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CAMARA DOS DIGNOS PARES.

EXTRACTO DA SESSÃO DE 1 DE MAIO.

Presidencia do Exm.º Sr. Visconde de Algés, Vice-Presidente supplementar.

Secretarios - os Srs.

Conde de Mello.

Conde da Louzã (D. João).

(Assistiam os Srs. Ministros, da Marinha, e da Fazenda.)

Pelas duas horas e um quarto da tarde, tendo-se verificado a presença de 37 dignos Pares, declarou o Ex.mo Sr. Presidente aberta a sessão.

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Leu-se a acta da antecedente, contra a qual não houve reclamação.

O Sr. Secretario Conde de Mello leu o seguinte

Officio da Camara dos Srs. Deputados, acompanhando uma proposição de lei sobre o modo de serem eleitos os Presidentes, e vice-Presidentes das Camaras municipaes, e seus substitutos.

A commissão de administração publica.

O Sr. Presidente — Peço a attenção da Camara. Veio ha pouco tempo da Camara dos Srs. Deputados um projecto de lei sobre o recrutamento, que foi mandado ás commissões de administração publica e de guerra; mas a Mesa intendendo que a doutrina deste projecto era complicada, e carecia de um estudo previo, mandou imprimir um numero suficiente de exemplares para distribuir pelos dignos Pares, a fim de o poderem ir estudando, e confrontar depois com o parecer das commissões reunidas (apoiados). Portanto, se a Camara quer, vai distribuir-se (apoiados).

O Sr. Visconde de Fonte de Arcada — Eu desejava que fosse pratica constante o que V. Ex.ª acabou de fazer a respeito d'esse projecto, porque realmente é de muita utilidade.

O Sr. Presidente — Mas permitta-me V. Ex.ª que diga, que a Mesa fez esta excepção por ser um projecto muito complicado, mas se fosse fazer o, mesmo a todos seria uma despeza muito grande.

O orador — Eu não pretendo que sejam todos, mas só os que foram mais importantes.

O Sr. Presidente — A Mesa deixa isso á deliberação da Camara, e quando ella decidir assim o fará. (O Sr. Visconde de Fonte Arcada — Muito bem.) Vai fazer-se a segunda leitura da proposta apresentada pelo Sr. Visconde de Sá.

É a seguinte: Proposta de additamento aos artigos do Regimento da Camara dos Pares.

«Quando a Camaras dos Pares, em cumprimento do artigo 10.° do Acto addicional á Carta Constitucional da Monarchia tiver de examinar, discutir e votar um Tractado, Concordata ou Contenção que o Governo houver celebrado com qualquer potencia estrangeira, observar-se-hão as regras seguintes:

1.ª O Presidente da Camara dos Pares, tendo recebido da Presidencia da Camara dos Srs. Deputados o competente projecto de lei, dará disso parte á Camara na primeira sessão publica que houver.

2.ª Em seguida e em sessão secreta será lido projecto de lei com o respectivo Tractado, Concerdata ou Convenção.

3.ª Depois praticar-se-ha a seu respeito o mesmo, que pelo Regimento da Camara se acha prescripto para o exame dos outros projectos de lei, menos no que diz respeito á impressão.

4.ª Logo que a commissão tiver examinado o projecto de lei, e houver communicado ao Presidente da Camara, que tem prompto o seu parecer sobre o mesmo projecto, o Presidente mandará, - por uma circular, fazer aviso a todos os Pares que estiverem em Lisboa, de que o mesmo projecto de lei com o parecer da commissão se acharão em um gabinete reservado da Camara, pare alli poderem ser examinados pelos Pares, que quizerem, indicando na mesma circular o numero de dias que alli estarão os mesmos documentos

5.ª Depois, em sessão publica da Camara, o Presidente designará o dia em que o projecto de lei deverá principiar a ser discutido.

6. Terminada que seja a discussão se procederá á votação do projecto de lei, a qual se fará pelo modo ordinario, ou nominalmente se assim a Camara o decidir.

7.° Em seguida tornar-se-ha a sessão publica, e o Presidente annunciará a solução dada ao projecto de lei.

Camara dos Pares, 30 de Abril de 1855. = Sá da Bandeira.»

Foi admittida, e mandada á commissão de legislação.

O Sr. Presidente = Hontem houve um incidente nesta Camara por occasião de ter pedido a palavra antes da ordem do dia o Sr. Visconde da luz; e ficaram ainda inscriptos alguns dignos Pares, assim como o Sr. Ministro da Fazenda, sobre o mesmo objecto; em quanto estes dignos Pares não desistirem da palavra continua a discussão, e o Sr. Visconde da Granja tem a palavra.

O Sr. Visconde de Granja — Sr. Presidente, o incidente que hontem occupou a Camara durante toda a sessão parece-me que se deve considerar terminado (apoiados), e pela minha parte não desejo concorrer para ella progredir, nem mesmo tenho muito interesse nesta questão. Eu envolvi-me na discussão em consequencia de uma accusação que se fez, e sobre a qual já dei uma explicação em defeza dos tribunaes militares então agredidos; e agora só me pertence, em continuação dessa defeza, mandar para a Mesa uma estatistica de 130 réos que foram condemnados em ultima instancia, e a qualidade dos crimes que foram punidos, cujas penas foram perdoadas ou commutadas: tambem já mandei o mappa dos réos condemnados a pena ultima, mas nessa occasião não podia dizer o destino que tinham tido esses processos, e agora posso dizer que a tres desses réos foram commutadas as sentenças de morte na pena immediata, e entre elles ao celebre major Christiano.

Em quanto aos outros todos ainda está pendente do Poder moderador a resolução dos seus processos, tendo decorrido para alguns mais de tres annos; e eu pedia agora aos Srs. Ministros que empregassem a sua influencia, e todos os meios ao seu alcance para se obter essa solução, porque demorar a imposição n'uma pena qualquer por muito tempo, faz perder grande parte do effeito moral quando não segue immediatamente o delicto, o além disso 6 tambem uma especie de deshumanidade conservar suspensa a espada da justiça por muitos annos sobre a cabeça de um réo condemnado á pena de morte.

Portanto eu pedia a SS. EE. que promovessem dar-se uma solução qualquer a estes processos (apoiados).

O Sr. Ministro da Fazenda — Como o digno Par, que tinha a palavra, cedeu della, limitando-se a mandar para a Mesa um documento a que tinha alludido nesta casa, não irá elle orador suscitar uma nova discussão nesta Camara, da qual nenhumas vantagens podem resultar para o paiz. (O Sr. Conde de Thomar — Não fui eu.) Mas hontem entrou o digno Par nesta questão. (O Sr. Conde de Thomar — Foi para responder ao Sr. Visconde da Luz.) E, pelo contrario, está convencido de que é mais util para a disciplina do exercito e para as conveniencias publicas pôr de parte este incidente, do que continuar a tractar delle (apoiados); por isso não duvida ceder tambem da palavra, uma vez que os outros dignos Pares, que estão inscriptos depois, façam a mesma cessão; pois do contrario ver-se-ha obrigado a pedi-la novamente, porque não ha-de deixar correr o debate á revelia. Espera que a Camara comprehenderá o motivo do seu procedimento (apoiados).

O Sr. Presidente — Se os dignos Pares, que estão ainda inscriptos, cederem da palavra, o Sr. Ministro tambem cede: SS. EE. dirão se querem fallar.

O Sr. Visconde de Sá da Bandeira – Pois eu não cedo da palavra, e desejo dizer alguma cousa (riso).

Quanto á allegada indisciplina do exercito, direi que em todos os tempos tem occorrido casos de indisciplina, e sempre que ha uma reunião grande de homens apparecem crimes: é isto o que acontece em toda a parte. Sobre este objecto já se fallou bastante. Passarei agora a occupar-me especialmente do que hontem se disse aqui relativamente a revoluções. Parecia-me melhor pôr de parte increpações sobre o que se tem feito a este respeito nos ultimos trinta e cinco annos em que temos experimentado tantas revoluções politicas, cujo resultado final não tem sido máo para o paiz, porque hoje ninguem póde desconhecer que a nossa patria está n'um estado superior áquelle em que estava antes de 1820, quanto á liberdade individual (apoiados), e ao desenvolvimento da industria fabril e agricola: temos uma cultura como nunca tivemos, o que é demonstrado pela saída dos nossos portos, de grande quantidade de cereaes e de outros generos diversos; quando em outro tempo só no porto de Lisboa se importavam para consumo 70:000 moios de trigo annualmente, segundo affirma Bento de Moura Portugal.

Mas eu quero chamar a attenção da Camara particularmente sobre as seguintes ponderações: em consequencia do numero consideravel de commoções politicas occorridas em Portugal, desde que se publicou a Carta constitucional tem successivamente dominado as parcialidades politicas, que tem obtido a supremacia proveniente dessas commoções. E a Corôa tem constantemente sido, não digo obrigada, mas levada a chamar aos seus conselhos homens influentes daquella parcialidade politica que tinha a supremacia no momento. Disto, a consequencia tem sido que, em geral, as administrações formadas não tem saído normalmente do parlamento. Por outro lado, uma boa parte das administrações que successivamente tem governado, e não cito nomes nem tempos, mas tomo a these em geral, e posso fallar porque por vezes fui Ministro e Presidente do Conselho; uma boa parte, digo, dessas administrações tem procurado, trazer ao parlamento individuos seus para sustentarem a sua politica, e para o conseguir empregavam ás vezes meios mais ou menos violentos, e outras vezes empregavam meios, senão desta natureza, de outra mais suave; com o que obtiveram o mesmo fim. Todos estes meios são irregulares.

O Principe, que dentro em poucos mezes deverá reger o nosso paiz, foi nascido durante uma das nossas guerras civis, em Setembro de 1837. Mencionarei uma circumstancia que nesse tempo teve logar: o nobre Marechal, que esta presente, achava-se no campo opposto áquelle em que eu, com um valente General, fallecido, alli estava; e tendo eu recebido, por uma parte telegrafica, a noticia do nascimento de Sua Alteza o Principe Real, em occasião em que o illustre Marechal e o seu collega, hoje Presidente do Conselho, depois das occorrencias de Ruivães, haviam mandado um official para se tractar determinar a questão que nos dividia, foi por elle que tive occasião de lhe participar o nascimento do herdeiro da Corôa.

Nasceu, é verdade, este Principe quando a guerra civil existia; mas tambem é certo que já os principios da liberdade dominavam na patria. Não se contestava então contra o poder absoluto, que depois de quatorze annos de conflicto, e de nos ter vencido em 1823 o em 1828, achava-se desde 1834 completamente anniquillado. Combatia-se por certas modificações da organisação constitucional, por uma cousa (que se póde dizer) que não valia a pena de combater (riso).

As revoluções por que temos passado tem sido uma serie de calamidades para o paiz. Convém pois procurar esquecer as nossas dissenções para proveito commum. Nós já estamos n'uma idade avançada, temos trabalhado durante trinta e cinco annos para o triumpho da independencia e da liberdade da patria. Soffremos muito, combatemos durante muitos annos, a final vencemos. Deixaremos aos nossos successores o paiz em melhor estado do que estava quando começou a grande lucta. Convirá pois que quando se entregar o governo do Estado ao novo hei, que elle entre plenamente no exercicio de um poder perfeitamente constitucional (apoiados).

Parece-me, por isso, que o Ministerio faria o maior serviço á nação, e igualmente a Sua Magestade, em apressar u discussão da lei eleitoral na outra Camara, para que no proximo anno umas novas Cortes possam apresentar o Monarcha á expressão completa e verdadeira da vontade e dos desejos do paiz (apoiados).

O Sr. Conde de Thomar — Muito bem.

O orador — Pedi a palavra para expressar este meu voto, e não tomarei mais tempo á Camara.

O Sr. Conde de Thomar — Muito bem.

O Sr. Presidente – O Sr. Ministro da Marinha tambem pediu a palavra. (O Sr. Ministro da Marinha— Eu cedo da palavra.) Então está concluido este incidente, e pertence agora a palavra ao Sr. Barão de Porto do Moz, que a tinha pedido hontem para antes da ordem do dia.

O Sr. Barão de Porto de Moz — É para mandar para a Mesa uma nota de interpellação ao Sr. Ministro da Justiça (leu);

«Pretendo interpellar o Sr. Ministro dos Negocios Ecclesiasticos e de Justiça sobre a execução que tem dado á Lei de 18 de Agosto de 1848. artigo 3.°, e § 3.° com relação á Lei de 15 de Setembro de 1845. Sala da Camara dos dignos Pares, em 30 de Abril de 1853. = Barão de Porto de Mos.

E sobre, a transferencia dos Juizes, e a syndicancia delles; peço a, V. Ex.ª que lhe dê direcção.

Mandou-se expedir.

O orador — Aproveito a occasião de estar em pé para pedir a V. Ex.ª que convide a commissão de legislação a dar com a possivel brevidade o seu parecer a respeito de um projecto vindo da outra Camara, sobre coimas; porque esta Lei é reclamada das provincias com urgencia.

O Sr. Presidente — Os membros da commissão estão presentes, e tomarão em consideração a observação do digno Par. Agora tem a palavra antes da ordem do dia, e que pediu hoje, o Sr. Visconde de Sá da Bandeira.

O Sr. Visconde de Sá da Bandeira — Pedi a palavra para chamar a attenção da Camara, e particularmente dos Srs. Ministros, sobre o caso da saída de Caminha de um navio chamado Incógnito com emigrados. Segundo diz um jornal de Vigo, este navio saiu com despacho de que a bordo levava 57 passageiros, ao mesmo tempo que pela sua carta de saude constava que haviam 200 passageiros a bordo, e as authoridades em Vigo acharam que haviam 234. Dizia-se que havia facultativo a bordo, e as authoridades hespanholas reconhecem que não havia no navio tal facultativo. Dizia-se tambem que havia bastantes mantimentos a bordo, e os passageiros depozeram que eram tractados pessimamente, passando fome. Lerei agora o que escreve o jornal de Vigo, transcripto no jornal de Lisboa o Português (leu).

Ora agora, casos similhantes a este teem sido repetidos muitas vezes; é preciso dar providencias legislativas sobre este objecto, mas precisam de ser bem meditadas, porque a questão da emigração, 6 uma questão complexa e complicada, que prende com outras muito importantes (apoiados). É muito difficultoso fazer immediatamente um projecto de lei sobre este assumpto, e eu proponho á Camara que seja convidado o Governo a fazer preparar no intervallo das sessões legislativas um projecto de lei sobre este assumpto; e espero que os Srs. Ministros, accederão á proposta seguinte (leu).

Na proposta não entrei em especificações, porque se o Governo disser que está disposto a nomear uma commissão para preparar o projecto de lei, não preciso dizer mais cousa alguma sobre isto. Mando pois este papel para a Mesa; e sendo necessario exporei a razão por que se recommenda ao Governo esta medida.

O Sr. Ministro da Marinha acceita, por parte do Governo, a proposta do digno Par; e por consequencia ou S. Ex.ª a mande para a Mesa, ou não, o Governo se encarrega de nomear uma commissão para tractar deste objecto (O Sr. Visconde de Sá — Estou satisfeito). Entretanto julga necessario dizer algumas palavras sobre o palhabote Incógnito. É exaggerado o que se tem dito a tal respeito, ainda que no fundo tudo é certo. Houve um emprehendedor, dono daquelle patacho, ou o Capitão, que levou na capacidade em que cabiam 57 passageiros 250, os quaes embarcaram em diversos pontos da costa. É verdade que a comida não era a equivalente ao pagamento que deram, mas não era má. Este palhabote, obrigado pelo tempo a entrar em Vigo, as authoridades trouxeram para terra os seus naturaes, fizeram os exames que o digno Par acabou de ler, e o nosso Consul chamou a si todos os papeis que permittiam a navegação livre deste palhabote; comtudo as authoridades hespanholas, o Sr. Ministro suppõe que sem culpa das mesmas, mas de alguem, permittiram que saísse áquelle palhabote, a tempo que já estava para sair um vapôr nosso para capturar aquella embarcação que saiu sem papeis, e por ter ido contra a Lei, que permitte só cinco passageiros a cada duas toneladas. Portanto não ficou ao Governo outro meio para castigar esta infracção de Lei senão escrever aos Consules portuguezes nas diversas paragens, para que, segundo as Leis dos paizes em que estão acreditados, requeiram o castigo correspondente, porque assim os magistrados hão de attender ás queixas que se devam fazer, a fim do se ver se esses homens são castigados; e pois se effectivamente levaram 200 e tantos passageiros n'um palhabote em que só podiam caber 57, é peior do que os navios em que iam os pretos (apoiados).

Quando o Sr. Ministro disse que approvava a proposta do digno Par, teve tambem em vista outra cousa. Accusou-se fortemente o Consul de Pernambuco, quando alli foi o Arrogante, por que não o apprehendeu; mas é preciso attender a que áquelle Consul fez o que devia fazer, o a prova está no que aconteceu com este palhabote que veio para um porto do paiz aonde tinha atacado a Lei; e que fizeram as authoridades desse mesmo paiz? Deram licença ao Capitão para sair da prisão em que estava, acceitaram-lhe fiança, e correu o processo favoravel a elle; mas a causa disto está em não haver a Lei, como disse o digno Par, e por isso elle Sr. Ministro acceita a proposta que S. Ex.ª fez.

O Sr. Silva Costa - Mando para a Mesa um

parecer da commissão de guerra sobre a proposta do Sr. Conde do Sobral a respeito dos veterinarios.

O Sr. Presidente — Este parecer manda-se imprimir para se distribuir, e entrar em ordem do dia.

O Sr. Ministro da Fazenda (por parte do Governo) disse que foi á Mesa ver a ordem da inscripção, e achou que estão alguns dignos Pares inscriptos para terem a palavra antes da ordem do dia; e com quanto não possa nem tenha a pertenção de contribuir para que S. Ex.ª não usem da palavra, se o julgarem conveniente o indispensavel, parece-lhe comtudo que não levarão a mal, que lhes peça, por especial favor, tanto quanto estas cousas se podem pedir por favor, que, se poderem deixar para a sessão immediata o tractarem dos objectos sobre que teem tenção de occupar a Camara, consintam em que se entre já na ordem do dia, principalmente para a Camara se occupar do projecto que authorisa o Governo a effectuar o contracto com o Banco de Portugal para o emprestimo de 500 contos para construcção das estradas do reino, objecto que o Governo considera urgente, o que a Camara assim reconheceu; e além do tudo isso, está fazendo falta na outra casa do Parlamento, e não póde demorar-se aqui sem ser por objecto da sua repartição.

O Sr. Presidente — Os dignos Pares ouviram, o requerimento que faz o Sr. Ministro; se não ha reclamação, resta-me só consultar a Camara para saber se quer com effeito começar desde já com a ordem do dia.

O Sr. Conde do Bomfim — Eu reclamo, mas é só para participar que o digno Par o Sr. Barão de Pernes, por falta de saude, não tem comparecido; e posto já se fizesse essa communicação. n'um outro dia, elle pede-me que observe, que appareceu já relacionado com aquelles que tinham faltado sem causa conhecida, talvez por que não prevenira que o seu incommodo continuaria.

O Sr. Presidente — Consulto a Camara par saber se ella quer passar á ordem do dia.

Approvou-se.

O Sr. Presidente —Agora consulto a Camara sobre a preferencia ao projecto de que o Sr. Ministro pede que a Camara se occupo já.

A Camara resolveu que se passasse á discussão do parecer n. 219.

(Leu-se).

ORDEM DO DIA.

Discussão na generalidade do seguinte parecer

(n.° 219).

Foi presente á commissão de fazenda o projecto de lei n.° 197, vindo da Camara dos Srs. Deputados, que tem por fim approvar o Contracto de Emprestimo celebrado entre o Governo e o Banco de Portugal, da quantia de quinhentos contos de réis, a juro de cinco por cento, o um por cento de gerencia, exclusivamente destinado ás obras de construcção o melhoramento das estradas principaes do reino, devendo ser amortisado, na razão do dez por cento ao anno, pelo rendimento do imposto das estradas dos cinco districtos administrativos nelle especificados, e sob o penhor de quinhentos contos de réis de Inscripções de tres por cento, que para este effeito, e nenhum outro, devem ser creadas na Junta do Credito Publico.

A commissão examinou com a devida attenção todas as condições do Contracto, que acompanham e fazem parte do dito projecto, e julga do seu dever manifestar á Camara, que em attenção ao estado actual, assim do credito publico, como do particular, nas differentes praças do reino, as acha razoaveis, e até mais vantajosas que as do ultimo Contracto approvado por esta Camara para as estradas do Minho.

Por este motivo, pois, e porque julga interpretar os sentimentos unanimes da Camara, no intuito de que se dê ás obras da viação publica a maior celeridade que for compativel com os meios postos para este fim á disposição do Governo, desenvolvidos e ampliados pela acção de bem intendidas operações de credito.

É de parecer que o mencionado projecto de lei deve ser approvado para ser levado á Sancção Real.

Sala da commissão, 28 de Abril do 1835. = José da Silva Carvalho, vice-Presidente = Visconde de Castro = Thomás de Aquino de Carvalho = José Maria Grande = Francisco Simões Margiochi (vencido) = Visconde de Algés = F. A. F. da Silva Ferrão.

Projecto de lei n.° 497.

Artigo 1.° É approvado, o convertido em lei, o Contracto celebrado entre o Governo e a Direcção do Banco de Portugal, no dia vinte e seis de Março de mil oitocentos cincoenta e cinco, para um emprestimo de quinhentos contos de réis, ao par, em moeda metalica, para serem exclusivamente applicados ás obras do construcção e melhoramento das estradas principaes do reino, nos termos das condições do mesmo Contracto, que ficam fazendo parte desta lei.

Art. 2.º A Junta do Credito Publico creará e emittirá as Inscripções de tres por cento, no valor nominal de quinhentos contos de réis, que devem constituir o penhor do mesmo emprestimo, segundo o disposto na condição quinta do Contracto.

Art. 3.° As Inscripções emittidas em virtude do artigo antecedente serão amortisadas logo que deixem de ser penhor do emprestimo.

Art. 4.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Palacio das Cortes, em 25 de Abril do 1855. = Julio Gomes da Silva Sanches, Presidente = Joaquim Gonçalves Mamede, Deputado Secretario = Carlos Cyrillo Machado, Deputado Secretario.

O Sr. Ferrão (sobre a ordem) — Parece-me que tambem se deviam ler as condições do emprestimo (apoiados).

Leram-se.

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Condições do Contracto celebrado entre o Governo e o Banco de Portugal em W de Março de 1855, para um emprestimo de 500:000$000 réis, ao par, em moeda metalica, com exclusiva applicação ás obras de construcção e melhoramento das estradas principaes do reino.

1.ª O Banco do Portugal empresta ao Governo até á quantia de quinhentos contos de réis, moeda metalica, sendo cem centos de réis entregues em prestações mensaes até ao fim do actual anno economico, e os restantes quatrocentos contos de réis em prestações que não excedam a trinta o tres contos trezentos trinta e tres mil trezentos trinta e tres réis.

2.ª A prertações estipuladas na condição antecedente serão satisfeitas pelo Banco, depois de receber do Governo uma conta desenvolvida, documentada e authentica de despezas effectuadas nas estradas, correspondentes á quantia que receber.

3.ª O referido emprestimo vencerá o juro de cinco porcento ao anno, e a sua amortisação será de dez por cento, tambem ao anno, sobre o valor total do emprestimo contractado, e terá principio esta amortisação tres mezes depois da entrega ao Governo de prestações que excedam o valor da amortisação.

4.ª O Governo abonará ao Banco mais um por cento ao anno, pelo trabalho da gerencia, sobre a quantia de que o Banco se achar em desembolso nas épocas em que se fizer a liquidação do juro e da amortisação.

5.ª Para garantia dos encargos do dito emprestimo, de que tractam as condições antecedentes, receberá o Banco a quantia do quinhentos contos de réis em Inscripções de tres por cento, com vencimento do juro do primeiro de Julho de mil oitocentos cincoenta e cinco em diante, que o Banco receberá da Junta do Credito Publico nas épocas competentes.

6.ª Será mais garantido o mesmo emprestimo pelo producto do imposto de quinze porcento para as estradas, que se arrecadar nos districtos de Aveiro, Coimbra, Faro, Lisboa e Santarem, que fica especialmente hypothecado ao cumprimento deste contracto, bem como pelo rendimento das portagens nas pontes que o construirem com o producto do dito emprestimo.

7.ª O producto dos impostos, de que tracta a condição antecedente, passará todos os mezes directamente das mãos dos respectivos Thesoureiros-pagadores, e sem dependencia de ordem especial do Governo, para os cofres do Banco, ficando as despezas de transferencia, até entrar nos cofres do mesmo Banco, a cargo do Governo. 8.° Os juros serão contados desde que as prestações forem postas á disposição do Governo.

9. Os juros, a amortisação e a importancia correspondente ao abono de um por cento para despezas de gerencia será pago pelo que o Banco arrecadar dos juros das Inscripções de que tracta a condição quinta, e pelo que produzir o rendimento do imposto de quinze por cento para estradas nos districtos designados na condição sexta.

10. A liquidação dos encargos do emprestimo será feita por trimestres. Quando os saldos forem a favor do Thesouro, ficarão, desde logo, á disposição do Governo; e vencendo o juro de cinco por cento ao anno, se pelo contrario forem a favor do Banco.

11. O Governo reserva-se o direito de augmentar a amortisação do emprestimo, quando o julgar conveniente.

12.ª Incumbe ao Governo a feitura e fiscalisação das estradas, para que o emprestimo é exclusivamente destinado.

13.ª O Governo não poderá, por fórma alguma, dispôr dos rendimentos que ao Banco compete receber, em quanto não estiverem satisfeitos os encargos a que ficam obrigados pelo presente Contracto.

14. Quando o Governo deixe de cumprir qualquer das condições deste Contracto, o Banco ficará, por esse acto, authorisado a vender em praça, das Inscripções que constituem o penhor do emprestimo a somma necessaria para satisfação do encargo que o Governo tiver deixado do cumprir.

15.ª Este Contracto sómente será obrigatorio depois de approvado pelas Cortes, e convertido em lei.

Palacio das Cortes, em 20 de Abril de 1855. = Julio Gomes da Silva Sanches, Presidente = Joaquim Gonçalves Mamede, Deputado Secretario = Carlos Cyrillo Machado, Deputado Secretario.

O Sr. Conde de Thomar: é com timidez que vai entrar em um objecto, que não é da sua competencia; mas como as pessoas mais competentes não pedem a palavra, vê-se obrigado a dizer alguma coisa; e isto lhe sirva de desculpa.

Ha poucos dias deu uma prova de que não

orador com um membro desta Camara, que julga no caso de avaliar devidamente a situação; e fallando-se sobre a conversão, e sobre o> grande numero de inscripções, que pesam já sobre a Junta do credito publico, respondeu-lhe elle, diante de outro cavalheiro que estava presente, que a nossa desgraça estava definida por tres palavras, que vem a ser: promoções, creações e inscripções (O Sr. Barão de Porto de Mos—apoiado). Effectivamente quanto mais reflete sobre esta resposta, mais se convence de que effectivamente essas tres palavras significam bem a nossa situação, e o abysmo a que corremos; o que tambem se póde dizer que está officialmente definido pela commissão de fazenda da outra Camara, de accôrdo com o proprio Sr. Ministro, bem como por uma authoridade respeitavel, que por um logar importante que occupa na Junta do credito publico, não póde deixar de merecer muito a consideração delle digno Par. Desgraçadamente as promoções, as creações de logares novos com grandes ordenados, e a continuada emissão de inscripções, não pode deixar de dar em resultado, que nos achemos á beira de um abysmo!

O orador estremece quando vê que a Junta do credito publico diz officialmente, que lucta com uma operação incommensuravel, que excede muito a 200 milhões de cruzados: treme, quando, passando em revista as contas da Junta do credito publico, vê que pesa sobre o paiz uma divida interna fundada e reconhecida, de nada menos de 44.284:000$587 réis; quando vê que a divida fundada externa é de nada menos de 10.436:701 libras estrelinas, 12 schelins, e 11 pences: quer dizer que no total pesa já sobre a Junta uma divida fundada de 89.825:988$294 réis.

E em quanto importará ainda a divida differida? Quantas inscripções se terão já passado? Muito desejaria que o Sr. Ministro informasse a Camara a este respeito, porque se são verdadeiras as informações que colheu, são já passados mais de 3:000 contos do que pertence á divida differida, o parece que essa operação ainda não está em meio.

O nobre Par repete que falla nisto a medo; e que só deseja que o Sr. Ministro o esclareça. Mas, pois que já pesa uma divida tamanha sobre a Junta do credito publico, e que a nação tem de pagar os juros correspondentes, é força reconhecer, que a constante creação de inscripções que vão pesar sobre a mesma Junta, e os rendimentos publicos, não póde deixar de nos affectar. É necessario que isto pare por uma vez. Bem sabe o orador que se diz que lancemos sobre as gerações futuras alguns dos onus que necessariamente tem de vir em resultado das vantagens que vamos conseguindo; porém elle intende que já são graves os onus que vão pesar sobre as gerações futuras; oxalá que as vantagens que se lhes legarem possam do alguma maneira compensar os sacrificios que tambem se lhes querem legar.

O nobre orador prevê que lhe hão-de dizer, que estas inscripções são para servir de penhor ao emprestimo que faz o Banco; mas isto não destroe de maneira nenhuma a circumstancia, de que para estas inscripções se ha-de crear a receita correspondente para o seu juro, de outra sorte seria inutil: e nesse caso, está claro que é um novo encargo que vai pesar sobre a fazenda; e se estes juros tem de sair da receita que já existe, lá vai haver uma diminuição nessa mesma receita, que ha-de faltar para outra coisa. Desejava portanto que o Sr. Ministro tranquillisasse a Camara, mostrando que isto, bem longe de ser um novo onus, em nada affecta o estado da fazenda publica.

Não obstante estar de accôrdo com o Sr. Ministro, e com a commissão em que é necessario fazer sacrificios para se conseguir o desenvolvimento das obras publicas, ainda o orador tem duvida em votar pelo projecto. É necessario verse até que ponto podem chegar esses sacrificios, o se a nação os póde fazer tão grandes, e simultâneos, para se conseguirem essas mesmas obras. E depois, áquelles que tem presente os actos do Sr. Ministro da Fazenda, não lhes póde ser estranhado que duvidem votar este projecto, porque quem os assegurará de que este penhor não ha-de desapparecer, dando-lhe o Sr. Ministro outra applicação? (apoiados). Sabe-se muito bem que S. Ex.ª não tem respeitado nenhuma lei; sabe-se muito bem que ainda, ultimamente distraiu da applicação legal as inscripções do fundo especial de amortisação (apoiados). Sabe-se muito bem que S. Ex.ª depois disso veiu muito seguro de si, e muito á sua vontade, dizer que tinha distraído aquelles fundos, por lhe ter sido isso indispensavel, o que contava com a benevolencia das Camaras!

Quem á vista de tanta sem cerimonia poderá asseverar-lhe, que S. Ex.ª se intender na sua alta comprehensão que tem motivo justificado para dar outra applicação a estes 500 contos, os não distrahirá do fim para que são votados? Nesta parte observa o nobre orador, que é necessario reconhecer-se que os antecedentes não dão segurança nenhuma de que tal facto não possa realisar-se; e que S. Ex.ª, a tal respeito, está debaixo de uma grande imputação, pois ainda espera uma votação da outra Camara para se saber, se deve ou não ser relevado das illegalidades que praticou.

Se ainda na outra Camara está para se discutir esse bill de indemnidade, diz o orador ainda mais, que em quanto o Corpo legislativo não tiver decidido essa questão não se póde tractar desta, por isso mesmo que só depois de ser o Governo absolvido das illegalidades que commetteu na distracção de fundos, é que se lhe poderia dar este novo voto, para crear inscripções que vão servir de penhor ao emprestimo de que se tracta. Proceder de outro modo não lhe parece regular; é necessario que o Sr. Ministro da Fazenda, antes de tudo, tractasse de se salvar da responsabilidade que lhe pesa, obtendo o bill de indemnidade, pelas illegalidades que commetteu. Em quanto se não tomasse essa deliberação nas Cama«as, elle orador, no logar do Sr. Ministro, não se julgaria com direito de apresentar-se a pedir a approvação deste projecto, que não póde ser votado senão por confiança; e esta, verdadeiramente, não se póde dar, em quanto S. Ex.ª não estiver absolvido das faltas já commettidas.

O orador tambem quer obras publicas, e oxalá que se lhes tivesse dado todo o desenvolvimento que na sua opinião se podia dar-lhes, á vista das grandes somma» de que S. Ex.ª tem disposto. E por esta occasião não póde deixar de dizer que não lhe parece que o Governo seja digno, nesta parte, de tantos louvores como áquelles que os seus escriptores lhe tem dado pela imprensa; pois está persuadido que effectivamente, com os meios de que o Governo tem disposto, e lhe foram votados, podiam as obras publicas ter muito maior desenvolvimento. Ainda que não tem agora bem presente as sommas que foram votadas para obras publicas nos Ministerios anteriores, parece-lhe que não chegaram de duzentos até trezentos contos por anno; e se bem se lembra, a conta que S. Ex.ª apresentou no orçamento de 1854 a 1855 para o Ministerio das Obras Publicas manifesta uma somma superior a mil contos de réis!... É possivel haver algum erro nestas cifras, ditas assim de memoria, mas nesse caso não tem difficuldade nenhuma em rectificar.

Tambem desejava que o Sr. Ministro apresentasse quanto antes um trabalho completo, mas ao mesmo tempo simples, de modo que o corpo legislativo o podesse examinar n'um golpe de vista, em que se mencionasse qual o numero de legoas de estrada que tem sido feito, e as sommas que se tem applicado para esses trabalhos, porque só assim é que; se póde mais facilmente avaliar. Suppõe elle orador que o Sr. Ministro, no Boletim das Obras Publicas, e tambem no Diario do Governo, tem publicado alguma cousa a este respeito; mas isso vem tão espalhado, que custa a compulsar para se tirar o resultado preciso. Se fora possivel, desejaria que S. Ex.ª apresentasse n'um só mappa esse desenvolvimento.

Manifestando estas apprehensões, não quer o Sr. Conde com isto fazer censura alguma ao Sr. Ministro em relação á divida geral que pesa sobre o Estado. S Ex.ª não tem culpa disso. É uma divida que vem de muitos annos; diz unicamente que o facto é este: — pesa uma divida enorme de mais de 89 mil contos sobre a Junta do credito publico; e quando ha já um tão grande numero de inscripções, em vez de o diminuir, vai-se augmentar com a emissão de novas inscripções, sendo muito para temer que se continue neste caminho. Por consequencia o orador, em quanto não ouvir a S. Ex.ª explicações a este respeito, para vêr se se póde convencer de que não resulta prejuizo nenhum para o Estado da creação destas novas inscripções, não está resolvido a votar pelo projecto, sentindo ao mesmo tempo que o Sr. Ministro, nas estipulações deste contracto, se sujeitasse a algumas condições que não lhe parecem decentes, como por exemplo, a segunda condição, em que se diz (leu). Parece que isto equivale a fazer o Banco juiz da authenticidade e validade dos documentos, apresentados pelo Governo, o que não julga muito digno para o Governo. Pôde ser que esta estipulação tenha uma differente intelligencia; mas a obvia, a que resulta da leitura da estipulação, é que o Banco fica authorisado a examinar se os documentos do Governo provam ou não o que se pertende, e se são ou não authenticos. Além disto, parece que o mesmo Banco é quem ha-de verificar se o Governo tem ou não devidamente applicado as sommas que resultam deste emprestimo, o que tambem não julga airoso, pois não lhe parece que seja um estabelecimento monetario quem vá julgar o Governo, e que o invistam de attribuições que só pertencem ao parlamento. O orador ouvirá porém as explicações do Sr. Ministro, da Fazenda, e á vista dellas fará o que intender de mais utilidade para o paiz.

O Sr. Ministro da Fazenda vê apparecerem do novo, mas com outras formas, e por outras palavras, as mesmas dúvidas que n'outras occasiões, tanto nesta como na outra Casa do Parlamento se suscitam na discussão dos projectos que elle tem a honra de apresentar ás Camaras, a fim de habilitar o Governo a emprehender em maior escala as obras e melhoramentos, de que o paiz carece. Dir-se-ía, que ha um pensamento que domina o digno Par, e os cavalheiros que partilham da sua opinião, de que é infecta ao paiz, e prejudicial á fazenda publica a creação de inscripções nos termos em que o Governo as tem proposto ao Parlamento! O digno Par, na expressão dos seus receios, recapitula as sommas que existem a cargo da Junta do credito publico, tanto pelo que pertence á divida interna, como á divida externa; S. Ex.ª calcula as dezenas de milhares de contos do réis, e de milhares de libras, mas sabe muito bem que estes milhões de libras se comprehendem naquelles tantos mil contos de réis; por consequencia ha uma repetição involuntaria (O Sr. Conde de Thomar — Mas por fim apresentei a somma total). Bem; são os oitenta e tantos mil contos. Longe do pensamento do Sr. Ministro está o querer inculcar á Camara, que o digno Par teve o pensamento de figurar a divida maior; faz justiça ás suas intenções e á sua lealdade: mas é uma fatalidade que o modo porque S. Ex.ª apresenta as suas apprehensões figure uma somma muitissimo mais crescida de divida publica, do que aquella que realmente existe. Isto procede do modo de apresentar as suas idéas, porque cada um tem a sua ordem natural de idéas, e não de vontade, que o digno Par tinha de complicar a questão.

A divida publica, esta divida de oitenta e tantos mil contos de réis a que se refere & digno Par, não é fructo da Administração, actual. S.

Ex.ª mesmo, n'uma parte do seu discurso, indicou á Camara que não podia lançar á conta d» Governo actual a responsabilidade destes oitenta e tantos mil contos; se elle não é responsavel por esta divida; se o herança dos Governos anteriores, que de certo foram herdando uns de outros; se o digno Par não quer fazer aqui o processo de qualquer homem politico, ou de qualquer Administração, a que proposito vem isto com a creação de inscripções para levantamento do imposto que se ha-de applicar á construcção de estradas?... A que vem mencionar, para este caso especial, uma somma consideravel de milhões de contos de réis, que constituem a divida publica paiz?... Ousará o digno Par inculcar á Camara, do que, porque ha uma divida publica de oitenta e tantos mil contos, não se devem empregar meios de credito, para levantar o paiz do abatimento em que existe?... Quererá S. Ex.ª que o Governo renuncie a usar desta grande alavanca politica e financeira, que tem feito a felicidade das nações que entraram neste desenvolvimento de communicações internas?.. O orador pede a S. Ex.ª que lhe explique, com a sua elevada intelligencia, como é possivel que o Governo satisfaça aos desejos de S. Ex.ª, que reputa sinceros, aos da Camara e do paiz, desenvolvendo uma rede de communicações nesta terra, sem usar de credito, ou sem lançar uma somma tal de impostos que esmagaria o paiz, antes de poder tirar algum partido dessas mesmas communicações?... Não ha senão estes dois recursos. — Quer-se, ou não se quer dar um grande desenvolvimento ás communicações do paiz?... De certo que sim — e neste ponto S. Ex.ª está de accôrdo com o Governo, e com os sentimentos da maioria, pois todos reconhecem que é isto de uma grande necessidade publica — se se quer pois dar este grande desenvolvimento ás vias de communicação, quaes são os meios de o conseguir?... Só ha dois: — ou lançar impostos que vão sobrecarregar mais os contribuintes, ou usar do credito. O Governo tem seguido este segundo arbitrio — o credito com que tanto argumentavam alguns cavalheiros, que hoje se oppõem ao projecto; quando, ha tres annos, a Administração actual, impellida pela necessidade, por força maior do circumstancias a que não era possivel resistir, tomava medidas em consequencia das quaes diziam os mesmos cavalheiros que se matava o credito, que era a cousa mais necessaria ao Governo: — e agora que vem propôr á Camara um emprestimo a cinco por cento ao par, com condições rasoaveis; e oppõe-se a isso porque seguio o conselho que lhe davam. E aqui pergunta o Sr. Ministro, será esta uma operação que possa ser consequencia dos receios que então manifestavam os dignos Pares de se comprometter altamente o credito publico, impedindo-o de dar aos melhoramentos do paiz as sommas, de que elle carecia?... Que mais se póde desejar?... Se o digno Par se achasse naquellas cadeiras teria forças do realisar uma operação mais vantajosa para o Estado, nas circumstancias actuaes do paiz, da Europa, e dos mercados de todo o mundo, como esta de um emprestimo ao par, e em metal, a razão de cinco por cento do juros, amortisado em tres annos?!... O Sr. Ministro não vê que nas outras nações, em que o credito está em melhores circumstancias, por diversas causas que são conhecidas de todos, e não se póde attribuir a este ou áquelle individuo, a esta ou aquella Administração; não vê que nesses paizes se façam operações mais vantajosas, ainda mais, nem tão vantajosas ás vezes, como esta que está sujeita á approvação das Cortes. Julga por isso mal escolhido, e pouco a proposito, que o digno Par, na occasião em que se apresenta um projecto revestido destas circumstancias, venha fazer uma exposição de receios e temores pelo augmento da divida publica, pelo augmento dos encargos, e pelo comprometimento das gerações futuras, quando nada disto se encontra no projecto. O projecto de que se tracta traz de certo o encargo de pagamento de juros e amortisação; mas esse encargo não vem augmentar o deficit, não compromette os meios do Governo, nem prejudica o estado da Fazenda. não está portanto no caso que S. Ex.ª indicou ha pouco, de augmentar os encargos publicos. Esses ficam exactamente como estavam, porque este emprestimo é para ser pago pelos rendimentos do imposto para as estradas. Isto provém de uma consignação annual, como o digno Par sabe, porque foi. no tempo de S. Ex.ª que se estabeleceu o imposto — o nesta parte louvou cordialmente o digno Par, porque elle orador é justo; podia discrepar, e discrepou naquelle tempo sobre o modo de estabelecer este imposto, e de promulgar a Lei de 22 de Julho 1850; entretanto intende que foi um pensamento de grande utilidade publica o estabelecimento do imposto, que tem por fim o desenvolvimento das communicações internas. Mas quando faz este comprimento a S. Ex.ª com toda a sinceridade do seu coração, não póde deixar de observar que S. Ex.ª não póde negar a consequencia do seu proprio acto, a Lei promulgada e assignada pelo proprio digno Par?... E se o quer fazer, desejaria que S. Ex.ª lhe dissesse então qual foi o seu pensamento quando promulgou a Lei de 22 de Julho do 1850?... Se foi para fazer estradas unicamente com as sommas que proviessem daquelle emprestimo á medida que fossem entrando no Thesouro; esse pensamento era absurdo, não cabia de certo na intelligencia do digno Par; e eis como elle orador vem á conclusão de que aquelle imposto não podia ser considerado senão como meio de levantar creditos sobre elle, a fim de obter as sommas necessarias para a construcção das estradas. E, sendo este, como não póde deixar de ser, o pensamento da Carta de Lei de 22 de Julho de 1850, o que é preciso examinar é se o Governo tem sido feliz na realisação dessa idéa.

O orador pede que se não esqueça que o Governo foi obrigado a levantar um emprestimo fora do paiz, esse emprestimo foi levantado em França, dando-se a circumstancia de haver mui

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tos annos que o Governo não tinha contractado um emprestimo naquelle paiz. É verdade que por essa razão, e por outras, esse emprestimo não foi feito com tanta vantagem como o Governo desejaria; mas attendendo a estas considerações, e tambem a que nessa época já as grandes nações da Europa tractavam de preparar-se para uma guerra amais formidavel que tem havido, não admira que esse emprestimo se não podesse fazer mais vantajosamente. Depois tractou o Governo de contrair um emprestimo no Porto com capitalistas portuguezes, accedendo de muito boa vontade a esse pensamento manifestado nas Cortes; e tractou de realisar esse emprestimo entre nacionaes, por 500 contos de réis para as estradas do Minho a 7 por cento ao anno: e ultimamente contractou com o Banco de Portugal, o emprestimo que consta do projecto de lei de que agora nos occupamos. Se se compararem as diversas operações de credito que o Governo tem feito desde o emprestimo Chabrol até agora, verá a Camara que essas operações tem sido cada vez mais vantajosas. O emprestimo Chabrol foi mais oneroso, do que o contracto feito com a companhia Utilidade, e este mais pesado do que o contracto feito agora com o Banco de Portugal.

Se pois o digno Par quizer reparar, verá que o Governo se interessa em melhorar o credito publico, e disto dá um documento no modo como fez este emprestimo.

O Sr. Ministro pondera que o digno Par diz está prompto a votar o emprestimo, mas o que não quer é as inscripções; e por isso pede a S. Ex.ª que attenda a que os emprestimos fazem-se sobre penhores, e as inscripções são penhores. O digno Par que teve muito credito, durante a sua administração, como S. Ex.ª diz que tinha quando esteve no poder, de certo não poderá deixar de confessar que fez muitas antecipações, maiores, ou menores, mas empenhando para isso valores que linha á sua disposição. Isto mesmo têem feito todas as administrações; e elle Sr. Ministro declara, que não estamos em circumstancias de deixar por ora de hypothecar, e por algum tempo, alguma cousa tangível áquelles que vieram emprestar ao Governo. Tambem - observa que a hypotheca que agora se dá ao Banco de Portugal, é insignificantissima em relação á entrega que o Banco faz ao Governo, por quanto, 500 contos de réis de inscripções, valem 200 contos de réis: já se vê, pois, que não é uma condição pesada para o Governo o dar penhor de 200 contos por 500 contos. Ainda ha -outra consideração, e é, que estas inscripções não vão parar ao mercado: não vão, ellas passam para a caixa do prestamista, e este não pode dispôr das inscripções se não na conformidade da Lei.

Mas diz o digno Par, que não tem confiança no Ministerio, e que este póde desviar essas inscripções da sua legal applicação! A isto responde o orador, que o actual Ministerio não desviou, o que se fez foi applicar para as despezas publicas e correntes, parte dessa somma que estava applicada para o caminho de ferro do norte. O Governo viu-se collocado em circumstancias difficeis, a Lei obrigava-o a pagar em dia; e a mesma Lei obrigava-o a applicar esses fundos para um fim especial: estas duas obrigações hirtavam entre si: e notou ainda que se não devia esquecer, que aquella hypothese já tinha sido prevenida nesta casa, como se lê no relatorio da commissão de fazenda, no qual se diz, que havia um deficit de 160 e tantos contos de réis, o qual o Governo devia preencher pelos fundos marcados na Lei.

Ora, esses fundos são os mesmos, cuja applicação ás despezas accusa o digno Par como uma violação; e com tudo o Governo não podia sair deste embaraço se não por este meio, meio indicado pela propria commissão de fazenda desta -casa: não o podia fazer de outro modo; e diz mais, que nenhum homem collocado neste logar poderia fazer outra cousa que não fosse isso. Como podia o Governo ter um deficit de 160 e tantos de réis, e não ir buscar o dinheiro aparte nenhuma? Não podia ser. Assim esta tão decantada violação de Lei, traduz-se do modo que acabou de dizer; e foi em presença disso, e tambem porque assim era reconhecido pelas pessoas mais conspicuas e conhecedoras da materia, que o Governo não julgou necessario apresentar-se desde logo ás Cortes pedindo um bill de indemnidade.

Quando esta especie se apresentou na Camara dos Srs. Deputados, o Governo, collocado entre o escrupulo e necessidade do cumprimento do seu dever, e entre a necessidade do modo como elle tinha procedido, julgou que havia um respeito pela Lei fundamental do Estado, e pelas leis a que se referiram aquelles que o combatiam; e declarou então que estava prompto a pedir á Camara que justificasse, ou legalisasse o seu procedimento, que não podia ser outro em presença da Lei que se invocava.

Aqui está pois a razão porque não se pode applicar para este caso a objecção que apresentou o digno Par, suppondo que o Governo ha de violar esta Lei como violou as outras. As outras foram intendidas como o Governo julgou que o deviam ser: o Governo violou um artigo para não violar o outro, e isto porque por força havia de fazer uma destas duas cousas, e não podia deixar de obrar assim, porque o deficit era conhecido, não em tão grande escala como o foi mais tarde; mas o Governo não podia prever que a Providencia havia de carregar a Sua Mão sobre este paiz, e fazer assim que a receita publica fosse diminuída, assim como que os embaraços procedentes da substituição do antigo systema tributario por a Lei da contribuição da repartição directa, haviam de retardar as entradas das receitas nas recebedorias; sendo que, em resultado de tudo isto o Governo achou-se com um deficit com que não contava; e que foi mais um motivo que o obrigou a violar um artigo para cumprir o outro.

O nobre Ministro reflete que sé esta Lei passar aqui, como espera, vai para a Sancção Real, e se a obtiver, é logo publicada no Diario do Governo; que em seguida manda logo passar a respectiva cautela para entregar ao Banco de Portugal; e assim habilitar-se a receber este dinheiro, porque necessita dos fundos que se hão de auferir em virtude desta Lei: nestes termos, como ha de depois ir ao Banco buscar essa cautela, para distrair esses fundos? e que assim vê o digno Par, que as suas observações Carecem de fundamento neste ponto; porque quando mesmo fossem essas as intenções delle orador, pela natureza da cousa, pela disposição da Lei, e pelas cautelas que acompanham esse deposito não era possivel que se desse aquillo que o digno Par prevê.

Mas o digno Par ainda se fez cargo de combater o emprestimo, propriamente dito, principalmente pelo que respeita á segunda condição, que S. Ex.ª intende ser deshonrosa, e pouco decente para o Governo, provavelmente porque julga o digno Par que ha garantia de mais para o Banco.

O Governo contractou este emprestimo de réis 800:000$000; e elle Ministro declara a S. Ex.ª com toda a franqueza, porque nestes negocios, assim como em todos, a verdade é a melhor conselheira e a melhor arma nos debates parlamentares; que para este emprestimo propoz ao Banco as mesmas condições que se haviam exarado no contracto feito com a Companhia Utilidade Publica para a construcção das estradas do Minho; mas como a respeito do emprestimo que se contraiu com o Banco de Portugal não se dão as mesmas circumstancias, que a respeito daquella Companhia, porque o capital mutuado não é applicado para a construcção, por exemplo, sómente das estradas A e B. mas para todas as estradas do paiz, e mesmo para estradas que o Governo por ora não sabe quaes serão, porque isso depende dos exames e dos orçamentos que ainda se não fizeram, mas que se hão de fazer, e que ainda o Parlamento terá de votar: pergunta á vista disto o Sr. Ministro poderia o Banco contractar com o Governo de modo que se obrigasse a fazer os pagamentos das ferias, ou dos jornaes dos operarios empregados nas provincias do Alemtéjo, da Estremadura, do Algarve? Era isto possivel? De certo que não. Então que fez o Governo em vista desta difficuldade? Procurou conciliar esta garantia da effectividade dos pagamentos dessas ferias comum certo desprendimento da parte do Governo, podendo assim empregar essas sommas que fosse recebendo, nos districtos ou localidades onde melhor lhe parecesse; e por conseguinte o contracto feito com o Banco de Portugal, é muito mais vantajoso para o Governo do que o foi aquelle que fizera com a Companhia Utilidade Publica, por isso que fica muito mais livre o Governo, podendo empregar as quantias que houver de receber nas localidades em que mais conveniente julgar. O Governo fica com o direito em virtude deste contracto de receber as prestações que prefaçam a somma dos 500:000$ réis, uma vez que prove a authenticidade das competentes contas, e essa authenticidade está na assignatura das contas feita pelo chefe da repartição donde ellas dimanaram, e está na assignatura prestada pelo chefe da repartição da contabilidade do Ministerio das Obras Publicas, fazendo-as confrontar com as que apresentar o director do respectivo districto, de modo que depois de serem assignadas pelo respectivo Ministro; e, desde que o Ministro diz ao Banco que pague — está a authenticidade feita, e não ha mais questão, porque o Banco só tem a verificar se as contas estão assignadas por quem as deve assignar e nada mais. É esta a opinião do Banco; é este o sentido em que o Governo contractou; e fique por tanto o digno Par descançado que o Banco não hesitará, nem porá a menor duvida quando a authenticidade se verificar pelo modo, porque, como acabou de dizer, ha de ser feita.

Notou ainda o orador que neste contracto ainda se fez um melhoramento em relação ao que se havia feito com a Companhia Utilidade Publica, porque o emprestimo com esta foi contrahido a razão de 7 por cento, e este é feito a 5 por cento; e, a fallar a verdade, fazer-se um emprestimo ao par a 5 por cento nas circumstancias actuaes, quando se nota uma carestia de capitães, e em que as casas mais acreditadas levantam fundos por preços superiores, não lhe parece que se possa dizer que o Governo f«z um contracto oneroso, nem que seja merecedor de censura.

O Sr. Ministro, intende ainda que deve fazer uma declaração nesta Casa, onde por mais de uma vez combateu aquelle estabelecimento, isto é, o Banco de Portugal, e vem a ser que elle se prestou com a melhor vontade a fazer este emprestimo, encontrando elle Sr. Ministro da parte dos illustres cavalheiros que o representam, o mais decidido desejo de contractar com o Governo para um fim que elles e todos julgam da maior utilidade e prosperidade para este paiz. Fez esta declaração, aqui, onde n'outro tempo soltou expressões de censura, que ficam para os factos a que se referiam; como estas de hoje ficam para os factos a que se referem.

O Sr. Ministro está convencido de que provou á Camara, tanto quanto coube em suas forças, em primeiro logar que este contracto não vai comprometter a organisação da fazenda publica, nem augmentar o deficit; porque o emprestimo a que se refere ha de ser pago com as contribuições existentes, que felizmente ainda sobem além da somma mutuada; e em segundo logar, que o systema que o Governo adopta é o melhor, e o preferivel; e, accrescenta, que nelle ha de continuar levantado assim fundos de uma maneira a mais vantajosa para o paiz; caminho que elle não descobriu, nem quer por isso attribuir ao Governo de que faz parte nenhuma gloria, porque em fim isto é da ordem das cousas, desejando só que se reconheça que ao mesmo tempo que somos accusados de ter peiorado o credito, vamos fazendo operações mais favoraveis, e chegando a uma época, que com quanto não se queira attribuir ao Governo, a uma época em que os capitães procuram á porfia emprestarem-se ao Governo com o juro de 5 porcento! Embora se não attribua por isso nenhuma gloria ao Governo actual; fique-se porém sabendo que é durante a sua gerencia que isso acontece; registem-se estes factos (apoiados); registem estes factos, pois muito estima que se dêem n'uma época em que elle e seus collegas se achem naquellas cadeiras (apoiados).

O Sr. Margiochi — Declarou que tendo assignado vencido o parecer da commissão de fazenda, que estava em discussão, não podia deixar de apresentar os motivos por que o fez.

Disse que ouvira com a maior attenção os illustres oradores que o precederam, e que o debate que tinha tido logar o confirmara na opinião em que estava de rejeitar o projecto de lei que se discutia; que o assustava a emissão successiva de titulos de divida fundada, que tem tido logar, desde 1851, e que, continuando neste systema, será impossivel pagar a estes credores do Estado, que ficaram reduzidos a circumstancias deplorareis.

Disse que no relatorio com que se pertenderam justificar as medidas adoptadas pelo Decreto de 3 de Dezembro, se affirmou que essas medidas eram necessarias para organisar a fazenda publica, diminuindo os encargos da divida; mas que, apezar do que então se allegou, a divida tinha augmentado; e fez diversas considerações sobre o orçamento de 1851 a 1852, e sobre o de 1855 a 1856, para mostrar o augmento dos juros da divida interna e externa, sem comprehender o de 1:280 contos de réis das inscripções, que foram mandadas crear para cumprimento do contracto do caminho de ferro do Alemtéjo. Que era nestas circumstancias, que o Sr. Ministro da Fazenda viera propôr a creação de mais 500 contos de réis em inscripções, para garantia do emprestimo de que se tractava, e blasonar das vantagens deste emprestimo (O Sr. Ministro da Fazenda'—Blasonar? Peço a palavra). Que elle orador retirava a palavra blasonar, e diria que o Sr. Ministro da Fazenda se viera lisongear do immenso credito do Governo, por ter contraído um emprestimo de 500 contos de réis ao par, e com o juro de 5 por cento, e 1 para despezas, quando era certo que, dando o Sr. Ministro da Fazenda de penhor SOO contos de réis de inscripções, cujo valor eram 200 contos, o Banco de Portugal só vinha a ficar sem garantia para 300 contos de réis, que eram o equivalente á consignação annual do contracto do tabaco; e como se o Banco não fizesse o emprestimo, o Sr. Ministro podia mandar aos contractadores, que entrassem com essa mesada no Thesouro publico, como costumava fazer, contando com as maiorias das Camaras legislativas, o Banco fizera o emprestimo, de que se tractava, pelas suas circumstancias especiaes, e não por que o Governo tivesse esse credito, que o Sr. Ministro dizia; pois que o Sr. Ministro sabia as difficuldades que achava para levantar dinheiro na praça, e que este só lhe era fornecido com o juro de mais de 7 por cento, e hypothecando inscripções pelo valor de 30 por cento.

Observou que tambem queria estradas; e, depois de fazer diversas considerações, disse que, tendo o Sr. Ministro da Fazenda pago com inscripções emprestimos feitos em metal, ao par, e comum juro modico, como praticou com a Companhia das Obras Publicas, e com o Banco de Portugal, só este Banco, pelas suas circumstancias especiaes, é que faria um emprestimo tão vantajoso para o Governo; mas que estas vantagens não mostravam o credito do Governo, mas sim as circumstancias especiaes do Banco; que a não serem estas circumstancias, não haveria capitalista que fizesse taes emprestimos, a não estar demente (O Sr. Ministro da Fazenda — Pois há); e concluiu votando contra o projecto de lei.

O Sr. Visconde de Castro — Sr. Presidente, eu fazia tenção de não fallar nesta questão, ainda que, sendo relator deste parecer, algum tanto se achava compromettida a minha lealdade, não dando a razão do meu voto.

Em quanto a questão esteve limitada á opposição que fazia o meu nobre amigo, o Sr. Conde de Thomar, e á defeza do illustre Ministro da Fazenda, qualquer dos dois com a força necessaria para sustentar as suas idéas, e apresentar ou rebater as suas duvidas, não linha necessidade de pedir a palavra; mas quando vi que o meu amigo, e illustre collega, o Sr. Margiochi, a pedia, para dar a razão por que tinha assignado vencido, intendi logo que me ficaria muito mal, sendo relator, não pedir tambem a palavra, para mostrar a razão, por que tinha assignado o parecer da commissão sem clausula, e porque não tinha seguido a opinião do digno Par.

Sr. Presidente, eu assignei este parecer, porque intendo que elle se dirige a um grande interesse publico (apoiados). Eu, Sr. Presidente, não venho aqui dar uma novidade a respeito do meu procedimento, quando se tracta de obras publicas: o meu modo de pensar a este respeito é muito conhecido ha bastante tempo, desde 1833 até hoje, e appello para o testimunho do meu antigo amigo o Sr. Ministro do Reino (O Sr. Ministro do Reino — Apoiado). Sempre dei o meu contingente para que esta urgentissima necessidade das obras publicas fosse satisfeita, e os desejos do paiz, e os nossos esforços fossem coroados. Portanto, Sr. Presidente, vindo um projecto desta natureza a esta Camara, e de modo tão rasoavel, que não compromettia a fazenda publica (eu peço perdão aos meus amigos que differem da minha opinião nesta parte), intendi que lhe devia dar o meu apoio, e estou certo que lhes não dei novidade alguma, pois tenho dito muitas vezes, em publico e particular, que, para objectos de obras publicas, hei de sempre dar o meu fraco apoio á Administração; é o mesmo que dei ás Administrações passadas, quando pozeram em pratica esforços, não tão bem succedidos, mas verdadeiros, e feitos na melhor boa fé, porque o meu maior empenho na minha vida é ser coherente (apoiados).

O Sr. Ministro já devia estar preparado para estas opposições (O Sr. Ministro da Fazenda— Para esta ultima não estava). Mas esta não é da» opposições que fazem mal (apoiados); quem via as luctas de outro tempo nesta casa, não póde deixar de considerar que é esta uma opposição muito pacifica. Eu julgaria, talvez, no logar do illustre Ministro, que mais mal me faria, do que esta opposição, o apoio de algum amigo indiscreto. Porque S. Ex.ª viu um dia o horisonte mais carregado do que elle era na realidade, por que recorreu a uma medida extraordinaria e violenta, com o intuito, segundo intendeu, do salvar a fazenda, e a ordem publica, ainda hoje alguem pensa que póde continuar a tirar partido de medidas de descredito (apoiados). Mas eu já disse, e sustento, que factos taes não se repetem, e S. Ex.ª hoje conhece muito bem o valor do credito, e está agora colhendo o fructo da efficacia com que se deu a sustentar a fé dos contractos, para que queira perder tantas vantagens, mudando de: direcção.

O Banco, por tractar com o Governo, não e demente, como disse, ou me pareceu que disse, o meu nobre amigo, nem o são tambem os seus Directores; pelo contrario, são homens sizudos, e muito respeitaveis, e que lêem muito zelo poios interesses dos seus accionistas (apoiados); e se elles estão hoje entrando em transacções valiosas; com o Sr. Ministro da Fazenda, é porque têem de casa a experiencia de que elle segue o verdadeiro caminho.

Perdoe-se-me esta digressão; mas quando se tractou aqui das Leis da dictadura, e com especialidade do Decreto de 18 de Dezembro, houve daquelle lado uma voz que disse, que ainda foi pequeno o corte. Os Srs. Ministros são desgraçados neste ponto, porque teem a opposição dos seus adversários politicos, e dos seus amigos indiscretos (apoiados).

Pois eu declaro que, em objectos de credito não faço opposição a Governo algum, porque intendo que atacar o credito publico é a maior das heresias, é o mesmo que atacar a nacionalidade, ou a paz do paiz, ou a religião do Estado, ou a familia, ou todas essas bases que fazem o fundamento do nosso ser social (apoiados). Atacar o credito! isso não póde ser, nem se pratica em paiz nenhum do mundo. Em todos os Parlamentos, ataca-se uma ou outra medida, que é do Governo, más não se ataca o credito publico, que é propriedade da nação; tal procedimento não entra no direito publico dos Corpos legislativos (apoiados).

Em materia de obras publicas nunca se poz de parte a idéa das operações de credito: o meu nobre amigo o Sr. Conde de Thomar não quia o contrario quando fez passar a Lei dos 15 por cento para fazer as estradas, e então S. Ex.ª não póde deixar de apoiar o Sr. Ministro nesta parte. A sua idéa era fazer todas as obras que fosse possivel mediante os fundos que podesse levantar sobre a base da nova contribuição: ora-se o nobre Ministro desenvolve esta base com a vantagem que apresenta este contracto, porque lhe não havemos dar o nosso apoio?

Se fizesse as estradas lentamente, como é opinião de alguem, nunca chegaria a occasião da realisar os melhoramentos do paiz (apoiados). Visto o atrazo a que esta nação se deixou levar é necessario fazer de prompto uma grande somma de obras publicas, e só deste conjuncto de meios e de esforços é que podem resultar áquelles melhoramentos progressivos, seguros, tangíveis, que nos hão de livrar das difficuldades em que estamos actualmente (apoiados).

Eu já disse isto mesmo em 1835 e 1836, em 1839 e 1840, e tiveram-me por utopista; póde ser que o seja, mas sou coherente (apoiados), e intendo que esta Camara toda, como se diz no parecer, é unanime no desejo de querer que se dê o maior desenvolvimento possivel ás obras de viação (apoiados).

Foi por este desejo, e por vêr que o contracto feito com o Banco era muito razoavel, que me prestei a dar o meu voto, e que tive o maior gosto em vêr que todos os dignos membros da commissão, menos um, se conformavam comigo. Eu tambem vi aquella condição, que aos meus amigos parece pouco decente para o Governo; mas tão longe estava eu de poder concordar com a sua censura, que censurei eu mesmo, em outra occasião o Sr. Ministro por não acceitar o primeiro emprestimo que se lhe offereceu no Porto depois da visita de Suas Magestades. S Ex. não acceitou então aquelle contracto porque tinha uma condição similhante a esta; eu censurei o Sr. Ministro por isso, e não podia agora censura-lo pelo contrario, estando ainda na convicção de que esta condição não prejudica, antes favorece o fim que se pertende alcançar.

Ora, a tal condição, isto é, o artigo 2.° do contracto diz o seguinte: «As prestações estipuladas na condição antecedente serão satisfeitas pelo Banco, depois de receber do Governo uma. conta desenvolvida, documentada e authentica, de despezas effectuadas nas estradas, correspondentes á quantia que receber.» Mas permitia-se-me notar, que estas palavras — desenvolvida, documentada e authentica, que fazem o objecto do reparo, na minha opinião não querem dizer nada, quando vem depois da clausula de que se ha de dar uma conta; porque quem diz — uma conta — diz tudo; e sé o Banco tinha o direito de receber — uma conta — é claro que tinha tambem direito para a examinar, confrontar, e vêr se era veridica e authentica: quem diz uma conta, e uma conta prestada pelo Governo, diz uma conta prestada com todas as solemnidades necessarias (apoiados).

Agora, Sr. Presidente, direi só mais uma palavra: nós temos uma divida, e não é pequena, oxalá que o fora; mas esta idéa dos abysmos já vem de muito longe, e já eu me levantei mais de uma vez no Parlamento para a rebater, Não

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me julgo pois n'uma posição falsa. Torno a dizer, em materias de credito tenho convicções profundas; o que disse ha vinte annos digo-o hoje; digo portanto que não creio neste abysmo. A divida publica é grande ou pequena segundo os meios de receita para lhe fazer face, mas nunca se deve reputar absolutamente pelos algarismos; e se nós trabalharmos para ter estradas e outras vantagens commerciaes, que não temos agora, devemos esperar que essa divida se nos não figure no futuro em tão grande escalla (apoiados).

O Sr. Ministro da Fazenda antes de passar a outro objecto deseja, ainda que por incidente, dizer duas palavras sobre as reflexões que fez o seu nobre amigo o Sr. Visconde de Castro, a respeito do modo de defender todas as medidas que intende serem uteis ao paiz. Parece-lhe que o digno Par se referiu no seu discurso á boa disposição em que via actualmente o Governo de concorrer por todos os meios para o desenvolvimento do credito: e pede licença a S. Ex.ª para dizer, que esta disposição do Governo não é de hoje, é desde o momento em que elle orador teve a honra de entrar nos Conselhos da Soberana; e que não podia deixar de ser o pensamento dos homens que tem gerido os negocios publicos (apoiados). O Governo podia intender que para rehabilitar o credito publico devia adoptar uma providencia, que podia não estar de accôrdo com a opinião do digno Par; mas o que o Governo teve sempre a peito, e declarou em ambas as casas do Parlamento é que a mola real em que havia assentar o edificio das finanças devia ser o credito publico (apoiados). Mas, como podia o Governo ter esse credito, se havia uma divida extraordinaria, muito antiga, e que levava uma grande parte da receita publica? É portanto evidente que naquellas circumstancias, o Governo não podia tomar alguma providencia para restaurar o credito, sem adoptar uma medida importante que o habilitasse a isso; e essa foi o Decreto de 3 de Dezembro (apoiados). Esta medida foi a consequencia da necessidade imperiosa em que se achava então o Governo, e não, a imputa a ninguem; mas não deixou de existir, e obrigou o Governo a apresentar aquella providencia para restabelecer o credito publico: porque devendo-se quatorze mezes aos funccionarios do Estado, e com um deficit de perto de 14:000 contos de réis, o Governo não podia continuar no caminho de restabelecer o credito, sem se habilitar para occorrer a todas as suas obrigações, e pagar aquillo que se devia (apoiados).

O Sr. Ministro não quer resuscitar a questão do Decreto de 3 de Dezembro; mas deve dizer ao digno Par, seu amigo, que não é de agora que o Governo reconheceu a necessidade de restabelecer o credito, e que as medidas que adoptou, como expôz no Parlamento, foi com o pensamento manifesto e claro do rehabilitar o credito publico; e, graças a Deos! Depois de uma serie de medidas do Governo, sempre dispostas no mesmo sentido e no mesmo pensamento, S. Ex.ª mesmo reconhece que aquella que agora se discute neste momento, é uma medida importante e vantajosa para os melhoramentos do paiz, e para restabelecer o credito publico (apoiados).

O Sr. Ministro pede á Camara permissão para dizer duas palavras em relação a pouco mais de duas, mas muito pesadas e tremendas, de um digno Par por quem tem tido muita consideração e deferencia, no que a dizer a verdade, vê que não lhe paga muito bem.

O digno Par chega a persuadir-se de que os Directores do Banco estavam dementes. (O Sr. Margiochi — Perdoe V. Ex.ª eu não disse isso, disse que o Banco lhe tinha emprestado dinheiro pelas circumstancias especiaes em que estava, porque aliás só algum demente é que podia emprestar com hypothecas tão fracas.) Mas o Banco que emprestou, a Companhia Utilidade Publica que emprestou, os Negociantes respeitaveis da cidade do Porto que emprestaram com aquellas condições, estão então todos dementes; e dementes de todo, porque diariamente fazem estas operações de que o digno Par tem conhecimento, e aproveita; vendo que não são phantasmagorias, pois ninguem póde reputar phantasmagoria o que lhe entra em casa por titulo legitimo. O orador sempre queria perguntar ao digno Par se acha que seja phantasmagoria o pagamento dos seus vencimentos; pois o digno Par, é um empregado de commissão, dependente do Ministerio a que elle orador preside, o que de certo o não deshonra, nem deshonra a ninguem. (O Sr. Margiochi — E tambem tenho inscripções.) E tambem tem inscripções, quer dizer que calculadas hoje com o juro que teem, em relação ao juro que tinham, não teem tanto, mas não crê o Sr. Ministro que o digno Par podesse ter a pertenção de querer considerar-se isolado no meio da nação, sendo exceptuado da reducção que era necessario fazer a todos os juristas; não mettendo o digno Par em linha de conta a compensação que o Governo lhe deu, na tal divida differida, que significa o respeito do Governo aos contractos existentes, e aos direitos dos possuidores que são mantidos pelo Governo. Que o digno Par viesse accusar o Governo do que elle fez em proveito de S. Ex.ª mesmo, isso é que se não podia esperar da elevada capacidade do digno Par, mas ás vezes dormita-se. Pois o digno Par, que sabe perfeitamente qual é a origem desses diversos fundos que affectam hoje a receita publica, e que estão a cargo da Junta, vem fazer uma resenha como faria o homem mais estranho a estas materias! O digno Par está aterrado, tem medo que o Governo não mande pagar esses titulos de divida differida! E elle Ministro não tem esse medo, porque é em nome do credito que o digno Par combate, é em nome dos interesses publicos a que o digno Par se mostra avesso mais que ninguem, que o Governo faz um emprestimo de 500 contos, que applicado a dar pão ao empregado, jornal ao trabalhador, e interesse a differentes classes, vai ao mesmo tempo servir de utilidade publica com o impulso a obras de primeira necessidade (apoiados).

Diz o digno Par que o Banco fez este emprestimo por circumstancias, e elle orador pergunta a S. Ex.ª, qual é a desintelligencia que o Governo tem tido com esse estabelecimento depois do accôrdo tomado; e que acção exerce o Governo alli? Cada um no seu logar; o Governo é o Governo do Estado, o Banco é um estabelecimento que gira segundo a orbita das suas attribuições; e collocados neste terreno, o Governo seria insensato se hostilisasse esse estabelecimento, deixando de recorrer a elle, sobretudo quando se tracta de um melhoramento que felizmente para o contrariar acha só o ecco do digno Par. Que significa o digno Par dizer que tambem quer estradas, se S. Ex.ª nega os meios dellas se fazerem (apoiados). Este subterfugio deploravel de se dizer — eu quero estradas mas não convenho em que se dêem os meios para ellas, isto realmente espanta!

Mas o Banco de Portugal tinha 300 contos na mão do Governo, e este tem o apoio nas duas casas do Parlamento! Em primeiro logar, pergunta o Sr. Ministro ao digno Par como concebe que neste systema possa haver Governo sem maioria? Acaso intende o digno Par que póde impunemente dizer que rejeita uma medida, por isso que o Governo tendo o apoio nas duas casas do Parlamento póde commetter uma indignidade, e uma extorsão? (O Sr. Margiochi — Como já fez.) Como já fez, na opinião do digno Par, a quem pede licença para dizer que tenha mais modestia, que não se anteponha ás opiniões e votos da maioria do Parlamento; cada um póde ter a sua opinião individual, mas não dizer nunca que a sua é justa, e que os outros estão em erro (apoiado). Quem é que póde ter direito de lançar em rosto ás Camaras que ellas authorisam extorsões, sobretudo fazendo-se referencia a uma Lei do Estado? Mas o Banco tinha 300 contos na mão do Governo, com mais 200 faz 500!! Isto declara o Sr. Ministro que o não esperava ouvir nesta casa, e que o Sr. Visconde de Castro tinha dito que devia estar preparado para estes argumentos de opposição; mas que para este de certo que o não estava, porque se disse que estava na mão do Governo tirar com violencia, e que vindo depois ao Parlamento ficava tudo approvado, e havia de ser sanccionado; porque ha aqui uma multidão de injurias que vão de envolta com estas considerações. Mas os 300 contos sobre o Banco, provenientes do contracto! O digno Par já se tem esquecido de que não são 300 contos (O Sr. Margiochi — cifra redonda). Bem; mas é que o digno Par arredonda sempre para mais (riso), gosta das cifras volumosas. Mas o digno Par não sabe que então dessa maneira o Governo tem muita coisa á sua disposição. O digno Par deve rejeitar todas essas leis, e até o orçamento, deve rejeitar todos, e rejeitar-se a si mesmo, porque o Governo em tudo que tem á sua disposição, querendo fazer violencia não põe duvida nisso, porque as Cortes estão promptas a absolvel-o! Os dignos Pares que lh'o agradeçam! Em quanto a elle Sr. Ministro só diz a S. Ex.ª, que para ser logico, deve votar contra tudo (vozes — isso está fazendo), mas deve votar contra o proprio systema representativo, porque tudo isto é então uma chymera. Isto é negocio um pouco mais serio; não se deve apresentar a questão debaixo deste aspecto, mas se alguma coisa pede á Camara, é que reflicta bem que se o argumento do digno Par podia servir para alguma coisa, era exactamente em sentido contrario ao que S. Ex.ª queria. Porque um homem tem compromettido parte da sua fortuna, porque lh'a pódem mesmo extorquir, elle entrega o que se lhe pede sem querer collocar-se ao abrigo da lei?... Não só isso; esse homem annue á expoliação e violencia que lhe fazem os poderes do Estado, e de mais a mais apressa-se a fazer elle proprio a entrega, dando ainda de premio mais 200 contos!! Este argumento é inadmissivel, e inaudito, mas tem o merecimento da novidade. Quando o orador vê destes argumentos faltam-lhe expressões para os classificar, e então não sabe senão apresental-os de novo, taes quaes os ouve, e pedir á Camara que os avalie como elles merecem. O Banco emprestou SOO contos porque lhe podiam tirar 300! Este é que é o argumento descarnado.

O Governo tem grande difficuldade em levantar fundos ao par, mas tem levantado por mais de uma vez, porque acha desses dementes que andam por este mundo de Christo (O Sr. Margiochi— mas é com penhor). Pois o digno Par se fosse membro de algum estabelecimento publico emprestava de outra maneira? Sempre desejaria saber se S. Ex.ª está resolvido a emprestar da sua fortuna particular sem juro algum (uma voz — a algum amigo podia ser). Aqui não se tracta agora de amigos particulares, tracta-se de estabelecimentos de credito, que tem direito a exigirem as suas garantias. O Estado tem direito a exigir que esses estabelecimentos, em termos rasoaveis, concorram para o bem publico, mas não póde nem deve negar-lhes as garantias que são justas, aliás mostrava um pensamento reservado que podia fazer com que se não realisasse coisa alguma, com condições vantajosas e reciprocas, assim para o interesse do paiz, como para o bem intendido interesse dos particulares.

O proprio Banco, quando empresta aos particulares, com juro e sobre penhores, será por medo dessa extorsão dos particulares?! O digno Par vai muito longe, rasga todos os contractos; basta palavra, estamos nos tempos patriarchaes: escripturas, para que? Contractos, de maneira nenhuma! Penhores, nada!! Pois é lá possivel que deixem de pagar? Isto são exigencias de mais! Exigência de mais considera elle orador a do digne Par, porque não apresenta exemplo na historia de nenhum paiz.

O Sr. Ministro sabe que se podem fazer emprestimos sem penhor; se elle quizesse, por exemplo, fazer uma operação qualquer, em virtude da qual se realisasse um grande beneficio pecuniario a uma companhia, ou estabelecimento publico ou particular, não haveria duvida, por isso que o premio do risco já lá ia no contracto. Mas quando se apresenta um contracto, despido de quaesquer considerações, e se pedem garantias, ha de o Governo nega-las? Ha de, no caso dado, pôr alguma duvida a dar os 200 contos, que é quanto valem os 500? Isto não se póde admittir. Tal exigencia ninguem a faz em parte nenhuma do mundo, nem em negocio particular (uma voz — Isso sim). Cada um aos seus amigos, é possivel; mas o Banco de Portugal não póde, nem deve faze-lo, porque tem obrigações para com os seus accionistas, e não póde, portanto, dispôr a seu bello prazer daquelles fundos que administra (apoiados).

N'uma palavra, o Banco intendeu que precisava dessas garantias, e o Governo intendeu que só ellas bastavam, para mais uma vez o mesmo Governo mostrar os desejos que tem pelos melhoramentos da causa publica. Assim parece ao Sr. Ministro ter mostrado que não ha inconveniente em se approvar o projecto, para ser convertido em Lei.

O Sr. Visconde de Balsemão — Eu peço a prorogação da sessão, até se votar a generalidade do projecto (apoiados).

O Sr. Presidente — O digno Par faz um requerimento, e eu vou pô-lo á votação. Foi approvada a prorogação.

O Sr. Conde de Thomar pediu a palavra unicamente para fazer algumas observações relativamente ao que disse o digno Par o Sr. Visconde de Castro, sobre dois assumptos: isto é, em quanto ao credito em geral, e em quanto aos desejos que S. Ex.ª diz ter mostrado sempre pelo desenvolvimento das obras publicas.

O orador tambem está convencido de que nas circumstancias em que nos achamos, e com este emprestimo, o Governo ha-de ficar habilitado para desenvolver em grande escala as obras publicas; assim como está de accôrdo em que os 15 por cento addicionaes que se crearam para as estradas, tiveram por fundamento o desenvolvimento dessas obras. Mas é força confessar que muitos dos actos que tem praticado o actual Ministerio não podem prestar muita confiança, e por sua parte sente muito não ter confiança no Sr. Ministro da Fazenda, quanto ao assumpto sujeito, porque os precedentes são contra S. Ex.ª (apoiados): e não valle o argumento que apresentou de que ha certos actos que se praticam uma só vez, como foi, por exemplo, o Decreto de 3 de Dezembro: e não valle esse argumento, porque S. Ex.ª tem praticado outros actos similhantes a esse: o que é o acto do Governo distraindo fundos publicos da applicação marcada na lei, e dar-lhe outra? E isto quando o Sr. Ministro declarára no parlamento que não tinha tocado nesses fundos; o depois se mostra que tocou, obrigando o parlamento, em consequencia disso a crear novos fundos! Póde isto inspirar confiança? Certamente não (apoiados).

Os Srs. Ministros podem dizer que o Decreto de 3 de Dezembro abriu ao Governo uma grande porta para poder pagar aos funccionarios do Estado, e tambem para consolidar muita parte da divida fluctuante: o orador não está persuadido disso, e a prova acha-a na opposição que ainda hoje S. Ex.ª acha em todos a esse mesmo acto: a prova está no descredito que daqui resultou para a nação portugueza, e tanto que os nossos fundos ainda hoje não são cotados na praça de Londres (apoiados). E em vista disso pergunta o orador se actos de tal natureza podem inspirar confiança no actual Governo? Não; por que não só a opinião da praça de Londres, mas tambem a de homens respeitaveis, é opposta á opinião de S. Ex.ªs

Por que os Corpos legislativos approvaram o Decreto de 3 de Dezembro, não se segue que se lhes falte ao respeito, censurando-se esse Decreto: a sua opinião ficou sempre livre para fallar nessa medida; obedece-lhe porque é uma Lei, mas ella não póde priva-lo do direito de dizer, que esse acto foi uma medida atroz: e tambem não quer que se diga, que este contracto de que agora nos occupamos, mostra o credito de que gosa o Governo, porque dá 200 contos de réis, e recebe 500 contos. Será isto o que está nas estipulações? Não são só 500 contos de réis de inscripções que se dão de penhor, ha lá uma garantia muito maior, porque lê no projecto o seguinte (leu). Note-se bem, que fica com mais esta hypotheca especial: e note-se tambem a sétima condição, que diz isto (leu,). Então como é que se vem dizer aqui, que ha unicamente o penhor de 200 contos de réis dados por 500 contos, que se recebem em metal? Não é assim, e o mostra a leitura que acabou de fazer. E poder-se-ha apresentar isto como uma grande prova do credito de que gosa o Governo? O orador reconhece que algum credito existe, e francamente declara, que se visse que se tractava unicamente de dar uma hypotheca a este emprestimo, não se opporia ao projecto; mas como vota contra a creação das inscripções, por isso vê-se forçado a votar contra o projecto: e isto porque está certo de que estas inscripções creadas, ámanhã o Sr. Ministro da Fazenda manda, que, em logar dessa somma entrar nos cofres do Banco, entre nos cofres do Governo, e as inscripções lá ficam; supposição que é authorisada pelos precedentes.

O nobre Ministro, accrescentou o orador, tem dito aqui, e na outra casa do Parlamento, que nunca na sua vida, nem como homem publico, nem como homem particular, disse o que não era verdade; como homem particular, acredita que assim é, mas como homem publico, está elle orador obrigado a dizer, que S. Ex.ª muitas vezes tem faltado ao que tem dito, e promettido. E é o proprio Sr. Ministro que o confessa, pois disse, que, collocado entre duas hypotheses forçadas, não tivera outra remedio senão lançar mão de uma: e comtudo não o devia fazer assim, porque quando certos fundos têem uma applicação especial, não se podem distrair dahi: outra cousa é o que S. Ex.ª tinha promettido; outra cousa é o que disse que tinha feito, nesta, e na outra Camara.

Observou mais o orador, que todas essas transacções, e operações de Thesouraria, feitas por S. Ex.ª, não são mais do que expedientes, de que tem lançado mão, para ir vivendo; expedientes que S. Ex.ª mesmo, e até a commissão de fazenda da outra casa, reconhecem que não é conveniente que continue a lançar mão delles, a fim de se poderem organisar as finanças.

Pelo que respeita ao abysmo das finanças a que referiu o nobre orador escudando-se com a authoridade de um membro da outra casa do Parlamento, que fallando nella sobre esta materia com todo o conhecimento de causa, mostrou o desgraçado estado em que as mesmas se acham, disse que o Sr. Ministro da Fazenda quando n'outro tempo combatia a Administração de que elle orador fez parte, dizia que as finanças se achavam n'um abysmo, e hoje que a divida do Estado é maior, não quer S. Ex.ª que se diga que estamos n'um abysmo! E comtudo em sua opinião naquelle tempo estava-se! O Sr. Conde observa que o que S. Ex.ª devia ter feito então, era não dirigir accusações que não quer que se lhe dirijam hoje, porque o principio é, que se não deve desejar aos outros aquillo que não desejamos para nós.

Como o digno Par, o Sr. Visconde de Castro, quer o orador o desenvolvimento das obras publicas; e, como já n'outras occasiões tem dita, nunca teve desejos de ser Ministro, porque como sabem todos quantos lá teem estado, aquelles logares são logares de espinhos; mas hoje se alguem a pena tem de o não ser, é por não ter podido dar o desenvolvimento que desejava ás obras publicas em grande escala, porque esse é o verdadeiro monumento que todos os Ministros devem deixar; mas antes convém indagar os meios de que se póde dispôr para taes obras, e não applicar para ellas sommas, que venham depois a faltar para outras cousas igualmente indispensaveis (apoiados).

Sabe o orador que o pensamento de alguem é que se vão creando inscripções (não é o pensamento do Sr. Ministro), e lançando carga sobre carga na Junta do credito publico, com o fundamento dos capitaes serem applicados á construcção de estradas, muito embora depois ajunta do credito publico caia com uma bancarota, e haja o descredito que é de esperar em taes crises, porque as estradas ficam feitas, e o credito mais cedo ou mais tarde ha de rehabilitar-se com essas mesmas estradas! E fundam-se para isto em que n'outros paizes já tem acontecido o mesmo; tem-se dado o descredito nos Governos; teem quebrado os Governos e os Bancos, mas esses paizes teem ficado com as vias de communicação! Mas elle orador é desta opinião; intende que se devem promover as obras publicas neste paiz; intende que as vias de communicação são uma das nossas, primeiras necessidades; mas intende igualmente que se não devem fazer todas essas obras procedendo com mi fé, preparando a quebra dos estabelecimentos de credito, e levando o descredito ao nosso Thesouro! Não é assim que pensa o Sr. Ministra, da Fazenda, está certo disso; mas haja cautela, porque este pensamento existe, e não é só d'agora, é mais antigo.

A razão principal pela qual se não conforma, elle orador com o projecto, é a de que está persuadido que, extincta a hypotheca, essas inscripções hão de ficar carregando sobre o Thesouro, e a fallar a verdade, não valia a pena a replica que lhe apresentou o Sr. Ministro da Fazenda — de que durante alguns Ministerios, e principalmente naquelles a que elle pertenceu, se deram como hypotheca e penhor estes titulos; porque é verdade que se deram, mas as inscripções que estavam já creadas, em quanto que agora não só se dão as creadas, mas vão-se creando outras; e é com estas creações repetidas que se não póde conformar, porque se não fosse esta circumstancia da creação de inscripções de certo não reprovaria o contracto, nem mesmo teria a menor difficuldade de votar por elle; mas assustam-no estas repetidas creações pelos motivos que expôz.

Por explicação, e em resposta ao digno Par o Sr. Visconde de Castro, em quanto disse que pela segunda condição se não podia julgar oneroso o contracto ao Governo, por isso que o Banco não podia nunca ser juiz da authoridade dos documentos em virtude dos quaes elle tenha de pagar as prestações a que se obrigou; o nobre orador passa a ler a condição segunda do contracto (leu), e depois observa que nesta condição se diz, que o pagamento se fará á vista da conta desenvolvida, documentada e authenticada. Se se dissesse sómente — authenticada, ainda se poderia suppôr que a assignatura da conta pelas pessoas competentes e authenticadas; mas como a conta ha de ser documentada, se o Banco disser que não está competentemente documentada, crê que por este facto é o Banco o juiz da competencia dos documentos, e da sua authenticidade; julgando por conseguinte o Banco em ultima instancia naquelle processo das contas que lhe forem apresentadas; e em quanto elle não decidir que as contas estão devidamente documentadas não se lhe póde exigir o seu pagamento. No entanto como o Sr. Ministro diz que o Banco satisfará essas contas, quando, e sempre que lhe sejam apre sentadas pelo modo porque S. Ex.ª intende que devem ser apresentadas, cessa o receio delle orador, que conclue declarando que não o tendo satisfeito as explicações dadas pelo Sr. Ministro, e reflexões que aqui foram apresentadas, vota contra o projecto em discussão.

O Sr. Barão de Porto de Moz — Sr. Presidente, mais uma explicação que vou dar do que fazer um discurso, escusado era dize-lo, porque

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eu nunca faço um discurso preciso, porém dar uma explicação do meu voto, xisto succeder que elle está em opposição com todos os meus amigos deste lado da Camara com quem costumo votar em quasi todas as questões que se ventilam nesta casa; voto comtudo pelo projecto em discussão, e vou dar o motivo.

Primeiramente declaro que eu sou sincero e franco, e por isso quando digo que quero que haja neste paiz vias de communicação, exprimo uma verdade: dá-se pois uma occasião de o provar; eu sempre disse que havia de dar o meu apoio a todo o esforço que se fizesse pura o desenvolvimento de todos os melhoramentos de que tanto carecemos; é certo porém que este meu desejo me não levaria ao absurdo de approvar uma operação ruinosa ou inconveniente, só porque della resultava algum melhoramento, seria proceder contra o bom senso; comtudo tambem é certo que eu vejo quasi todos os meus amigos politicos votarem contra este projecto, a favor do qual voto talvez porque eu não vejo os inconvenientes que elles, mais esclarecidos do que eu, lhe descobrem; não combato as opiniões destes dignos Pares que tem fallado contra o projecto, nem lhes levo a mal o verem as cousas por differente modo por que eu as vejo, porque não é esse o meu systema. Tem-se dito que a divida fundada é grande, que o estado da fazenda é difficil, e nisso concordo eu; ainda ha pouco o exprimiu nesta Camara, e tambem importa pouco agora á conta de que administração se deve lançar a origem dessa divida, o que convém saber, é que a divida é enorme, e que as circumstancias são difficeis, isto e que para mim é muito essencial: não contrario portanto nisso aquelles, que combatendo o projecto, exprimiram essas verdades; mas de que me não posso dispensar de dizer, é que este projecto não póde com bons argumentos, e com taes fundamentos, ao menos quanto a mim, ser impugnado, e eu voto por elle, porque estou, e sempre tenho estado, na intenção sincera de concorrer, quanto em mim couber, para a realisação de todos os meios bem calculados para obter as vias de communicação, que eu intendo serem da maior necessidade, posto que não considero as estradas, como tantos, a primeira necessidade deste paiz, mas sim uma muito importante: não sou tão materialista, que me persuada de que os interesses materiaes sejam a primeira necessidade de um paiz: temos maior necessidade de melhoramentos moraes, e para exemplo apontarei de passagem a necessidade das reformas na justiça deste paiz, que de certo o precisa. Mas eu declarei que me limitaria a uma simples explicação, e volto ao meu proposito.

Sr. Presidente, não ha duvida que existe uma Lei neste paiz, em virtude da qual estão votados 15 por cento addicionaes, sobre as contribuições para a construcção das estradas, e não ha duvida que com este meio, applicado em proporção, e á medida da sua percepção, não póde dar-se ás estradas aquelle desenvolvimento que é conveniente á administração que proceder á factura de estradas: com os meios que fôr adquirindo desse imposto, nunca dará um passo muito avante, e o dinheiro gastar-se-ha, mas quando o ultimo lanço de uma estrada estiver feito, os primeiros estarão arruinados com grave prejuizo do Thesouro.

Ora parece-me que este projecto de emprestimo não excede os limites da dotação das estradas, e que sendo uma antecipação necessaria nada tem com o resto da divida, nem accrescenta as difficuldades do Thesouro. Mas o Governo póde abusar! Vejo no projecto todas as garantias para o não fazer, e é por isso que por elle voto. Mas se o fizer fica-me o direito de o censurar, e arguir: eu faço pela minha parte o que devo, faça o Ministerio o que deve, e se o nao fizer permitta-se-me a expressão vulgar, sua alma, sua palma, accusem-o, que eu terei a coragem de o condemnar. Os 15 por cento que estão creados para as estradas é que são a garantia deste emprestimo, por este lado não vejo, que elle possa com razão ser impugnado, porque o que está votado tem a sua natural applicação, e reputo necessaria esta, e outras operações da mesma natureza, porque de outro modo, os que vivemos, não gosaremos o beneficio, e nesta parte não posso deixar de ser egoista, porque quero tambem antes de acabar de existir servir-me das estradas: eu quero pois estradas, e para que as haja é necessario dar meios ao Governo, do contrario é não as querer, e eu que as quero, e que sou sincero não tenho duvida em votar esses meios ao Governo.

Sr. Presidente, para sermos vigorosos é necessario que sejamos justos (O Sr. Conde de Thomar — Peço a palavra). Com isto não quero dizer que os meus amigos deste lado, e que votam contra o projecto do lei, não tenham boas razões para assim proceder, elles o sabem, e eu já disse que tinha eu mesmo receio de errar, mas estou ainda convencido da vantajem do projecto, e de que todo o Governo que quizesse dar desenvolvimento ás vias de communicação, tem necessariamente do lançar mão de operações de credito sobre a base ou verba votada para a sua factura, porque de outro modo nunca seriam uma realidade: pois de que serve fazer-se um pedaço de estrada, de que serve fazer aqui e alli alguns lanços, se a final esses lanços muito tarde poderão formar uma estrada completa, tendo de vêr destruidos os lanços que se fizeram primeiro, antes de concluidos os ultimos, ou tendo de os conservar com grandes despezas antes de poderem servir? O que o Governo quer fazer por meio desta operação está dentro da orbita do imposto votado para estradas, com a unica differença de que em logar de se applicar essa verba aos poucos e de vagar, se applica com antecipação e em maior extensão. Os meus amigos porém não acreditam neste meio, receam que mesmo se lhe dê depois outra applicação, mas eu intendo que na propria condição 2.ª do contracto está o correctivo, condição que eu se fosse Ministro não acceitaria, mas que o aprecio muito sendo opposição; e que diz essa condição? Vejamos: — diz que, o Banco não dará por conta do emprestimo quantia alguma, senão á vista dos documentos, que provem a sua applicação ás estradas.

Sem me encarregar de saber quem authentica, estes documentos, como pareceu necessario, que não importa para nada, com tanto que os documentos sejam legaes, o que me importa saber é que o artigo diz que o Banco ha-de pagar por conta deste emprestimo unicamente a despeza que se fizer nos caminhos a que é applicado, á vista de documentos authenticos. É verdade que o Governo com demasiada abnegação consentiu que esta estipulação se inserisse no projecto, mas a mim não me toca examinar se elle conservou ou não a sua dignidade nesta parte, o que é certo é que para mim serve de garantia, e fico sem aprehenções sobre a applicação deste dinheiro, e nestes termos voto pelo projecto.

O Sr. Conde de Thomar — Limita-se a observar que estima vêr o seu nobre amigo sustentar o projecto, não achando difficuldades na sua execução; mas o digno Par se lembrará de que as primeiras impressões que teve foram suscitadas por S. Ex.ª (O Sr. Barão de Porto de Moz — Peço a palavra). O que o orador intende e que as explicações dadas pelo Sr. Ministro da Fazenda satisfizeram o seu nobre amigo, e não se admira disso, porque tambem esperou ser convencido, mas teve a desgraça de não se poder dar por convencido, e ter por isso de continuar na mesma opinião em que estava.

Mas não foi para isto que o orador pediu a palavra, mas especialmente para dizer que os amigos de S. Ex.ª não mereciam as expressões que lhes applicava, quando dirigindo-se a elles particularmente disse — quem quiser ser vigoroso, deve ser justo. O digno Par póde ter a opinião que quizer relativamente á justiça do projecto, e das razões para o Sustentar; mas pode-lhe que, assim como admitte que tenha a sua opinião livre sobre as razões para sustentar este projecto, que admitta tambem que elle orador e outros dignos Pares, vigorosos: ou não, estejam convencidos da justiça da sua causa; pois se assim não fosse não haviam de vir mostrar o seu vigor contra o projecto (apoiados). Portanto, espera que o digno Par e seu amigo intenda que o rigor com que elle tracta esta questão, em maior ou menor escala, não póde authorisar S. Ex.ª a dizer que para serem vigorosos é necessario que sejam justos (apoiados).

O Sr. Barão de Porto de Moz — Admirou-se muito, e maravilhou-o até, que o Sr. Conde de Thomar, seu amigo, tivesse ouvidos para ouvir uma expressão, e não os tivesse para outras; e que interpretasse a seu modo, e sabor essa expressão que ouviu. Que disse que era natural que estivesse em erro votando em sentido opposto aos seus amigos, que não havia ainda muito que tinha proferido estas palavras, para se não admirar de terem esquecido. Estas expressões excluem toda a idéa de allusão á injustiça do modo de votar dos seus amigos, attribuidas pelo Sr. Conde de Thomar a estoutras expressões que tambem proferira — que quem quisesse ser forte devia ser justo — que estas significavam a profunda convicção em que podia estar da justiça do projecto, e que a sua votação era determinada por essa circumstancia.

Que a fallar a verdade o digno Par fôra injusto nesta occasião, e é esta a primeira vez que merecia uma injustiça da parte de S. Ex.ª, talvez por estar em contradicção com a sua opinião; mas não deviamos ser injustos só pela simples razão de divergencia de opinião nestes objectos; que logo no principio do sou discurso lhe fizera uma censura achando-o em contradicção porque dizendo que lhe insinuará, que a segunda condição do contracto se prestava a uma censura ao Governo, elle orador se fundára nesta mesma condição para approvar o contracto; que respondia que era isso mesmo o que dissera, e que não havia nisso contradicção alguma; que era um lado fraco porque a Administração podia ser atacada, mas não o projecto, pela opposição.

E concluiu dizendo que se admirava que dizendo isto em particular a S. Ex.ª, elle o viesse dizer em publico, mas que daqui em diante não lhe diria mais nada (riso).

O Sr. Conde de Thomar — Não faço um discurso, é unicamente para dizer — que visto o digno Par declarar que as expressões de que me queixei não foram referidas aos meus amigos, como eu intendi e outros, não digo mais nada (apoiados).

Tendo-se acatado a inscripção, foi o parecer posto a votos, e approvado.

O Sr. Presidente — A ordem do dia para ámanhã é a continuação da mesma de hoje, e está fechada a sessão. — Eram quasi seis horas.

Relação dos dignos Pares presentes na sessão do 1.º do corrente.

Os Srs. Silva Carvalho; Duque da Terceira; Marquezes de Ficalho, de Fronteira, e de Vallada; Condes da Arrochella, do Bomfim, de Fonte Nova, da Louzã (D. João), de Mello, de Peniche, da Ponte, da Ponte de Santa Maria, de Rio Maior, do Sobral, de Thomar, e de Villa Real; Bispos de Bragança, e de Vizeu; Viscondes de Algés, de Athoguia, de Balsemão, de Benagazil, de Castro, de Fonte Arcada, de Francos, da Granja, de Nossa Senhora da Luz, o de Sá da Bandeira; Barões de Chancelleiros, de Lazarim, de Porto de Moz, e da Vargem da Ordem; Mello e Saldanha, D. Carlos Mascarenhas, Sequeira Pinto, Ferrão, Margiochi, Larcher, Silva Costa, José Maria Grande, Duarte Leitão, Brito do Rio, Fonseca Magalhães, e Aquino de Carvalho.

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