DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 297
bem ou mal quando tratou de restabelecer a ordem publica, o que se apreciava era o estado grave em que encontrava o paiz, e de que os acontecimentos de domingo tinham sido um symptoma.
A agitação que se nota no paiz é resultado da falta de confiança no governo.
Apoia com toda a força da sua convicção a proposta do sr. Fontes, que está de accordo com o espirito da proposta do sr. Barjona. Este digno par não teve intenção alguma de dar força aos arruaceiros, mas a maioria é que lhe quiz dar essa interpretação, para ver se afastava alguns votos d'essa proposta.
A camara deve approvar a proposta do sr. Fontes, porque assim affirma mais uma vez a sua dedicação ao systema monarchico constitucional, que offerece todas as garantias de liberdade, e é seguro penhor da independencia da patria.
Apreciou rapidamente a questão de fazenda, procurando demonstrar que ella não tem melhorado, não obstante as affirmações do governo em contrario; e concluiu dizendo que, em vista das causas permanentes de agitação, entende que é dever do governo e dos altos corpos do estado não esperarem que as manifestações da opinião publica cheguem a um extremo que possam ser perigosas para as instituições.
(O discurso de s. exa. será publicado logo que o devolva.)
O sr. Barjona de Freitas (para um requerimento): - Devo declarar a v. exa. e á camara que tenho estado em todo este debate, em perfeita harmonia com o illustre chefe do partido regenerador.
S. exa. apresentou uma moção que interpreta bem o pensamento d'aquella que eu apresentei, e por isso peço a v. exa. que consulte a camara se quer que eu retire a minha moção, que ficou completamente substituida pela do sr. Fontes.
O sr. Presidente - Os dignos pares que approvam que o sr. Barjona de Freitas retire a sua moção, tenham a bondade de se levantar.
Foi approvado.
O sr. Bispo de Vizeu: - Sr. presidente, vou mandar para a mesa uma emenda á proposta do digno par o sr. Fontes, a fim de se dividir em duas partes.
Na primeira todos estamos de accordo, affirmando a nossa adhesão á monarchia e á manutenção da ordem.
Na segunda, que importa uma censura ao governo, é que nos separâmos. O sr. Fontes diz que a sua proposta é identica á do sr. Barjona; mas n'esse caso seria inutil a sua moção.
Estas diversas moções motivam divergencia no campo da opposição; porém é questão domestica, que nos é defezo prescrutar.
As opposições são livres em escolherem o campo de batalha, e a nós o dever de acceitar o debate onde se nos offerecer.
A camara dos pares apenas se tem occupado de questões politicas.
No discurso da corôa houve larga discussão sobre a politica geral do governo, que acabou por uma moção de censura.
Desde essa epocha nada occorreu de extraordinario, senão os acontecimentos de Lisboa, ou esses tumultos, subversivos da ordem publica, que foram reprimidos pela guarda municipal.
As moções do censura, que se nos apresentara agora, não podem ter outros motivos, nem filiar-se n'outros acontecimentos senão no procedimento do governo, que ordenou a repressão desses tumultos, de onde saíram vivas á republica e morras á guarda e á dynastia.
N'estas circumstancias, uma proposta de censura ao governo, porque soube manter a ordem, vinda de uma camara conservadora, não nos parece muito consoante á indole d'esta camara.
Em circumstancias extraordinarias, quando a tranquillidade publica é alterada e se trata de restabelecer a ordem, é pratica constante que as opposições suspendam as suas hostilidades e se acerquem dos governos para lhes darem toda a força precisa para a manutenção da ordem
Agora vimos o contrario, e a camara conservadora, em logar de auxiliar o governo, aproveita a occasião de o censurar, intimando-o a que saia d'aquellas cadeiras, porque não está na altura das circumstancias.
Que faria a camara se elle não podesse reprimir os tumultos e restabelecer a ordem?
Os dignos pares que tomaram parte na discussão, pintaram com negras cores o estado do paiz.
Exageraram a agitação que vae pelas provincias e na capital. Mas entendem que a unica panacea que neve curar todos esses males é a queda do governo, porque a sua permanencia n'aquellas cadeiras é a causa de todos esses maleficios.
Eu tenho visto muitas agitações arbitrarias como esta, e muitas intimações a diversos ministerios, a fim de que largassem o poder como sacrificio e holocausto ao descontentamento geral.
O sr. Fontes bem sabe isto por experiencia propria.
Muitas vezes tem sido intimado, como estes ministros o estão sendo agora.
Mas, quantum mutatus ab illo!
Quando o sr. Fontes era intimado por cincoenta mil signatarios para largar o poder, mal diria elle que um dia seria instrumento dos mil signatarios que, de uma aldeia do alto Minho, encarregaram de apresentar a esta camara um protesto contra a permanencia d'este governo nos conselhos da corôa?!
Como os tempos mudaram!
O digno par reprovava estes meios de deitar abaixo os governos, que viviam em condições constitucionaes, e não saíu do poder quando se empregaram contra elle; agora já lhe parecem bons!!!
Como os tempos mudaram!
E talvez que esses mesmos signatarios do Minho fossem os proprios que peticionaram n'outro tempo para derrubar a administração do sr. Fontes.
Sr. presidente, o texto das representações e de todos esses meetings, que se têem feito em todas as localidades, é o imposto de rendimento. A necessidade dos impostos foi uma triste herança que o governo teve.
Não foi por vontade que o governo arriscou a sua popularidade, recorrendo aos impostos, que são repugnantes sob qualquer fórma; mas depois de votados e estarem em via de cobrança, não será grande patriotismo promover a este governo embaraços, que affectarão a todos os governos que se seguirem a elle.
O que me parece necessario é parar no funesto systema de continuos recursos ao credito, com o pretexto de fomento inadiavel, gastando dinheiro sem conta, peso nem medida, sem cuidarmos d'onde nos ha de vir.
Parece impossivel que uma nação pequena, como a nossa, com trinta ou quarenta annos de paz podre, e sem ter havido nada de extraordinario na sua marcha politica, se encontre no estado afflictivo do nosso regimen financeiro. Viver de emprestimos continuados é o maior dos males para uma nação.
É mister cravar um prego n'esta roda de fomento, e de talharmos obras todos os dias sem saber d'onde ha de vir o dinheiro para ellas.
Se assim continuarmos, teremos a sorte do Egypto; terão de vir os estrangeiros governar-nos, como ainda agora nos disse o Times.
Isto não póde continuar assim.
Porém a camara não se tem occupado d'estas questões; desperdiça-se o tempo em votos de censura, e na esteril questão dos coroneis.
Os tumultos da capital vieram de molde para excitar as