O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

486 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

difficuldades se as suas medidas passassem sem discussão alguma.

Por estas rasões concluo, e o governo que continue a navegar em maré de rosas, que bom será se não convertam em espinhos.

Tenho dito.

O sr. Conde do Bomfim: - Mando para a mesa um parecer da commissão de guerra.

(Leu-se na mesa e foi a imprimir.)

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Luiz Soveral): - Desejava apenas responder duas palavras ás observações feitas pelo sr. conde de Thomar ácerca das ordens de despeza effectuada com a missão extraordinaria á Russia. S. exa. tem effectivamente rasão: o orçamento do ministerio a meu cargo é pequenissimo, os seus recursos são muito acanhados e eu lucto com immensas difficuldades para satisfazer a despeza com essa missão; mas entendo que, na situação em que se encontra o paiz, mal ficava ao governo inscrever no orçamento uma nova verba para este fim, e, por consequencia, abrir um credito especial. Entretanto, parece-me que, apesar da difficuldade, posso fazer face a tal despeza com uma somma tirada da verba de despezas extraordinarias, que não digo que s. exa. criticasse, mas cuja existencia achou superflua.

(S. exa. não reviu.)

O sr. Visconde da Silva Carvalho: - Agradeço as explicações do sr. ministro da fazenda. Desde que s. exa. declara que as gratificações a que me referi serão conferidas em conformidade com as leis existentes, doa-me por satisfeito completamente com a sua resposta.

O sr. Telles de Vasconcellos: - Disse que não assistiu ao principio do debate, por não ter podido vir á camara, quando elle se encetára; viera hoje com o proposito firme de não tomar parte na discussão, e antes para ouvir os seus collegas, embora podesse dizer ao paiz quaes as suas apprehensões sobre o estado da fazenda publica, e a sua opinião, o seu voto, pelo que respeita ás affirmativas feitas pelo sr. ministro da fazenda no seu relatorio, e no orçamento de previsão apresentado ao parlamento, que elle, orador, acabara, porém, de ouvir a um digno par, a accusação mais grave e mais forte, que jamais se tem feito no parlamento portuguez.

Que o digno par affirmára que todos os governos faltavam á verdade aos parlamentos e ao paiz, e elle, orador, sentia que immediatamente se não levantasse algum dos srs. ministros para repellir uma tão grave affirmativa.

Que elle, orador, não podia crer que tal asserção fosse verdadeira, e que homens encarregados dos sêllos do estado, procurassem, enganar propositadamente o parlamento e o paiz, e não lhe dizer toda a verdade em relação ao estado da fazenda publica.

Que elle, orador, estivera nos conselhos da coroa, e elle e os seus dignos collegas foram tão claros e explicitos nas suas declarações, e na apreciação do estado do thesouro, que tiveram de propor a reducção nos juros da divida pu-blica, muito a seu pesar, mas com o firme convencimento de que obedeciam a uma imperiosa e fatal necessidade; o que calou no animo de portuguezes e estrangeiros, porque a verdade tinha sido exposta tal qual ella era.

Que, portanto, o digno par tinha sido injusto para com o governo a que elle, orador, pertencêera, e crêe que o seria para com os outros.

Que muitas vezes ha apreciações inexactas, cálculos errados, orçamentos mal calculados, relatorios obedecendo a informações apaixonadas, apreciações da fazenda publica todas cor de rosa, quando o quadro é todo sombrio e negro.

Tudo isto tem acontecido e acontece agora com o famoso relatorio do sr. ministro da fazenda, e com o orçamento em discussão, mas não quer elle, orador, nem por sombras, imaginar que o governo tivesse o proposito firme de enganar o paiz.

Apreciou mal o estado da fazenda publica, calculou mal o orçamento que se discute, e propõe medidas que não podem, nem devem ser votadas, sem que, em um futuro muito proximo, as finanças não estejam em peor estado do que em 1891 para 1892.

Que abandonando elle, orador, o incidente levantado pela phrase violenta do digno par, seu amigo, pedia licença á camara para examinar o laborioso e intrincado relatorio do sr. ministro da fazenda, que só á força de muita paciencia e grande concentração de espirito se póde comprehender.

Que elle, orador, entende que não são exactas as tres affirmativas feitas no famoso relatorio - existencia de saldos positivos e thesouro desafogado - extincta a crise economica, pois quasi não tinha existido e só existira a crise financeira, - influencia benéfica da famosa dictadura sobre as finanças, e boas condições do thesouro.

Que para se apreciar o estado da fazenda publica, as difficuldades são enormes, mas que para se ver que a primeira das affirmativas não é verdadeira, basta recorrer ao exame da divida fluctuante.

Que o sr. ministro da fazenda se encontrou entre a divida fluctuante externa expressa em oiro e a divida fluctuante sujeita ao regimen do papel, e que nos tres annos de sua gerencia, ora fazia diminuir a divida externa expressa em oiro e augmentava a divida fluctuante sujeita ao regimen do papel, ora diminuia esta e fazia subir aquella; foi um jogo igual ao que tem feito com o banco de Portugal, não avolumando a conta corrente para ir buscar a outros estabelecimentos de credito dinheiro por juro elevado, mas porque as attenções publicas vão naturalmente examinar a conta corrente, e vendo-a diminuir, por este facto ajuizam que tudo vae bem; mas o pobre paiz é que tem de soffrer as differenças pagando juros, não os devendo pagar.

Que em relação ao jogo feito com a divida fluctuante, expressa em oiro e a sujeita ao regimen do papel, lucrava o governo; fixarem-se as attenções de uns e outros na baixa, ou diminuição ora numa, ora na outra, é argumento para o governo, de que tinha melhorado as finanças, mas que, examinadas essas differenças, davam, nos tres annos civis, o augmento da divida, na importancia de 3:217 contos de réis em 1892-1893, de 4:283 contos de réis em 1893-1884, de 2:979 contos de réis em 1894-1895, o que dá nos tres annos civis a quantia de 10:479 contos de réis.

Sendo assim, só pelo que respeita a divida fluctuante, sem fallar nos titulos vendidos na importancia de 2:850 contos de réis, e no grande augmento das receitas desde 1892 a 1895, exclamou elle, orador, é extraordinario que se venha asseverar que nos annos de 1893-1894 e de 1894-1895 ha saldos positivos, e o thesouro desafogado.

Onde estão os taes saldos positivos, pergunta com vehemencia o orador, e onde está no orçamento a verba para pagar o material encomnendado para os caminhos de ferro? Onde está a verba para fazer face ao encargo resultante da conversão, que não póde ser inferior a 1:800 contos de réis? Onde está a verba com que se ha de pagar o encargo resultante do emprestimo, encargo que não póde ser inferior a 640 contos de réis em oiro, sujeito ao ágio, o que póde eleval-o a 700 ou 800 contos de réis? Onde estão estão as despezus feitas com as nossas expedições? Estas ficaram em operações de thesouraria, para passarem a avolumar a divida fluctuante.

Que assim, é muito facil arranjar saldos, o peior é o descobrir-se que os calculos estão errados.

Que o orçamento, com o que n'elle devia estar descripto e não está, attinge á cifra de 53:000 a 54:000 contos de réis, o que se traduz no déficit de, approximadamente, 5:000 contos de réis; triste é similhante quadro, e mais triste o apresentar-se pintado a cores garridas, quando elle é sombrio e negro como a noite escura e medonha.