298 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
iras d'esta camara contra e governo que reprimiu os tumultos.
Todos os governos têem o dever de manter a ordem e nenhum deseja que a força publica, quando tenha de intervir, commetta excessos. O governo andou com moderação, e a força publica;, insultada e apedrejada, não abusou nem é accusada de excessos; logo esta cardara, esquecida dos altos deveres inherentes á sua missão constitucional, e vindo aqui censurar o governo, dá testemunho de falta de prudencia, que terá funestas consequencias no futuro.
Sr. presidente, eu entendo que a fórma de governo que nos rege nos dá todas as garantias de liberdade, e que a fórma republicana póde trazer-nos graves complicações, talvez a nossa desgraça.
Não ha republica onde se gose mais liberdade do que n'esta nossa monarchia constitucional; se não temos caminhado bastante no progresso, se a prosperidade publica não chegou ao ponto que desejamos, a culpa não é das instituições, mas dos homens.
E se elles são maus na monarchia, não esperem que mudem de natureza e sejam bons na republica.
A questão é de homens, que estão impacientes de subirem ao poder, e nada mais; o grande mal não é essa agitação artificial, que ahi se ostenta, mas a demasiada ambição, que tudo explora para chegar a seus fins.
Fallou-se ahi do pacto da Granja, que fôra uma ilusão, mas não é verdade.
Dois grupos politicos, que andaram desavindos; divergindo apenas em pontos secundarios, concertaram-se, em pontos essenciaes de politica, consignados em programma definido, reunindo as forças communs para realisarem no poder as suas aspirações.
Foi novo partido, que tem sido coherente, desmentindo os falsos propheias que annunciavam futuras desintelligencias.
O digno par o sr. Fontes fôra o primeiro a estigmatisar o programma da Granja, alcunhando-o de detestavel.
Porém, quando as circumstancias mudaram, quando estava agonisante a ultima restauração em 1878, que o mesmo digno par confessou ter sido impolitica, n'essa occasião aqui nos disse o sr. Fontes que não largaria o poder, apesar das intimações que lhe eram feitas até pelos amigos de hoje, e quando tivesse de o largar deveriam ser os seus successores os progressistas, por ser esse o partido mais forte, e o unico que tinha elementos de governo. Já o partido da Granja, cujo programma era detestavel, podia e devia ser no poder o successor do sr. Fontes!!!
Esta contradicção, em publico e raso, tinha, quanto a mim, a sua justificação. Não é asado o momento de discutir esse ponto, mas só lembro estes factos para se ver como o mesmo digno par já considera o partido da Granja tão falho de força e recursos, que já não está na altura das circumstancias. Todos os partidos têem a mania do programmas.
Os programmas partidarios podem exprimir as aspirações dos homens que se associaram debaixo de certa bandeira, mas não o molde onde possam fundir-se todos os factos que resumem a vida social dos povos.
A boa politica consiste em resolver as dificuldades, sempre nascentes, pelos principios do justo e de util e nada mais.
Todos os governes desejam o maior bem, mas a força irresistivel das circumstancias póde mais do que a vontade dos homens.
Sr. presidente, já disse n'outra occasião, que á camara dos pares não convem inverter os papeis que devem representar as duas casas do parlamento.
Se os pares de nomeação regia podem, cem seus votos, derrubar governos e levantar ontros, fica annullada a representação nacional na camara popular, fica sem importancia politica, teremos um sophisma constitucional, ou o absolutismo com as apparencias de regimen liberal.
Se, porém, a camara dos pares se lançar no plano inclinado do obstrucionismo, impedindo a marche, regular na administração publica, quando a, opposição de hoje for governo, não estranhará que os seus adversarios usem de represalias
Um abysmo traz outro abysmo, e a morte da camara e mesmo das instituições será a consequencia de se inverterem os papeis das duas casas de parlamento, e de se trazerem para o senado conservador os debates apaixonados, que são inseparaveis do predominio politico dos diversos bandos que disputam o poder.
Mando para a mesa a minha proposta e a camara tomará a resolução que julgar mais conveniente.
O sr. Visconde de Chancelleiros: - Requeiro a v. exa. que mande ler a lista dos oradores que estão inscriptos para usar da palavra n'este debate.
O sr. Presidente: - Estavam inscriptos já da ultima sessão, e inscreveram-se depois, os dignos pares Vaz Preto, Henrique de Macedo, conde do Valbom, Cortes, visconde de Chancelleiros, Mártens Ferrão. Usaram já da palavra os srs. Vaz Preto e conde de Valbom, e segue-se o sr. Henrique do Macedo.
O sr. Henrique de Macedo: - Cedo da palavra.
O sr. Presidente: - Segue-se o sr. Cortez.
O sr. Cortez: - Reservando-me o direito de usar da palavra depois de fallar o sr. Mártens Ferrão, cedo por emquanto d'ella, e peço a v. exa. que me inscreva para depois de s. exa.
O sr. Presidente: - N'esse caso tem a palavra o sr. visconde de Chancelleiros.
O sr. Visconde de Chancelleiros: - Reservando-me o direito de usar da palavra depois do sr. Cortez, cedo da palavra, pedindo para ser inscripto depois do digno par.
Vozes: - Votos.
O sr. Mártens Ferrão: - Pedi a palavra no plenissimo uso do meu direito, e não reconheço competencia em ninguem a não ser em v. exa., para m'a tolher.
Sr. presidente, não tinha tenção de entrar ao debate, que estava pendente; as poucas palavras que vou proferir têem por fim unicamente expôr o modo por que comprehendo as circunstancias especiaes que ha porcos minutos se crearam n'esta casa pela apresentação da nova moção do digno par o sr. Fontes.
Folguei com essa moção, tem o grande merecimento de afastar a que estava no debate.
Costume dizer sempre com isenção o que entendo, tenho-me imposto esse dever, e declarar as rasões do meu voto em todas as occasiões em que a importancia dos assumptos assim m'o aconselham. É costume meu antigo, que já agora não perco, estando, como estou, no declinar da vida parlamentar.
Sr. presidente, entendo que a proposta do sr. Barjona de Freitas, perdoe-me o illustre amigo a cujo grande talento presto homenagem, entendo, digo, que essa proposta foi um grande erro politico, nem outros erros poderia, commetter a sua intelligencia privilegiada. Grandes erros politicos, só os grandes homens politicos commettem; são elles os proprios, que mais tarde os vem confessar.
A proposta do sr. Fontes tem a vantagem de afastar do debate essa moção. Tres partes tem a proposta agora apresentada. Duas são affirmação importantissima, elevada e nobre, como o sr. Fontes sabe sempre fazer, de principios, em torno dos quaes se reune toda a camara, (Apoiados.) e a grandissima maioria da nação portugueza; (Apoiados.) e quando eu ouvi o digno par ler a sua moção até o fim d'aquelles dois periodos, julguei que s. exa. parava ahi, e reduzia a sua proposta pura e simplesmente a elles. Nas circumstancias actuaes julgo uma manifestação importante a reunião de toda a camara, em torno dos principios consignados nas duas primeiras partes da moção, affirmando a sustentação d'elles, e entendo que quando se trata