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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 349

Lamento, pois, a posição fatal em que s. exa. se acha collocado...

O sr. Ministro da Fazenda (Barros Gomes): - Peço a palavra.

O Orador: - Posição que o leva a tributar o carvão de pedra, que é materia prima de todas as industrias e um elemento essencial da navegação transatlantica, que tanto anima o porto de Lisboa.

Resta ainda o imposto de rendimento, que me parece que está condemnado pelo proprio sr. ministro.

S. exa., que nos seus arredondados discursos (oxalá que eu os podesse fazer assim), tem por mais de uma vez dito ao parlamento que consente em que nas suas propostas se introduzam, modificações, emendas ou additamentos, mostra, comtudo, o maior empenho em que todas ellas sejam acceites, embora por este modo transformadas, ou substituidas, prestando-se para o conseguir a ir ao seio das commissões para discutir com ellas.

O desejo do sr. ministro de ver as suas propostas approvadas é perfeitamente natural: porém, eu, sr. presidente, ao ver a disposição em que s. exa. está, ao que parece, de acceitar todas as emendas, atrevo-me a dizer que o systema fazendario do governo está de antemão condemnado até pelo proprio sr. ministro da fazenda.

E em vista das manifestações pacificas que apparecem todos os dias no paiz, e que se têem traduzido em representações dirigidas ao parlamento, e em artigos em que quasi toda a imprensa tem procurado demonstrar que a maior parte das propostas do governo não devem ser approvadas, estou convencido de que o governo melhor avisado andaria se reconhecesse a conveniencia de retirar, pelo menos, aquellas das suas propostas que mais têem sido combatidas, como, por exemplo, a do imposto sobre o carvão e a do imposto do rendimento; não para ficar sem o imposto, uma vez que se julga necessario pedir esse sacrificio ao contribuinte, mas para o ir buscar a outra parte.

Alem d'isso tem agora sobre os seus antecessores a grande vantagem de que nós não excitamos o paiz, não vamos aos comicios, nem aos meetings das praças publicas, discorrer contra os impostos; mas o que nós não podemos é evitar que a imprensa diga a sua opinião, quando vê tantas classes ameaçadas, e, por consequencia, ameaçados tambem os interesses do paiz; porque é esse um direito seu, e até um dever.

Tenho, sr. presidente, por mais de uma vez, sido combatido por agitações, que me têem obrigado a saír dos conselhos da corôa.

Sabe-se que em 1856 o ministerio, de que eu tinha a honra de fazer parte, teve de pedir a demissão por se ter visto na necessidade de recorrer ao imposto, e note-se que havia já annos que se não appellava para esse recurso.

Mais tarde n'um outro ministerio a que pertenci, sendo n'essa occasião ministro da fazenda um homem illustre, que então, e por muitos annos, militou na politica ao meu lado, tambem os ataques dos nossos adversarios, e as manifestações da opinião, excitada por elles crearam ao governo uma situação difficil; o gabinete pediu a demissão; n'esta conjunctura, (ainda que não foi precisamente essa a causa que nos fez saír do ministerio), e foi v. exa., sr. presidente, que succedendo-nos no poder, teve o alto bom senso e a illustrada politica de acceitar algumas das propostas d'aquelle distincto homem d'estado a que me refiro, o sr. conde do Casal Ribeiro.

Mais tarde, sr. presidente, sendo eu ministro da fazenda, vim pedir ao parlamento que me votasse as leis que julguei necessarias para habilitar o thesouro a satisfazer os seus encargos, e n'esse tempo prepararam-se agitações em differentes pontos do paiz, com o fim de derrubar o governo, e impedir a cobrança dos impostos, insinuando-se ao povo que não devia pagar nem mais um real.

Podia o governo ter combatido essa agitação; mas as resistencias que se esmagam levantam-se algumas vezes mais tarde e mais fortes, sobretudo quando têem por ponto de apoio o interesse immediato do contribuinte.

O governo retirou-se então do poder, e todavia a verdade exige que se diga que foi uma causa altamente constitucional, mas estranha á agitação, que determinou precisamente o nosso procedimento, como por mais de uma vez o tenho declarado n'esta camara.

Não se póde negar que os srs. ministros gosam de uma grande ventura, que eu não peço que me agradeçam, mas o facto é, sr. presidente, que nós não promovemos meetings, não assistimos a elles, não fazemos agitação, nem proclamâmos ao povo dizendo-lhe que não pague.

Em confirmação d'isto invoco o testemunho de todos os dignos pares que me escutam. Eu combato aqui no meu logar, onde tenho o direito e o dever, de fallar ao paiz, e não escrevi uma linha, nem disse uma palavra ainda fóra d'este recinto que tendesse a excitar as paixões populares. Não me aconteceu outro tanto, como ha pouco demonstrei com a narração de alguns factos, porém não quero seguir os exemplos que me deixaram.

Sr. presidente, ha vinte e oito annos escrevia eu n'um documento que ficou notavel, não, por ser escripto por mim, mas por ter ficado como bandeira de guerra, a seguinte phrase, que ha muito está justificada: «O povo póde e deve pagar mais». Que fez então a opposição? Procurou tornar-me odioso ao paiz, e paraphraseando o que eu escrevêra, proclamava-se o contrario, dizendo «o povo não póde, nem deve pagar mais um real». E isto repetia-se em todos os tons a um governo que tinha reduzido desapiedadamente as despezas publicas, que dera um golpe mortal no deficit, e que afrontava as iras dos mais poderosos interesses nas pessoas ou corporações que os representavam. Esse governo, comtudo, era forte pela opinião que nos bafejou durante muitos annos, embora os nossos adversarios procurassem tornal-o odioso, dizendo que queria tirar a pelle ao povo!

Quem me havia de dizer, sr. presidente, que no fim de vinte e oito annos eu estaria n'esta tribuna, encontrando em frente as reliquias do partido que então me combatêra, pregando hoje a necessidade dos impostos, e empenhando todas as suas forças para que sejam votados!

Sr. presidente, ainda ha pouco tempo se escrevia, e dizia publicamente, até nas casas do parlamento, que o paiz estava é beira de um abysmo, e que ou se havia de pedir ao paiz 4.000:000$000 réis de impostos, ou decretar a bancarota.

D'este dilemma não se podia saír. Isto dito por um homem auctorisado entre as phalanges ministeriaes, e repetido pelos membros de um partido, que se acha representado no poder, impunha aos srs. ministros obrigações indeclinaveis.

A final o que aconteceu? Não veiu a bancarota, nem se pediram os 4.000:000$000 réis nem cousa que se pareça com isso.

Depois mostrarei o pouco valor effectivo do que se propõe, ainda que a camara o sabe perfeitamente.

Ora, quando se diz que é preciso pedir ao imposto 4.000:000$500 réis, ou caír na bancarota; quando se tem esgotado, e n'essa parte faço justiça ao sr. ministro da fazenda, todos os meios de fazer economias, porque fazer economias não é atrophiar os serviços publicos, nem destruil-os; quando se tem chegado ás regiões do poder com o fim determinado de fazer as maiores reducções nas despezas, tendo empenhado n'isso os maiores esforços, diga-se a verdade: depois de tudo isto, é muito difficil ao sr. ministro da fazenda saír da posição em que se encontra. S. exa. declarou que ía dizer a verdade, e toda a verdade, como se nunca se tivesse dito até hoje; mas que verdade é essa que se diz?

Não basta declarar que se quer dizer a verdade, quando atrás d'ella, debaixo e ao lado d'ella, está alguma cousa, que tambem é verdade, e se não diz. E não se diz porque