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portugueza. Se porém o governo rejeita esta minha supplica, empregue então contra mim o direito da força, e faça o que entender, que eu da minha parte farei sómente, com o auxilio de Deus, o que me dictar minha consciencia.

Terminarei este meu discurso, fazendo duas rapidas considerações. Sr. presidente, é mui justo que os servidores do estado sejam remunerados, e que ás suas viuvas se dêem pensões alimenticias rasoavelmente; mas não será ainda mais justo que sejam attendidos os egressos, despojados dos seus bens, e que pedem ha tanto tempo as suas prestações por inteiro? E porque não tem sido attendidos até ao presente? Não será igualmente de rigorosa justiça que os parochos, despojados dos rendimentos que tinham, sejam indemnisados (segundo a promessa do governo) dos prejuizos que têem soffrido ha trinta annos? Mas não fallemos do passado e vejamos o futuro. Esse projecto de lei para a dotação do clero, quero dizer, dos parochos, que tambem, segundo é voz publica, não póde ser convertido em lei na actual camara doa senhores deputados, por falta de meios para custear as despezas, não parece estar dizendo que os parochos pouco ou nada têem a esperar da parte do governo?

Se porém o governo não póde soccorrer a todos, soccorra ao menos os mais necessitados; lance mão de meios que sem alterar a harmonia que deve haver entre as ovelhas e seus pastores, habilitem estes a viver decentemente, e os subtraiam á dependencia de funccionarios pouco escrupulosos. Ninguém ousará dizer que os parochos merecem menos consideração que as viuvas dos servidores do estado.

Sr. presidente, a segunda consideração é a seguinte: o governo declara ser protector e defensor da religião catholica apostolica romana, que a carta reconhece como religião do estado, e presta juramento de defende-la e mante-la; mas que protecção é esta que não se estende nem á observancia doa domingos e dias santos de preceito, pois se trabalha publicamente e com escandalo, nem á observancia dos preceitos ou leia da igreja, de que se não importa o governo? Como é que tambem não parece estender se a vedar que-se espalhem ou imprimam romances immoraes ou livros anti religioso», n'uns doa quaes ou se destroe a base do christianismo, negando a divindade de Jesus Christo, ou se atacam alguns dos seus dogmas, e n'outros se ensina o atheismo ou pantheismo, negando a existencia de Deus, acreação, e immaterialidade da alma, e a vida futura? Pois não será isto uma das suas principaes obrigações? Não é até de conveniencia propria impedir a propagação de tão perniciosas doutrinas, de mãos dadas com o episcopado? Todavia não o tem feito assim; e por isso em presença d'esta camara protesto, reprovo e condemno essas doutrinas Ímpias, que espalham a descrença, a immoralidade e a corrupção, e que minam pelas bases a sociedade humana.

Á vista d'isto, pergunto me a mim mesmo, sr. presidente, em que consistirá a protecção do governo para com a religião do estado, reconhecida na carta constitucional? Eu não o saberei dizer; e só sei, que parecendo haver plena liberdade para a publicação doa romances immoraes e livros anti religiosos, diz se que o governo exige que as pastoraes doa bispos não possam correr sem primeiro serem publicadas no Diario de Lisboa; ou, por outras palavras, sem primeiro obterem a sua approvação: e se alguma pastoral, como aconteceu com a de s. em.ª o sr. patriarcha, ou do sr. bispo de Coimbra, não passaram pelo chrisol da sua approvação, mereceram do jornalismo que mais priva com o governo, severa critica, e ataques injustos e violentos.

A vista de taes factos não falta quem diga, sr. presidente, que a protecção do governo para com a religião é eó para vexar a igreja, priva-la de seus direitos, a qual não tem por isso protecção, mas perseguição.

Eu, sr. presidente, fazendo inteira justiça aos sentimentos religiosos do nobre ministro dos negocios ecclesiasticos e aos dos seus illustres collegas, não partilho de taes duvidas e, suspeitas, antes mui humilde e encarecidamente ouso pedir a es. ex.ªs que queiram por factos destrui-las, mostrando assim quanto ellas são infundadas e injustas.

(Declara-se que este discurso, apesar de lido por seu auctor, attenta a debilidade de sua voz, não foi ouvido pela camara.)

O sr. Presidente: — Peço attenção acamara. O artigo 51.° do nosso regimento diz: «São prohibidos os discursos por escripto, que não tiverem por objecto motivar um projecto ou proposta, logo depois da respectiva leitura» (apoiados).

Passámos á

ORDEM DO DIA

CONTINUA A DISCUSSÃO ESPECIAL DO PARECER N.° 348, SOBRE O ARTIGO 5.º

O sr. Osorio de Castro: — Sr. presidente, eu pedi ja palavra sobre a ordem para fazer um requerimento; o requerimento é para que V. ex.ª consulte a camara se permitte que eu retire a minha substituição ao artigo 5.° As rasões apresentadas pelo meu amigo e digno par o sr. Seabra illustraram de tal maneira a questão, s. ex.ª apresentou em termos tão precisos e claros, em linguagem tão juridica, o que desejava, que me parece que a minha substituição se torna desnecessaria, desde que á mesmo objecto se apresenta mais bem redigido, mais bem elaborado e maia juridicamente, como s. ex.ª o apresentou; mas s. ex.ª fez-me o favor de se dirigir a mim, para mostrar que eu comprehendia mais do queria na proposta que tinha feito, porque, querendo dar garantias aos juizes para saberem por quem haviam de ser julgados, dava attribuições excessivamente largas aos medicos, a quem eu determinava que o sr. ministro encarregasse de examinar os juizes. Eu tinha feito n'este sentido a minha substituição, e não creio que haja vergonha nenhuma de o dizer; quando mestria tão competente se apresentou e se propoz a illustrar a materia, eu não quereria por certo uma garantia d'aquella ordem, porque seria tambem uma falta de garantia, e aqui houve esquecimento de muitas outras cousas que se podiam apresentar. É uma prova que eu dou á camara, de que desejo sempre acertar, e ao mesmo tempo de que me reconheço incompetente para tratar d'esta materia; mas o que é sempre conveniente, é que cada um exponha as suas duvidas, e eu d'esta vez fui muito feliz, porque a duvida foi mais bem esclarecida por mestre tão competente; mas se a doutrina não póde ser adoptada em toda a sua amplitude, póde ser nos casos em que o er. ministro tenha de estabelecer, por assim dizer, um processo preparatorio, sobre o qual venha a recaír o veridictum do tribunal; é por isso que, retirando a minha substituição, tomo a liberdade de mandar para a mesa um additamento, para que V. ex.ª consulte a camara, se deve entrar em discussão conjunctamente com artigo 5.° (leu). Com este additamento, sr. presidente, fica completamente resolvido tambem o principio era que me fundava para apresentar a minha substituição o maia justamente, como muito bem notou o digno par, que estava já determinado por lei, e que elle muito melhor expressou do que eu poderia ter feito.

A camara permittiu que o digno par retirasse a proposta.

ADDITAMENTO AO ARTIGO 5.º

A suspensão do juiz, por excesso ou prolongação de ausenciar quando tenha por motivo a falta de saude, não poderá ter logar, sem que o ministro da justiça faça verificar o facto por uma junta de facultativos de sua nomeação.

Sala das sessões, 14 de abril de 1864. —Miguel Osorio Cabral de Castro.

O sr. Presidente: — Vae ler-se o additamento que o digno par agora mandou para a mesa (leu-se).

Admittido para entrar em discussão com o artigo.

O sr. Ministro da Justiça (Gaspar Pereira): — Sr. presidente, não pretendo alongar este debate nem desejo exacerbar a discussão; não o farei, a minha phrase é sempre comedida em toda a parte, a minha phrase é sempre comedida e respeitosa no parlamento.

Sr. presidente, seja qual for a vehemencia que tenha sido empregada para combater o artigo 5.° do projecto em discussão, principalmente por parte do digno par, o sr. Antonio Luiz de Seabra, a minha resposta ha de ser dada com toda a placidez, ha de ser dada com todas as attenções.

Sr. presidente, a palavra muito auctorisada dos dignos pares que impugnaram a materia do artigo 5.° podia ter feito alguma impressão na camara se não fóra a sua reconhecida e elevada illustração; na presença d'essa illustração reconhecida eu não tenho nada a receiar, absolutamente nada, pela sorte do artigo 5.°

Sr. presidente, illustrações menos vigorosas, illustrações menos robustas, illustrações até medíocres, estão nas circumstancias de poder ao primeiro golpe de vista, ao primeiro intuito pela simples leitura do artigo 5.°, reconhecer que elle não contém o que o digno par lhe attribuiu, e que d'elle se não podem tirar as consequencias e os corollarios que s. ex.ª tirou. Eu não digo isto na idéa de não acreditar que a impugnação que foi feita pelos dignos pares fosse filha da sua profunda convicção, eu estou intimamente convencido de que os dignos pares que impugnaram a materia do artigo 5.° o fizeram simplesmente pelo desempenho de um dever que teem todos os membros do parlamento, qual é o de concorrerem quanto couber em suas forças para que se façam leis acertadas e justas; foi sem duvida e unicamente debaixo d'este ponto de vista que ss. ex.ªs fizeram as suas impugnações na sessão passada. Mas, sr. presidente, parece-me que n'este caso tenho direito a esperar que ss. ex.ªs acreditem que da minha parte havia a mesma boa vontade, a mesma boa fé, e as mesmas intenções, o mesmo desejo, emfim, de remediar um inconveniente;. e se apresentei a proposta foi por estar intimamente convencido de que apresentava uma medida necessaria e indispensavel para a boa organisação e para a boa administração da justiça.

Sr. presidente, proferiram-se no entretanto certas phrases que, tendo sido proferidas pejo illustre auctor do projecto do codigo civil portuguez, é necessario levantar essas phrases, e dizer alguma cousa em resposta a ellas.

A camara não deixará certamente de me prestar a sua attenção, não porque eu a mereça, mas pela benevolencia dos dignos pares, pela importancia do assumpto, e pela responsabilidade do logar que occupo. Darei em breves palavras aquellas explicações que me for possivel dar.

S. ex.ª disse, e disse em voz muito clara e intelligivel, que este projecto que se apresentava no parlamento, que este projecto que se discutia, era uma medida em que se jogava a independencia do poder judicial. Joga-se n'este projecto a independencia do poder judicial, exclamou o digno par! Sr. presidente, hora infeliz aquella em que eu me envolvi numa partida em que se joga a independencia do poder judicial!! Nem tal cousa me passou nunca pela imaginação, nem me passa ainda!

Mas posto que não queira recorrer a argumentos de auctoridades não posso deixar de dizer n'esta occasião que me considero um tanto animado, vendo em roda de mim um grande numero de parceiros respeitaveis, que me acompanharam n'este tal jogo da independencia do poder judicial!

Sr. presidente, o que d'aqui 66 conclue, é que não póde ser attribuido este defeito á disposição do artigo 5.°, que se discute. Não se joga aqui a independencia do poder judicial; não ha aqui uma palavra d'onde se possa deduzir que isso seja veridico.

Eu, sr. presidente, honro-me de pertencer a esse poder; sou, sem duvida, o mais somenos de todos os seus membros; mas, apesar d'isso, não é crivei que eu, no uso das minhas faculdades, me lembrasse de trazer ao parlamento um projecto onde seja atacada a independencia de um poder tão respeitavel, e ao qual, torno a dizer, tenho a honra de pertencer ha mais de trinta annos. Peço perdão, mas s. ex.ª preoccupou se, e viu o que não está no artigo.

Seja qual for o resultado d'este projecto, não posso deixar de ter um certo desvanecimento, quando vejo que, tendo elle sido apresentado na outra casa do parlamento, foi impugnado apenas por tres ou quatro srs. deputados; e foi votado quasi unanimemente por todos os lados da camara, sem distincção de côr politica. Isto é uma prova de que ha muita gente que se associa ás minhas idéas. Eu mostrarei logo, analysando as disposições do artigo, em como não ha n'elle uma unica palavra d'onde se possa deduzir com fundamento similhante asserção.

Disse o digno par tambem: «Desde que o juiz é tirado do exercicio das suas funcções, faz-se-lhe uma flagrante injustiça o uma grande offensa e violação á carta constitucional. O poder executivo não póde arrancar um juiz das suas funcções; o poder executivo só póde decretar a suspensão, depois de ser previamente ouvido o juiz e depois de ser também ouvido o conselho d'estado.» Eu tambem logo direi onde o digno par foi buscar estas palavras que empregou, as quaes, salvo o respeito devido, não vem nada a proposito para o caso de que se trata; são empregadas em outro sentido e têem uma significação mui diversa, sendo essa significação applicada a uma differente hypothese (apoiados).

Sr. presidente, a discussão fez-se principalmente para se esclarecerem os pontos duvidosos das propostas, os pontos duvidosos dos projectos, que se discutem no parlamento; ás vezes porém parece que ella produz um resultado contrario, por isso que se não faz mais do que confundir aquillo que é claro e terminante, collocando o em circumstancias taes, que muito difficil é perceber os argumentos que se apresentam. Eu não quero dizer com isto que os dignos pares que têem tratado esta questão, impugnando o artigo 5.°, procurassem confundir a discussão com as suas argumentações; longe de mim similhante idéa: o que desejo demonstrar é que o artigo 5.° é tão claro e explicito, que tenho o mesmo receio, querendo explica-lo, do o confundir e tornar menos intelligivel.

Mas sr. presidente, voltando á asserção apresentada pelo digno par, sobre o juiz ser arrancado ao exercicio das suas funcções, pergunto como é possivel ver na letra do artigo em discussão um acto tão violento, tão opposto aos principios constitucionaes e tão alheio da verdade? Onde é que o projecto ordena que o juiz seja tirado do exercicio das funcções por determinação arbitraria do governo? Qual é o caso em que elle deixa de exercer as suas funcções? Desde o momento em que um juiz requer qualquer licença, desde o momento em que elle declara que está doente, que tem motivos fortes que o inhibem de poder continuar a exercer jurisdicção ou as suas funcções, é elle proprio que se separa do exercicio dellas, e o governo não o arranca do seu logar nem o póde arrancar por modo algum, não faz mais do que proceder como o serviço reclama, vista a sua declaração que faz de que se não acha em circumstancias de poder continuar a exercer as suas funcções. Aqui não ha a violencia que pareceu querer-se inculcar quando se disse que o juiz é arrancado do seu logar! Nada d'isso: o juiz fica no quadro porque elle proprio diz que não póde continuar a servir, e fica no quadro para um outro ir administrar justiça, visto que os substitutos em regra são menos idoneos para isso como todos sabem.

Logo fallarei dos casos em que deve ser ouvido o conselho d'estado e previamente ouvido o juiz que se pretende suspender.

Sr. presidente, imagina se talvez que os logares da magistratura são um patrimonio do juiz, que as comarcas aonde exercem jurisdicção são propriedades suas, e quer-se-lhe por conseguinte applicar o direito de propriedade. Não é assim. A lei dá certas garantias aos juizes para os tornar independentes, a fim de que possam administrar justiça com inteireza e rectidão, e essas garantias consistem em terem a perpetuidade dos seus logares. A carta constitucional diz no artigo 120.° que os juizes de direito são perpétuos, e no artigo 122.° que só poderão perder o logar por sentença. Ora o artigo 5.° do projecto contém uma providencia para o caso do juiz se achar impossibilitado, sem de modo algum offender os seus direitos, e provendo a uma necessidade do serviço publico e cada mais. A perpetuidade do logar é a sua garantia, e essa não a póde o juiz perder senão por uma sentença. Quando se diz ao juiz: «Estaes doente, não podeis exercer jurisdicção na vossa comarca, que se acha abandonada, pede a conveniencia do serviço que outro juiz ali vá administrar justiça, e vós quando prompto para servir tereis uma comarca de classe igual». Esta é a disposição do artigo 5.° Não se diga, sr. presidente, que este artigo ataca as prerogativas do poder judicial, e que o facto da collocação do juiz no quadro da magistratura sem exercicio é uma violencia que se lhe faz, uma pena que se lhe impõe e que lhe dá um corte na sua antiguidade! Se o juiz está fóra do seu logar, se não faz serviço, ou tenha sido declarado no quadro, ou permaneça sem essa collocação, nunca se lhe conta como tempo de serviço effectivo aquelle em que não serve estando ausente, salvos os trinta dias de licença em cada anno. Portanto a collocação no quadro não peiora a sua condição pelo que pertence á contagem do tempo para regular a antiguidade.

Por consequencia nenhum vexame se faz ao juiz quando se lhe declara, e a lei é quem lhe faz essa declaração, que ha de ser provido quando cessar o seu impedimento n'um logar igual aquelle em que deixou de servir por se ter declarado impedido por doença propria ou por outro motivo.

Quer-se despojar o juiz das suas garantias, disse o digno par. Peço perdão: nada d'isso se pretende, o que se quer é fazer com que os povos tenham magistrados que lhes