DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 205
pois ella dizia "o qual estava de accordo". A segunda, por que, estando presente a commissão de guerra, ella estava por consequencia habilitada a responder ás duvidas do digno par. Ora se foi, como se observou, um digno par de decidida opposição que pediu o adiamento, a insistencia para que se discutisse partiu de um par decididamente ministerial, que sou eu, o que nce acontece bem poucas vezes. Portanto a observação do sr. conde de Cavalleiros parece me que não tem fundamento.
A commissão tem presente aqui n'este momento um dos seus membros, e creio que para esse membro da commissão de guerra não será muito agradavel entrar no debate não tendo vindo preparado para elle. Assim pois entendo que a camara deve sustentar a deliberação que tomou hontem de não discutir este projecto sem estar presente o sr. ministro da guerra.
O sr. Visconde de Ponte Arcada: - Sr. presidente, segundo a declaração que ha pouco se fez n'esta casa, acha-se unicamente presente um membro da commissão de fazenda, e por consequencia não se póde ella reunir para tratar dos projectos vincios da outra camara. Eu desejava saber se outras commissões estão trabalhando.
Vozes: - Nenhuma.
O Orador: - Então como hade a camara discutir os assumptos que precisam do parecer das commissões para serem discutidos, e sobre os quaes ellas ainda o não deram? Não é possivel obrigar a camara a discutir projectos sobre os quaes não têem ainda sido ouvidas as commissões, e de que a camara não tem conhecimento. Pois póde querer-se que a camara vote ás cegas? Isto não póde ser, e é impossivel continuar assim.
Peço desculpa ao meu amigo o sr. visconde de Chancelleiros, de o ter ha pouco interrompido com algum calor e voz mais levantada do que eu queria, quando s. exa. mostrou querer que se discutisse um parecer que veiu da camara dos senhores depurados ha poucos instantes. S. exa. desculpa-me de certo, porque sabe que eu tenho toda a consideração pessoal por s. exa., e que sou incapaz de o offender voluntariamente.
Sr. presidente, parece-me que a sessão não póde continuar, e eu sou de opinião que v. exa. a levante, visto não haver trabalhos preparados em circumstancias de a camara se poder occupar d'elles.
Deploro a maneira porque as discussões têem corrido, ou para melhor dizer a sua falta. Todos os incidentes que se têem dado hão de ser explorados pelos mal intencionados, para desvirtuar o governo representativo; e é para lastimar que os poderes publicos forneçam elles proprios as armas aos inimigos do systema constitucional.
Nós vemos o que está acontecendo em França, e devemos pôr ali os olhos, alem das más doutrinas espalhadas n'aquelle infeliz paiz, grande parte dos desgraçadissimos acontecimentos de que tem sido theatro e victima, proveiu da má administração e to modo porque se dirigiam os negocios publicos n'aquelle estado, dando assim occasião aos partidos desorganisadores da sociedade para explorar mais facilmente tão funestos erros, e rasgar os laços sociaes.
Não queiramos nós tambem pela nosse falta de circumspecção, na avaliação dos negocios publicos, dar occasião a que qualquer partido, aproveitando-se dos nossos erros, possa illudir como pertendem, o nosso povo, para o desvairar.
Não tenho mais nada a dizer.
O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, desejava saber se na mesa estavam já uns documentos que pedi pelo ministerio das obras publicas, e que se referem a gravissimas accusações feitas ao director das obras publicas de Castello Branco.
O sr. Secretario: - Na mesa não existem documentos alguns a respeito do negocio a que se refere o digno par.
O Orador: - Como a sessão se vae encerrar, e os documentos que pedi ainda não vieram, aproveito a occasião de se achar presente o sr. ministro das obras publicas, para lhe recommendar este negocio, que é urgentissimo.
Na secretaria das obras publicas ha representações muito serias contra aquelle empregado, queixas muito graves, accusando-o de factos incriminados pelo codigo penal, e para os quaes as leis deste reino exigem penas severas.
Estas representações serias, aquellas queixas graves, foram ha muito apresentadas n'aquelle ministerio, e até hoje o ministro respectivo não deu uma unica providencia.
É pois preciso que s. exa. tome essas representações na devida consideração, e que tome verdadeiro conhecimento dos factos que ali se allegam, e que verifique se são ou não verdadeiros, que mande proceder a uma syndicancia, que nomeie, se preciso for, uma commissão de inquerito composta de empregados intelligentes e honrados, e que, levados por espirito de classe, não lancem um véu sobre si-milhantes factos; só assim se póde dar um exemplo que sirva de lição, ou mostrar illibado o caracter do empregado a que me refiro.
Queira s. exa. dar-se ao incommodo de chamar a si aquelle processo, de o examinar, como lhe compete, e de fazer o que lhe parecer mais conveniente a bem da utilidade publica e da justiça; é o que eu desejo, e o que me cumpre pedir, e exigir mesmo como membro do poder legislativo.
Se não annunciei a s. exa. uma interpellaçao ácerca d'este momentoso negocio foi porque os documentos que pedi por differentes vezes não me foram enviados, e como não os examinei ainda, não sei se esse era o meio de proceder, ou se será um outro mais conveniente.
O sr. Conde de Cavalleiros: - Sr. presidente, o meu nobre amigo, o sr. ministro das obras publicas, achou-me em contradicção com o digno par, o sr. visconde de Fonte Arcada.
Parece-me que s. exa. se enganou. Eu argui o governo por não promover a discussão dos projectos que estão impressos, e têem pareceres das illustres commissões; até disse quaes elles eram, um dos quaes é da maxima importancia financeira.
O sr. visconde quer evitar a discussão de outros que não têem parecer. Estamos de accordo.
Ouço por ahi dizer por toda a parte, e constantemente, que é preciso crear receita, e ao mesmo tempo vejo desprezar pareceres tão importantes, que são valiosissimas fontes d'essa receita, que se diz ser precisa, e chegar um ministro a pedir o adiamento da discussão até que chegue outro, que elle sabe que não apparece.
Declaro que não percebo tal cousa, e era isto mesmo que eu censurava, e s. exa. sabe que, não se discutindo hoje os projectos que ha impressos, elles caducam, e para que vão por diante é preciso que a nova camara faça outros.
E se elles não vão por diante não é por culpa da camara, mas sim por culpa de algum digno par ou de algum sr. ministro.
Um digno par quiz que certo projecto se não discutisse até estar presente o ministro competente, que era o da guerra, e para o outro quiz tambem um ministro que se não discutisse até estar presente um outro ministro. Ora, nem o da guerra nem o da fazenda cá vem, e ahi ficam os projectos sepultados por uma vez.
Parece-me que isto faz muita differença do que quer o nosso collega, o sr. visconde de Fonte Arcada. S. exa. não quer que se discutam projectos que não estejam impressos, nem outros que por ahi ha vindos da outra camara, sobre os quaes não ha pareceres; e, na realidade, como se podem elles tratar se os não póde haver? A commissão de fazenda resume-se toda no sr. José Lourenço da Luz! Como é, peia, possivel haver pareceres? Nem mesmo o digno par tinha necessidade, sendo sósinho, de dar parecer, porque então pedia a palavra e usava d'ella como qualquer de nós, que não pertencemos á commissão, e ficavamos sabendo a sua opinião, sem ter que estar com similhante trabalho.