SESSÃO DE 5 DE JULHO DE 1890 475
selho, que tem obrigação de velar pelos interesses publicos, e impedir que se façam favores a industrias estrangeiras com detrimento das portuguezas.
Emquanto ás explicações do collega da fazenda de v. exa. dispenso-as, não as quero. Não preciso d'ellas nem as consinto.
V. exa. tomará as providencias que julgar necessarias e convenientes.
O sr. Conde de Avila: - Tenho a honra de mandar para a mesa um requerimento do sr. marquez das Minas, D. Pedro da Silveira e Lorena, pedindo para tomar assento n'esta camara, como successor de seu pae, o sr. D. Maria Braz da Silveira e Lorena.
Enviado á commissão de verificação de poderes.
O sr. Bernardo de Serpa: - Sr. presidente, a proposito do requerimento que ha pouco tempo foi apresentado á camara e que tem de ir á commissão de verificação de poderes, lembro a v. exa. a necessidade que ha de serem annexados a esta commissão mais dois dignos pares, os srs. José de Mello Gouveia e conde do Bomfim.
A commissão é diminuta, sendo absolutamente necessario augmentar o numero de seus membros para poder funccionar regularmente.
Peço, pois, a v. exa. que se digne consultar a camara sobre se consente que sejam annhexados a esta commissão os dignos pares os srs. José de Mello Gouveia e conde do Bomfim.
O sr. Presidente: - O digno par, o sr. Bernardo de Serpa, presidente da commissão de verificação de poderes, deseja que sejam aggregados áquella commissão os dignos pares, os srs. José de Mello Gouveia e conde do Bomfim.
Os dignos pares que approvam este requerimento tenham a bondade de se levantar.
Foi approvado.
O sr. Presidente: - Vamos passar á ordem do dia.
Tem a palavra...
O sr. Marquez de Vallada: - Eu tinha pedido a palavra.
O sr. Presidente: - Desculpe-me o digno par.
Não ouvi s. exa. pedir a palavra
Tem o digno par a palavra.
O sr. Marquez de Vallada: - Disse que, quando presidia o conselho de ministros o sr. José Luciano de Castro, occupando a pasta da marinha, primeiro o sr. Henrique de Macedo e depois o sr. Ressano Garcia, erguera a sua voz a favor de uma pessoa desvalida. E são as pessoas desvalidas que mais precisam de auxilio e protecção, mormente quando representam serviços prestados ao paiz.
O orador quer referir-se á viuva do almirante Rodovalho, cujos serviços são assaz conhecidos e largamente descriptos no ministerio da marinha. Apesar de não estar presente o sr. Julio de Vilhena, o negocio não é tão escuro, nem a pessoa tão obscura, que não, baste fallar-se n'isto na presença do sr. Serpa Pimentel e do sr. Arroyo, que tambem já foi ministro da marinha.
O orador não se admira, que tenha caído no esquecimento este assumpto, porque na pasta da marinha ha muitos negocios graves e importantissimos, mas o que pede é que o nobre presidente do conselho lembre ao sr. Julio de Vilhena que no seu ministerio ha um requerimento da viuva d'aquelle prestante official, a qual se acha na miseria.
Quem conhece a historia dos tempos passados, não se admira da historia de hoje; os homens publicos devem estudal-a muito, para fazer o parallelo, não da justiça absoluta, porque n'isso todos se accordam, mas da justiça relativa. O esquecimento dos homens notaveis não é recente, nem em Portugal nem lá fóra
Já Garrett, na sua linguagem de oiro, com a sua grande eloquencia, lamentara que o eminente estadista Francisco Manuel Trigoso de Aragão Morato tivesse morrido sem uma condecoração que lhe cobrisse o peito; Trigoso nunca trocou o nome honrado por um titulo sem historia. "Honra grande se o recusou, honra ainda maior se o esqueceram!" dizia Garrett n'um jornal que se publicou em Lisboa, O Constitucional.
Praticar o bem só pelo bem e não pela idéa de recompensa, escreveu José Ignacio de Andrade, nas suas Cartas sobre a China, e isto applica-se sobretudo aos que prestam serviços de certa valia.
Uma formiga que rasteja não se teme, o que se teme é o leão que ruge e que tem garras.
Tão distinctos homens teem occupado ha tres annos a pasta da marinha, e comtudo a viuva do almirante Rodovalho jaz no esquecimento e na miseria. É preciso pôr um termo a isto, porque aquelle nobre official, que em vida nunca pediu nem esperou a recompensa dos seus serviços, merece que a posteridade lhe consagre o seu agradecimento, como ella o faz a todos os que souberam manter-se junto d'essa columna, a columna da justiça, cuja base é na terra, e cujo capitel está no céu.
Todos os homens publicos que praticam actos justos e de nobre isenção sabem o que podem esperar dos seus. O orador tambem já tem sido calumniado e detrahido, mas está sempre prompto a responder pelos seus actos, como auctoridade e como particular. É preciso muitas vezes contrariar aquelle principio de se parce et mopeste, de se minima et pauca.
Todos temos direito á nossa reparação; a verdade n'esta epocha é preciso patenteal-a sempre. Dizia a illustre escriptora mme. Lwetchine: mais vale a verdade num hospital, do que a mentira cercada de todos os adornos da grandeza.
Do orador não deve a camara ter grande rasão de queixa, porque é a primeira vez que falla n'esta sessão. Mas agora entendeu que não devia permanecer no silencio. Tempus est loquendi, quia jam praeter illud est tempus tacendi; tacere signum est defidenitae non modestiae ratio.
O orador espera que o sr. Serpa Pimentel e o sr. Arrojo, que estão presentes, insistam com o sr. Julio de Vilhena, para que ainda n'esta sessão proponha uma pequena pensão á viuva do almirante Rodovalho. S. exas., como teem grandes e importantes negocios, é possivel que se esqueçam, mas não se magoarão de certo se o orador lhes lembrar outra vez, não diz já este acto de justiça, mas esta obra de caridade.
( O discurso do digno par será publicado na integra, e em appendice a esta sessão, quando s. exa. haja restituido as respectivas notas tachygraphicas.)
O sr. Presidente: - Passâmos á ordem do dia.
Continúa no uso da palavra o sr. José Luciano de Castro.
ORDEM DO DIA
Continuação da discussão do parecer n.° 48, relativo ao bill de indemnidade
O sr. José Luciano de Castro: - Ao terminar a sessão de hontem, estava mostrando á camara que não eram extraordinarias as circumstancias na occasião em que o governo assumiu pela primeira vez a dictadura a 11 de fevereiro d'este anno, apesar da agitação patriotica que atravessava o paiz de um a outro extremo, e que, longe de ameaçar a ordena publica, era uma força que devia ser aproveitada pelo governo.
As circumstancias nada tinham de anormaes.
Mas ao mesmo tempo que mostrava isto o orador confessava realmente que essa situação, que o governo tinha creado pelos seus actos, pelas suas incoherencias, pelas suas fraquezas, era, se não grave, pelo menos difficil, e obrigava o governo a tomar algumas providencias que mostrassem ao paiz a sua força, ou a confiança da corôa.
O primeiro d'esses actos foi a nomeação e demissão, quasi consecutiva, do sr. general Vasco Guedes para ministro da guerra, exoneração que se explicava geralmente como uma imposição do exercito.