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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 285

importante que a Inglatterra tem nas suas colonias, o de vice-rei da India, foi confiado e é desempenhado por um catholico, lord Ripon.

Quer v. exa. saber (é um modo de dizer, porque v. exa. sabe-o melhor do que eu) como a Inglaterra procede no Industão com respeito á religião?

A base da sua politica é a tolerancia, tolerancia a mais completa.

A Inglaterra, nas Indias orientaes, não tem religião official, tolera todos os cultos. E desde o momento em que ella abandonasse esse systema de conducta, tornando-se suspeita dos povos, era-lhe impossivel sustentar-se na India.

Tive occasião de tratar com empregados altamente collocados, que me disseram que esta nação não fazia propaganda da sua religião official, e que não subsidiava e enviava missionarios d'ella; que isso pertencia ás associações particulares, especialmente ás sociedades biblicas; que alguns ministros anglicanos eram mandados pelo governo para presidir aos actos do culto dos empregados do estado, e tiveram a franqueza de me dizer que a unica religião que ali fazia importantes progressos era a catholica.

Eu cito simplesmente um facto.

Como já disse, temos, alem do arcebispado de Goa, em territorio portuguez, os vicariatos do norte, dos Gates, do Canará, de Cochim, Cranganor, Ceylão, Malaca, Meliapor e Bengala.

A congrua dos missionarios do vicariato do norte, em subsidios do governo, monta a 80:000 rupias; o governo inglez contribuo com dois terços, e o portuguez com um terço approximadamente!

O governo inglez funda igrejas, subsidia largamente os vigarios apostolicos e os capellães militares; as companhias dos caminhos de ferro subsidiadas pelo estado, e as particulares concedem passagem gratuita aos missionarios, facilitam a correspondencia das auctoridades com os administrados, isto em referencia á religião.

Com respeito á instrucção, a nenhuma nação póde ser indifferente este assumpto. A Inglaterra creou escolas nas colonias, e protege e auxilia outras de iniciativa particular; e como entende que não póde haver a verdadeira instrucção sem boa inspecção, tem os seus agentes, que vão inspeccionar as escolas em toda a parte. Os premios e os subsidios são concedidos em attenção á categoria das escolas e aproveitamento dos alumnos, em attenção, emfim, aos resultados praticos.

Isto não acontece sómente em Singapura.

Temos felizmente escolas em Bombaim, Matim, Bandorá, Calcuttá, Meliapor, Tuticurim, Singapura, que o governo inglez inspecciona, protege e premeia, mandando publicar os resultados nos seus jornaes officiaes. Ha em Bombaim uma universidade, e exigem-se certas habilitações para frequentar os seus estudos, e uma d'essas habilitações é que o individuo seja perito na lingua ingleza, na sua propria, e em uma outra, sendo uma d'ellas a portugueza, para o que ha um jury composto de vogaes da nossa colonia, ali estabelecidos, que os ha distinctissimos, e premios para os examinados que se distinguem.

O reverendo Sant'Anna da Cunha assevera que a sua escola (parece pretender que ella pertence mais a elle do que á nossa missão) foi sustentada exclusivamente á sua custa. Mas sendo a sua côngrua, como coadjutor, insignificantissima, como podia elle o ocorrer ás despezas com mestras europeas, ajudantes, casa, utensilios e mais cousas necessarias á escola? Julga-se indispensavel para a existencia da escola, mas na sua ausencia a escola continuou, e creio que continua a prosperar. Agora devo dizer duas palavras a respeito da syndicancia. Eu entendia que a syndicancia aos actos d'este ecclesiastico era precisa, e a mandaria fazer, não para saber se o devia mandar recolher a Goa, mas para saber o procedimento ulterior, que para com elle devia adoptar. Não a pude fazer, porque fui dispensado de servir as missões do Oriente, e tive de regressar ao reino.

Mas não podendo eu fazer a syndicancia nem mandal-a fazer, deixei na secretaria do arcebispado de Goa todos os documentos favoraveis e desfavoraveis, todas as representações que recebi a respeito dos actos do mesmo ecclesiastico.

Deixei dito ao meu delegado que logo que chegasse o sr. arcebispo de Goa, chamasse a attenção de s. exa. para este assumpto, deixei mesmo, entre outras, esta indicação por escripto, e indiquei o modo pratico de fazer a syndicancia; o coadjutor do sr. arcebispo, de confiança e insuspeito, na sua passagem em Singapura de Macau para Goa podia ser encarregado d'ella. Não sei se a fez, se não; e aqui começa a responsabilidade do arcebispo; pois eu entendo que as administrações e auctoridades têem obrigação de reparar, podendo, as injustiças que as anteriores porventura tenham commettido, sob pena de se tornarem cumplices responsaveis por essas injustiças.

Recolhido a Goa, pareceu, este ecclesiastico conformar-se com as rasões que lhe expuz (costumo dar aos meus subordinados os motivos do procedimento que tenho para com elles), mas depois levou esta questão para a imprensa, e dizendo o que não devia, ouviu o que não queria, fizeram-se-lhe accusações graves, cuja veracidade não pude verificar, mas que não foram destruidas, aggravando-se assim a sua situação, pois o que era particular-se tornou do dominio publico. Appareceu-me em Bombaim, instando pela sua restituição a Singapura, apresentou-se ao arcebispo para o mesmo fim, e não o podendo conseguir, veiu para Lisboa, creio que em condições desfavoraveis, por não trazer seus papeis em ordem.

Propalou que assim procedi por pressões exercidas sobre mim pelo governo da metropole, pelas auctoridades de Goa, pela Propaganda Fide, pelo vigario apostolico, que superintende nas missões de Singapura, pelo sr. bispo de Macau, e não sei por quem mais.

Mas a verdade é que ninguem me fallou n'este negocio, senão as nossas auctoridades de Singapura, que ninguem ousou fazer-me pressão, nem eu a acceitaria. As palavras favoraveis proferidas por occasião da apresentação do requerimento do reverendo Sant'Anna da Cunha fazem honra aos illustres deputados, pois revelam sentimentos nobres e corações sempre abertos a qualquer queixa, fundada ou infundada; mas a verdadeira generosidade não exclue a justiça, e esta pede que se ouça o accusado.

Audi et alteram partem.

A insistencia d'este ecclesiastico cada vez me convence mais da inconveniencia de o mandar de novo para Singapura.

O sr. deputado Luciano Cordeiro attribue a supposta injustiça, de que se trata, á anarchia e desorganisação dos serviços das missões na Africa e na Asia.

Estou de perfeito accordo; provi-o com differentes documentos citados por s. exa., e é confessado num decreto publicado em 1880, em que se procurou organisar e melhorar a situação das nossas missões, a doutrina, dando-se por motivo d'isso a decadencia d'ellas.

Melhor organisados os serviços das missões da Asia, mais facilmente poderia o superior ter conhecimento do que se passasse, e providenciar convenientemente, mas nunca poderia ser privado da faculdade de mandar os missionarios servir onde lhe pareça mais conveniente.

O individuo e a auctoridade julgam-se justos emquanto se não provar o contrario. Servi por onze annos o ultramar, Angola e a India.

Acolá suspendi um ecclesiastico com muito pezar, porque para o fazer era necessario violentar os meus sentimentos e revelava o castigo um estado moral anormal no punido.

Aqui, na India, não suspendi ninguem, devido á boa indole, morigeração e submissão do cloro de Goa, de cujas excellentes qualidades me apraz dar aqui testemunho.