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346 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

gua que me acompanhava ao ver publicado um tal documento. (Apoiados.) Disse, pois, que detestava aquelle programma, mas não disse uma palavra contra os homens que o assignaram.

Sr. presidente, o programma que o nobre ministro veiu hontem aqui elogiar mais uma vez, o programma que faz a base da sua politica, que é a norma do seu proceder, e que deve ser a estrella que ha de guiar o governo ao caminho da governação publica, a frente da qual se acha actualmente, é uma das mais importantes rasões por que eu não posso dar o meu voto ao gabinete.

É uma questão de principios; é uma questão em que divergimos profundamente; é uma questão em que duas escolas politicas se acham em frente uma da outra, ácerca das reformas premeditadas, que têem de ser propostas e referendadas pelos mesmos homens que, fazendo hoje parte do governo e do parlamento, são ao mesmo tempo os principaes representantes d'esse partido.

O programma a que me refiro, baseado em doutrinas que tendem a subverter a actual ordem de cousas, e no qual se diz que é necessario investir com o rei, não podia ser menos do que detestado politicamente por mim, que sou fiel ao soberano de quem era ministro, e que por essa, e por outras rasões d'estado, era levado a protestar contra tão perigosas doutrinas. (Muitos apoiados.)

Sr. presidente, respeito todas as opiniões, por mais oppostas que ellas sejam ás minhas; respeito todos os homens que, fieis ás bandeiras dos partidos a que pertencem, as defendem valorosamente no seu campo; respeito os miguelistas e os republicanos convictos, mas entendo que aquelles que professam essas idéas não podem, nem devem, ir sentar-se nos conselhos da corôa. (Apoiados.)

Eu, sr. presidente, que sou sempre dos primeiros a testemunhar a minha consideração pelas convicções dos homens que defendem as diversas escolas politicas, porque admiro a firmeza de principios de cada um, não posso imaginar que hoje, no poder, elles vão pôr em pratica idéas contrarias ás que hontem advogavam. Por outro lado, não posso admittir que homens que se sentam n'aquellas cadeiras, deixem de ir para ali com a consciencia dos seus deveres, e compenetrados das obrigações que lhes impõe um poder que não conquistaram, e que receberam das mãos do augusto chefe do estado.

Não podia eu, portanto, acreditar que o partido da Granja viesse ao poder com o proposito de fazer vingar as aspirações do seu programma, aspirações que eu não quizera ver postas em pratica, porque trariam talvez á nossa patria commoções funestas. Sem renegar as suas idéas, julguei que tinham adiado a sua execução. Ao ver, porém, que se pretende destruir a auctoridade da camara, na propria occasião em que se lhe vem pedir o voto, não póde deixar de me occorrer, que se pretenderá todos os dias querer destruir alguma cousa mais.

Ora, sr. presidente, eu não posso negar ao governo o direito de empregar os meios legitimos para que prevaleçam as suas idéas sobre administração; mas usem d'elle sem ameaças, que aliás não intimidam ninguem; usem d'elle sem nos vir recordar um programma que tende a reformar tudo ao mesmo tempo, e cuja execução seria o transtorno de muitos serviços e a subversão das instituições politicas da monarchia.

Sr. presidente, quem quer reformar tudo não reforma nada, e levanta contra si tantas opiniões que se julgam affrontadas, e tantos interesses que se julgam feridos, que formam uma atmosphera de resistencia diante da qual ficam quasi sempre compromettidos os reformadores e as reformas.

Um dos homens mais distinctos d'esta epocha, que é um dos primeiros da Inglaterra, mr. Gladstone, viu compromettida a sua administração na opinião dos seus proprios admiradores, por ter pretendido reformar tudo ao mesmo tempo.

E se é licito a um homem publico fazer a critica dos seus proprios actos, permitta v. exa. que eu lhe diga que eu e os meus collegas commettemos em 1867 o mesmo erro quando pretendemos fazer muitas reformas simultaneas.

Ferimos interesses, e levantamos susceptibilidades; e maior que fosse o nosso amor de gloria, a de bem servir o paiz, unico estimulo que nos impellia, é forçoso confessar que creámos difficuldades que tornaram embaraçosa a nossa situação.

Sr. presidente, peço licença ao illustre ministro, cujo caracter respeito e cujo talento admiro, mas com cujas opiniões não concordo, para lhe dizer que não fui eu que vim fallar no programma, mas que, uma vez que s. exa. fallou n'elle, eu ouso recordar os auctorisado commentarios que o precedem.

Não vinha, nem venho, fallar no programma no momento de discussão de um projecto, que para mim tem pouca importancia, mas que para outros tem muita, a avaliar pelos largos discursos a que tem dado logar. Sinto, porém, que o sr. ministro n'aquella allusão formulasse uma ameaça a esta camara, que está constituida, segundo o systema que nos rege, que é filha da prerogativa real, é certo, mas que é independente, e não significa a representação de nenhum partido exclusivo. (Apoiados repetidos.)

E para que não fique duvida, nos espiritos mais desconfiados, permitta-me v. exa., sr. presidente, que eu leia os commentarios feitos a esse programma na parte que diz respeito a esta assembléa legislativa:

«A camara dos pares, nascida da prerogativa real, dirigida e aconselhada pelos ministros, ou da cega designação de hereditariedade, não representa nenhum elevado interesse nacional, nem póde ter, em principio, a independecia e a auctoridade necessarias para conter as demasias ou reprimir as funestas tendencias do governo.»

Sr. presidente, quando se escreve isto, quando alguns dos membros mais importantes d'este gabinete tem commentado por tal modo a parte do programma politico que diz respeito á camara dos pares; quando se diz que ella não tem auctoridade, nem independencia, embora ainda hontem a tenham acrescentado com vinte e seis dos seus melhores amigos, a allusão a esse documento constitue uma affronta; que não póde passar sem protesto. (Apoiados repetidos.)

Se foi para reforçar a auctoridade da camara que o governo metteu aqui vinte e seis pares, nada tenho que dizer, porque os respeito a todos, e nunca são de mais n'esta casa as capacidades e talentos, que em muitos reconheço. Se houve, porém, intenção de occorrer á falta de independencia, de que nos accusam, permitta me v. exa. que eu assegure ao nobre ministro que por mais elevados que sejam os caracteres d'aquelles cavalheiros, esta camara ficou tão independente como d'antes era. (Apoiados.}

Sr. presidente, estou fallando n'este assumpto de passagem, porque elle não faz objecto da discussão que nos occupa. O meu discurso devia ter por fim sómente fundamentar o meu voto. Mas a fallar a verdade, eu não podia deixar passar em silencio a ultima par e do discurso do nobre ministro da fazenda, que realmente foi sobre posse, permitta-me que o diga, porque a provocação veiu do seu lado, e o que se discutia não era nem o programma chamado Granja, nem o nome proprio de cavalheiros que não têem assento n'esta assembléa.

O sr. ministro da fazenda, sem precedentes que a isso o obrigassem, sem rasão conhecida que o impellisse, veiu aqui fallar no programma do seu partido, e tecer elogios a pessoas que se associaram ás ameaças que n'esse programma se faziam a esta camara.

Esses nomes podem representar caracteres que na sua vida privada sejam dignos de consideração, e que possuam até qualidades, como particulares, que eu não contesto, nem discuto, mas debaixo do ponto de vista politico, unico em que nos é licito tratar das cousas e dos ho-