacavel condem nação dos actos do governo.

Creia s. exa. que não será tão grande a nossa obcecação nem tão entranhado o nosso afferro ao poder, que nos demoremos n’estas cadeiras um momento alem d’aquelle em que reconheçamos a necessidade constitucional da nossa queda.

O governo não póde abandonar o poder á simples e summaria intimação de dois ou tres meetings sem faltar ao que deve a si e á causa publica. Nem a essas peremptorias intimações, nem ás dos que mandam representações ao parlamento contra a marcha politica do governo, podemos obedecer.

A violenta agitação que os dignos pares dizem existir em todo o paiz, é exclusivamente partidaria. Não é uma convulsão profunda, nem um movimento serio que possa pôr em perigo as instituições ou a paz publica.

Houve effectivamente em Lisboa no domingo passado alguns acontecimentos que eu sou o primeiro a lamentar. Mas não se segue d’ahi que o governo desse ordem para açu a lar o povo. Nem o governo nem nenhuma auctoridade deu similhante ordem, nem o povo foi acutilado. O que succedeu foi o que todos sabem.

Os soldados da guarda municipal, vendo-se ultrajados e apedrejados, no uso do seu direito de legitima defeza, carregaram sobre os seus aggressoses; mas esse facto não sendo ordenado, como não foi, por nenhuma auctoridade, nem pelo proprio commandante da guarda, como se vê dos documentos que eu apresentei á camara, para que se vem aqui dizer por mais de uma vez que se mandou acutilar o povo?

As minhas ordens foram para que se não empregasse a força senão em ultimo caso, e a força não foz mais do que defender se. Não se póde consentir que a força publica seja apedrejada e offendida, que as auctoridades sejam enxovalhadas e apupadas, sem que a taes demazias opponham algum correctivo.

Querem os dignos pares porventura defender as arruaças ou advogar o direito dos amotinadores de apedrejarem a força? Acredito que s. exas. não podem ter essa pretensão nem querem que os soldados se deixem insultar por centenares de pessoas sem usarem do direito de legitima defeza. Não foi o povo socegado, o povo laborioso e ino-oftensivo, aquelle que trabalha dia e noite, e paga as contribuições publicas, que desattendeu a auctoridade e apedrejou a cavallaria municipal.

Sr. presidente, o grande crime do governo é este! É o não ter evitado que á guarda municipal caísse sobre os desordeiros no uso do seu direito de defeza, quando se viu maltratada e apedrejada, resultando d’hi alguns leves ferimentos, que eu sou o primeiro a lamentar!

Disse-se aqui tambem que o governo não governa, mas que é governado.

Mas qual é o governo que não se rodeia dos seus amigos a quem pede auxilio e conselho, e que são os seus naturaes collaboradores na gerencia dos negocios publicos?

Querem, os dignos pares que o governo se imponha ás maiorias, que os acompanham, e aos amigos, que o fortalecem com a efficaz cooperação da sua palavra e do seu voto? O governo é uma associação de individuos que representa as idéas, os pensamentos, as aspirações do seu partido. Não póde deixar de receber o conselho d’aquelles que com elle concorrem na ardua tarefa da administração do paiz. Se é n’este sentido que o sr. Barjona de Freitas accusa o governo de ser governado, essa accusação não nos incommoda, nem nos envergonha.

Disse s. exa. que o governo tinha tido n’esta casa uma maioria apenas de dois votos, no additamento proposto pela opposição ao projecto de resposta ao discurso da corôa.

Eu não sei se foram dois ou tres votos. Foi pequena a maioria, é verdade; mas, sr. presidente, não é a primeira vez, mesmo fora de Portugal, que um ministerio governa sem a maioria da segunda camara, ou com pequena maioria. Na Belgica, por exemplo, o governo actual não tem na camara dos senadores senão quatro votos de maioria, e governa.

Eu sinto muito que não possamos ter maioria mais numerosa do que a que temos; mas isso não é rasão para que o governo, emquanto tiver maioria com que possa fazer vingar as suas idéas, deixe de occupar o seu logar.

O antigo partido progressista governou durante alguns annos com uma maioria de dois e tres votos. E nesta camara, a lei dos vinculos, que é uma das glorias d’aquelle partido, vingou por uma pequena maioria, sendo o artigo mais importante d’essa lei approvado apenas por um voto, que foi o do sr. duque de Loulé, que era ministro, e aqui veiu expressamente para este fim. Este nobre caracter, talvez contrariando os sentimentos do seu coração e os interesses da sua familia, deu o seu voto áquélla lei, não para satisfazer ambições pessoaes ou politicas, mas para obedecer aos dictames e aspirações do seu partido.

Póde governar-se muito bem cem tres ou quatro votos, a questão é ter idéas e maioria para as fazer vingar.

Por nossa parte, se não temos governado mais e melhor, a culpa não é nossa.

Disse o digno par, que nós não temos feito sair d’esta e da outra casa do parlamento nenhuma medida importante. A asserção de s. exa. carece de ser rectificada. Na outra camara já alguns projectos valiosos, e grandemente uteis, têem sido approvados. Só a reforma administrativa, que está ali em discussão, era bastante para occupar o parlamento por muito tempo; alem de outros projectos que se estão preparando, e que em breve serão discutidos e apreciados pela camara.

A verdade é que esta casa do .parlamento não tem habilitado o governo a poder levar á sancção regia maior numero de leis. A opposição desta camara não nos tem deixado trabalhar. Surgem e multiplicam-se os debates politicos todos os dias. Accumulam-se as questões incidentes. A paixão tomou o logar da rasão fria e tranquilla. Quasi que não temos tempo para respirar. Não fazemos outra cousa senão responder ás interrogações e censuras dos dignos pares.

O sr. visconde de Chancelleiros não deve tornar a culpa ao governo desta desgraçada situação. S. exa. tem peccado muito. É em grande parte a sua politica opposicionista que não deixa trabalhar o governo. O que os dignos pares (querem é fazer cair o ministerio seja de que maneira for. O expediente não é novo; mas nós temos o direito de dizer ao paiz que só não temos trabalhado mais é por que a politica impeditiva não nos tem deixado caminhar tão larga e desassombradamente como desejavamos.

Sr. presidente, até s. exa. veiu enumerar entre os aggravos e crimes attribuidos a esta situação nefasta a tremenda responsabilidade, que assumimos perante o paiz e perante a historia, da restauração do legendario arrema-