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SESSÃO DE 16 DE JULHO DE 1869

Presidencia do ex.mi sr. Conde de Lavradio

Secretaries-o, *««

C Assiste o sr. presidente do conselho.)

Depois das duas horas da tarde, tendo-se verificado a presença de 24 dignos pares, declarou o ex.mo sr. presidente aberta a sessão.

Leu-se á acta da antecedente, contra a qual não houve reclamação.

O sr. secretario Costa Lobo mencionou a seguinte

Correspondencia,

Um officio do ministerio da marinha e ultramar, remettendo, para serem distribuidos pelos dignos pares, noventa exemplares da conta da gerencia do anno economico de 1867-1868 e do exercicio de 1866-1867.

Teve o competente destino.

Um officio da presidencia da camara dos senhores deputados remettendo a proposição sob ser o governo auctorisado a admittir no hospital de inválidos militares de Runa o numero de praças do exercito, que comportar o rendimento da subscripção aberta entre os militares para perpetuar a memoria de El-Rei o Senhor D. Pedro V.

Á commissão de guerra.

Outros officios da mesma presidencia da camara dos senhores deputados, remettendo a proposição sobre a approvação do decreto de 13 de fevereiro, do corrente anno, pelo qual foi fixada a côngrua do superior da missão de Timor.

A commissão do ultramar.

Remettendo a proposição sobre a approvação do decreto de 17 de março do corrente anno, pelo qual foi creada uma cadeira de lingua ingleza nó concelho de Salsete.

A commissão de marinha e ultramar.

Remettendo a proposição sobre o augmento extraordinario das taxas da contribuição industrial parafo anno de 1869.

A commissão de fazenda.

O sr. Presidente: — Antes de dar a palavra aos dignos pares que a pedirem, devo participar á camara que Sua Magestade recebeu, com a sua costumada benevolencia, a deputação que lhe foi apresentar os decretos ultimamente approvados pelas côrtes.

Aproveito a occasião para declarar á camara que não tenho podido comparecer a tomar o logar da presidencia, porque o meu mau estado de saude mo não permittiu.

Tem a palavra o sr. marquez de Vallada.

O sr. Marquez de Vallada: — Peço a v. exa. o obséquio de me inscrever para tomar parte na interpellação annunciada pelo digno par, o sr. Rebello da Silva, ao sr. ministro das obras publicas.

Eu não estava presente na sessão em que esta interpellação foi annunciada, mas se bem me parece ella refere-se ás tristes circumstancias em que ficaram collocados os empregados da extincta repartição dos pesos e medidas, e, sobre isto creio que ha na outra camara um parecer de commissão, no qual se recommenda ao governo a justiça que assiste áquelles infelizes. (O sr. Rebello da Silva: — Peço a palavra.)

Não sei se o digno par pede a palavra sobre este mesmo assumpto?

O sr. Rebello da Silva:— Não, senhor, é sobre outro incidente.

O Orador: — Julguei que seria sobre o mesmo assumpto, porque nesse caso eu me uniria ás palavras de s. exa., embora pequeno e fraco fosse o reforço que eu podesse prestar a s. exa., tão distincto orador e tão competente em todas as questões em que toma parte.

Aproveitarei a occasião de me achar de pé para fazer uma pergunta ao sr. presidente do conselho, visto não se achar na camara o sr. bispo de Vizeu, a quem me queria dirigir, não como a um prelado, mas como a um ministro, e ministro do reino, que s. exa. é, e a quem por conseguinte pertence a direcção dos negocios politicos.

Vou pois, na falta do sr. ministro do reino, dirigir-me ao chefe do gabinete, ao qual peço se digne dar-me alguns minutos de attenção, e espero que annuirá a este meu pedido, porque s. exa. sempre se tem mostrado benévolo para commigo, e eu respeitoso e reconhecido ás provas de deferencia do nobre marquez.

(Pequena pausa.)

O sr. Presidente:— V. exa. acabou?

O Orador: — Não, senhor, parei, porque o sr. presidente do conselho recebeu agora um telegramma que está lendo, e só depois de s. exa. acabar de ler é que eu posso continuar.

(Pausa.)

Parece que se realisou o que eu já ha tempos annunciei nesta casa e em presença do nobre presidente do conselho; parece-me, repito, que se realisou a crise politica, ou como melhor se lhe deva chamar. Diz se que está sentenciado o sr. conde de Samodães a ser a victima expiatoria dos erros do actual ministerio.

Eu já aqui me referi ao que havia dito numa reunião particular e muito solemne, á qual se, deu toda a publicidade, pois até foi annunciada da cadeira da presidencia a pedido do ministerio. A essa reunião, não da maioria, mas de toda a camara, assisti eu e assistiram muitos dignos pares que ali concorreram, e foi então que o sr. ministro do reino, respondendo a uma pergunta, disse que os srs. ministros tomavam a responsabilidade dos actos do sr. ministro da fazenda, porque todos eram solidários nesses actos. A resposta, como se vê, não podia ser mais simples, nem mais clara e categórica, e em consequencia della é que, segundo me parece, agora se realisa a crise ministerial, porque o sr. ministro da fazenda está em desintelligencia com a commissão de fazenda da outra camara e com a rejeição de algumas das suas propostas, soffreu isto a que se chama cheque, palavra que se não acha no nosso dicionário da lingua portugueza, mas que se emprega na linguagem politica. V

Assim parece natural a saída do sr. conde de Samodães do gabinete, e eis ahi os outros srs. ministros libertos da presença daquelle cavalheiro, que lhes parece agora inopportuna e impertinente, porque comquanto leve comsigo alguns amigos essa falta, espera s. exa. que será supprida por outros. Mas contra todas as praticas constitucionaes, veremos nós sair o sr. ministro da fazenda, e continuarem no gabinete os outros srs. ministros? Continuarão s. Ex.as á testa dos negocios do estado, depois das declarações já feitas, de que eram responsáveis pelos actos do sr. ministro da fazenda? Não sei como isso seja possivel, porque s. Ex.as não podem eximir-se á responsabilidade que aceitaram e que por todos é reconhecida, e tão altamente reconhecida, que o proprio sr. ministro do reino assim publicamente o declarou nesta camara.

Por consequencia, sr. presidente, pergunto eu, existe ou não existe a crise? Talvez s. exa. me diga que não; mas não ha duvida que existe a crise. Em breve apparecerá o parecer da commissão de fazenda da outra camara, rejeitando os 50 por cento propostos pelo sr. ministro da fazenda, sobre a contribuição predial, e propondo só 20 por cento; em breve apparecerão outras demonstrações de des-

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agrado ao Sr. conde de Samodães, que mostrarão a verdade do que digo.

Postas as cousas nestes termos, para ser coherente com o que tenho dito, e com as idéas que tenho enunciado, e com os principies que tenho sempre defendido; desejo saber se effectivamente o sr. conde de Samodões sae do ministerio. Espero da lealdade do nobre presidente do conselho e chefe da situação, que me responda a esta pergunta, e diga se porventura ha crise, e se está resolvida a saída do sr. conde de Samodães, porque se está resolvida a saida de s. exa., deve estar tambem resolvida a saida de todos os ministros. Eu cão comprehendo de outro modo o systema constitucional. Aguardo as explicações do sr. presidente do conselho.

O sr. Presidente do Conselho de Ministres (Sá da Bandeira):— Creio que o digno par deseja saber se o sr. conde de Samodães pediu a sua demissão. Respondo que não me consta ter o sr. conde de Samodães dado tal passo...

O sr. Marquez de Vallada: — Perguntava mais alguma cousa a v. Ex.a; perguntava se no caso de sair o sr. conde de Samodães, o governo sairia todo?

O sr. Presidente do Conselho de Ministros: — Responderei ao digno par na occasião opportuna. Se o sr. conde de Samodães pedir a demissão, então, segundo as circumstancias que por esse facto se derem, eu declararei se sae o governo todo ou não.

Não tenho mais nada a dizer em resposta á pergunta que me dirigiu o digno par.

O sr. Marguez de Vallada: — Continua o systema das contradicções: um ministro diz uma cousa, outro diz outra. O sr. bispo de Vizeu, que pensa de uma maneira differente de v. exa., disse na reunião dos pares, que o governo tomava a responsabilidade dos actos do sr. conde de Samodães; se o sr. conde sair do ministerio, não é como particular, nem por se achar doente, nem por ter praticado nenhum acto criminoso, sae, em virtude dos seus actos ministeriaes.

Digo isto para justificar a pergunta que fiz, que não foi inconveniente, pois que estas perguntas fazem-se na Inglaterra, na Bélgica e na França, de outro tempo, não de hoje que o seu systema de governo é muito differente. Assim, e do mesmo modo perguntei se o ministerio tomava a responsabilidade dos actos do sr. conde de Samodães; não perguntei se s. exa. pedira a demissão, mas sempre estimei que s. exa. ma respondesse que o seu collega não tinha pedido a demissão. E ajunkra o nobre presidente do conselho: «se por ventura o sr. conde de Samodões p-air do ministerio, será então a occasião opportuna para dirigir essa pergunta ao governo». Pois bem, eu dirigi a pergunta já ao sr. ministro do reino, e elle não a achou inopportuna, e respondeu immediatamente que tomava a responsabilidade dos seus actos, portanto já vejo que existe contradicção entre o sr. ministro do reino e v. exa.

O sr. Presidente do Conselho de Ministros:— Não posso responder a hypotheses; se as circumstancias forem umas, o governo sae; se forem outras, o governo não sae: portanto não posso responder a hypotheses como disse.

O sr. Marguez de Vallada:— Não posso obrigar o sr. ministro a dar uma resposta. S. exa. não responde, porque entende não dever responder, e eu perguntei, porque entendi dever perguntar. S. exa. reserva-se para quando se der o caso; se não se der, porque o sr. ministro da fazenda póde conservar-se por muitos annos e bons no ministerio, não tem logar a minha pergunta: mas se não se conservar, como me parece deprehender, porque eu ando neste mundo e vejo o que se passa, desde já previno o sr. marquez de Sá, com toda aquella atenção que merece, que eu por essa occasião tornarei a fazer a minha pergunta. S. Exa. sabe que as opposições são exigentes, s. exa. já foi da opposição e não muito quieta, sempre polido, como é proprio do seu caracter, mas um pouco inquieto: por consequencia não se deve admirar do que as opposições sejam exigentes sobre

tudo quando essas exigencias se fazem por interesse publico. Serviu-me esta resposta para registrar que não ha grande accordo entre os srs. ministros, visto que o sr. ministro do reino deu uma resposta, que manifestava uma certa doutrina, e o sr. presidente do conselho deu outra que parece contraria-la. Tambem quero aguardar o acontecimento possivel dentro em poucos dias, como espero, para tornar a renovar a minha pergunta, e se nessa occasião estiver presente o sr. bispo de Vizeu folgarei muito para confrontar as duas respostas que provavelmente hão de ser contradictorias entre si.

O sr. Conde da Ponte: — A commissão de obras publicas não se tem podido reunir por alguns dos seus membros estarem doentes, e portanto pedia á camara que auctorisasse a mesa a nomear dois membros para a mesma commissão poder funccionar.

A camara sobre este pedido concedeu a auctorisação.

O sr. Costa Lobo:— Mando para a mesa dois pareceres da commissão de fazenda.

Leram-se na mesa e mandaram-se imprimir.
O sr. Rebello da Silva: — É para pedir á mesa, e em especial ao sr. presidente, que se digne fixar o dia de sessão em que se devem verificar as interpellações que annunciei ao sr. ministro das obras publicas sobre as obras no districto de Santarem, e sobre a questão dos empregados da extincta repartição de pesos e medidas. O sr. ministro já se declarou habilitado para responder (Entrou o sr. ministro das obras publicas.), e eu já requeri em outra sessão que se fixasse o dia, para que eu e o sr. ministro possamos trazer os documentos necessarios.

O sr. Presidente: — O sr. ministro das obras publicas ouviu o que disse o sr. Rebello da Silva?

O sr. Ministro das Obras Publicas (Calheiros de Menezes):— Ouvi que s. exa. se referiu á interpellação que me tinha annunciado, mas como ainda não se tinha marcado o dia para ella se verificar, não trouxe hoje as notas para responder.

O sr. Rebello da Silva: — Eu pedi apenas que se destinasse o dia.

O sr. Presidente: — Então fica designado o dia de segunda feira.

O sr. Ferrer: — Sr. presidente, eu peço a v. exa. que designe tambem o dia em que se ha de verificar uma interpellação Que annunciei ao mesmo sr. ministro das obras publicas, porque me parece que na ultima sessão, á qual não tive a honra de assistir, s. exa. se deu por habilitado para responder; pelo menos foi o que li nos extractos dos jornaes. E creio que não póde haver duvida em que ella se verifique no mesmo dia destinado para a do sr. Rebello da Silva.

O sr. Presidente: — Havendo tempo tambem se verificará na segunda feira.

O sr. Menezes Pitta: — Mando para mesa a seguinte nota de interpellação dirigida ao sr. ministro das obras publicas:

e Desejo interpellar o sr. ministro das obras publicas ácerca do imposto das portagens nas estradas da província do Minho. — Rodrigues de Castro Menezes Pitta.

Mandou-se expedir.

O Sr. Marquez de Vallada:— Sr. presidente, cumpre-me, por um dever de delicadeza, participar ao sr. ministro das obras publicas, que pedi para tomar parte na interpellação annunciada pelo sr. Rebello da Silva a s. exa. com relação aos empregados dos pesos e medidas.

O sr. Ministro das Obras Publicas: — A interpellação do sr. Rebello da Silva refere-se ás obras publicas no districto de Santarem, mas se v. exa. quer interpellar o governo ácerca dos empregados dos pesos e medidas, eu estou habilitado para responder, porque esse mesmo assumpto já foi tratado na outra casa do parlamento.

O Sr. Marquez de Vallada: — O sr. ministro diz que a interpellação do sr. Rebello da Silva se refere apenas ás obras publicas do districto de Santarem.

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O sr. Rebello da Silva: — Eu annuncei tambem uma interpellação ácerca dos empregados da repartição de pesos e medidas, e vem publicada a competente nota no Diario da gamara.

O sr. Marguez de Vallada: — Eu pedi para tomar parte na interpellação, e declarei-o ao sr. ministro, por julgar isso proprio da minha delicadeza.

O sr. Presidente: — O sr. ministro das obras publicas só se tinha declarado habilitado para responder á interpellação relativa ás obras publicas do districto de Santarem, mas agora acaba de declarar que tambem está habilitado para responder sobre a que diz respeito aos empregados da extincta repartição de pesos e medidas, e então, quando esta se verifique, v. exa. póde pedir a palavra, porque todos os membros desta camara podem tomar parte nas interpellações.

O sr. Marquez de Vallada: — Eu espero que v. exa., na conformidade dos nossos usos e costumes, faça annunciar no Diario do governo o dia em que se devem verificar as interpellações, e a ordem por que devem ter logar.

O sr. Ministro das Obras Publicas: — Eu, sem querer por forma alguma perturbar os usos desta camara, parece-me que me podia declarar habilitado para responder desde já. Foi um assumpto que já se tratou na outra casa do parlamento, e ainda que não saiba precisamente o ponto a que os srs. Rebello da Silva e marquez de Vallada, se referem, responderei, se s. ex.as quizerem verificar desde já a interpellação.

O sr. Marquez de Vallada: — Pela minha parte tambem estou prompto a entrar desde já no assumpto, se o sr. Rebello da Silva quizer verifica-la agora.

Leu se na mesa a nota de interpellação do digno par o sr. Menezes Pita.

O sr. Presidente: — O sr. ministro ouviu ler a nota de interpellação, e dirá quando se julga habilitado para responder a ella.

O sr. Ministro das Obras Publicas: — Eu não ouvi bem a leitura, mas sabendo bem qual é objecto da interpellação do digno par, talvez me de por habilitado para responder promptamente.

O sr. Presidente: — Em todo o caso ella será enviada a v. exa. Eu darei pois para ordem do dia de segunda feira as interpellações annunciadas pela sua ordem chronologica; primeiro, terá logar a do sr. Rebello da Silva, sobre as obras do districto de Santarem, immediatamente depois a do sr. Ferrer, depois a outra do sr. Rebello da Silva, e por ultimo a do sr. Menezes Pitta.

Passou se á

ORDEM DO DIA

Leu se na mesa o seguinte

Parecer n.° 13

Senhores. — Foi remettido á commissão de fazenda o projecto de lei n.° 16, vindo da camara dos senhores deputados, fixando a contribuição pessoal relativa ao anno de 1869, no continente do reino na quantia de 180:000$000 réis, no archipelago dos Açores na de 9:629$990 réis em moeda insulana, e 4:300$720 réis na mesma moeda quanto ao districto do Funchal.

A commissão, tendo verificado que as quantias propostas são exactamente iguaes ás que, foram já approvadas para os annos anteriores, é de opinião que q referido projecto de lei deve ser approvado por esta camara para subir á real sancção.

Sala da commissão, em 6 de julho de 1869. = Conde d’Avila = Francisco Simões Margiochi = Antonio de Sousa Silva Costa Lobo — José Augusto Braamcamp = Conde da Ponte.

Projecto de lei n.° 16

Artigo 1.° A contribuição pessoal, relativa ao anno de 1869, no continente do reino, é fixada para os respectivos districtos administrativos na importancia de 180:000$000 réis, e nas ilhas adjacentes, para os districtos dos Açores, na de 9:629$990 réis em moeda insulana, e para o districto do Funchal na de 4:300$720 réis na mesma moeda, a qual contribuição será repartida pelos mesmos districtos, na conformidade do mappa que vae junto a esta lei e della faz parte.

Art. 2.° Fica revogada a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 1 de julho de 1869. = Diogo Antonio Palmeira Pinto, presidente = José Gabriel Holbeche, deputado, secretario = Henrique de Barros Gomes, deputado secretario.

Mappa a que se refere a lei desta data

Districtos administrativos
ontigentes
ontinentes
Aveiro
Beja
Bragança
Castello Branco
Coimbra
Evora
Faro
Guardado pela última vez por Leiria
Lisboa
Portalegre
Porto
Santarem
Vianna do Castello
Villa Real
Vizeu
Ilhas
Açores
Angra do Heroismo
Horta
Ponta Delgada
Funchal

-
2:297$963
2:351$880
5:485$425
867$282
3:298$032
5:174$967
5:505$169
4:684$038
3:179$917
4:483$542
88:878$623
5:000$769
31:043$367
7:000$821
2:264$761
3:417$016
5:066$428
180:000$000
3:436$090
1:679$520
4:514$380
9:629$990
4:300$720

Palacio das côrtes, em 1 de julho de 1869. = Diogo Antonio Palmeiro Pinto, presidente = José Gabriel Holbeche, deputado secretario = Henrique de Barros Gomes, deputado secretario.

O sr. Visconde de Fonte Arcada:— Sr. presidente, eu antes de se entrar na apreciação deste projecto de lei, quero dizer duas palavras na presença dos srs. ministros do reino e da fazenda; contudo como se acha presente o sr. ministro das obras publicas, s. exa. terá a bondade de participar aos seus collegas as minhas observações, alem de que os srs. ministros hão de ver impressos os meus discursos, e s. Ex.as farão então o que entenderem. O facto é que eu precisava, para poder votar este projecto, uma resposta categorica de s. exa.

(Pequena pausa.)

Sr. presidente, alguns dignos pares estão insistindo commigo para que proponha o adiamento até que esteja presente o sr. ministro da fazenda; mas como está presente um sr. ministro, e por não querer demorar a discussão, continuarei.

O sr. Rebello da Silva: — Eu não digo a v. exa. que o proponha, então poderia eu proprio; o que eu digo é que v. exa. pôde, se quizer, propor o adiamento.

O Orador: — E u resolvo-me a continuar, porque entendo que o sr. ministro das obras publicas fará presente ao seu collega o que vou dizer.

Eu quizera fazer algumas perguntas ao sr. conde de Samodães, porque segundo a resposta de s. exa. é que eu approvaria ou rejeitaria o projecto que entrou em discussão.

Sr. presidente, quando se está a ponto de se lançar sobre o povo impostos extraordinários e vexatorios, quando se deve estabelecer um systema de economia no paiz, é preciso evitar que o povo faça despezas, por qualquer titulo seja, das quaes nem se quer o thesouro tira interesse algum; despezas que saem da mesma algibeira donde hão

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de sair os impostos, sem que o thesouro tire dellas nenhum interesse, e impossibilitam a cobrança dos impostos que se devem pagar, o que vou demonstrar.

Já aqui fallei sobre a carta de lei e tabella judicial de 30 de junho de 1864, por onde se fazem as contas para pagamento das custas, dos processos para pagamento das contribuições atrazadas, que muitas vezes para obrigar a pagar a contribuição de 40 réis, as custas importam 2$000 réis e 3$000 réis.

Ora, isto realmente é escandaloso! É preciso que o governo tome em consideração este objecto, que reforme a tabella convenientemente, e que resolva estas questões de administração, que são de grande importancia, com o menor vexame possivel para o povo.

Alem disto, sr. presidente, acontece agora que os proprietarios são obrigados a fazer grandes despezas com o registo das servidões, a que vão ser obrigados os registos. O praso para este registo é de um anno, como se dentro deste espaço de tempo se podesse fazer um numero apreciavel de registos; e quando os registos se não façam em tempo competente, neste caso não podem ser allegados os direitos de terceiro ás servidões. Quer dizer que se a propriedade se vender, e não forem registadas antes as servidões que pertencem ás propriedades, estes direitos não podem ser invocados em relação a terceiro.

Emfim é preciso que se saiba que uma grande parte dos proprietarios (eu fallo diante de pessoas das provincias que sabem isto muito bem) não teem documentos legaes para provar a posse das servidões das suas propriedades que estão estabelecidas talvez ha seculos, e neste caso preciso fazer uma justificação, para mostrar o direito que tem ás servidões.

A camara que avalie á vista da immensidade de propriedades que têem servidões como é possivel que se possa dar justificações, sem que os proprietarios façam grandissimas despezas. No Minho, na Beira e na ilha da Madeira aonde a propriedade está muito dividida, acontece isso, e todos estes embaraços que a lei foi impor á propriedade reduz-se tudo ou em grandes despezas, e á propriedade ficar sujeita, como acabei de dizer, e perder os direitos sujeites a registo, senão for registada em tempo competente, sem que possam ser invocados em relação a terceiro.

Portanto é necessario que o parlamento tome tudo isto em consideração; e necessario que o sr. ministro do reino e o da fazenda, que é, digam se têem tenção de propor ao parlamento qualquer medida que isente as propriedades, que teem servidões, do ónus que lhes vae impor a lei que os manda registar. Esta lei é uma lei inexequivel, porque as servidões das propriedades não podem ser registadas, senão em um grande numero de annos, sendo esta despeza inutil e mui grande.

Imagine a camara que uma grande parte das propriedades, que teem servidões, não tem documentos, e sendo preciso dar uma justificação, como é possivel que dentro de um anno todos os proprietarios que teem propriedades com servidões possam dar as justificações?

O modo de qualquer proprietario levar a effeito a justificação de qualquer servidão que lhe pertença é despendiosissima; e claro está que esta despeza recae sobre o proprietario, concorre para que lhe seja mais penoso pagar os impostos a que vae ser obrigado, que isto é uma cousa que não tem contradicção, e é necessario evitar.

O parlamento é que tem obrigação de pôr cobro a este grave incommodo que todos estão passando; e o governo do mesmo modo tem obrigação de olhar para todos os ramos de administração do paiz, e de tratar de remover todos os torpeços, embaraços e despezas que vão carregar sobre a propriedade. Pedir impostos é facil; lança-los tambem é facil, mas cobra-los é que é difficil, principalmente quando o povo está sobrecarregado com despezas, que eu apontei, e de que está sendo victima.

Eu desejava que os srs. ministros do reino e fazenda estivessem presentes para lhes perguntar qual era a sua opinião sobre este assumpto, opinião que já devem ter formado.

O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, este projecto é um dos do sr. conde de Samodães, e que está ligado com muitos outros que s. exa. apresentou; e posto que s. exa. não esteja presente, como está o sr. ministro das obras publicas, que já geriu a pasta da fazenda, e naturalmente estará habilitado a responder a alguns pontos em que desejo ser esclarecido, e dos quaes julgo conveniente que a camara teme conhecimento; se o mesmo sr. ministro das obras publicas está habilitado a responder a esses pontos, não terei duvida de os formular, e de os discutirmos, para que o projecto possa ser hoje votado. Mas no caso de s. exa. não se achar habilitado para responder, e não está presente o sr. ministro da fazenda, não me parece conveniente a discussão deste projecto (apoiados}.

Reservo-me pois para ouvir as explicações de s. exa., e pedirei depois a palavra.

O sr. Ministro das Obras Publicas: - Como eu não sei a que pontos o digno par se refere, não posso tambem dizer se saberei responder a tudo que s. exa. perguntar.

O sr. Vaz Preto: - Conhecendo a natureza do projecto, e sabendo que os pontos que se hão de tratar devem ter relação com o objecto, facil é conhecer até onde podem ir as perguntas, e se acaso póde s. exa. responder ou não.

O sr. Ministro das Obras Publicas: - Desde que a discussão póde ser variada, parece-me que, assim como se podem apresentar pontos a que eu saiba responder, poderá tambem dar-se o caso de se apresentar algum a que não possa bem satisfazer, visto não ter especialmente occupado o tempo com o estudo destas materias.

O sr. Marquez de Vallada:- Eu creio que nós temos de votar forçosamente este projecto, porque é tal o fervor ministerial que, não só estão dispostos a dar o seu voto aquelles que sustentam o governo, mas até aquelles que lhe fazem opposição. Isto é tanto mais exacto e verdadeiro, que numa das proximas passadas sessões, já esta camara deixou approvado um outro projecto, que estabelecia o augmento extraordinario de 50 por cento sobre esta mesma contribuição, que ainda não estava votada! Quer dizer, votou se aquelle augmento sem haver o conhecimento da base (apoiados).

Eu não estive presente, mas não posso deixar de notar este fervor em sustentar o actual gabinete. Todos o querem ajudar; não póde haver um ministerio mais feliz.

Dir se-ha, sr. presidente, -mas esta questão que se dá agora é apenas uma questão de methodo -. Muito bem, mas o methodo é tudo, porque elle é necessario na vida economica, na vida commercial, etc., em tudo. Assim, eu entendi dever fazer a observação em nome das conveniencias, por isso que me parece não se poder negar que teria sido mais natural e mais rasoavel discutir este projecto primeiro, e o outro depois (apoiados). Mas o que eu tambem noto é que o sr. ministro das obras publicas não devia considerar-se tão estranho a este assumpto, por isso mesmo que já occupou o logar de ministro da fazenda; alem de que s. exa. faz parte de um ministerio que já por mais de uma vez tem declarado ser solidario. Conseguintemente, se para estar sentado naquellas cadeiras, se ha de tomar conhecimento dos negocios que se apresentam, s. exa., que já foi ministro da fazenda, até em occasião que se póde dizer difficil, muito melhor parece que ha de satisfazer a quaesquer perguntas que o sr. Vaz Preto lhe faça em relação ao assumpto propriamente dito.

Admittido porem, mas não concedido, que s. exa. não possa responder a alguma cousa, devemos então esperar pelo sr. ministro da fazenda, segundo o proprio parecer do sr. ministro das obras publicas, apoiado pelo digno par o sr. Reis e Vasconcellos, que por aquella demonstração devemos crer que se associa ao nobre presidente do conselho para nos assegurar que ainda está no mesmo logar o sr. conde de Samodães.

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Se pois for necessario esperar por s. exa., esperemos, e se entretanto se realisar o que tanto se insiste em asseverar por toda a parte, esperaremos pela pessoa que substituir o sr. ministro da fazenda.

O sr. Rebello da Silva: - Eu já declarei aqui, em relação ao augmento deste imposto, que votaria por um acrescimo de contribuição extraordinariamente, a fim de ajudar o governo a fazer com que o paiz saia da crise em que todos conhecem que nos achamos. Devo porem dizer que se eu soubesse bem que esta contribuição ordinaria não estava ainda votada quando se nos apresentou o outro projecto do augmento de 50 por cento, eu teria proposto o adiamento como uma cousa a mais rasoavel, por isso que não se tinha votado a base sobre que recaia aquelle augmento (apoiados}.

O primeiro ponto e a base desta contribuição, o segundo é a influencia que, pé1 a maneira por que é apresentada esta contribuição, póde ter na receita, como tive a honra de já dizer. Eu desejo provocar explicações da parte do governo com relação á desigualdade da contribuição pelos districtos do reino. Não serei tão rigoroso que exija do sr. ministro das obras publicas explicações que de certo s. exa. não me póde dar. Tem-se dito que a base desta contribuição é a mais justa e rasoavel, porque não vae ferir as classes pequenas, e apenas tem em vista exclusivamente as manifestações da riqueza, os vehiculos de luxo, a que vulgarmente se chama carruagens, cavalgaduras e o numero de creados, quer dizer, que abrange todas as differentes despezas que indicam um certo grau de opulencia e de goso de commodidades; mas para aquelles que consideram as questões economicas segundo as idéas modernas, ha na lei um ponto importante a que é preciso attender, e é o aluguer das casas comparado com o preço das subsistencias numa capital, cuja residencia é forçada para um grande numero de individuos. Qualquer aggravamento de imposto augmenta o preço dos alugueres das casas, e torna ainda mais penosa para as classes pobres a vida na capital. Nós fallamos muito em democracia, e dizemos que somos progressistas, mas não seguimos os preceitos da escola democratica e progressista, a que seu tenho a honra de pertencer. Não basta fazer elogios ás doutrinas democraticas, é preciso traduzir em factos essas doutrinas.

Eu desejaria ver pôr em pratica a iniciativa das capitães, applicada á construcção de bairros e casas propriamente para habitação de operarios pobres (apoiados). Não desejaria, nem quereria que o governo do estado, por um abuso de todos os principies de descentralisação fosse construir esses bairros e essas casas, mas desejaria que empregasse uma iniciativa fecunda e illustrada para promover a aggregação de capitães que por meio de sociedades constructoras acudissem a esta differença, que é grave, e para promover tambem a formação de sociedades cooperativas, que têem sido outro meio proveitoso, empregado lá fora em favor das classes operarias. Desejaria que o governo empregasse um estimulo para que estas sociedades se constituissem e se chegasse á solução do problema.

Acredite o sr. ministro das obras publicas que a sua pasta não se encerra só em obras publicas, tambem se estende ao commercio e industria, e se as obras publicas são um impulso e uma força vivificante sensatamente applicada para o desenvolvimento da riqueza, não esqueça o sr. ministro que a agricultura é mais vasta, mais importante, é aquella de que especialmente se alimenta o paiz, e que toda a protecção que se lhe der, fundada em prudentes e bem organisadas reformas, não póde deixar de produzir um grande augmento de riqueza.

Portanto, sr. presidente, se combinarmos todas estas cousas, se unirmos no nosso pensamento a acção deste aggravamento de imposto com a acção do imposto sobre a principal industria do paiz, havemos de ver que temos applicado uma prensa de impostos Sobre as fontes de riqueza mais productivas, emquanto que os homens que mais deviam contribuir para o estado escapam á acção do fisco. A igualdade na contribuição é a primeira base da justiça.

Portanto eu voto este imposto, mas voto-o como uma medida transitoria puramente annual, por ser profundamente defeituosa. Pelo systema que tenho concebido do imposto desejaria ver transformados todos elles em contribuição de rendimento não como o income tax mas como um imposto bem calculado, porque como por ora está vae ferir muitas outras fontes de receita, e se seguissemos o caminho que indico, acabariam estas desigualdades que resultam do modo por que ainda se cobra o imposto.

Diz-se que o que nós vamos ferir são as classes ricas; mas não é assim. O que nós vamos ferir são as classes pobres, pois que naquella parte do imposto que affecta as classes ricas, essa mesma parte pelo principio de repartição vem pesar sobre os pobres, porque os ricos podem fazer desapparecer todas as manifestações de riqueza, escapando-se assim ao fisco, e annullando uma parte da verba que se calcula, e que vem como já disse, recair sobre as classes pobres, que ficam sujeitas a pagar essa verba a par da carestia das subsistencias.

Emquanto á verba geral da contribuição que é dividida pelos differentes districtos, noto tambem que ha uma grande desigualdade, desigualdade que se vae aggravando cada vez mais. Portanto, resumindo, desejava saber para poder votar com mais satisfação, se o governo, porque necessariamente devia ter sido tratado em conselho de ministros, não só o que se refere ao expediente, para se cobrar o imposto, mas tambem com relação aos meios que conta empregar para o melhoramento das nossas finanças; desejava saber, digo, se o governo pensa em continuar a contribuição nos tres ramos, industrial, pessoal e predial, com o systema do augmento de addicionaes, systema contra o qual eu sempre me hei de pronunciar, pois que só serve, quanto a mim, para augmentar as dificuldades e fazer com que as injustiças sejam maiores, e só serve para favorecer aquelles que pelas influencias locaes, têem sabido eximir-se do pagamento da contribuição que lhes cabe. Desejava portanto saber, primeiro se este projecto é provisorio, ou permanente; e em segundo logar, desejava saber se a base para a contribuição é a mesma que tem sido adoptada pelos outros, e se esta base tem relação com o augmento dos 50 por cento, pois que, tendo-a, vae pesar sobre as classes pobres que são altamente feridas por este imposto.

(O orador não reviu os seus discursos.)

O sr. Presidente: - Peço licença para fazer uma observação. Sem querer entrar de modo algum na discussão porque não posso deixar este logar, devo fazer uma observação ou rectificação sobre uma observação que fez o sr. marquez de Vallada, e creio que foi depois repetida pelo sr. Rebello da Silva.

Eu não estava presente na occasião em que se deu para ordem do dia o projecto de lei que se acha hoje em discussão; quem estava presidindo era o sr. vice-presidente, e eu devo defender a s. exa., porque todos sabem a sabedoria com que dirige os trabalhos; mas s. exa., com a sua modéstia, não quiz fazer a observação que eu julgo dever fazer. O projecto de lei n.° 16 devia ser discutido antes do n.° 15, porem como a camara ainda não tinha conhecimento deste projecto n.° 16, e como não havia por essa occasião outros trabalhos, foi o que levou o nosso digno vice-presidente a dar o projecto n.° 15 para ordem do dia antes do n.° 16.

O sr. Marquez de Vallada: - Eu desejo apenas dizer duas palavras.

Não assisti á ultima sessão desta casa por estar um pouco incommodado, mas declaro que se estivesse presente, b primeiro acto que eu praticaria quando entrou em discussão o projecto para o augmento da contribuição seria pedir o seu adiamento; e procedendo assim parece-me que ia de accordo com a conveniencia de se não discutir este projecto de que nos occupamos depois daquelle que foi votado na ultima sessão.

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Como estou de pé aproveito a occasião para dizer a v. exa. que falta juntar a este projecto uma tabella, que necessariamente deve fazer parte delle.

Vozes: - Está no verso dor parecer.

O Orador: - Não é isto. E uma cousa muito differente.

Eu não sei bem se este projecto é igual ao que nos é apresentado todos os annos para a fixação das contribuições; se é o statu que nada tenho a dizer, e reservo-me para quando se apresentar alguma cousa de extraordinario sobre este assumpto...

Uma voz: - E igual ao que votámos o anno passado.

O Orador: - Nesse caso não direi mais uma palavra sobre este objecto. O que eu peço a v. exa. é que ordene me seja enviada a tabella que se refere a este projecto e a qual me não foi distribuida. E por esta occasião o que pedirei tambem., é que v. exa. de as suas ordens na secretaria para que com regularidade sejam enviados aos membros desta casa todos os pareceres e documentos imprecas que venham aqui; porque se tem dado o facto de muitos dignos pares não receberem cousa alguma. Ultimamente não tenho recebido um só parecer.

O sr. Presidente: - Eu devo dizer ao digno par que teem sido distribuidos pelos dignos pares todos os documentos que se mandam imprimir, e se s. exa. quizer ter o incommodo de mandar buscar o parecer a que se refere, ha de lhe ser enviado conjunctamenta com a respectiva tabella a que o digno par allude, e que se acha na mão de todos os membros da camara, porque não se tiraram duas edições diversas.

O sr. Marquez de Vallada:- Eu, felizmente, ainda ouço e vejo muito bem, e é por isso que reconheço que não é esta a tabella que eu pretendo examinar. A tabella u que me refiro é a que diz respeito a uma nova proposta do sr. ministro da fazenda; mas como essa proposta não se discute, quando ella vier aqui então hei de acrescentar mais alguma cousa.

O sr. Presidente:- Permitta-me o digno par que lhe diga, não sei a que hei de attribuir a falta que tem havido da parte da secretaria em não mandar distribuir tambem a v. exa. os pareceres que ultimamente teem sido impressos; mas eu vou estabelecer um inquerito para descobrir as rasões que teem dado logar a esta omissão.

O sr. Marquez de Vallada:- Estimo bastante que v. exa. assim proceda. porque eu gosto muito das commissões de inquerito; e desejarei bastante que venha a descobrir-se quaes são os empregados culpados desta falta.

O sr. Presidente:- Mas é preciso que o digne par faça igualmente em sua casa um inquerito rigoroso.

O sr. Marquez de Vallada: - Quando eu affirmo uma cousa costumo tomar a responsabilidade do que digo, porque affirmo uma verdade, e estou prompto a prova-lo, seja onde for.

O sr. Conde d'Avila:- Parece-me que ha equivoco a respeito do pedido do digno par, o sr. marquez de Vallada. A tabella a que se refere s. exa. não é a que acompanha este parecer de que nos occupamos, mas sim uma outra que não veiu da outra camara, e que diz respeito ao imposto progressivo que se deve pagar pelos creados. Por exemplo, quem tem um creado, paga l$000 réis; quem tem dois, paga 1$0OO réis; quem tem tres, paga 3$000 réis; quem tem quatro, paga 10;000 réis; quem tem cinco, paga reis 45$000; e assim por diante 9$OOO réis cada creado. Imagino que é a esta tabella a que o sr. marquez do Vallada se referiu; por consequencia tem rasão a mesa, e tem tambem rasão o digno par. Mas se essa tabella não veiu da outra casa do parlamento, como julgo que não veiu, porque a não VI na commissão de fazenda, é evidente que fica vigorando a antiga, isto é, a que se acha junta á ultima lei, porque a não ser assim, era indispensavel que este projecto trouxesse annexa a tabella a que se referiu o digno par. Não pôde, repito, restar duvida alguma de que a tabella que fica vigorando é, como disse, a tabella antiga.

O sr. Ministro das Obras Publicas: - Sr. presidente, esto, contribuição não é nova, é até bem conhecida, e o governo não fez mais do que pedir auctorisação para que ella continuasse. Assenta exactamente sobre as mesmas bases em que assentava, e foram adoptados os mesmos principios que tinham sido adoptados pelos governos anteriores. Não ha aqui alteração nenhuma, e não só a não ha, mas até esta contribuição já foi approvada pela camara na sessão anterior, votando o augmento dos 50 por cento.

Perguntou o sr. Rebello da Silva tambem se o governo entendia que isto era uma lei permanente, ou se a reputava transitoria; o governo já declarou na outra casa do parlamento, e creio tambem que nesta camara, que esta medida é transitoria, e que se o actual gabinete continuar a conservar-se á frente dos negocios publicos, apresentará para o anno as propostas de lei que forem convenientes para regular todo o systema de contribuição.

É isto o que tenho a declarar, como os meus collegas já o têem feito nesta e na outra casa do parlamento.

O sr. Conde de Castro: - Sr. presidente, pedi a palavra para agradecer a v. exa. as expressões de favor com que se dignou explicar a rasão por que eu tinha dado para a discussão os projectos de lei pela ordem por que os dei. Eu dei os projectos para a discussão ao passo que os iam apresentando as respectivas commissões, e seguindo a ordem chronologica. Era esta a explicação que eu tinha a dar, agradecendo, como disse a v. exa., o modo como justificou a minha maneira de proceder.

O sr. Conde d'Avila: - Eu desejo completar a explicação que acaba de ser dada pelo sr. conde de Castro. A medida que os projectos vinham da outra casa do parlamento, como todos eram urgentes, a commissão ia dando sobre elles o seu parecer. Aconteceu que veiu primeiro o projecto para o augmento da contribuição, e por isso foi apresentado antes deste que se discute.

E a prova é que tenho aqui presentes os dois pareceres, um sobre o augmento da contribuição pessoal, que tem o n.° l5, o outro sobre a contribuição pessoal, que tem o n.° 16. Por consequencia á commissão de fazenda foi primeiro o projecto n.° 15 sobre que deu parecer, e muito depois é que foi o n.° 16, sobre o qual deu tambem o seu parecer. Nós fazemos isto: no dia em que se recebem na commissão de fazenda os projectos que vem da outra casa do parlamento, procuramos logo dar parecer sobre elles. Hoje foram presentes á commissão dois projectos, e foram logo elaborados os pareceres sobre elles. Portanto não cause estranheza aos dignos pares o ter sido apresentado primeiro o parecer sobre o augmento da contribuição pessoal, e depois o parecer sobre a contribuição pessoal ordinaria, porque a causa disto foi vir da outra casa do parlamento, primeiro o projecto sobre o augmento da contribuição pessoal, e depois este que se discute.

Quanto á outra questão, vaie a pena de se examinar, porque na commissão de fazenda não se apresentaram se não as propostas sem a nova tabella que regula o imposto de vehiculos, cavalgaduras e creados.

O Sr. Braamcamp:- Não ha nova tabella.

O Orador:- Bem. Nesse caso a que vigora é a tabella anterior, e a este respeito não ha nada a dizer.

O digno par o sr. marquez de Vallada o que desejava era que se alterasse a tabella da contribuição pessoal, e a verdade é que na proposta da contribuição pessoal, apresentada na outra camara, havia alterações com relação ao imposto de vehiculos, cavalgaduras e creados; mas essas alterações não vieram, porque não foram aceitas, e nós não temos nada com isso; não temos senão a examinar o projecto que veiu da outra casa, e que assenta numa base conhecida, porque é a em que tem assentado os projectos sobre estas contribuições que teem sido apresentadas pelos governos anteriores.

(O orador não reviu as suas notas.)

O sr. Visconde de Fonte Arcada: - Sr. presidente, eu

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no principio da sessão disse á camara que desejava a presença do srs. ministros do reino e da fazenda, para que elles me respondessem ao que eu tinha a dizer. Vejo presente o sr. ministro do reino, e por consequencia vou repetir o que eu disse para que s. exa. me responda.

Eu declarei que quando se tratasse de lançar impostos era necessario que o governo tivesse toda a attenção em evitar que o paiz pagasse qualquer importancia que não devesse pagar, e muito principalmente quando essa importancia não fosse entrar no thesouro, e referi me á tabella de 30 de junho de 1864, pela qual se contam as custas do processo para os pagamentos das contribuições que não se pagarem em tempo competente. Os resultados desta tabella são muito diversos para o povo. Um contribuinte que deva 40 réis, por exemplo, como já disse da outra vez, vê-se obrigado a pagar muitas vezes por custas 2$000 ou 3$000 réis.

Ora, isto é que é preciso que o governo evite, e que faça com que os povos não sejam vexados. Alem disso disse eu mais, que sendo obrigada a propriedade a registar todas as servidões, dentro em pouco tempo essa obrigação era impossivel que fosse cumprida não só no tempo em que se exige, mas até em muitos annos. Alem de que ha a ponderar que para mostrar a maior parte das servidões não ha documentos para as poder provar, e só o poderá ser judicialmente, o que "augmenta a despeza extraordinariamente. O Minho, a Beira, a ilha da Madeira vão fazer grandes despezas em consequencia da lei sobre registo das servidões, alem de que não sendo registadas as propriedades no tempo competente, depois os direitos sujeitos a registo não podem ser invocados em relação a terceiro.

É necessario pois que o governo tome isto em muita consideração, porque é certo que grande parte da propriedade em Portugal, como todos sabem, está extremamente dividida, especialmente no Minho, Beira e ilha da Madeira, etc., e então é um grande encargo ter de se verificar por justificações judiciaes as servidões de cada propriedade.

Eu desejava que o sr. ministro tivesse a bondade de me dizer se me póde dar ao menos uma esperança de que o governo ha de tomar este negocio em consideração, porque elle é realmente da maior importancia, e até mesmo porque pelo augmento dos impostos a propriedade vae ficar extremamente carregada. Estou convencido que será impossivel levar a effeito esta medida ainda mesmo que se prorrogue o praso para o registo, porque se vae fazer grande despeza para justificar o direito ás servidões de que não ha documentos, e não os ha da maior parte dellas.

Era sobre este ponto que eu queria que os srs. ministros me dissessem alguma cousa.

O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, eu pergunto ao sr. ministro das obras publicas, se s. exa. na ausencia do seu collega da fazenda, me poderia responder a algumas considerações que eu queria fazer. Tambem desejo apresentar algumas substituições ou emendas ao projecto em discussão, é por isso que primeiro pretendia saber se s. exa. se acharia habilitado a entrar nesta discussão.

Quando, pedi a palavra, não foi para fazer opposição ao governo, sobre um objecto desta ordem, mas para apresentar emendas que julgo de tal forma vantajosas com relação ao paiz, que todo e qualquer governo quererá aceitar estas bases, que de modo algum prejudicam a votação que já houve sobre o augmento dos 5 por cento lançados sobre a contribuição pessoal, a qual todavia póde ser modificada pelo parlamento.

Esta contribuição, recaindo toda sobre taxas progressivas do rendimento collectavel, nem ellas, nem a percentagem da renda das casas são sufficientes, e trazem muitas vezes flagrantes desigualdades; e tanto assim é, que em muitos districtos, em logar de se lançar a contribuição sobre a materia collectavel, lança-a sobre a cifra da população. Ora, como isto traz grandes desigualdades, ò que o governo devia fazer era fixar ás taxas, e fazer com que ellas nunca fossem progressivas, porque, sendo-o, os ricos reduzem sempre as despezas sumptuarias, e note v. exa. e a camara que essa reducção vae sobrecarregar outros elementos.

Sr. presidente, isto não tem nada de politico, é simplesmente uma questão de forma. Eu quizera que se desse antes a progressão decrescente.

Não tenho bem presente a tabeliã, mas um creado paga um tanto, dois creados paga já mais, etc. Isto pela tabella antiga, porque moderna não ha nenhuma a não ser em projecto.

E relativamente a cavallos e vehiculos, apesar de serem objectos puramente de luxo, são comtudo cousas que teem grande influencia sobre a industria; mas eu não quero agora fazer uma prelecção, que podia levar muitos dias; o que eu quero é mostrar como é erróneo lançar-se a contribuição tomando por base à cifra da população. A lei manda lançar uma percentagem sobre as rendas das casas, e alem disso um tanto sobre cavallos e creados; mas em logar de se lançar contribuição sobre estas bases, lança-se em alguns concelhos sobre a população!

Sr. presidente, era sobre este ponto que eu desejava apresentar algumas emendas, e como não está presente o ministro competente, parecia-me mais conveniente que, por parte do governo, se declarasse-se elle estava ou não disposto a fazer algumas alterações no sentido que indiquei. Desde o momento em que o governo declarasse que não tinha duvida em fazer taes alterações, que julgo de grande interesse para o thesouro e para o contribuinte, eu não insistiria e dar-me-ia por satisfeito; porque aqui não ha questão politica, ha simplesmente uma questão economica, uma questão de principios, uma questão que interessa ao paiz e ao governo, porque não se trata senão de facilitar o pagamento da contribuição, não coagindo os individuos a privarem-se de commodidades que têem direito a gosar.

Agora, se o governo declarar que não aceita as alterações a que me tenho referido, é necessario que o sr. ministro da fazenda venha aqui declarar as rasões que teve para conservar estas tabellas contrarias a todos os principios economicos.

Desejo que os srs. ministros me deem algumas explicações a este respeito.

(O orador não viu os seus discursos.)

O sr. Ministro do Reino (Bispo de Vizeu): - Sr. presi: dente, pedi a palavra para responder ao digno par o sr. visconde de Fonte Arcada, que, se não me engano, desejou ouvir me sobre dois pontos. O primeiro é em relação ás custas avultadas que pagam muitas vezes os contribuintes, por terem deixado de pagar uma pequena contribuição, chegando essas custas a elevar ás vezes uma diminuta somma de contribuição a dez vezes mais da sua importancia.

Nesta parte creio que o digno par fará a justiça ao governo, não só a este, como a todos que o precederam, de acreditar que não podia ter tido nunca em vista affligir e vexar os contribuintes. Quando estes não pagam, ou porque não podem, ou porque não querem, lá estão as leis que providenciam a este respeito, a fim de que o thesouro possa haver o que lhe é devido. Portanto o governo não: póde fazer mais nada que procurar tornar as contribuições o menos pesadas que seja possivel.

O sr. Visconde, de Fonte Arcada: - Referi-me á tabella de 30 de junho de 1864.

O Orador:- Creio que o digno par ha de concordar em que o governo não póde deixar de querer chegar aos mesmos resultados que s. exa. tem em vista. Demais, aqui não ha nada novo. Esta tabella é a mesma que se votou o anno passado.

O digno par o sr. Vaz Preto apresentou varias considerações sobre o tributo sumptuario, e sobre a conveniencia de. alterar a tabella de um modo progressivo sim, más contrario ao que está estabelecido nesta tabeliã. Isto é um ás-

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sumpto de doutrina mais ou menos contestavel, que o digno par ha de concordar não ser agora occasião de discutir. O governo não fez mais, apresentando esta tabeliã, que repetir o que se tinha feito nos annos passados. Quando for occasião não terá duvida em fazer nesta parte as modificações que o interesse publico reclama.

Involuntariamente deixei de responder ao segundo ponto sobre que o digno par o sr. visconde de Fonte Arcada me pediu explicações. Fa-lo-hei agora. Esse ponto referia-se ao registo obrigatorio das servidões, e a ser muito pesada a obrigação da justificação, quando não ha titulos da propriedade dessas servidões, etc. Allegou s. exa. rasões que me parecem justas, porquanto as servidões são uma especie de annexos ás propriedades, e lhes dão valor.

Por isso o governo deve tratar de facilitar quanto seja possivel esses registos. Na outra casa do parlamento ha já dois projectos sobre servidões, um tornando-as facultativas e alterando assim inteiramente a lei actual, e outro prorrogando por mais tres annos o praso marcado para o registo. Alem disto, o governo já mostrou os seus bons desejos, prorrogando, por um acto de dictadura, o praso do registo por mais um anno, que finda em março futuro; e quando este assumpto vier para esta camara, o digno par poderá aprecia-lo convenientemente.

(O orador não reviu o seu discurso.)

O sr. Rebello da Silva: - Sr. presidente, pedi a palavra sobre a ordem para dirigir uma pergunta aos srs. ministros, que não é estranha á materia que estamos tratando.

Eu disse aqui numa discussão importante que votava ao governo os meios extraordinarios, mas por um anno somente; e fiz esta declaração em virtude de outra que tinha pedido ao sr. presidente do conselho, e que s. exa. teve a bondade de fazer nos termos mais categoricos e explicitos, dizendo que o governo não encerraria nem adiaria a actual sessão legislativa emquanto as propostas tributarias e o orçamento não fossem discutidas, porque isto era o que o governo tinha promettido ao paiz para organisar a fazenda publica. Não acredito portanto que o governo meditasse hoje adiar as côrtes ou pedir uma nova auctorisação para cobrar a receita e applica-la ás despezas publicas, porque as declarações desta ordem não se desmentem horas ou dias depois; e neste ponto não pedirei explicações sobre os boatos que correm, porque estou certo que a palavra honrada do sr. presidente do conselho é sufficiente garantia. Mas a pergunta que quero fazer é a seguinte: consta que está roto o contrato Goschen por parte do governo portuguez, e que o concessionario fizera um protesto perante o stock exchange, e portanto pergunto se isto é assim, e se o governo tem de pagar a multa de 258:000$000 réis.

O sr. Ministro das Obras Publicas:- Eu não tenho conhecimento algum do facto a que o digno par se refere, e creio que o sr. ministro da fazenda tambem o não terá, porque estive hontem com s. exa., conversámos sobre differentes assumptos, e elle não me communicou cousa alguma a similhantes respeito; por consequencia se esse facto se deu, e se s. exa. tem conhecimento delle, foi de certo depois de ter estado commigo.

O Orador: - V. exa. não teve conhecimento deste facto até hoje?

O sr. Ministro das Obras Publicas: - Eu não tenho noticia alguma do facto a que v. exa. se refere, e creio que o sr. ministro da fazenda a não teve igualmente, pela rasão que já dei.

O Orador: - Nesse caso devemos suppor que o governo mantem o contrato Goschen?

O sr. Ministro das Obras Publicas: - Eu digo só o que sei.

O Orador:- A camara ouviu a resposta do nobre ministro. Agora, emquanto ao adiamento das côrtes não pergunto, nada porque a declaração que fez aqui o sr. presidente do conselho significa que não ha de ter logar.

O sr. Presidente: - Não posso deixar continuar esta discussão sem consultar a camara se quer que continue a interpellação que acabou de fazer o sr. Rebello da Silva.

Consultada a camara resolveu negativamente.

O sr. Presidente: - Não está approvado, e tem a palavra o sr. Silva Ferrão sobre a ordem.

O sr. Ferrão: - Sobre a ordem nada tenho agora que dizer depois da resposta que o sr. ministro deu á pergunta feita pelo digno par, o sr. Rebello da Silva.

Emquanto á materia, sobre a qual tambem já tinha pedido a palavra, direi, sr. presidente, que o projecto em discussão não é mais do que a reproducção dos projectos que teem sido apresentados ás côrtes em cumprimento de dois artigos da carta constitucional da monarchia. Não se trata neste momento de alterar eu modificar a base do imposto, mas simplesmente de repartir a contribuição directa pessoal, e para isso foi apresentado o mappa dessa repartição. Portanto continua, como diz a carta constitucional, o imposto directo pessoal que é estabelecido annualmente emquanto não for alterado. Nós não temos presente proposta alguma de alteração, nem modificação deste imposto que tenhamos de votar, o nosso dever limita-se á satisfação de um preceito constitucional, que é repartir o imposto para que continue a pagar-se emquanto não for alterado.

Ora, para alterar qualquer proposta o digno par sabe que é necessario que se apresente na outra camara a competente proposta, mas lá não foi apresentada proposta nenhuma neste sentido, e por consequencia não se trata agora senão da lei da repartição do imposto pessoal. Podia portanto muito bem votar-se o accessorio, que foi augmentar com 50 por cento a contribuição pessoal.

Se acaso os dignos pares, que fizeram observações, querem saber a minha opinião, eu tambem entendo que esta base é falsa a muitos respeitos, e que é negativa a receita para o thesouro, e que, como lei sumptuaria ou de economia e commodidades, é inconveniente, porque ha de obrigar os contribuintes a fazerem grandes economias, a pôr-se a pé e despedir os creados que poderem (apoiados); hão de supprimir os cavallos e apear as carruagens, e de muitos sei eu que estão resolvidos a faze-lo (O sr. Vaz Preto: - É verdade.), e então o imposto da contribuição pessoal ha de recair sobre os pobres, porque os ricos livram-se do imposto da percentagem, e do augmento da contribuição pelas economias para diminuir as suas despezas. Isto como lei sumptuaria e de commodidade. Mas nós não tratámos disto; e portanto o imposto ha de repartir se por esta lei, alem de mais uma certa quantia para as percentagens, que ha de ser por força aquella quantia que votámos, mas a maior parte della ha de recair sobre os pobres, como já disse.

Mas, com relação ao imposto predial, como existe o pensamento da contribuição de repartição, ha de ser distribuido na conformidade da lei que está em vigor.

O que é constitucional é repartir a contribuição directa; mas o orçamento da receita faz-se com a despeza. O que o auctor da carta quiz dizer foi que a camara repartisse annualmente o déficit; não quiz dizer que o systema de repartição é inconstitucional. E se nós seguirmos a respeito da contribuição do registo o imposto ad valorem, está claro que o contribuinte, a respeito dos impostos de transmissão onerosos, ha de simular a venda pelo preço que o governo taxa.

O governo disse, com este decreto de dictadura, que não consentia que se pagasse uma contribuição de transmissão onerosa, por menos do que constar da matriz predial. Confundiu assim logo o valor venal com o valor resultante da multiplicação do rendimento annual, que póde ser o valor de vinte ou trinta annos da propriedade. Mas a propriedade póde não valer isso no fim dos vinte ou trinta annos. Uma morada de casas póde nos primeiros annos dar um certo rendimento, e ter um valor correspondente a esse rendimento, mas depois chegar a não valer as despezas da demolição; e quem for calcular pelo

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rendimento acha um outro valor. Por consequencia vê-se que não está em proporção o valor real com o rendimento annual. E como as matrizes estão muito defeituosas, o fisco ha de muitas vezes ficar defraudado.

A respeito do imposto pessoal ha de acontecer o mesmo. Cada um ha de resistir ás violencias por meios indirectos; e está no seu direito. Cada contribuinte póde ter um creado em logar de dois, ou não ter nenhum; póde deixar de ter carruagem, cavallos, pagar uma casa mais barata, etc., e a pobre propriedade rustica e urbana é a mais infeliz de todas, porque essa não se esconde, vê se bem, e soffre todos estes gravames.

O que eu digo é que o thesouro ha de ter muito melhor receita, mais até do que os 50 por cento, se acaso se mudar a base do imposto, se se destruirem as desigualdades, e se se seguir o exemplo dos nossos maiores durante a guerra de Hespanha, isto é, se se estabelecer a decima, e organisar convenientemente as matrizes, o que nunca se tem feito, principalmente nas terras em que o escrivão de fazenda, entidade desgraçadissima que veiu a este paiz, hoje substituida pelos delegados do thesouro, que são a mesma cousa, trata, de accordo com os influentes das terras, de carregar a contribuição sobre os que estão fora, e de a diminuir, nos que residem nellas.

Que remedio isto tenha póde-se talvez indicar, mas é necessario que seja um remedio regular, que deve vir do governo; só por este meio é que eu sustento que poderia melhorar o estado do thesouro.

(O orador não reviu as suas notas.)

O sr. Presidente: - Tem a palavra sobre a materia o digno par, o sr. conde d'Avila.

O sr. Conde d'Avila: - Eu cedo da palavra.

O sr. Presidente:- Então quem se segue inscripto sobre a materia é o digno par, o sr. Ferrão.

O sr. Ferrão: - Perdoe v. exa., mas eu tendo depois pedido sobre a ordem, logo que consegui que me chegasse a palavra, declarei que fallava sobre a ordem e sobre a materia.

O sr. Presidente: - Resta então inscripto o digno par, o sr. Rebello da Silva.

O sr. Rebello da Silva: - Eu tambem cedo da palavra, e até creio que já não ha numero.

O sr. Vaz Preto:- Então lembro a v. exa. que eu tambem tinha pedido a palavra.

(Entraram alguns dignos pares.)

O sr. Presidente: - Ha numero, e tem a palavra o sr. Vaz Preto.

O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, se o projecto é importante, ainda mais importante se torna pelas circumstancias que o acompanham, e pelas declarações differentes que saem do banco dos ministros, sendo a mais notavel aquella que a camara acabou de ouvir ao sr. ministro do reino, negando que seja opportuno fazer agora aqui qualquer modificação.

Oh! sr. presidente, que systema é este de governo! Trata-se de um objecto dos mais importantes, e não está presente o ministro da repartição competente, dirige se a palavra aos seus collegas, e uns dizem que não sabem se estão habilitados para responder ao que se possa dizer ou propor, emquanto que um outro levanta se e diz "aqui não ha que alterar ou modificar, porque a occasião não é opportuna! Que quer dizer tudo isto? Quer dizer que não ha systema; e eu declaro que me custa bem ter de fazer estas reflexões, muito mais excitando-me ellas necessariamente um calor de que reconheço devo pedir desculpa á camara; mas ella não estranha menos do que eu aquillo que está vendo, e que realmente o effeito que póde produzir é o da descrença no systema representativo, e ainda mais no systema de administração.

Pois que quer isto dizer? Então reconhece-se que as convem aqui defeituosas, e argumenta-se sempre com a necessidade de deixar passar tudo sem alterações, ou porque depois se ha de fazer cousa melhor, ou porque o tempo urge, e não convem demorar os projectos! Pois que urgencia é a deste projecto, e qual é o outro negocio preparado para entrar em discussão? Não se demonstra nem se indica.

Como se quer então deixar de convir em que se veja se apparece alguma cousa de vexatorio ou por qualquer forma injusto, que todavia se possa desde já remediar ou prevenir o remedio? E se se demonstrar que ha alguma cousa que não é conforme com a base da contribuição, e que o imposto deve aqui ou ali, por esta ou aquella maneira, ser suavisado? Não sabemos todos que apparecem sempre com muita frequencia as injustiças relativas, que em geral os impostos são mal distribuidos, notando-se nisso cousas revoltantes! Quem é que não reconhece tudo isto? E então um governo que se diz reformador, que quer economias (posto que muito incompletas), que procura por todo o modo meios para poder governar, como é que descura certas cousas essenciaes, deixando sobretudo de apresentar uma reforma bem combinada sobre a organisação do serviço publico, limitando se a fazer economias que não teem alcance algum para o thesouro, por isso mesmo que de mais a mais só servem para entrar nas algibeiras dos capitalistas estrangeiros?! E eis nos aqui soffrendo que se façam contratos ruinosos, vergonhosos, com encargos pesadissimos, e até com multas!

O que eu lastimo, sr. presidente, é que as cousas não caminhem regularmente no meu paiz, como vejo que costumam caminhar em outros paizes civilisados; que se attenda a que um ministro da fazenda deve ser um homem que tenha verdadeiramente um pensamento financeiro, sobre que elle só seja aquelle que responda, visto que em certos pontos não é proprio mesmo que os seus collegas respondam. Assim, agora neste momento, nós todos ouvimos dizer sobre o emprestimo, que elle está feito, e outros que ainda não está nada resolvido definitivamente; que se está tratando com outras casas bancarias, etc.

Sr. presidente, quando as cousas correm deste modo, quando de dia para dia se aggrava a nossa situação financeira, e quando finalmente não sabemos qual será a opinião do sr. ministro da fazenda, entendo que o mais conveniente neste momento seria adiar esta questão, até que s. exa. estivesse presente, pois é necessario sabermos se o sr. ministro aceitará quaesquer emendas ou alterações que por ventura possam ser apresentadas, assim como necessario é tambem que s. exa. declare quaes os termos em que toma a questão, para que tratemos este negocio como deve ser tratado, e não de um modo menos regular e conveniente. Pedia portanto a v. exa. que houvesse de consultar a camara sobre se quer que esta questão seja adiada até estar presente o sr. ministro. E faço este pedido não só pelas considerações que acabo de expor, como porque, e note v. exa. isto, este negocio tem relação com um projecto de lei que o sr. ministro já apresentou e fez publicar no Diario do governo. Logo torna-se ainda mais necessaria a presença de s. exa., a fim de evitarmos que hoje votemos uma cousa que vae de encontro a outra que se pretenda amanhã votar. Por todas estas rasões, repito, peço a v. exa. que consulte a camara sobre o meu pedido.

O sr. Presidente:- Queira mandar a sua resposta por escripto para a mesa.

O sr. Visconde de Benagazil:- O peior foi ter-se votado o outro projecto antes deste.

- Q Sr. Vaz Preto:- Peço perdão, mas a votação do outro projecto não prejudica este. Emquanto a este projecto o governo ha de receber a verba que nelle vem fixada, quer se façam modificações e alterações no projecto, quer não, porque essas modificações são muito simples e tendem só a que a arrecadação do imposto seja feita por uma forma melhor e mais conveniente do que aquella estabelecida neste projecto.

Portanto q governo não perde nada, recebe a mesma

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verba, com a differença porem de que essa verba póde-se cobrar com mais facilidade, regularidade e de uma maneira muito mais conveniente. É esta a rasão por que tenho insistido no adiamento.

Vejo, sr. presidente, que o governo nada diz a este respeito, o governo não quer responder, mas eu salvo a minha responsabilidade.

É necessario que o governo declare, porque consta e dizem por ahi que o governo pretende adiar as camarás, e adiando-se as camaras não se póde tratar das cousas publicas com a circumspecção que ellas pedem; é necessario pois que o governo declare se pretende adiar o parlamento sem se discutir o orçamento e as outras medidas de fazenda. E certo que o sr. presidente do conselho já aqui declarou ha dias que não era essa a intenção do governo, e para mim, que respeito muito s. exa. e a sua palavra, tenho-a por um penhor seguro; comtudo, como hoje vejo presente o ministerio, desejaria que algum dos srs. ministros me dissesse se é esta ainda a idéa do gabinete.

O sr. Ministro do Reino: - O governo não tem de responder a boatos que se levantem sem fundamento. O sr. presidente do conselho já aqui declarou que o governo não adiava as camaras sem primeiro se terem votado as medidas mais necessarias para a organisação da fazenda.

Fez já esta declaração o governo pela boca do sr. presidente do conselho, e por isso não vejo necessidade alguma em se estar todos os dias a repetir as mesmas perguntas, para terem, de obter as mesmas respostas.

É unicamente o que tenho a dizer ao digno par.

O sr. Marquez de Vallada: - Sr. presidente, quando um governo toma conta do poder em circumstancias extraordinarias, como aconteceu ao governo actual, quando um governo toma o pesado encargo de resolver questões de alta magnitude e subido interesse economico e social, é por que se considera com força para o fazer, e então todos os homens que estudam as cousas publicas devem esperar que os males sejam remediados, e que os erros anteriores sejam removidos. Não aconteceu porem assim com o actual governo, porque subindo elle ao poder com o fim de resolver a importantissima questão de fazenda, tendo o apoio, segundo se dizia, não só do parlamento e da propria opposição, mas até outro alto apoio, ainda todavia não resolveu essa questão.

E note a camara uma cousa e é, que quando se aponta para o seu procedimento, levanta-se uma voz nos bancos ministeriaes e diz: "Não é agora a occasião propria para estarmos a discutir principios e doutrinas; o que é preciso é resolver as questões importantes que tanto interessam ao paiz". Mas eu não vejo resolver nenhuma dessas questões. A questão financeira está no mesmo estado, e era essa que os srs. ministros deviam resolver, mas deviam começar pela base, como muito bem disse o digno par o sr. Vaz Preto, reformando as matrizes, porque essa reforma seria tambem a reforma do cadastro. Eu conheço perfeitamente a importancia dessa questão; sei como ella amedronta sempre os politicos que a querem resolver: já Lebrun, quando em França se tratou desta questão, dizia que ella só podia resolver-se com grandes dificuldades. Mas o governo tem promettido resolver tudo, e a final nada tem feito, a não ser enganar o povo. E a Providencia permittiu que os srs. ministros continuassem no poder, talvez para que os seus actos trouxessem o desengano aos que nelles tinham alguma confiança, e para que se realisassem as previsões dos que nelles não confiavam.

O que tem feito o governo? O que é feito dessas medidas importantes com que promettia dotar o paiz? Eu vejo que elle apenas se tem limitado a apresentar um ou outro projecto para augmentar os impostos, e mais nada; acrescentando sempre que esse augmento de imposto só vae sobrecarregar os ricos, porque o governo é amigo dos pobres! Sempre ratoeiras armadas ao povo! Sempre o povo a servir de degrau! Mas o povo vae-se desenganando; vae reconhecendo os logros em que tem caído, e já viu que 03 governos não querem salva-lo, mas só tratam dos seus proprios interesses, das suas honras e dignidades.

Talvez se diga que os contribuintes podem estabelecer barreiras para defenderem o seu lar, podem construir um baluarte e assestar artilheria, mas que depois o exercito lhes tornará inutil a defeza. O exercito tem interesses iguaes aos do povo. Aqui não ha interesses individuaes, e quando se queira aceitar o principio de que existem, direi que neste caso os interesses de cada um em particular, são os interesses de todos em geral. Temos tanto direito a defender as nossas casas e a nossa justiça, como teem os bispos a defender os seus passaes. Se nos querem lançar em rosto que é o interesse que nos anima, essa bala fere de recochete.

Sr. presidente, se se trata do interesse gerai, se se quer o bem do povo, falle-se a linguagem da verdade, não se lance poeira aos olhos dizendo se que esta contribuição só vae affectar os ricos. Não discutirei agora se ella é anti-economica ou anti-politica, comtudo não posso deixar passar sem reparo certas insinuações. Um homem abastado, que tenha um grande numero de domésticos, presta um serviço ao paiz, porque essas pessoas que emprega deixam de vaguear sem terem em que ganhar a vida, e sendo causas de perturbação moral, quando o não sejam de material.

Quando se discutirem os impostos que propõe o sr. conde de Samodães, quando s. exa. os apresentar aqui, ou o cavalheiro que lhe succeder, se porventura tomar a responsabilidade delles, entrarei detidamente na doutrina; e eu, que a tenho estudado, conto provar até á evidencia quanto elles ferem e aggravam o paiz, e o modo por que o povo fica sobrecarregado com essa rede de contribuições que se pretende lançar-lhe. Veremos se o povo aceita esses impostos.

O povo, sr. presidente, aceita sempre os impostos quando são justos e razoáveis; mas não se deve cuidar só em lançar contribuições, como se pretende fazer; é necessario attender ás necessidades imperiosas do paiz. Este quer a reforma radical de todos os serviços, e não se contenta só com medidas ficticias para auctorisarem o augmento do imposto. Ainda me lembro, sr. presidente, das lamentações e das censuras que se faziam aqui no tempo do ministerio presidido pelo sr. Joaquim Antonio de Aguiar, quando se tratava da reforma da secretaria dos estrangeiros; mas o que vimos nós que fizessem os homens das censuras? Aonde estão as reformas?!...

Quasi sempre assim acontece. Sr. presidente, quando se tratar dessas propostas de fazenda, quando se apreciarem essas questões, então tratarei largamente do imposto indirecto, do imposto de renda, do income tax, etc., e emfim de todas essas questões que interessam ao publico, e que ha muitos annos teem sido o objecto de estudo dos homens mais eminentes; mas reservo-me para o fazer opportunamente.

Eu confesso, sr. presidente, que quando começou esta discussão, tambem partilhava dos mesmos receios do sr. Rebello da Silva, mas depois da resposta tão clara do sr. ministro do reino, esses receios desappareceram, e fiquei completamente socegado; mas peço que a declaração, que tão terminantemente fez o sr. ministro do reino, seja lançada na acta. Effectivamente não era possivel nem crivei que o governo, que nos chamou para o campo da discussão, a fim de nelle justificar os seus actos, viesse comprometter a coroa, apresentando uma proposta de adiamento, proposta que não significaria senão intuitos, que não direi inqualificaveis, mas que poderiam provar até onde póde chegar o desejo de abafar a discussão. Pois se os srs. ministros nos levaram para o campo da verdade, porque não havemos de dizer a verdade? Pois nós não sabemos que estão em completa desharmonia os membros da commissão de fazenda da camara electiva com o sr. conde de Samodães? Pois nós sabemos que se trata de convidar cavalheiros para

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4 tomarem conta da pasta da fazenda? Mas esses cavalheiros creio que não estão resolvidos a aceitar a missão de serem cyrinéus do sr. ministro da reino. Entretanto eu, que desde o primeiro dia declarei que era opposição ao governo, não me surprehenderia se o gabinete viesse agora,- para continuar no caminho das contradicções, propor o adiamento e fechar as côrtes, para depois governar á sua vontade. Que é feito dessas propostas, de todos esses planos salvadores que se nos prometteram? De tão pomposas promessas resta apenas o desengano, resta o contrato Goschen, que não sei se está morto ou vivo, e que eu combati com muita consolação, mas creio que combati um defunto? (Apoiados.)

Pois nós não sabemos até já o nome de outra casa bancaria com que se trata de contratar um emprestimo, não já de 18.000:000$000 réis mas de 13.500:000$000 réis? Tudo isto ha de apparecer, e quando nos quizerem fazer caiar, o espirito liberal está tão fortemente arraigado no povo portuguez que não ha nenhum déspota que se atreva a acabar com as nossas liberdades, e quando o houvesse e se atrevesse com o parlamento, ainda ficava a imprensa, e se acabasse com esta havia a imprensa clandestina, e depois, e por ultimo recurso, a revolução, que é a ultima rasão dos povos, como disse o celebre frade Lacordaire, que quando se fecham as portas da legalidade abrem-se as portas da revolução. É esta a doutrina de um frade, homem notavel, que deixou as riquezas para estabelecer em França a ordem de S. Domingos.

Esta doutrina, affirmada por este homem celebre, tem sido muitas vezes adoptada pelo povo, a quem assiste o direito da revolução quando já não tem para onde appellar; direito do qual muitas vezes se tem abusado, mas a rasão deste abuso não está nos povos e sim naquelles que os desejam seduzir, que não os conduzem pelo caminho da verdade, e que não dirigindo, a opinião publica como a devem dirigir, são como o descuidado nauta que no meio da tempestade abandona o leme. E dahi as gravissimas calamidades de que teem sido victimas os povos, e que tem inundado de sangue as nações. Visto que não se trata da questão em mais larga escala guardarei as minhas observações sobre o que o sr. ministro do reino disse, respondendo acerca de differentes pontos de doutrina economica, e reservar-me-hei para em occasião opportuna dar mais larga resposta a s. exa. Guardarei as declarações claras, terminantes e categoricas que acabam de ser feitas pelo sr. ministro do reino, esperando que os actuaes srs. ministros não fecharão as camaras, nem adiarão o parlamento.

Eu pedi que se lançasse na acta a declaração do sr. ministro do reino, que o governo não fechava o parlamento nem adiava as camaras sem previamente se ter discutido e votado o orçamento e as propostas sobre o imposto.

(O orador não reviu os seus discursos.)

O sr. Presidente: - Acha-se extincta a inscripção, vae votar-se o projecto na generalidade.

Leu se na mesa, e posto á votação foi approvado.

O sr. Rebello da Silva: - Peço a palavra sobre o artigo 1.°

O sr. Presidente: - Tem a palavra o sr. Rebello da Silva.

O sr. Rebello da Silva: - Diz o artigo 1.° o seguinte (leu).

Eu, sr. presidente, não posso separar este projecto de lei, nem a camara o póde fazer, do outro que já approvámos; perguntarei portanto ao governo se depois dos acontecimentos que ultimamente houve na ilha de S. Miguel, e do descontentamento manifesto que se apresenta nas outras ilhas, incluindo a Madeira; se o governo acha conveniente aggravar neste momento o imposto de repartição naquellas localidades, ou se será melhor reservar este aggravamento do imposto para mais tarde. Elles dizem que estão promptos a satisfazer a sua parte no sacrificio, mas a maneira como a contribuição directa se acha repartida é que lhes repugna, porque a acham excessivamente pesada. Desejava pois que o governo declarasse se convem em que será com effeito mais prudente para evitar dificuldades e para attender ao que parece justo e rasoavel, que se estabeleça o meio de conseguir o mesmo fim, evitando qualquer vexame. Uma vez que se estabeleça a igualdade no sacrificio, parece de certo muito melhor que se attenda á conveniencia de cada um, segundo a especialidade das localidades. Espero ouvir as explicações por parte do governo.

O sr. Ministro do Reino: - Antes de tudo, sr. presidente, pedia eu a v. exa. e á camara que consentissem em que se prorrogasse a sessão, até se acabar a discussão e votar-se este projecto de lei.

Respondendo ao digno par o sr. Rebello de. Silva, direi que este projecto não é novo, e não aggrava cousa alguma porque é uma contribuição pessoal lançada sobre creados, cavalgaduras, carruagens, etc. O digno par sabe que não está na Índole deste governo, nem doutro qualquer o desejo de lançar a perturbação entre os povos, e as noticias que ultimamente se teem espalhado por ahi das ilhas, não são verdadeiras, as officiaes são que tem havido socego e que nem um discolo sequer se tem levantado, e que a alteração que houve não devia dar grande cuidado ao governo, porque não ha elementos nenhuns que auctorisem os receios que se manifestam.

O governo entende que isto é uma lei ordinaria em que se não altera o que estava, mas emquanto a outras medi? das extraordinarias de que haja que lançar mão, é certo que ha de attender ás reclamações dos povos; mas as reflexões do digno par nesta parte não tem logar porque não ha symptoma nenhum de revolta, pelo contrario todas as noticias das ilhas são, que ha completo socego.

Sr. presidente, finalisarei tornando a interceder com v. exa. e. a camara para que se prorrogue a sessão até á votação deste projecto.

Vozes:- Isso não póde ser.

O sr. Rebello da Silva: - O sr. ministro do reino tem visto que eu tenho facilitado ao governo cousas mais graves, e se insisto na discussão deste projecto, e em pedir explicações ao governo, é porque desejo ouvir o sr. ministro da fazenda (apoiados). Eu não comprehendo que se possa discutir e votar um imposto ou qualquer medida financeira, sem que esteja presente o sr. ministro da fazenda (apoiados). Ainda que se trata da contribuição ordinaria annual, não posso desliga Ia da que já se votou, quando se discutiu o augmento extraordinario da contribuição pessoal que eu votei; mas é mesmo por existir já esse augmento dos 50 por cento, que o governo deve procurar na base desse augmento minorar os soffrimentos dos contribuintes, porque nem por isso terá menos receita. Eu sei bem que esta não é uma questão facil, o sr. ministro do reino que tem grande pratica da provincia tambem o sabe; mas o que eu queria era que, sem se entrar agora numa reforma radical, se fizesse quanto possivel para minorar o rigor com que esta contribuição é lançada, e alliviaremos os povos de todas as cousas que offendem a justiça e de todos os gravames, não deixando por outro lado de zelar os interesses do estado.

Eu queria por consequencia que em quaesquer propostas de addicionaes se attendesse á baseada contribuição, e era o que se devia ter feito com o outro projecto de augmento de contribuição que o outro dia discutimos; porque, permitta a camara que lhe diga, que nós discutimos principiando pelos pés em vez de principiarmos pela cabeça (apoiados). Por isso é que eu desejo ouvir aqui o sr. conde de Samodães, mesmo porque parte destas cousas tem ainda remedio, e nós temos todo o direito de não discutirmos um projecto de fazenda sem a presença do respectivo ministro.

(Interrupção do sr. ministro do reino que não se ouviu.)

O Orador: - Ah! perdão, mas é que eu não voto, e não votam muitos dignos pares sem sermos esclarecidos sobre alguns pontos, e v. exa. ha de convir em que se eu qui-

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zesse promover dificuldades ao sr. ministro do reino não tinha mais do que perguntar-lhe cousas a que s. exa. me não soubesse responder, porque este objecto não é da sua competencia.

Portanto, se s. exa. tem tido a bondade de responder a alguns pontos, e se o sr. ministro das obras publicas tambem diz que está prompto a responder, ainda assim o sr. ministro da fazenda é que nos póde dizer mais alguma cousa; e em todo o caso a demora não seria grande, porque se hoje se não votasse, votava-se amanha.

O que nós queriamos era concordar no modo para não aggravarmos excessivamente a distribuição do imposto, e que os impostos sobre creados, etc., que representam commodos da vida, se não vão confundir com outras contribuições.

Numa palavra, eu não digo isto porque deseje crear embaraços ao governo.

(O sr. presidente conde de Lavradio entregou a presidencia ao sr. conde de Castro, e saiu da sala.)

O sr. Costa Lobo (sobre a ordem): - Sr. presidente, eu confesso sinceramente que julguei do meu dever descer da cadeira de secretario para dizer o que entendo sobre a maneira por que alguns dignos pares teem feito correr a discussão. Ainda que não fosse senão por dignidade desta camara, que já approvou um projecto augmentando esta mesma contribuição; ainda que não fosse senão por essa consideração, não se devia fechar a sessão sem se approvar este projecto de lei, que é a base de outro que já aqui se votou. O digno par, o sr. Ferrão, membro da commissão de fazenda, e em nome della já declarou, quando defendeu e sustentou com tanta proficiencia este projecto, que todas essas alterações que os dignos pares queriam, não podiam ser introduzidas no projecto por esta camara, porque não era isso da sua competencia, mas sim e exclusivamente da competencia da camara dos senhores deputados. Não vejo pois rasão alguma para que se adie a discussão, e se deixe de votar hoje o projecto. A verdade é, como todos comprehendem, que se quer levantar aqui uma questão politica, e eu entendo, como membro desta casa, que não devo annuir a que se levante uma tal questão sobre este ponto, que não póde admittir discussão, porque a camara, approvando o projecto que augmentou a contribuição pessoal, votou implicitamente este projecto, que é o fundamento daquelle. Seria inconstitucional ir esta camara fazer alterações numa tabella de impostos, porque isso, como já se disse, pertence á outra camara. Portanto voto pela prorogação da sessão até que se vote este projecto, e faço-o por dignidade desta camara, e não por outra cousa.

O sr. Rebello da Silva: - Sr. presidente, pedi a palavra para responder ao digno par que acaba de fallar; mas antes de usar della desejava saber se ha numero na casa.

O sr. Secretario (Marquez de Sabugosa): - Ha na casa dezeseis dignos pares.

O sr. Rebello da Silva: - Então não ha o numero legal.

O sr. Secretario (Marquez de Sabugosa):- Para abrir a sessão é que são precisos dezenove dignos pares; porem para a discussão continuar não é necessario o mesmo numero de dignos pares com que se abriu a sessão.

O sr. Rebello da Silva: - Se ha numero legal para a votação, peço que se proceda a esta sobre a proposta do sr. ministro do reino.

O sr. Presidente:- Para a votação ser valida, é preciso que hajam quinze votos conformes.

O sr. Rebello da Silva:- Requeiro que v. exa. consulte a camara se quer ou não prorrogar a sessão até se votar este projecto.

O sr. Presidente:- Desejo dar uma explicação regimental. A camara póde abrir-se estando presentes dezenove dignos pares, mas para uma votação ser valida são precisos quinze votos conformes. Ha na casa dezeseis dignos pares; portanto póde submetter-se á votação o requerimento para a prorogação da sessão, e vou sobre elle consultar a camara.

Consultada a camara, só votaram pelo requerimento quatorze dignos pares.

O sr. Secretario (Marquez de Sabugosa):- Ha quatorze dignos pares levantados.

O sr. Presidente: - Está fechada a sessão.

Eram cinco horas e um quarto.

Relação dos dignos pares que estiveram presentes na sessão
de 16 de julho de 1869

Os exmos srs.: Conde de Lavradio, de Castro; Marquezes, de Niza, de Sá da Bandeira, de Sabugosa, de Vallada; Condes, d'Avila, da Azinhaga, de Fornos, da Ponte; Bispo de Vizeu; Viscondes, de Benagazil, de Fonte Arcaria, de Condeixa; D. Antonio José de Mello, Costa Lobo, Ferraz Sacchety, Rebello de Carvalho, Pereira de Magalhães, Montufar Barreiros, Silva Ferrão, Braamcamp, Reis e Vasconcellos, Lourenço da Luz, Baldy, Rebello da Silva, Preto Giraldes, Menezes Pitta, Ferrer.

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