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476 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Já uma vez disse aqui o sr. presidente do conselho que o sr. Vasco Guedes tinha sido nomeado ministro da guerra sem ser consultado.

Extraordinaria confissão!

Pois n'uma conjunctura tão grave como aquella em que o sr. presidente do conselho era chamado a formar gabinete, s. exa. não achou entre os seus correligionarios outro homem de confiança que não fosse o mesmo que já merecêra do governo progressista a confiança de ir governar a india?!

O facto é que o sr. Vasco Guedes foi logo exonerado, e que o sr. presidente do conselho explicou que os motivos da exoneração haviam sido representações vindas da India, pedindo a sua conservação ali.

Quem poderá acreditar que o sr. presidente do conselho, que tinha nomeado o sr. Vasco Guedes com tanto empenho que nem o consultara, o exonerasse, por causa de simples representações, do alto cargo a que o tinha elevado?!

Como ninguem podia acreditar esta explicação, todos ficaram persuadidos de que ao sr. presidente do conselho tinha a exoneração sido imposta pelo exercito.

E desde que correu esse boato o governo ficou desauctorisado o toda a gente se convenceu de que elle não dispunha de meios necessarios para manter a ordem.

Logo em seguida foi nomeada uma commissão de officiaes adjunta ao ministerio da guerra, commissão illegal, e que não podia, nem devia, ter sido nomeada.

Tambem logo se disse que a commissão tinha sido nomeada para seguir e fiscalisar os actos do sr. ministro da guerra, e, ao mesmo tempo, attribuia-se tambem esta nomeação dos officiaes á imposição da classe militar.

Este tacto era apreciado pelo publico, que reputava o governo como não tendo força para manter a ordem n'aquelle momento.

O orador não quer de modo nenhum melindrar o sr. Arroyo que vê presente, mas diga-se a verdade, até a nomeação de s. exa., segundo o que corria, foi desagradavel á corporação da armada.

E disse-se tambem que à armada tinha manifestado o seu descontentamento, e alguns officiaes havia que nem tenção faziam de ir cumprimentar o sr. ministro da marinha: o governo prometteu então que dentro em pouco s. exa. seria substituido, o que effectivamente succedeu.

Outros factos ainda concorreram para que o publico se convecesse de que estavamos proximo de graves acontecimentos, e me que o governo não tinha, força para manter a ordem publica, nem a confiança precisa na disciplina do exercito.

O orador refere se, por exemplo, á reforma precipitada do alguns generaes do nosso exercito.

Não nega ao governo o direito que elle tem, de reformar os officiaes que entenda, quando, por invalidez ou por qualquer outro motivo, não satisfaçam aos deveres da sua elevada missão, mas o que não póde acceitar, é a fórma precipitada por que se fizeram algumas reforma, faltando se aos deveres de cortezia para com esses velhos militares, que tantos serviços tinham prestado ao paiz.

Veja a camara a lealdade com que falla o orador.

Podia dizer que as circumstancias do paiz não eram extrordinarias, que nenhum acontecimento grave se dava, que fizesse suspeitar do procedimento do governo, mas não o diz. O que diz é que a sua incoherencia, os seus actos de fraqueza o tinham collocado na necessidade de affirmar perante todo o paiz que estava resolvido a manter a ordem publica, e que o podia fazer. Mas, para que o governo podesse fazer taes demonstrações perante todos, era acaso necessario publicar os decretos de 11 de fevereiro, auctorisando-se a si mesmo a fazer a reorganisação do exercito e da armada, tomando todas as auctorisações que queria, sem usar d'ellas até hoje?

Para isto não era preciso que o governo rasgasse a constituição do estado e violasse as leis constitucionaes.

Isto diz-se, expõe-se e não se auctorisa. Ninguem crê que fizessem isto os srs. ministros só pelo prurido de serem dictadores.

No dia 11 de fevereiro o governo prohibiu um comicio que estava annunciado a favor da causa patriotica que agitava n'esse momento o paiz, e prohibiu igualmente o prestito civico á estatua de Camões; e, não só para mostrar a sua força, mais ainda mais do que isso, para mostrar que tinha, a confiança da coroa, declarou-se em dictadura.

Se no comicio annunciado, se praticassem alguns actos illegaes ou se perturbasse a ordem, ou se deixasse de obedecer ás intimações da auctoridade, o governo então procedes com rigor e affirmasse desde logo, pelos actos que julgasse mais convenientes, que dispunha das forças do exercito e da guarda municipal, o orador não contestava esse direito.

Mas, prohibir-se o comicio annunciado nos termos legaes cem a menor manifestação nem ameaça de desordem, e prohibir-se o prestito civico que se queria fazer nesse mesmo dia sem haver o menor symptoma de desordem, sem haver qualquer acto que perturbasse a ordem publica, não foi de certo affirmação de força, foi simplesmente prova de fraqueza e de medo.

Que o governo prohibisse o comicio, quando houvesse qualquer resistencia ás suas ordens, e usasse da força de que dispunha e de todos os elementos indispensaveis para se conservar no seu togar, comprehende-se. Mas a dictadura, porque? Seria preciso affirmar a confiança da corôa?

Mais a corôa era inexperiente, como disse o nobre presidente do conselho.

Era inexperiente a corôa e o empenho de mostrar a sua confiança era uma das causas que difficultavam a marcha do governo, que o collocavam n'uma situação embaraçosa e difficil.

Mas, se a corôa era inexperiente, se a corôa não podia fornecer auctoridade ao governo, porque o soberano era moço, nem tinha a experiencia de largos annos; como entendeu o nobre presidente do conselho que só uma affirmação da confiança da corôa podia auxiliar a sua marcha?

Todavia não era inexperiente a coroa, e se o fosse, não podia nem devia dizel-o o nobre presidente do conselho para attenuante em sua defeza.

Não podia nem devia dizei-o, porque nos paizes constitucionaes, quem responde pelos actos da coroa, são os ministros; e inexperientes ou não inexperientes os monarchas, são os ministros que tomam todas is responsabilidades. Nós não temos que avaliar a experiencia ou não experiencia dos monarchas.

Mas o actual monarcha não é falto de experiencia, porque assumiu por vezes a regencia do reino durante a ausencia de seu fallecido pae, e aprendeu as lições d'aquelle monarcha exemplar, tão exemplar nos actos da sua vida particular como pelas lições que deixou de amor aos principios liberaes. O actual monarcha aprendeu com seu augusto pae a reger constitucionalmente este paiz e a exercer com toda a isenção e acerto a sua alta magistratura constitucional. Portanto, não era inexperiente. Enganou-se n'isso e fez uma grave injustiça o sr. presidente do conselho, que quiz suppor ou acreditou que o actual monarcha era inexperiente. Tinha já, quando chegou assumir a corôa, a experiencia de umas poucas de regencias, em que elle tinha tido a luctar com graves difficuldades e tinha mostrado bem que estava perfeitamente preparado para aquelle logar supremo.

Mas quiz o governo fazer uma affirmação da força, mostrando que tinha a confiança da corôa, para que? Pois um governo nascido ha tão pouco tempo, havia menos de um mez chamado aos conselhos da coroa, exclusivamente pela confiança que nos srs. ministros depositava o soberano, póde porventura deixar de ter a confiança da corôa? Era