4 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
dias sem sair de casa, com receio de ser lançado nas enxovias da terra.
D'aqui resultou que o commerciante, dirigindo-se ao Presidente da Relação e ao procurador regio, pediu-lhes providencias.
O Presidente da Relação mandou que o juiz effectivo se apresentasse na comarca e o procurador regio procedeu da mesma forma a respeito do seu delegado na comarca de Mirandella.
Escusado será dizer que, mal o juiz effectivo chegou á comarca, foi acceito o fiador que o commerciante apresentava.
Sendo o juiz incumbido de fazer um relatorio sobre os acontecimentos, expôs singelamente que tudo derivava da falta de competencia do substituto, visto que dos quatro bacharéis formados, que tinha proposto, nenhum havia sido acceito.
O Presidente da Relação mandou que o juiz fizesse uma nova proposta. Essa proposta teve a mesma sorte da primeira, o que levou, o juiz, que é um magistrado integerrimo, a declarar que não fazia mais propostas.
Mais tarde, dos quatro nomes que figuraram na segunda proposta, o que estava em quarto logar passou para n.° 1.
Claro está que o Sr. Ministro da Justiça tem o direito de nomear quem quiser; mas ha uma circunstancia especial neste caso, que eu vou referir á Camara.
A lista publicada no Diario ao Governo é composta dos seguintes nomes:
Olimpio Guedes de Andrade.
Antonio de Oliveira Gomes.
Alberto de Araujo Leite.
Francisco da Costa e Sá.
Este ultimo cavalheiro é uma autoridade politica na comarca de Mirandella e que já foi recebedor em Macedo de Cavalleiros, tendo deixado de o ser por virtude de exigencias da politica então feita no districto de Bragança.
O motivo do Sr. Costa e Sá passar a quarto juiz substituto não foi certamente maguar o Digno Par Eduardo José Coelho, mas a verdade é que o conservador reunia todas as qualidades para exercer o logar, emquanto que o Sr. Costa o Sá vive a uma grande distancia da sede da comarca e é um individuo que conta mais de 70 annos, comprehendendo-se que não estava nas melhores circunstancias de frequentar a sede da comarca.
Julguei opportuno dar á Camara estes simples esclarecimentos, e remato dizendo ainda que isto de juizes substitutos em Mirandella é cousa difficil e complicada.
O Sr. Ministro da Justiça respeitou, e muito bem, o decreto que dá autoridade e força para nomear juizes substitutos, mas certamente não conhece todas ás providencias de que os Srs. Ministros podem lançar mão para proceder a essas nomeações.
Ahi por 1905 tambem houve juizes substitutos em Mirandella, com a differença de que os dois primeiros, em logar do serem correligionarios do Sr. Eduardo José Coelho, militavam no partido a que tenho a honra de pertencer. Um era illustre membro da outra casa do Parlamento, e o outro era meu amigo e correligionario.
Mas, Sr. Presidente, um bello dia, tendo o juiz da comarca pedido licença, e tendo-lhe sido concedida, recebeu um telegramma directo, ordenando-lhe que não entregasse a vara ao primeiro substituto, porque exercia logar incompativel, nem ao segundo, que ia ser syndicado, e que entregasse ao terceiro, que não era meu correligionario.
Para que V. Exa. comprehenda que isto de juizes substitutos faz dar volta ao miolo a muita gente, dir-lhe-hei que estas cousas até se fazem com completo desconhecimento do Ministro da pasta.
Quem assim procede não sei eu, mas os anjos que lhe respondam.
(O Digno Par não reviu).
O Sr. Eduardo José Coelho: — Requeiro a V. Exa. que consulte a Camara sobre se permitte que eu use da palavra para responder ao Sr. Ministro da Justiça.
O Sr. Presidente: — Eu não posso dar agora a palavra a V. Exa., porque já chegou a hora de se entrar na ordem do dia.
O Sr. Eduardo José Coelho: — Então peço a V. Exa. que mo inscreva para antes de se encerrar a sessão.
Vozes: — Fale, fale.
O Sr. Eduardo José Coelho: — Faço V. Exa. arbitro d'esta questão, na certeza que sei defender as minhas prerogativas, como membro d'esta Camara.
Eu pedi a palavra para responder ao Sr. Ministro da Justiça, antes de a ter pedido o Sr. Teixeira de Sousa. Eu não posso ficar debaixo da objurgatoria amigavel do Digno Par.
Era dever de V. Exa. dar-me a preferencia, visto que eu sou o interpellante.
O Sr. Presidente: — Nesse caso fica V. Exa. inscrito para antes de se encerrar a sessão, notando ao Digno Par que o assunto de que se trata não era uma interpellação, mas sim um simples incidente. V. Exa. fica inscrito para antes de se encerrar a sessão.
O Sr. Eduardo José Coelho: — Já declarei a V. Exa. que pedia para ficar com a palavra reservada para antes de se encerrar a sessão, visto que o meu requerimento para usar immediatamente da palavra se torna impertinente.
O Sr. Presidente: — Eu estava consultando a Camara sobre o requerimento do Digno Par, quando S. Exa. disse que preferia usar da palavra antes de se encerrar a sessão.
O Sr. Eduardo José Coelho: — O Sr. Ministro da Justiça acaba de me dizer que não pode assistir ao final da sessão.
O Sr. Presidente: — Os Dignos Pares que permittem que se dê a palavra ao Sr. Eduardo José Coelho tenham a bondade de se levantar.
A Camara resolveu affirmativamente.
O Sr. Eduardo José Coelho: — Sr. Presidente: serei parco nas minhas considerações, embora o assunto merecesse larga explanação.
Tudo eu podia esperar, mas confesso que fui surprehendido pelo facto do Digno Par Sr. Teixeira de Sousa vir intercallar na minha interpellação, que versa um facto concreto, assuntos a ella estranhos e alguns factos, segundo a sua narração, succedidos ha annos, e a respeito dos quaes o Digno Par fez largas considerações.
S. Exa. entendeu que assim cumpria o seu dever, e eu não tenho que o arguir por esse facto. A Camara não pode apreciar este debate sem compulsar os documentos que a elle respeitam. Eu não gosto de falar em questões parlamentares sem documentos á vista, e por isso pedi a proposta integral do Presidente da Relação.
Estranhei tambem a resposta do Sr. Ministro da Justiça. S. Exa., que é quasi sempre tão suave e tão doce, respondeu-me com uma acrimonia que não está em harmonia com os seus habitos, nem a minha pergunta merecia tanta vehemencia, nem tantas susceptibilidades. A verdade é que ò Sr. Ministro da Justiça não se sente bem collocado.
S. Exa. attribuiu-me um estado de irritação que a Camara decerto não presenceou, e para o seu testemunho appello.
A esse respeito louvo-me no criterio da Camara.
O Digno Par Sr. Teixeira de Sousa veio depois fazer declarações que reputo gravissimas, declarações relativas ao Presidente da Relação do Porto e que me levam a pedir sem detença ao Sr. Ministro da Justiça que me envie as informações que vou pedir.