SESSÃO N.° 38 DE 10 DE AGOSTO DE 1908 7
desenvolver dos minuciosos calculos do Digno Par Sr. Ressano Garcia sabe que a verba de desistencias se eleva a 3:925 contos de réis.
Isto é, muito mais do que a somma dos auxilios prestados pelo Estado á Fazenda da Casa Real.
Estes foram, no tempo de El-Rei D. Luiz, de 967 contos de réis, segundo a autorização da lei de 2 de maio de 1885.
No reinado de El-Rei D. Carlos esses soccorros,- representados em reclamações antigas e modernas da Casa Real, em rendas correntes de predios do usufruto da Coroa que estão na posse do Estado, e em supprimentos legalizadas e não legalizados, sobem, segundo o calculo do Sr. Baracho, a 2.196:688$598 réis.
Ora é de notar que este calculo, que julgo errado, é tambem exageradissimo.
A maior parte d'esta quantia recebeu-a a Casa Real por ter direito a isso; mas, que assim não fosse, a somma dos auxilios do Estado seria ainda inferior em 761:311$402 réis áquelles que elle recebeu da Fazenda da Casa Real.
Bastava, pois, que os Soberanos nunca desistissem de parte da lista civil em favor da nação, para que a fazenda da Casa Real fosse prospera, sem carecer dos soccorros do Estado.
As despesas de representação tambem teem aumentado consideravelmente.
Durante o reinado do Senhor D. Luiz, se bem se lembra, apenas vieram a Portugal o Principe de Galles, o Rei de Espanha Affonso XII e o Imperador do Brasil; mas no decorrer do reinado da fallecido Rei D. Carlos recebemos as visitas dos Soberanos da Inglaterra, da Allemanha e de Espanha, do Presidente da Republica Francesa, do Rei de Saxe, da Rainha de Inglaterra e do Principe de Hohenzollern.
Houve, portanto, no reinado do Senhor D. Carlos maiores despesas, que affectaram tambem a fazenda da Casa Real.
Taes são as causas principaes que teem concorrido para os embaraços financeiros da Casa Real.
O Estado tem procurado remediar esses embaraços por successivas medidas. Para isso foram promulgadas as leis de 23 de maio de 1859, 30 de julho de 1860, 23 de maio de 1863 e 12 de abril de 1876, que permittiram a venda de diamantes da Coroa, para o seu producto ser convertido em inscrições cujos juros fossem usufruidos pelo Chefe do Estado, e as leis de 25 de junho de 1864 e 7 de abril de 1877, permittindo para igual fim o aforamento, sobrogação e venda de terrenos da Coroa.
O producto total d'essas operações deu em resultado a acquisição de inscrições do valor nominal de 2:029 contos de réis.
Os embaraços continuaram; as leis de 7 de abril de 1877, 14 de maio de 1880 e 12 de agosto de 1882 autorizaram a Casa Real a contrahir emprestimos na totalidade de 900 contos de réis.
Encontrando-se esta quantia, com os seus juros, elevada a 967 contos de réis, a lei de 2 de maio de 1885 autorizou a Junta do Credito Publico a adeantar á Casa Real a quantia precisa para o seu pagamento, mediante a caução de inscrições no valor preciso para o seu reembolso, ficando autorizada a aliená-las, de acordo com o Governo, para seu pagamento.
Quanto á questão das reclamações antigas e modernas da Casa Real e das rendas dos predios da Coroa na posse do Estado, faz a sua historia desde 1879, chegando á conclusão de que a commissão nomeada apurou em favor da Casa Real os creditos de 120:328$828 réis e 507:698$998 réis, e, abatendo-se as dividas da Casa Real ao Estado, ficou o saldo a favor d'esta reduzido a 401:980$381 réis.
Feita largamente a historia das reclamações antigas e modernas, passará á das rendas de predios, da Coroa.
O Sr. Baracho considerou e fez bem, em igualdade de circunstancias todos os predios arrendados. O Sr. Ressano, porem, encontrou differenças entre os antigos paços reaes e de que provieram da extincção da Casa do Infantado, entendendo que estes não pertencem á Coroa emquanto não for renovada a lei de 16 de julho de 1855.
Não teve S. Exa. razão quando tirou esse argumento do artigo 1.° d'essa lei, que sem duvida não leu até o fim. Esse artigo não foi para dar a El-Rei D. Pedro V os palacios do Infantado: foi para lhe tirar provisoriamente o Palacio da Bemposta. Os outros pertenciam-lhe já, como pertencem a todos os successores do Rei, nos termos do artigo 85.° da Carta Constitucional a que se refere o decreto de 18 de março de 1834. Assim se deduz das leis e assim se entendeu sempre, como se vê pela parte final do decreto de 9 de dezembro de 1850.
Explicando e desenvolvendo a doutrina dos diplomas citados, em rosposta a varias interrupções do Digno Par Sr. Ressano Garcia, conclue que tanto os antigos como os palacios que vieram para a Coroa depois da extincção da Casa do Infantado, estão em iguaes circunstancias — na posse da Fazenda Nacional para usufruto da Coroa.
As rendas por varios predios que fazem parte ou são dependencias d'esses palacios foram cedidas em 1894. Louvados os predios, foram arbitradas as rendas segundo 5 por cento do valor da avaliação, começando o pagamento em 12 de outubro de 1894, autorizado por despacho ministerial d'esse mês, á razão de 27:654$000 réis annual, subindo em 1895 a 28:903$992 réis por serem arrendadas então dependencias do Palacio de Queluz.
O arrendamento é legal, segundo as disposições da lei civil. Desde que a Casa Real usufrue estes predios da nação, desde que a lei de 16 de julho de 1865 claramente permitte que possam ser arrendados, com exclusão dos jardins e palacios, nada obsta a que a Casa Real, usufrutuaria, os arrendasse ao Estado, proprietario. São até vulgares os contratos d'essa natureza, e perfeitamente legaes.
Pelo que diz respeito aos pagamentos, dirá que tanto os das reclamações antigas, como os das modernas, como os das rendas correntes estão legalizados pelas leis orçamentaes de 13 de maio de 1896 e 12 de junho de 1901.
A disposição da primeira é effectivamente pouco clara, mas a da segunda é extremamente intelligivel.
Desde que essas leis foram votadas, as responsabilidades do pagamento passaram para o poder legislativo: deixa1 ram de ser dos Governos.
Entende que o pagamento das rendas correntes é extremamente regular e justo.
Quanto ao das antigas parecia-lhe melhor não tivesse sido pedido; mas deve confessar-se que esse assunto foi tratado com as formalidades devidas, por uma commissão competente, e encontra-se legalizado e autorizado pelas Côrtes.
E assim esclarecida a questão das reclamações e das rendas continuará a tratar das difficuldades financeiras da Casa Real.
As causas que as motivaram, o aumento de despesas de representação, sobretudo, aggravaram-se nos ultimos annos do passado reinado e os Governos, por motivos que não vêem para aqui, e a seu tempo se hão de esclarecer, fizeram supprimentos á Casa Real até o valor de 771:715$700 réis.
Fez-se a tal respeito uma nova liquidação pelo decreto de 30 de agosto de 1907, o que representa um grande erro politico.
O certo é que esse decreto, tão nocivo, não liquidou a questão. Suspenso esse decreto, a questão ficou de pé.
Poderia tê-la liquidado a morte de El-Rei D. Carlos, se não fossem as declarações tão nobres e tão levantadas do actual Monarcha.
Assim o affirma, porque se não fosse a vontade de El-Rei, a nação não poderia exigir-lhe o pagamento dos supprimentos feitos a seu Pae, em virtude