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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 295

são, pois, todos estes factos, não digo indicios, mas uma prova manifesta da culpabilidade do governo? Não estão os dignos pares na sua consciencia condemnando por esta narração a verdade do que affirmo?

Tenho pezar de que não esteja presente o sr. ministro das obras publicas, porque era a elle a quem principalmente me dirigiria. Era s. exa. que eu desejava aqui para lhe pedir explicações de certos factos que lhe dizem, respeito, era a s. exa. que eu queria dirigir-me, porque acho a sua responsabilidade grande pelas relações que teve e tem ainda com os republicanos. Todos lhe imputam as desordens de S. Carlos, e geralmente affirma-se que fôra s. exa. que mandara para o meeting os seus amigos. Lá estava o seu secretario particular no meio dos arruaceiros; lá estava um ex-deputado, empregado no ministerio da justiça, que já declarara em publico, que é verdade que o governo fôra quem promovera a desordem, e mandara ali gente, para que o meeting monarchico abortasse, o que não tendo conseguido lançou mão do partido republicano, por intervenção de amigos do sr. Saraiva; lá estava um administrador de concelho, muito conhecido em Lisboa e relacionado com o sr. ministro das obras publicas.

Como s. exa. não está presente não posso ser mais expressivo, e por isso passarei a um outro ponto importante. Na imprensa appareceu, como aqui eu já tive occasião de relatar, uma carta assignada e reconhecida em que um cidadão affirmava que tinha sido solicitado por um ministro para empregar os meios de fazer abortar o meeting.

Este facto é grave, gravissimo, e como não o podem negar, porque ha documentos, diz o sr. Pereira Dias que o governo não deve descer a responder a uma similhante accusação. Ha de confessar o digno par, que esse seu systema de defeza é commodo, e alem de commodo economico, mas permitta-me s. exa. que eu diga que o não acho correcto.

Sr. presidente, eu não sei nem me importa saber quem é o sr. Teixeira Marques, o que sei é que é um cidadão portuguez que vem á imprensa fazer serias e graves accusações ao governo tomando a responsabilidade do que affirma. O que sei é que existe uma carta de um deputado, alto influente do partido progressista, nas mãos dos redactores do jornal que publicou a carta do sr. Teixeira Marques, e que o deputado na sua carta promettia um emprego ao tal sr. Teixeira Marques, se fosse bem succedido.

Pergunto ao sr. Pereira Dias se tambem não merecerá resposta a carta do deputado a que alludo? Descerá o governo se lhe responder?

Uma voz: - São calumnias.

O Orador: - Bem sei que v. exa. falla ironicamente; mas, se fosso serio, diria que não sei se são calumnias; mas, se o são, o governo que cumpra o seu dever; n'este paiz ha leis que castigam a calumnia; o governo tinha obrigação de, pelos tribunaes, mandar proceder contra quem, em circumstancias tão graves e em assumpto tão serio para o governo, o accusa por tal fórma. O que está provado até á evidencia, o que não offerece a menor duvida, é que aquelle cidadão tinha relações com os srs. ministros, e todos sabem que um dos amigos do governo, um dos seus correlegionarios mais intimos, o empregado da secretaria da justiça a que me referi, na presença de dois cavalheiros, (alguns dignos pares que aqui estão presentes sabem-no tão bem como eu) contou a historia como ella se passou, o que lhe disse o tal Teixeira Marques e o que elle lhe respondeu.

O que fez o governo a final, depois de lhe falharem aquelles meios?

Lançou mão do partido republicano e, para lhe pagar o serviço, não só o elogiou na camara, mas mandou-o elogiar pela sua imprensa. Emquanto ella, em espanejados encomios, affirmava que elle tinha sido cordato e avisado, atacava o partido dynastico com os epithetos menos proprios!

Querem mais clara a connivencia do governo com os republicanos?

Eu esperava que o governo tivesse comprehendido bem a sua missão, que pozesse acima da sua conservação no poder o bem publico e a salvação das instituições, e que pela sua imprensa fizesse propaganda monarchica contra a propaganda republicana; que esclarecesse o publico ácerca da republica, e lhe fizesse ver que o illudem, que lhe desfiguram os factos e que lhe fazem ver as cousas por um prisma illusorio. Eu esperava que o governo, respeitando, as convicções de todos, discutisse sem receio com os adversarios e esclarecesse aquelles que de boa fé laboram em erro.

Entre os republicanos ha uns que são convictos, ha outros que o são por lhe dizerem que a republica é a idéa moderna, a instituição aconselhada pelo espirito do seculo; ha outros, porém, que são republicanos por verdadeira especulação; e, finalmente, outros illudidos de boa fé, como succede em todos os partidos; (Apoiados.) mas a esses, aos convictos e aos illudidos, a imprensa do governo deveria demonstrar que a republica hoje em Portugal acabaria com a independencia d'este paiz, que só se póde conservar com a monarchia constitucional. Era esta a propaganda que eu desejaria que o governo tivesse feito; que demonstrasse como é verdade que Portugal é hoje o paiz mais liberal de toda a Europa; que Portugal está, mesmo em liberdade, acima da Inglaterra e da Belgica. Para que se faça idéa do que é a Inglaterra, basta que eu diga que, na maior parte dos jardins publicos não se consente que se fume, e que n'elles se vê uma taboleta indicando os que têem sido castigados por terem transgredido os regulamentos. Eu assisti em Inglaterra a uma festa nacional, a uma parada em honra do sultão; quando ali esteve em 1867, e sabe v. exa. o que me surprehendeu? Foi que o povo inglez, se quiz assistir á festa nacional, teve de pagar, como se fosse a um theatro! Na Belgica, onde tambem ha liberdade bastante, ainda assim é tal a intolerancia dos partidos politicos que não convivem uns com os outros e detestam-se entre si. Em Portugal cada um faz o que quer; a liberdade, muitas vezes, chega a converter-se em licença.

Note a camara. A liberdade de que se gosa no nosso paiz é muito superior á de que gosa o povo francez, não obstante ali vigorar o systema republicano.

Se em Franca, n'essa França tão republicana, se praticasse o que se tem visto em Portugal ultimamente; se ali se désse, em face da auctoridade e em plena manifestação, vivas á monarchia, como aqui se tem dado vivas á republica, os carceres e as masmorras estariam a estas horas atulhadas de presos.

Isto é que o governo devia fazer conhecer ao povo, esta é a propaganda que o bom senso aconselha.

N'um paiz tão livre como o nosso, onde cada um, póde-se dizer, que faz e diz o que quer, não ha motivo algum para que se queira derrubar as instituições, e acarretar para o seio da nação a desordem e a anarchia, e apoz d'ella, e como consequencia, a perda da nossa independencia e da nossa autonomia.

Liberdade temos nós como não ha em republica alguma do mundo, o que nos falta apenas é um pouco de bom senso governativo; se o tivessemos tido, e sabido organisar as nossas finanças, creio que a nação portugueza se deveria dar por completamente feliz, embora nos progressos materiaes propriamente de fomento não levassemos a dianteira a outros povos.

Em todo o caso em questões de liberdade podemos rivalisar com todos os paizes da Europa. (Apoiados.)

Disse-o já um grande vulto do reino vizinho, o mais eloquente dos oradores do mundo, como o appellidam em Hespanha. Castellar quando aqui esteve disse que uma monarchia assim é superior a todas as republicas; que uma mo-

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