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tade uma exposição, na qual Lhe fazia vêr. o estado em que nos achavamos, pedindo-lhe unicamente que não esperasse para demittir o Sr. C. de Thomar do Ministerio que contra elle se levantasse o menor grito armado em qualquer canto do Reino. Seis mezes haviam decorrido desde a entrada do Sr. Conde no Ministerio; e a conducta do Sr. Ministro tinha sido tal, que me tinha convencido que bem longe de ter aproveitado pela experiencia, até aos revezes de 1846 lhe haviam esquecido; continuando o mesmo anterior systema, que infalivelmente nos lançaria no abysmo que ainda hoje ameaça engolir-nos.
Affirmou o Sr. Presidente do Conselho que eu havia sido demittido de Mordomo-Mór, porque me servia do meu emprego para intrigar, e não pelas minhas votações nesta Camara.
Sr. Presidente, é facil fazer conhecer qual é o gráo de credito que deve merecer a asserção do Sr. Ministro. Em 18 de Dezembro tive a honra de apresentar a Sua Magestade a Representação a que alludiu o Sr. Conde, passou o resto de Dezembro, todo o mez de Janeiro, e dois dias depois do voto que dei nesta Casa em Fevereiro fui demittido, tendo-se-me dito no dia anterior, que eu não podia continuar a ser Mordomo-Mór depois do voto que havia dado na vespera. Não será clara e positiva a razão por que fui demittido? (Apoiados da esquerda.) ' Chamou me o Sr. C. de Thomar intrigante, mas em quanto sobre elle pesam accusações claras, positivas, não anonymas, de roubo e concussão, não póde o D. de Saldanha pedir satisfações ao C. de Thomar.
Tendo terminado a inscripção
O Sr. V. de Laborim — Requereu que se consultasse a Camara se as explicações deviam ter logar depois da votação.
O Sr. V. de Algés — Se a Camara decidir que se prorogue a Sessão até se votar, ha de obedecer a esta decisão da Camara, e ficará na Sala até que se vote; julga porém que é conveniente que as explicações tenham logar antes da votação, porque do contrario as explicações sómente se darão ás paredes por não ficar ninguem na Casa.
A Camara resolveu por 29 votos contra 27, que as explicações teriam logar depois da votação.
O Sr. C. de Lavradio — Declarou que se abstém de votar (sensação). (O Sr. C. da Taipa — E eu não) (sussurro).
Procedeu-se á votação por espheras, para o que se fez a competente chamada.
O Sr. D. de Saldanha (depois de ter votado)— Julga necessario declarar que se enganou nas Urnas, lançando na do voto a esphera que queria lançar na da contraprova, e vice-versa.
O Sr. V. de Laborim — Não quer oppor-se, mas observa que esta declaração é contra o Regimento, pois equivale a descobrir o segredo da votação (Apoiados).
O Sr. V. de Algés — Ninguem se póde oppôr a que se reforme a votação, quando se declara que houve engano.... (sussurro).
O Sr. V. de Laborim — Eu disse que não me oppunha. (O Sr. V. de Algés — Então para que fez a sua reflexão?)
O Orador — Porque quiz. (Sussurro. Vozes — Ordem, ordem.)
O Sr. D. de Saldanha — Os D. Pares que o viram votar, é que lhe disseram que se tinha enganado.... (Vozes — É verdade, é verdade. — Sussurro.)
(Agitação na Camara. Muitos D. Pares levantaram-se e sahiram de seus logares.)
O Sr. Presidente — Pede ordem. O segredo do escrutinio não póde revelar-se. Vai proceder-se a nova votação (Muitos apoiados): recommenda aos D. Pares que se conservem sentados, porque se vão distribuir de novo as esferas.
(Os D. Pares tomam novamente as suas cadeiras.)
O Sr. C. de Linhares — Peço a palavra... (Uma vos — Ninguem tem agora a palavra. Sussurro).
Faz-se de novo a chamada, e os D. Pares, aproximando-se da Urna, depositam o seu voto, lançando n'outra a esteira restante.
O Sr. Presidente — Convida os Sr. V. de Gouvêa e M. de Ponte de Lima para a contagem.
O Sr. Margiochi — Votaram 55 D. Pares, e apparecem 56 esferas, 30 approvando, e 26 rejeitando o Parecer, ha por tanto um voto de mais...
O Sr. Presidente — Então está nulla a votação... (Vozes — E verdade, é verdade. Sussurro.)
Verificou-se de novo a contagem, e deu o mesmo resultado.
O Sr. Tavares de Almeida — Mas não desmancha a votação....
O Sr. Mello Breyner — A votação está nulla (sussurro).
(Muitos D. Pares deixam os seus logares.) O Sr. Presidente — Peço aos D. Pares que tomem os seus logares (Apoiados). Restabelece se a ordem.
O Sr. Margiochi — A differença de um voto não faz perder a votação.
O Sr. C. da Taipa — Ha o mesmo numero de esferas em ambas as Urnas.
O Sr. Presidente — é igual: mas os votantes foram 55, e appareceram 56 votos; ha por tanto um demais....
O Sr. Margiochi — Vou lêr a relação dos D. Pares que foram chamados para votar.... (Vozes — Já sahiram uns poucos.)
O Sr. Presidente — Vai ler-se a lista dos D. Pares que votaram para verificar se houve engano na chamada (Apoiados).
Fez-se a leitura.
O Sr. V. de Algés — Não se leu o nome do Sr. C. de Mello que está presente, e assim está explicada a presença de 56 esferas, igual ao numero dos votantes. (O Sr. Margiochi — É verdade.) E evidente que o engano procedeu da Mesa. (Vozes — É exacto.)
(Passou-se ás explicações.)
O Sr. C. de Linhares — Sr. Presidente. Lisonjeiome que a Camara me fará a justiça de reconhecer, que na minha, hoje já longa carreira parlamentar, tenho mostrado sempre independencia. (O Sr. C. de Lavradio — Apoiado). Algumas vezes mesmo tenho provado a minha independencia, sem attenção ao que se poderia chamar os meus interesses particulares; entre outras poderia referir-me á desistência da minha patente militar; portanto julgo, como Pari ter o direito de ser o unico juiz da minha consciencia, e assim da conveniencia ou inconveniencia de votar em qualquer questão que se possa tractar nesta Camara (Apoiados).
Este é, pois, Sr. Presidente, o motivo porque julguei que não me devia abster de votar nesta occasião, não considerando haver motivo de coacção, ou delicadeza, que impedisse o meu voto espontaneo, de maneira alguma, nesta questão, que, no meu modo de vêr, é meramente de principios, e não de individualidade, pois a Lei já existe ha muito, e S. Ex.ª, o Sr. M. de Vallada, não é aqui senão um accessorio, pois a questão para mim é, se em vista do Decreto de 28 de Maio de 1834, hoje Lei do paiz, nos é livre reconhecer a S. Ex.ª como Par: questão inteiramente independente de sua pessoa (Apoiados).
Não se tracta, pois, de S. Ex.ª individualmente, e de quem me prezo de ser amigo, e até Collega, sendo S. Ex.ª um dos Officiaes Mores da Casa de Sua Magestade, motivo que mais depressa poderia influir, até para ser parcial, se eu tivera a liberdade de interpretar a Lei em seu favor. Mas eu considero esta questão uma mera questão de principios, e já definitivamente julgada pela Camara em outras occasiões, e aqui me cabe declarar, que as novas e muito habilmente deduzidas razões que tenho ouvido, não mudaram a minha convicção sobre o rigoroso sentido da Lei existente, e que só indirectamente attinge a S. Ex.ª o Sr. M. de Vallada.
Que motivo haveria pois que me obrigasse a não votar sobre a questão do parecer emittido pela nossa Commissão, e isto em consideração de ter a honra de ser Camarista de Sua Magestade a nossa Augusta Soberana? Parecer que tem unicamente referencia a uma Lei hoje regulamentar desta Camara, e que só póde ser alterada por uma nova Lei que a revogue ou altere; é pois esta uma questão de principios, e não de individuo.
Eu sinto muito que a decisão não fosse favoravel aos desejos do meu amigo, comtudo eu não podia, como membro desta Camara, abster-me de votar nesta occasião (Muitos apoiados).
O Sr. D. da Terceira — Sr. Presidente, eu pedi a palavra a V. Em.ª para uma explicação; quando o D. Par o Sr. C. de Lavradio, dirigindo-se ao Sr. Ministro dos Negocios do Reino, pareceu-me dizer que elle obrigava aos altos funccionarios, e igualmente aos altos Empregados da Casa Real, a votarem segundo a sua vontade. Ainda que o D. Par se dirigia ao Sr. Ministro, e era mais depressa um ataque que lhe fazia, eu comtudo intendi que podia talvez suppôr-se que esses altos Empregados, ou da Casa Real, ou funccionarios publicos, obedeciam a S. Ex.ª, é iam com a opinião delle.
Eu declaro, Sr. Presidente, que eu voto nesta Camara sempre segundo intendo (Muitos apoiados), e voto segundo a minha consciencia (Apoiados); votarei mal, e intenderei mal; mas peço ao D. Par que acredite, que eu voto sempre como intendo. (O Sr. C. de Lavradio — Apoiado.) É tudo o que tenho a dizer.
(Vozes — Muito bem, apoiado).
O Sr. C. de Lavradio — Desiste das explicações que tencionava dar, porque não quer demorar mais a Camara; mas não podia deixar de dizer aos D. Pares que acabavam de fallar, que tem tido muitas occasiões de conhecer de perto, por isso que ha muitos annos é amigo de S. Ex.ª, os sentimentos de honra e de independencia de S. Ex.ª, e que por isso senão dirigira a S. Ex.ª, de quem, repete, ha muitos annos era amigo, e que respeitava não obstante divergirem em opiniões politicas (Apoiados).
O Sr. Presidente do Conselho — Eu peço á Camara que note, que quando eu me referi ao N. Marechal, fui o primeiro a reconhecer os serviços prestados a este Paiz por S. Ex.ª, nunca os neguei, ao contrario prestei mesmo testimunho dos actos heroicos que S. Ex.ª tinha praticado em differentes occasiões, bem como das suas boas qualidades, e esta circumstancia devia servir para que o N. Marechal se conduzisse com mais cavalheirismo a meu respeito (Muitos apoiados).
Sr. Presidente, ainda assevero o facto que asseverei ha pouco. O Sr. D. de Saldanha não foi demittido de Mordomo-Mór, pelo voto que deu nesta Camara: S. Ex.ª foi demittido porque abusou da sua posição de Mordomo-Mór junto de S. Magestade, para intrigar contra o Ministerio: E observarei, que o Sr. D. de Saldanha referiu aqui palavras, que não pedia, nem devia referir (Apoiados prolongados). Commetteu uma grande falta constitucional (Vozes — É verdade), e eu não quero cahir no mesmo erro, eu podia mostrar a S. Ex.ª, que não foi exacto no que disse (Vozes — Muito bem); mas eu sei guardar as conveniencias parlamentares. Essa representação, essa carta, mostrou-se a um cento de pessoas; sei qual é o seu contheudo: nella referem-se factos de natureza igual aquelles que agora apresentou, e que eu desprezo, e rejeito (Repetidos apoiados), e tanto mais que hoje vem da bôca de S. Ex.ª.
Sr. Presidente, não é assim que as questões devem ser tractadas; não é este o modo como se devem respeitar os Membros desta Camara (Apoiados). O N. Duque como homem valente, é um dos primeiros deste Paiz, mas eu tenho direito a exigir que na qualidade de Par, na qualidade de Presidente do Conselho, e na qualidade de homem, se tenham comigo todas as considerações (Repetidos apoiados).
Sr. presidente, é extraordinario, e até atrocíssimo, que o N. Duque venha aqui ser orgão das mais infames calúnias, que os jornaes teem apresentado contra mim (Apoiados). Tem S. Ex.ª a coragem de me acensar em fórma, e com as provas, dos factos que menciona?
O Sr. D. de Saldanha — É o que dizem os redactores de jornaes.
O Orador — Também o N. Duque foi accusado pelos redactores dos jornaes, e até no Parlamento. (Vozes — É verdade: é. verdade.) Este caso pois é inaudito, é caso nunca visto: peço á Camara desculpa da vehemencia com que fallo. (Vozes — Tem razão.)
O N. D. de Saldanha tem direito para que o julguem pelos seus actos; mas eu tenho tambem igual direito. Se S. Ex.ª pelo que se passou em 1846 intendeu que eu era um homem abominavel, para que me honrou então com a sua amizade, e para que se serviu tanto dos meus serviços e dos meus conselhos quando esteve á testa do Ministerio? (Apoiados.) Se eu viesse preparado para fallar nesta questão, S. Ex.ª não havia de içar muito satisfeito, porque eu apresentaria documentos pelos quaes mostrava á Camara a versatilidade de S. Ex.ª... Não digo mais.
Sr. Presidente, eu era um homem sem igual na opinião do N. Marechal até certa época (Apoiados); mas no momento em que S. Ex.ª sahiu do Ministerio, e eu lhe succedi, passei então a ser, na opinião de S. Ex.ª, um homem infame (Sensação).
Vou terminar dizendo, que em outra qualquer occasião em que este negocio possa vir aqui, como deve vir, porque o N. Marechal desde que apresentou aqui tal accusação tem obrigação de offerecer as provas, então mediremos as nossas espadas parlamentares. Sinto que esta questão viesse trazida aqui incidentemente, porque não recuo entrar no desenvolvimento da materia, qualquer que seja a face em que S. Ex.ª a queira tomar: e se é homem cavalheiro não ha-de recusar-se a apresentar as provas das accusações que me fez. (Apoiados repetidos — Muito bem, muito bem.)
O Sr. D. de Saldanha: — Eu não me apresentei como accusador, disse, que sobre o Sr. C. de Thomar pesavam duas accusações não anonymas, mas sim claras e positivas, de roubo e concussão: — e um jornal desta Capital, a Revolução de Setembro, fazendo estas accusações a S. Ex.ª varias vezes, ainda as repeliu no dia 29 de Janeiro passado, debaixo do titulo — Um grande roubo — dizendo; — Aos tribunaes, Sr. Conde, aos tribunaes, lá se provará a verdade do que dizemos. (O Sr. Presidente do Concelho: — Eu despreso essas accusações).
O Orador: — Já, se vê por tanto, Sr. Presidente, que não sou eu que accuso a S. Ex.ª, é a imprensa; mas S. Ex.ª fica calado não se justificando para com o paiz, dessas accusações que lhe são feitas.
Agora não tenho a menor duvida em affirmar, que é verdade que durante a primeira Sessão desta Legislatura, S. Ex.ª se portou comigo como cavalheiro, que sustentou com esmero a administração que eu presidia; mas logo que o horisonte politico lhe mostrou um leve signal de poder o Sr. Conde entrar no Ministerio; deste esse momento o negocio foi outro, e delle datam as suas intrigas. Accrescentarei tambem que é verdade terem-se-me feito imputações no Parlamento, e em um jornal — O Estandarte; — não podia eu chamar aos tribunaes o membro do Parlamento irresponsavel pelas opiniões que emitte, mas alli o combati; chamei porém aos tribunaes aquelle jornal, posto que por motivos incomparavelmente menos graves do que as accusações que a imprensa periodica todos os dias dirige ao Sr. C. de Thomar; e no dia 24 do corrente mez se deve decidir o recurso de revista que interpuz para o Supremo Tribunal de Justiça. Porque não faz outro tanto o Sr. Conde?
Tendo Analisado as explicações, levantou o Em.mo Sr. Presidente a Sessão, declarando que a immediata teria logar no dia 22 do corrente, sendo a Ordem do dia a discussão dos Pareceres da Commissão de Petições n.º 296 sobre o requerimento de D. Antonia de Jesus Villas Boas, e 297 sobre o requerimento dos proprietarios do Brigue portuguez Galgo; e a do Parecer n.º 288 da Commissão de Legislação, relativo ao arrendamento da quinta do Alfeite. Juram quasi 6 horas da tarde.
Relação dos D. Pares que estiveram presentes na Sessão de 20 do corrente mes.
Os Srs. Cardeal Patriarcha, Cardeal Arcebispo Primaz, D. de Saldanha, D. da Terceira, M. de Castello Melhor, M. de Fronteira, M. de Loulé, M. das Minas, M. de Niza, M. de Ponte de Lima, Arcebispo, de Evora, C. das Alcaçovas, C. das Antas, C. do Bomfim, C. do Farrobo, C. de Ferreira, C. de Lavradio, C. de Linhares, C. de Mello, C. da Ribeira Grande, C. de Rio Maior, C. de Semodães, C. da Taipa, C. de Thomar, C. do Tojal, Bispo de Beja, Bispo de Lamego, Bispo de Vizeu, V. de Algés, V. de Benagazil, V. de Campanhã, V. de Castellões, V. de Castro, V. de Fonte Arcada, V. de Fonte Nova, V. de Gouvêa, V. da Granja, V. de Laborim, V. de Oliveira, V. de Ovar, V. de Sá da Bandeira, B. da Arruda, B. do Monte Pedral, B. de Porto de Moz, B. de S. Pedro, B. da Vargem da Ordem, Pereira Coutinho, Pereira de Magalhães, Margiochi, Tavares de Almeida, Silva Carvalho, Albergaria Freire, Portugal e Castro, Serpa Machado, Fonseca Magalhães, e Mello Breyner.