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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 333

Que o major Serpa Pinto atravessou a Africa do lado occidental para o oriental, e que n'essa travessia praticou um acto de audacia a que corresponde um premio de certa importancia, é um ponto inquestionavel.

O governo, creio eu, agraciou com a commenda da esclarecida ordem de S. Thiago, destinada a premiar o merito scientifico, litterario e artistico, este official, cujos serviços, sob qualquer d'esses tres pontos de vista, eu não conheço por em quanto.

Parecia-me, pois, que a mencionada distracção era bem cabida, sómente quando houvesse conhecimento do valor scientifico, litterario ou artistico dos trabalhos do major Serpa Pinto; mas, começar pelo fim, isto é, premiar trabalhos que são desconhecidos ainda, e pôr de parte a audacia, o valor, a coragem que elle teve occasião de desenvolver, não está de accordo com o que eu entendo.

O que se vae dar ao major Serpa Pinto é insignificante, comparado com o arrojo que se precisa para praticar actos como elle praticou. Eu disse na commissão, e repito agora: se alguem propozesse que ao explorador Serpa Pinto fosse concedido o posto de major, sem a clausula de não serem prejudicados na antiguidade outros officiaes, eu não hesitava em approvar essa proposta. E votava-a, porque? Porque as nossas leis militares auctorisam a promoção com prejuizo de antiguidade, todas as vezes que se pratiquem actos de dedicação e coragem.

Eu julgo que os actos praticados pelo major Serpa Pinto não são inferiores a qualquer feito de bravura n'um dia de batalha: porquanto elle deu mostras de bravura e intrepidez, não sómente n'um dia, mas em dias, em mezes consecutivos.

Á vista d'isso, o que podia acontecer? Queixarem-se os capitães mais antigos? Eu digo a esses capitães: Fazei o mesmo que Serpa Pinto, praticae actos tão corajosos como elle praticou, e tereis, para obterdes igual concessão, o apoio do meu voto, que é o mais com que vos posso ajudar no parlamento.

Dispensar apenas de voltar a Africa o major Serpa Pinto, que já na Africa tanto tempo esteve, e tantos trabalhos supportou, prestando serviços reconhecidos não só no paiz, mas pelos estrangeiros, onde foi recebido nas sociedades de geographia pelos homens de sciencia, que trabalham de coração, parece-me, repito, uma recompensa insignificante, que está abaixo dos serviços feitos por aquelle official. Torno a repetir, eu não faço proposta alguma, e voto o projecto, porque é melhor do que não conceder nada; mas a fallar a verdade, eu desejaria que os poderes publicos, inspirando-se na importancia d'aquelles serviços, concedessem uma remuneração mais larga.

Disse ha pouco o nobre ministro da marinha, que o governo se reservava para fazer outra demonstração de apreço para com os serviços d'aquelle official, dando-lhe maior recompensa. Permitta-me s. exa. que lhe diga que o governo não poderá fazer isso sem lei que o auctorise.

O sr. Ministro da Marinha (Marquez de Sabugosa): - Apoiado.

O Orador: - Sem essa lei, só lhe poderá fazer alguma concessão honorifica, como já fez; eu desejaria, porém, recompensa de outro alcance, porque as honorificas podem aggravar um pouco a situação de um official pela rasão de importarem despezas consideraveis, como direitos de mercê, sêllo, etc.

A minha opinião, pois, é que a recompensa fosse mais solida e mais real, e essa não póde ser para um official do exercito senão a concessão de um posto na sua carreira. Não creio que isto seja uma cousa extraordinaria. Não quero fazer politica nem crear embaraços ao governo, se é que d'esta questão lhe poderia advir qualquer difficuldade, o que não é crivel.

Eu não conheço este official senão de o ver em uma conferencia que teve logar no salão da Trindade; mas conheço, como toda a gente, os seus grandes serviços, e dou-lhes toda a importancia que elles merecem.

Por ultimo direi que acompanho o sr. visconde de S. Januario nas suas observações ácerca das difficuldades do commettimento do sr. Serpa Pinto, e parece-me que esta camara se honrava dando a este official uma vantagem mais condigna e adequada aos serviços relevantes que elle prestou.

(O orador não reviu o seu discurso.)

O sr. Ministro da Guerra (João Chrysostomo): - Concordo com as idéas do digno par que acaba de fallar, e, como s. exa., entendo tambem que os actos praticados pelo major Serpa Pinto merecem alta remuneração; mas este projecto não tem por fim significar a unica recompensa devida áquelle distincto official. Do que principalmente se trata aqui, como muito bem disse o sr. visconde de S. Januario, é de regularisar a posição do mesmo official, pois é certo que elle, em vista da lei, tinha de cumprir uma obrigação que o governo não lhe podia dispensar por acto proprio. Era necessario que o parlamento interviesse e se fizesse uma lei para tal fim. Essa era a primeira condição a preencher emquanto ao posto do accesso, mas o governo tinha desde logo dado demonstrações do apreço e consideração que merecem os serviços do sr. Serpa Pinto, conferindo-lhe differentes mercês honorificas. A missão, porém, d'este distincto official ainda não está ultimada e não se limitou ao acto audacioso de atravessar o continente africano; nós conhecemos e avaliâmos esse acto de tanto arrojo, que conquistou desde logo ao sr. Serpa Pinto grande consideração, não só da parte dos poderes publicos e de todos os seus concidadãos, mas tambem da parte dos sabios estrangeiros e de todas as pessoas que sabem dar valor a similhantes actos. Mas a missão e serviços da major Serpa Pinto não consiste só n'isso. Elle realisou tambem trabalhos e observações scientificas que está colligindo, e o governo, sendo o primeiro a reconhecer que o distincto explorador patenteou a ousadia e resolução necessarias para os grandes commettimentos d'esta ordem, e que animado dos brios e enthusiasmo proprio para emprezas tão audaciosas como são as expedições atravez da Africa, só por isso merece grande consideração e apreço; esperava comtudo que aquelle official concluisse a sua missão e apresentasse o resultado dos seus trabalhos scientificos, não menos importantes, para então lhe dar a recompensa condigna e completa.

Para quem como o major Serpa Pinto executou aquella missão com enthusiasmo e desinteresse, desprezando os perigos a que se expoz, a verdadeira recompensa está na consideração e estima publica e geral, e no legitimo orgulho de ter praticado um acto meritorio a bem do progresso scientifico e da humanidade. Portanto, o residir no continente africano ou no continente europeu por alguns annos, e a maior ou menor altura na escala do accesso, são cousas por certo de pouca monta para este distincto official.

Mas deve concluir-se só pela pequena recompensa que resulta d'este projecto de lei, que o governo não esteja disposto a premiar mais condignamente os importantes serviços d'este illustre official? De certo que não.

Os trabalhos que o major Serpa Pinto tem a apresentar talvez não sejam de menor valia e importancia que o seu arrojo; esses trabalhos certamente deverão ser preciosos para a sciencia, e deverão mostrar que o seu auctor é digno de maior remuneração. (Apoiados.) Ora: por occasião da apresentação d'esses trabalhos, que hão de ser devidamente apreciados, é que os poderes publicos poderão melhor proporcionar a remuneração devida.

Por consequencia a approvação d'este projecto não importa mais do que regularisar a situação d'este official e não inhibe que se apresentem propostas, em tempo opportuno, para que se dê o devido galardão a todos os serviços e trabalhos praticados por este benemerito portuguez.

O sr. Conde de Rio Maior: - Sr. presidente, as re-