206 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
Está, pois, provado que os projectos se não podem discutir, nem pode, repito,, haver pareceres sobre elles, por não comparecerem os membros da commissão.
Ora, a minha opinião é que se discutam aquelles sobre os quaes ha pareceres, que já são antigos, que estão sobre a mesa, e para que houve pedidos de adiamentos, que talvez se possam dispensar.
Houve tambem outro ponto em que o meu nobre amigo o sr. visconde de Chancelleiros se illudiu. Eu não fiz censura nenhuma ao governo civil de Lisboa, não a podia fazer...
O sr. Ministro das Obras Publicas: - S. exa. é que está illudido, eu não suppuz tal, nem podia significar essa idéa nas poucas palavras que disse.
O Orador: - Ainda bem que s. exa. o não suppoz assim, porque eu n'esta simples questão de administração nem fiz censura alguma ao governo civil, nem ao dono do trem a que me referi, e que anda hoje não sei quem é. Se não processaram o cocheiro, se não o chamaram aos tribunaes, de certo que o dono do trem não é o culpado. Eu referi apenas o que disse o jornal; mas o que desejava era, que houvesse uma praxe estabelecida ácerca do serviço da policia com o consulado; pcrque não me parece que um policia deva, ás ordens de em consul qualquer, prender alguem, e acompanhar essa pessoa ao caminho de ferro, e faze la embarcar sem motivo justificado e provado evidentemente. Contra isto é que eu fallo, a não ser os pobres e vadios que procuram Lisboa para a explorar.
Tambem quero dizer ainda ao meu nobre amigo o sr. ministro das obras publicas, que quando fallei na necessidade que temos de missionarios, para civilisar os povos selvagens que estão debaixo do dominio portuguez, não indiquei cousas que se não poasam conciliar ou prestar mutuo auxilio. Se se quer abrir o caminho á civilisação pelo meio da espada, é preciso que cepois a cruz sustente essa civilisação. Mas, quanto a mim, o melhor é que a cruz abra o caminho á civilisação e que a espada a sustente. D'aqui ha sempre o bom resultado da não ir de repente de encontro ás idéas erroneas dos homens menos civilisados do selvagens.
A marinha é indispensavel, mas tão indispensavel como a marinha são os governadores civilisados; porque se se deu o facto, como disse, de um governador portuguez mandar cortar a cabeça a um enviado dos indigenas sublevados, se isto é verdade, repito, o governo deve processar esse governador (apoiados}.
Não pense o meu nobre amigo o sr. visconde de Soares Franco, que eu quero negar a utilidade de um elemento tão necessario como é a marinha, porque nós ainda somos a segunda nação da Europa no que toca a possessões (apoiados).
Se ha nação que tenha rasão para ter marinha somos nós, logo depois da Inglaterra, porque somos a segunda nação colonial, e de tal importancia, que das nossas colonias se podem formar imperios.
O sr. Marquez de Vallada: - Sr. presidente, competia-me a palavra, mas estou em duvida se deverei usar d'ella, porque me parece que não estamos em numero.
O sr. Secretario (Visconde de Soares Franco): - Ha quatorze.
O sr. Ministro das Obras Publicas: - Disse que não tinha recebido nenhuma nota de interpellação ácerca do director das obras publicas do districto de Castello Branco, e sómente um documento em que se lhe annunciava que se exigiam certos documentos, alguns dos quaes deu ordem para que fossem remettidos, e já deviam ter chegado á camara.
Quanto á syndicancia pedida, que a responsabilidade é sua, e portanto só elle é o juiz, tanto da necessidade d'ella, como do modo, e do quando.
Com relação ao que disse o sr. conde de Cavalleiros, observou que se lastimava muito de que, sendo esta camara tão numerosa, apenas concorressem tão poucos dignos pares ás suas sessões, de modo que ás vezes nem as commissões podiam trabalhar como se estava observando a respeito do projecto para o qual tinha pedido a urgencia e dispensa do regimento.
O sr. Vaz Preto: - Sr. presidente, eu não annunciei, nem disse que tinha annunciado interpellação alguma ao sr. ministro das obras publicas; fiz esta declaração quando ha pouco fallei: o que disse foi, que desejava ser informado sobre se já havia sido satisfeito o meu requerimento repetido, em que eu pedi a remessa de varios documentos do ministerio das obras publicas, ácerca dos factos de que é accusado o director das obras publicas d'aquelle districto.
Perguntei e torno a perguntar se já foram remettidos a esta camara, e se estão sobre a meza?
O sr. Ministro das Obras Publicas: - O digno par pediu a representação e o officio do director do districto; e eu já dei as respectivas ordens para esses documentos lhe serem enviados.
O sr. Secretario (Visconde de Soares Franco): - Não consta.
O Orador: - Já vê pois o sr. ministro que se enganou na sua asseveração ou a sua ordem não fui cumprida. Mas não são só esses documentos a que s. exa. se refere, que eu pedi, ha outros de que preciso, que existem na secretaria e que são muito importantes, é á vista d'elles que eu poderei annunciar ou não a minha interpellação, e como esses documentos ainda não vieram, a interpellação ficará para outra vez se as providencias não forem dadas. Como porem esta sessão está a encerrar-se, antes d'isso eu não quero deixar de fazer todas as recommendações a s. exa., para que este negocio não fique no esquecimento, como tem ficado até aqui, o que surprehende a todos, e que não vae bem nem á equidade nem á honra do sr. ministro. Eu não peço favor, peço justiça, requeiro-a, exijo-a até.
Este negocio é gravissimo, é de administração publica, e sobretudo de alta moralidade. Tenho pedido, peço ainda (e supponho que o sr. ministro não se eximirá a este pedido), que se verifiquem os factos, que se procure a verdade, pouco me importa o modo ou a fórma que s. exa. escolher n'esta questão, e para chegar ao fim desejado. É-me indifferente a commissão de inquerito ou a syndicancia, com tanto que se chegue ao conhecimento completo d'aquelles factos.
Esteja e fique s. exa. descançado que eu não lhe imponho o methodo, mas estou no meu direito de lhe fazer indicações, e s. exa. de as seguir ou não conforme julgar mais conveniente ao serviço publico, ou castigando e dando assim um exemplo severo, ou mostrando o caracter iliibado daquelle empregado e da corporação a que pertence.
Portanto proceda o sr. ministro como quizer, dirigindo se sempre ao intuito a que visamos, a justiça.
Isto é que eu peço a s. exa., torno a repetir, é com este pedido que a camara se conforma, e n'este intuito me acompanha; porque são os verdadeiros principios, e estou tambem certo de que o sr. ministro das obras publicas não poderá deixar de os attender e seguir. Creio que s. exa. não duvida d'elles, pois tenho-lhe ouvido sustentar n'outras occasiões a mesma doutrina.
Concluirei pois, pedindo novamente justiça e só justiça.
O sr. Conde de Cavalleiros: - Parece-me que o sr. ministro foi menos justo com a camara. Pois já alguma vez deixou de se discutir e votar algum projecto n'esta casa? Porventura já passou alguma lei importante n'esta camara, a não ser á ultima hora, que não tivesse discussão, e tão pequena que não fizesse com que fossem alterados os projectos vindos da outra casa do parlamento? Parece-me que não.
O exemplo da alteração do projecto relativo aos privilelegios concedidos para os bancos e companhias é uma prova do que acabo de dizer, porque este objecto foi largamente discutido mais de um mez na camara da srs. deputados, e