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SESSÃO N.° 37 DE 27 DE ABRIL DE 1896 487

Que elle, orador, ao ler o a relatorio, e encontrando os taes saldos positivos, dados como uma cousa averiguada, e o estado do thesouro desafogado, ficara contentissimo, porque conhecia as faculdades do sr. ministro da fazenda; e acreditara que, apesar do conhecimento que elle, orador, tinha do estado precario das nossas finanças, o sr. ministro da fazenda fora qual outro Cesar: chegára, vira e vencera; mas que duas cousas lhe impressionaram o espirito: primeira, o plano financeiro do sr. ministro da fazenda, porque, tendo saldos positivos, não se percebia porque é que se pretendia sobrecarregar o paiz com mais impostos; segunda, a contradicção manifesta entre a commissão de fazenda da camara dos pares e o sr. ministro, pois que ao passo que este apresenta tudo cor de rosa, a commissão, no seu parecer sobre o imposto do assucar e do sabão, assevera que não é demais o dizer-se que as circumstancias do thesouro demandam, sacrificios, a que j nação não pôde, nem deve recusar-se; que um dos dói está em erro, e é de certo o sr. ministro da fazenda, o que se verifica pelo exame do famoso relatorio e do seu mal calculado orçamento.

Que as asseverações do sr. ministro da fazenda são de uma illusão completa; e s. exa. ou se enganou nas suas apreciações com respeito ao estado da fazenda publica, ou alguem o illudiu.

Pergunta elle, orador, se é licito, no actual estado de cousas, praticar por tal fórma; e affirmando que tudo melhorou, pedir ao paiz dinheiro, que este não tem, nem póde pagar, crear novos encargos e seguir no caminho escabroso dos emprestimos, atirando para fóra das arca do thesouro com a unica reserva que tinha o governo para fazer face a qualquer caso extraordinario, unica reserva e unico valor em oiro que vae ser negociado, com o pretexto dos navios, para desapparecer na voragem das despezas ordinarias, é caso tão extraordinario, como condemnavel; e quem diria que esse valor, tirado ao banco de Portugal, havia de ter um tão fatal destino.

Que é assombroso, na opinião d'elle, orador, o apresentar-se um systema financeiro, um relatorio e um orçamento, como apresentou o sr. ministro, e o que mais é, depois da reducção dos juros da divida publica.

Que na opinião d'elle, orador, a administração, depois que um paiz é forçado a reduzir o juro da sua divida, deve ser tão economica, tão severa, tão clara e tão verdadeira que, a portuguezes ou estrangeiros, não seja licito fazer qualquer observação, ou levantar qualquer duvida ou suspeita com respeito ao modo como se administra; só assim, cumprindo um dever sagrado, nós poderiamos ir, pouco a pouco, adquirindo o credito de que necessitamos.

Que de desconsolação e de tristeza não resulta para os amigos do seu paiz o esmiuçar, no remanso da noite, essas contas, esse relatorio e esse mal calculado orçamento, e chegar á fatal conclusão de que só se tem brincado com a administração de um paiz cheio de ricas tradições, e que ainda ha pouco mostrou ao mundo inteiro que tem valentes, e homens capazes de sacrificar saude, fortuna, vida e até a propria familia em favor da patria que lhes foi berço.

Que ninguem poderia sequer imaginar que o sr. Hintze. sacrificando a reflexão á politica condemnavel e á sua conservação no poder, viesse fazer umas affirmativas, que todas carecem de verdadeiro fundamento.

Que elle, orador, crê que não ha um só portuguez que acceite, como verdade, o dizer-se que não ha crise economica, que esta quasi nunca existiu, pois que a crise foi financeira.

Que juizo se poderá fazer daquelle que tal asseverar, num paiz que não produz senão para meio anno, e onde as fabricas estão barateando os seus productos, vendendo com grandes prejuizos para poderem sustentar os seus operarios, sem se attender senão a um argumento infeliz, deduzido da baixa do déficit commercial de 1894 para 1890, quando essa baixa em logar de indicar cessamento da crise economica, bem pelo contrario indica o seu aggravamento, não só pelo que respeita ao commercio, mas ás industrias?

Mas que no pensar delle, orador, basta o despender o paiz todos os annos para pão a somma enorme que em oiro vae para o estrangeiro, para ter uma crise economica permanente.

Que na opinião d'elle, orador, melhor fôra que o governo empregasse os redditos do thesouro em adquirir o pão de que o paiz carece; que se não temos no continente terrenos que possam dar o abastecimento necessario, que os temos nas nossas terras de Africa a rivalisarem com os americanos, mas que, infelizmente, o governo tem passado tres annos a fazer uma politiquice infeliz e desgraçada, que é uma vergonha, e que será a administração do governo de molde a abrir um parenthesis na historia da governação publica do paiz.

E com tão triste exemplo, que fará o governo diante deste anno, que se apresenta temeroso, e quando a falta de serviços e a fome começa de alastrar-se no paiz inteiro, que está pobre, e, o que mais é, descrente de tudo e de todos.

Que elle, orador, tem as mais graves apprehensões, fundadas no estado precario da fazenda publica, apreciada pelos dados officiaes (porque não tem elle, orador, outros), e na pouca attenção que vê dar á administração do paiz.

Que hontem se luctava com as grandes difficuldades creadas pela crise financeira e economica, e hoje lucta-se com estas e com a questão politica creada pelo governo, para não saber como é que a ha de resolver, tendo collocado o paiz na mais completa indifferença, e na desconfiança absoluta de tudo e de todos.

Tristissima situação a que tudo chegou, e baldado foi o empenho d'aquelles que, no cumprimento do seu dever sagrado, tanto se esforçaram para prevenir o grande desastre a que o paiz de novo está sujeito.

O sr. Presidente: - V. exa. póde concluir o seu discurso, apesar de ter dado a hora, ou ficar com a palavra reservada para a sessão seguinte.

O Orador: - Peço então a v. exa. que me reserve a palavra.

O sr. Presidente: -Fica o digno par com a palavra reservada.

A primeira sessão será ámanhã, continuando a mesma ordem do dia.

Está levantada, a sessão.

Eram cinco horas e cinco minutos da tarde.

Dignos pares presentes á sessão de 27 de abril de 1896

Exmos. srs.: Luiz Frederico de Bivar Gomes da Costa; Marquezes, das Minas, da Praia e de Monforte (Duarte); Arcebispo de Evora; Condes, da Azarujinha, do Bomfim, de Cabral, de Carnide, de Magalhães, de Mártens Ferrão, de Thomar; Viscondes, de Athouguia, da Silva Carvalho; Moraes Carvalho, Sá Brandão, Telles de Vasconcellos, Arthur Hintze Ribeiro, Ferreira Novaes, Palmeirim, Cypriano Jardim, Sequeira Pinto, Ernesto Hintze Ribeiro, Fernando Larcher, Costa e Silva, Margiochi, Frederico Arouca, Jeronymo Pimentel, Baptista de Andrade, José Maria dos Santos, Pessoa de Amorim.

O redactor = Alves Pereira.