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N.º 40

SESSÃO DE 10 DE ABRIL DE 1878

Presidencia do exmo. sr. Duque d’Avila e de Bolama

Secretarios — os dignos pares

Visconde de Soares Franco
Montufar Barreiros

(Assistem os srs. ministro do reino, fazenda, marinha e justiça.)

As duas horas da tarde, tendo-se verificado a presença de 23 dignos pares, declarou o exmo. sr. presidente aberta a sessão.

Leu-se a acta da antecedente, que se considerou approvada, por não ter havido reclamação.

Mencionou-se a seguinte

correspondencia

Um officio do. ministerio do reino, remettendo o decreto autographo datado de hoje, pelo qual Sua Magestade El-Rei houve por bem prorogar as côrtes geraes ordinarias até ao dia 16 do corrente mez.

Para o archivo.

Outro do mesmo ministerio, participando que por carta regia de 8 do corrente, houve Sua Magestade El-Rei por bem nomear par do reino ao dr. Joaquim Gonçalves Mamede, do seu conselho e presidente da camara dos senhores deputados.

Para o archivo.

Outro do ministerio da marinha, remettendo sessenta exemplares dos relatorios dos governadores de Cabo Verde, Moçambique e Estado da India, sobre a administração publica d’aquellas provincias, com referencia ao anno de 1875.

Mandaram-se distribuir.

O sr. Presidente: — A camara fica prevenida de que as côrtes estão prorogadas até ao dia 16 do corrente.

O sr. Vaz Preto: — E para mandar para a mesa o seguinte requerimento:

«Requeiro que, pelo ministerio da guerra, se mande a esta camara uma copia do contrato feito pelo governo com o sr. Pedang d’Ogeu, ácerca da compra de armas. = Vaz Preto.»

Sr. presidente, estes esclarecimentos, que peço, é muito conveniente que venham com urgencia á camara, para ella poder avaliar alguns dos projectos que hão de ser submettidos á sua approvação.

O sr. Presidente: — Os dignos pares que approvam que seja remettido este requerimento ao governo, tenham a bondade de se levantar.

Approvado.

ORDEM DO DIA

O sr. Presidente: — Não ha mais ninguem inscripto antes da ordem do dia, vamos portanto entrar na primeira parte d’ella, que é a eleição da commissão, composta de sete membros, que ha de dar parecer sobre ò projecto de lei de reforma eleitoral.

Convido os dignos pares a formularem as suas listas.

Convido os dignos pares conde de Cabral e Franzini, a servirem de escrutinadores.

Entraram na uma 36 listas, 2 das quaes eram brancas.

O sr. Presidente: — Saíram eleitos os srs.:

Sequeira Pinto........................... 29 votos

Barros e Sá.............................. 27 »

Conde do Casal Ribeiro................... 23 »

Visconde de Bivar.. .,................... 23 votos

Conde de Cabral.......................... 22 »

Cau da Costa............................. 21 »

Visconde da Praia Grande................. 19 »

Tambem obtiveram votos os dignos pares:

Carlos Bento............................. 12 »

Conde de Cavalleiros...................... 10 »

Martens Ferrão............................ 10 »

Marquez de Sabugosa....................... 8 »

Braamcamp................................. 6 »

Vaz Preto................................. 4 »

Palmeirim................................. 3 »

Conde de Rio Maior....................... 2 »

Costa Lobo............................... 1 »

Franzini.....,........................... 1 »

Larcher.................................. l »

Ornellas................................. 1 »

Conde da Ribeira......................... 1 »

Visconde de Alves de Sá...................1 »

D. Affonso de Serpa...................... 1 »

Visconde de Fonte Arcada................. 1 »

Conde do Bomfim.......................... 1 »

Xavier da Silva.......................... 1 »

Conde de Linhares........................ 1 »

Visconde dos Olivaes...................... 1 »

Marquez de Vianna........................ 1 »

D. Antonio de Mello....................... 1 »

Tenho a participar á camara que se recebeu na mesa a carta regia que eleva ao pariato o sr. Gonçalves Mamede.

Nomeio os dignos pares Sequeira Pinto, Barros e Sá e Larcher para examinarem este diploma.

Vamos entrar na segunda parte da ordem do dia, que é a continuação da discussão do parecer n.° 290, e tem a palavra sobre a ordem o sr. Vaz Preto.

O sr. Vaz Preto: — Eu chamo a attenção do sr. ministro do reino para as reflexões que vou fazer.

Ouvindo com toda a attenção o discurso de s. exa. deprehendi que, ou não percebeu ou evitou responder ás minhas perguntas e ás minhas reflexões, e portanto tornarei a insistir n’ellas, as quaes foram já até certo ponto respondidas pelo sr. relator da commissão por alguns sophismas.

Eu perguntei e pergunto a s. exa. o sr. ministro, em quanto avaliava os encargos que novamente irão pesar sobre os districtos e municipios e que até aqui têem estado a cargo do thesouro?

Peço licença para asseverar ainda outra vez, apesar de s. exa. declarar hontem no seu discurso que esses encargos eram facultativos para as juntas geraes e camaras, que o não são, mas sim obrigatorios, como se ve das disposições do codigo que se discute.

Sendo obrigatorios, e tendo sido deslocados do orçamento geral do estado, hão de ter um valor, e é exactamente esse valor que eu pergunto a s. exa. qual é.

S. exa. não desconhece que nós temos precisão de saber qual é esse valor, porque alem dos encargos que hão de ter mais tarde as juntas districtaes, já lhes são lançados por esta reforma alguns, a que ellas se não podem eximir.

O sr. Mártens Ferrão, reconhecendo effectivamente que

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a pergunta que eu fazia tinha alguma rasão de ser, respondeu que os não podia calcular, porque não sabia qual seria o desenvolvimento e a escala em que as juntas geraes procederiam com as suas despezas.

S. exa. referiu-se aos encargos que de futuro haviam de ter, e eu tinha-me referido aos encargos que provinham já da sua deslocação do orçamento para cargo das juntas.

Parece-me, pois, que se póde calcular esse valor, porque o governo sabe quanto gastava com os districtos, o sabe os encargos que passam agora para as juntas.

Emquanto ás camarás, tambem sabe perfeitamente quaes os encargos que estavam a cargo do thesouro, e que ellas agora passam a satisfazer, como, por exemplo, o recenseamento da população.

Estimaria, pelo que acabo de dizer, que o governo esclarecesse a camara a este respeito e o paiz, a tira de que elle saiba o que por este codigo lhe vae ser lançado.

É convicção do sr. ministro do reino que esta reforma será bem acolhida pela opinião publica. Duvido.

Não duvido, tenho a certeza; na actualidade diz-se mal d’ella, e quando se lhe apreciarem as difficuldades levantará grandes clamores.

Sr. presidente, o sr. ministro, que não tinha percebido a minha pergunta, declarou que as juntas geraes tinham de pagar unicamente os ordenados na importancia de 900$000 réis ás commissões executivas e os ordenados ao conselho de districto.

A isso não me referi eu, pois tinha ali claro e estabelecido no novo codigo.

Já mostrei a inconveniencia que resultava da despeza de 900$000 réis que se pretende fazer com a commissão executiva e com relação aos ordenados estabelecidos para os conselheiros de districto.

Eu peço a s. exa. que reforme essa disposição pelo que respeita ao conselho de districto, porque até hoje as pessoas das mais serias e competentes das capitães dos districtos têem-se prestado da melhor vontade a desempenhar gratuitamente essa funcção; e se se retribuirem os legares vae-se crear uma nova ordem de funccionarios publicos, que podem não ser os mais aptos, mas os que tenham melhores empenhos. (Apoiados.)

N’este codigo tambem está consignado um principio que até certo ponto tira ao governo a faculdade de nomear os membros do conselho de districto, pois desde que se estabelece por uma disposição que hão de ser pelo menos dois bachareis formados, ipso facto logo que entrem na lista escolhida pela junta geral serão nomeados conselheiros de districto. Quer dizer que o governo até demitte de si uma attribuição que pertence ao poder central.

Portanto, peço ao nobre ministro que tome nota d’estas minhas considerações, e que deixe ficar os conselhos de districto como estão actualmente, e que não se estipule ordenado para os seus membros, porque só assim irão escolher-se as pessoas mais competentes para desempenhar aquella missão, de outro modo a escolha recairá em pessoas que pretendam alcançar uns certos meios de subsistencia, e o fim que se tem em vista não se poderá obter.

Sinto não ver presente o illustre relator d’este projecto, pois desejava dirigir-me as. exa.

Uma das rasões por que me tenho pronunciado mais contra esta reforma, é por ella vir desacompanhada de uma nova circumscripção administrativa, que era o unico elemento que poderia tornal-o util.

(Entrou o sr. Mártens Ferrão.}

Estimo ver entrar o digno par e meu antigo condiscipulo o sr. Martens Ferrão.

Estava dizendo que este projecto vem desacompanhado de uma nova circumscripção administrativa, e esta era o meio para elle produzir bom resultado. Sem uma circumscripção, como a que se continha na reforma de 1867, da iniciativa de s. exa., não podem as localidades ter os elementos e as condições necessarias para se desenvolverem.

Conservando-se a sua circumscripção actua succede que, tanto as parochias como os concelhos, não se encontram preparados, nem têem os elementos para poderem satisfazer os onus e encargos que lhes são impostos por esta reforma, nem têem mesmo pessoal.

Disse o sr. Martens Ferrão que concordava commigo e sustentava ainda as idéas da sua reforma de 1867; mas, que tendo ella sido condemnada pela opinião publica, acceitava agora o projecto apresentado pelo sr. ministro do reino, apesar de não preencher as condições a que a sociedade deve aspirar. Cousa notavel!

Sr. presidente, sou eu que defendo aqui o projecto do sr. Martens Ferrão contra o sr. Mártens Ferrão; o projecto de s. exa. não estava condenmado pela opinião publica, como s. exa. e mais alguem disse. Isto é um grande erro.

S. exa. sabe que não foi o seu projecto que o obrigou a sair do ministerio, mas sim o imposto do consumo.

O sou projecto foi approvado e começou a pôr-se em execução, e hoje estava aclimatado e lei do paiz se o governo que se seguiu as. exa. o não tivesse revogado. O que no meu entender foi uma grande calamidade.

O projecto do sr. Sampaio é que me parece estar n’esse caso, pois dá-se um facto muito expressivo, e que indica que elle não satisfaz muito a opinião do paiz, e a prova é que foi apresentado na camara dos senhores deputados e por ella largamente discutido, e voltou com emendas á commissão, onde ficou até agora, apesar de ter sido eleita nova camara e lá ficaria de remissa, e ficaria para sempre, se porventura não houvesse esta restauração.

Alem d’isso acresce a camara, dos senhores deputados estar no ultimo anno da sua legislatura, e proximo a fazer-se uma eleição geral, e n’este caso não está resolvida a crear um conflicto com o governo, que é o grande eleitor. Por consequencia esteja o nobre ministro certo de que se o projecto passar, não será porque elle tenha grandes vantagens, mas porque as eleições estão proximas, e n’este momento, n’esta confusão dos partidos e no meio das excitações, pensa-se mais na questão politica do que na administrativa.

Aqui tem v. exa., sr. presidente, a rasão por que este projecto não satisfazendo á opinião publica, o parlamento o vota, e permitta-me a camara que lhe diga, que duvido que a actual camara dos senhores deputados represente a opinião publica. Por um voto seu está hoje no poder o partido regenerador, contra o qual a imprensa e as penitenciarias têem clamado bem alto.

A opinião publica é adversa a esta situação, e ella lá está porque o Rei foi illudido.

Sr. presidente, desengane-se v. exa. e convença-se acamara, que este projecto não tem a seu favor a vontade da nação.

O que expoz o illustre relator da commissão, emquanto á sua reforma não ter sido executada, não é argumento que possa sustentar e justificar o projecto do governo.

Sr. presidente, o projecto do sr. Martens Ferrão, alem de muitas disposições todas convenientes á boa administração publica e com as quaes o paiz estava de accordo, tinha a circumscripção, e essa circumscripção, sr. presidente, dava meios, e, sem duvida, pessoal sufficiente para desempenhar a missão importante que era confiada aos differentes corpos administrativos.

Lamento, e lamento muito, que na occasião em que s. exa. foi ministro tivesse havido aquella excitação, que obrigou o seu projecto a não poder ser executado, e, a não ser esta circumstancia, estaria já hoje radicado em Portugal.

Mas, sr. presidente, o projecto do sr. Martens Ferrão tinha a grande vantagem de reconhecer o que este não reconhece. S. exa. julgou que devia pôr um limite aos addicionaes lançados pela camara, o que o projecto em discussão não marca, e isso é um grande inconveniente.

Quanto á questão do imposto, disse-nos o sr. Mártens Ferrão, que elle era apenas em ensaio. Como se póde ad-

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mittir tal, sr. presidente? Pois fazem-se ensaios que podem ter consequencias funestas e excitações populares? Se é o imposto que já existe, porque se trata de aggravar este imposto por uma lei? Se este imposto não é preciso para já, se é sómente para fazer ensaio, para que se vae buscar um dos impostos mais vexatorios? Era muito mais acertado deixar estar o que está, o que já existe. Acho muito inconveniente inserir novas disposições no projecto, que só têem, por unico fim tornar o vexame mais forte. Creio que é imprudente fazer ensaios de tal ordem.

Sr. presidente, esta discussão está bastante adiantada, o sr. ministro está um pouco. impaciente por que se vote este projecto, e eu teria vontade de satisfazer os desejos de s. exa. se porventura não estivesse convencido, como estou, de que faço um grande serviço impugnando-o. Não obstante, Vou limitar-me nas minhas observações.

A rasão por que eu tenho tomado a palavra, é por que tenho expendido mais. largamente as minhas opiniões, é porque eu tinha os maiores desejos que quando esta lei passasse, fosse com os desejos defeitos possivel, é estou persuadido que ás emendas que esta camara lhe tem feito, comquanto não consigam tirar-lhe todos os defeitos, sempre lhe tirarão alguns.

Um outro ponto para que eu chamo a affeição do sr. ministro, é para se remediar para o futuro os inconvenientes que se têem dado na pratica, é de que o codigo não trata; refiro-me ás contas das juntas de parochia, que muitas estão nos conselhos de districto, e algumas mesmo de vinte e trinta annos, sem serem examinadas.

É indispensavel que o governo tome algumas medidas e de providencias, a fim de se saldarem por uma vez estas contas antigas, consignando-se no codigo algum principio que evite para o futuro o estarem muitos annos as contas por tomar ás confrarias, misericordias, etc;

Mando para a mesa uma. emenda e peço á illustre commissão que a considere maduramente. Quem tem exercido cargos administrativos reconhece que o que eu digo a este respeito é exactamente o que se passa.

Portanto, sr. presidente, mando para a mesa, não uma proposta, mas um additamento ao artigo 243.°

(Leu.)

Ora, eu vou explicar as rasões por que mando para a mesa o meu additamento.

Como a camara sabe, ha posturas municipaes que devem ser approvadas ou
rejeitadas dentro de mez; e como se não cobra recibo, succede demorar-se no conselho de districto a resolução d’aquelle negocio, porque não ha dia marcado em que começou b praso:

Estabeleço, tambem esta percentagem para remunerar esses serviços extraordinarios, por que os governadores civis e os administradores de concelho, allegam sempre que não satisfazem a esse serviço por não terem empregados sufficientes, e ser esse serviço muito penoso;

Alem d’esta emenda, proponho que o n.º 5.° do artigo 60.° seja redigida da seguinte fórma:

«As, despezas de construcção e conservação das cadeias e mais edificios districtaes.

«Os governos civis e repartições publicas, não são considerados districtaes = Vaz Preto.»

Pelo novo codigo esta despeza vae recaír sobre os districtos.

Ora, como eu entendo .que sobre os districtos só devem pesar as despezas puramente districtaes, não posso crer que sejam os cofres locaes que paguem o que se despende com as repartições, onde funccionam os delegados do poder central, isto é, os governadores civis, os seus delegados e outros agentes do governe.

O thesouro e não o districto é que deve satisfazer ao que se despende com estas repartições.

Por consequencia, para harmonisar o systema que se vae estabelecer é, preciso dividir com justiça os encargos que competem ao poder central e os que dizem respeito ao poder local, é precisei estipular que cada um d’esses poderes pague só as despezas, que exclusivamente lhe pertencerem. Aqui tenho, outra emenda que prende com este assumpto: refere-se ao ordenado dos vogaes do conselho de districto, estabelecido n’este codigo:

Titulo VI - No capitulo, III, secção 2.ª, proponho a eliminação dos §§ 25.° e 26.° do artigo 127.º = Vaz Preto.»

Sobre este ponto tenho a dizer que comquanto o sr. ministro, do reino tenha declarado que não quer desvirtear as instituições, s. exa. todavia estabeleceu no artigo 234.° da sua reforma uma disposição que equivale a uma invasão das prerogativas das juntas geraes ide districto.

Por que é que é sr. ministro, que deixa ás juntas geraes a faculdade de arbitrar os ordenados, aos empregados que careça nomear para é serviço da administração districtal, não deixou ás mesmas corporações o direito de estabelecerem ellas mesmos vencimentos aos conselheiros de districto, se entendessem que os deviam remunerar?!

As juntas geraes é que deviam ser juizes n’esta parte, e se em todo o caso o governo entendia que os mencionados conselheiros deviam ter ordenado, pelo menos devia conceder ás juntas geraes que fossem ellas que arbitrassem esses ordenados.

Na minha opinião uma tal despeza, não devia ser obrigatoria, mas sim facultativa. Vae-se com ella crear Um mau precedente sem necessidade nenhuma.

Com referencia ás despezas locaes ainda tenho outra emenda a mandar para a mesa. Esta é tambem para tornar mais harmonico systema do projecto em discussão:

«Artigo 243.° - l.° Para execução do n.° 9.° d’este artigo deverão os instituidos, n’elle mencionados, apresentar as respectivas contas ao administrador do concelho ou bairro, e cobrar recibo d’essa entrega, mencionando-se no recibo a importancia da receita e o numero de documentos appensos.

«2.° A conta deverá será julgada no decurso do semestre que se seguir; findo, esse praso considera-se approvada.

«3.° Os orçamentos comprehenderão uma verba igual á percentagem de um por mil da receita ordinaria do anno antecedente. Esta verba, destinada á retribuir o acrescimo de trabalho occasionado pelo exame e julgamento, das contas, será entregue ao governador civil, depois de findo o processo, para ter a applicação conveniente.

«4.° Ficam isentos de pagar a referida percentagem os institutos, cujo rendimento annual for inferior a 1:000:000 réis = Vaz Preto.»

Já vê a camara que tenho em vista applicar com relação ás despezas das camarás, municipaes a mesma doutrina que propuz a respeito dá separação das despezas districtaes, das que devem ser propriamente da responsabilidade do poder central.

As camaras municipaes, assim como os districtos, não devem satisfazer as despezas feitas com as repartições dirigidas pelos agentes do governo. Só devem pagar as que são exclusivamente do municipio, e n’estas não se devem contar as que se fazem com a casa e mobilia para a secretaria da administração do concelho, e outras que vem designadas no projecto.

Sr. presidente, vou concluir, porque já demasiado longas vão as minhas considerações, é concluo por um pedido ao illustre relator da commissão. Rogo a s. exa. que usando das suas immensas faculdades intellectuaes, do seu muito saber, illustração e pratica d’estes assumptos de queremos estado a occupar-nos, e compenetrando-se bem da necessidade de melhorar este projecto; e pol-o quanto possivel em conformidade com as doutrinas que s. exa. professa, e que tão bem consignou na sua reforma administrativa, que tanta honra lhe faz, empregue no seio da commissão toda a sua influencia e diligencia para que, este codigo, que vamos votar, sáia com as menos imperfeições possiveis.

Não sou dos que desejam mais as reformas radicaes promptas e immediatas porque essas reformas radicaes, prom-

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ptas e immediatas, trazem sempre obstaculos e grandes difficuldades, e custam a executar, e são quasi impossiveis quando o terreno não está preparado.

V. exa. sabe perfeitamente o que se tem passado no paiz com a introducção do novo systema de pesos e medidas; e deve tambem saber porque é que essa reforma tem encontrado difficuldades para ser levada a effeito na sua totalidade e em todos os pontos do reino. É porque nós fomos buscar o systema lá fóra e tal qual lá o encontrámos, e assim o quizemos logo introduzir aqui, sem attendermos que o terreno não estava preparado, e alem disso sem o apropriarmos ao nosso systema.

Para serem bem recebidas certas reformas, é necessario fazel-as conhecer de forma que as localidades se vão acostumando áquellas idéas e as recebam sem dificuldades.

Sr. presidente, parece-me pouco acertado fazer muito de repente, quando a opinião publica não vae para ahi, nem o terreno está preparado. Ha um rifão popular que diz assim: «de vagar que tenho pressa». O mesmo digo agora pelo que respeita á reforma administrativa. Se querem chegar ao fim desejado, vão pouco e pouco introduzindo novos melhoramentos no codigo actual.

O sr. Sequeira Pinto: — Mando para a mesa o parecer da commissão encarregada de examinar a carta regia que nomeia par do reino o sr. dr. Mamede.

Leu-se na mesa e é do teor seguinte.

Parecer n.° 316

Senhores. — A commissão especial nomeada para examinar a carta regia que eleva á dignidade de par do reino o exmo. sr. Joaquim Gonçalves Mamede, tendo verificado o respectivo diploma conforme prescreve o artigo 94.° da carta constitucional da monarchia, cumprida a disposição do artigo 110.° da mesma carta, e bem assim que na pessoa nomeada concorrem as condições legaes necessarias:

E por isso de parecer que está nos termos de ser admittido a tomar assento na camara, prestando previamente o juramento do estylo.

Sala da commissão, em 10 de abril de l818. = Diogo Antonio Correia de Sequeira Pinto = Bancos e Sá = Jayme Larcher.

Foi approvado.

O sr. Presidente: — Consta que o digno par, novamente nomeado, está nos corredores da camara. Por conseguinte peço aos dignos pares Sequeira Pinto e Jayme Larcher que tenham a bondade de o introduzir na sala.

Foi introduzido na sala com as formalidades do estylo, prestou juramento e tomou assento.

Leu-se a carta regia da sua nomeação.

«Joaquim Gonçalves Mamede, do meu conselho, lente de prima jubilado da faculdade de mathematica na universidade de Coimbra, presidente da camara dos senhores deputados da nação portugueza, amigo. Eu El-Rei, vos envio muito saudar. Tomando em consideração os vossos distinctos merecimentos e qualidades: hei por bem, tendo ouvido o conselho d’estado, nomear-vos par do reino.

«O que me pareceu participar-vos para vossa intelligencia e effeitos devidos.

«Escripta no paço da Ajuda, em 8 de abril de 1878.= EL-REI. = Antonio Rodrigues Sampaio.

«Para Joaquim Gonçalves Mamede, do meu conselho, lente de prima jubilado da faculdade de mathematica na universidade de Coimbra, presidente da camara dos senhores deputados da nação portugueza.»

O sr. Visconde de Bivar: — Mando para a mesa o seguinte parecer.

(Leu.)

Mandou-se imprimir.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Sr., presidente, mando para a mesa um requerimento, no qual peço alguns esclarecimentos ácerca de um projecto de lei, que eu reputo,

muito importante, e que está já dado para ordem do dia; é sobre a venda dos pinhaes.

«Requeiro que, pelo ministerio das obras publicas, se remetta a esta camara um relatorio do estado em que se acha o pinhal real de Leiria, bem como as matas e outros pinhaes que estão debaixo da administração das obras publicas.

«Em 10 de abril de 1878. — Visconde de Fonte Arcada.

Foi mandado expedir.

O sr. Ministro do Reino (Rodrigues Sampaio): — Sr. presidente, eu pensava que tinha respondido ao digno par o sr. Vaz Preto, porque quando usei da palavra fiz tudo quanto podia para satisfazer s. exa.; vejo porém que o não consegui e sinto-o, porque desejava ser-lhe agradavel.

Ha uma grande infelicidade para mim a proposito d’este projecto. Propuz uma circumscripção mais larga, e levantaram-se todas as iras contra mim.

Disseram que eu ia excitar as paixões da localidade, crear difficuldades ao governo e incommodar os povos! Obrigado a acceitar o parecer da commissão e o voto da camara dos senhores deputados, venho para aqui e sou combatido porque não fiz essa circumscripção que tantos incommodos se dizia havia de trazer á administração. Verdade d’áquem erro d’alem. É triste uma situação assim. Póde parecer que não ha verdade nem cousa certa.

Eu tinha querido n’este projecto que a area dos concelhos fosse igual á das comarcas.

O sr. Vaz Preto: — Eu ía bem.

O sr. Ministro do Reino: — Mas quando eu ia bem, diziam que ía mal, e quando acceitei aquillo que pediam, é rejeitado tudo aquillo que proponho. É infelicidade minha! Comtudo creio que tanta é a justiça d’esta causa, que ella ha de triumphar.

Eu já declarei que não podia dizer quaes as despezas que os districtos teriam de pagar em virtude d’esta lei, a não ser as que o projecto marca, isto é, o vencimento dos vogaes da commissão districtal e do conselho de districto.

Quanto ás outras despezas são eventuaes. Os districtos hão de querer melhoramentos, que têem de pagar, e eu não sei quaes os melhoramentos em que os districtos hão de tomar a iniciativa, e por consequencia não posso dizer ai. despezas que hão de fazer.

O sr. Vaz Preto: — Se s. exa. me dá licença, direi que a minha pergunta não foi sobre essa parte. Referi-me ás despezas que fazem actualmente os districtos, e que hoje estão a cargo do thesouro, as quaes em virtude d’este codigo hão de ir pesar sobre os districtos. Ha por exemplo a despeza com os alugueis das casas onde funccionam as repartições dirigidas pelos agentes do governo, como são as dos governos civis, as despezas de mobilia, etc.

Não é o governo que paga hoje a instaucção publica, e por este codigo não terão os districtos de concorrerem para essas despezas?

O sr. Ministro do Reino: — Que instrucção publica decretámos nós aqui a não ser as que as juntas geraes poderem estabelecer e que necessariamente hão de pagar? Mas, o que aqui decretámos é na conformidade das leis, que hoje regulam este assumpto. Isto não é um arbitrio do governo. Por conseguinte d’este projecto não constam outros vencimentos senão os dos membros da commissão districtal e do conselho de districto.

Sr. presidente, eu não quiz nunca abater a dignidade dos conselheiros de districto.

Se é gloria para elles o servirem gratuitamente, eu não lhes contesto essa gloria.

Se se entende que devem glorificar-se por isso, não ha rasão para o não fazerem; mas parece-me bom estabelecer estas gratificações. Isto não é uma cousa que se propõe pela primeira vez.

Todos os governos que têem apresentado reformas da na.

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tureza d’esta que se discute, têem proposto gratificações aos conselheiros de districto.

Tenho aqui diante de mim uma proposta do sr. Anselmo Braamcamp, apresentada em 1864, que diz o seguinte:

«Os conselheiros de districto vencerão uma gratificação de 400$000 réis nos districtos de l.ª classe, de 350$000 réis nos de 2.ª classe e de 300$000 réis nos de 3.ª classe, pagas pelo cofre do respectivo districto.»1

Repito, isto não é novo. Poderia ser erro da minha parte, mas foi sabedoria e prudencia da parte dos meus antecessores.

Para mim nem esta gloria me póde caber, porque copiei; não fiz mais do que seguir os bons exemplos por parte dos meus antecessores n’esta reforma, que não tem sido combatida pela opinião publica.

É verdade que eu ouvi dizer aos meus adversarios na outra camara, e ouvi predizer que a reforma não passaria n’esta camara, por isso mesmo que a julgavam perfeita.

Eu não a julgo uma perfeição; ha de ter defeitos, como todas as cousas humanas; mas creio que ella melhora alguma cousa a administração publica, o que para mim já é uma grande satisfação.

Disse o digno par que - as reformas devem ser feitas a pouco e pouco; mas eu tenho sido accusado porque esta reforma está na tela parlamentar desde 1872! Não sei se a demora tem sido um bem ou um mal; o que já ouvi dizer, é que tendo ella estado ha seis annos na tela da discussão, podia ficar para mais tarde. O argumento não me parece acceitavel. Se é necessario demorai-a, já se ve que ella é um mal.

Ora, o que é mau não se adia, rejeita-se, e o que é bom, tambem não se adia, approva-se. Escolhe-se, aproveitando o que é bom e rejeitando o que é mau.

E o que têem feito os dignos pares, que têem fallado; e eu confesso que tenho gostado de ouvir as suas opiniões.

Outro grande defeito, de que é accusada esta reforma, é o de o governo abdicar as suas prerogativas. Na verdade, não pensava ouvir este argumento.

Pois um governo que tira de si attribuições e prerogativas, que podia aproveitar, póde ser accusado por um tal facto?

Não será diminuição de poder, o entregar o governo a administração do povo ao mesmo povo?

Será isto centralisar?

Creio que não. É descentralisar; é separar os poderes para todos trabalharem na grande obra da civilisação.

Já tambem um digno par accusou esta reforma por ter posto umas certas restricções aos governadores civis, ficando elles privados ... Engano-me. Não ficaram privados de cousa nenhuma, porque a garantia que se dá agora é a de ouvirem um corpo que funccione junto d’elles, um corpo formado de membros que ella tem indicado e um conselho cujo voto podem não seguir.

Esta tyrannia para mim é honrosa, este desprendimento de uma prerogativa do poder creio que não póde ser condemnado, pelo menos pela opinião publica, que não é formada só de deputados, de pares do reino e de escriptores publicos.

Por isso eu acceitei como gloria essa restricção, que dizem que eu ponho ao poder do governo. Não é preciso que lha venha arrancar, elle mesmo a larga em beneficio da liberdade.

Um digno par quer uma reforma radical, que ao mesmo tempo reformasse a lei do recrutamento e a leis sobre as corporações de beneficencia publica, e declarou que, depois d’estas reformas, é que se devia fazer a reforma administrativa. Outro digno par entende que as reformas se deviam fazer pouco a pouco. Isso era mais prudente, mas é preciso tambem saber, para que estas medidas sejam exequiveis, por onde se ha de começar e por onde se ha de acabar.

Nós não podemos estar cada anno a fazer um poucochinho de reforma administrativa.

Esta reforma é, como todas as reformas d’esta natureza, um corpo de providencias para reger cortas corporações populares. Por isso não póde vir de cada vez um retalho, não póde ser, ha devir toda de uma vez, ou como está ou de outra qualquer forma.

A reforma do sr. Mártens Ferrão tambem não era para se executar a pouco e pouco, veiu de uma vez, e veiu perfeitamente. Se nós fossemos a reformar hoje uma cousa, no anno seguinte outra, e assim successivamente até completar-se a, reforma, quando chegássemos ao ultimo ponto d’ella aconteceria como antigamente acontecia nos nossos arsenaes, que, quando se chegava a acabar de metter o mastro n’uma embarcação, já estava podre.

O sr. Vaz Preto: — É o que succede a esta medida.

O sr. Ministro do Reino:- Eu não posso prever de tão longe as desgraças futuras. Eu não fallo em nome da opinião publica, fallo em meu nome; a opinião publica póde ser differente.

O que póde parecer conveniente a uns, póde parecer inconveniente a outros.

Dizem alguns dignos pares que a opinião publica não acceita esta reforma.

Pelo menos, a mim não me consta que tal facto se de, nunca recebi representação alguma contra ella, nunca vi, n’esse sentido, indicação feita pela imprensa adversa ao governo, a qual accusa mais a minha demora do que a minha impaciencia.

E eu declaro que tenho alguma impaciencia. Encontro-me no caso de quem deseja acabar uma obra, e que está sempre impaciente por que ella chegue ao seu termo. Já se dizia de Cesar: Nil actum credens, guum quid superesset agendum. Parece-me que o iniciar é bom, más o concluir é melhor. Se o digno par, a quem estou respondendo, quizesse ser-me agradavel, de certo concorreria para que tambem eu conseguisse a conclusão da minha obra.

A respeito de todos os alvitres, que têem sido apresentados durante o debate, era uma imprudencia se agora me pronunciasse de qualquer maneira.

Sendo só eu que decidisse, tinha evitado esta discussão que já vae tão larga. Mas não póde ser assim. Ha primeiramente necessidade de ouvir a commissão, que deve dar parecer sobre todas as propostas de emendas mandadas para a mesa. Portanto, não quero arriscar-me a dizer ámanhã o contrario do que estou dizendo hoje. Todavia, não julgo uma vergonha reconsiderar, e tanto, que reconsiderei ácerca de alguns pontos d’esta reforma; vergonha julgaria eu, errar conscientemente. (Apoiados. — Vozes: — Muito bem )

Quero sempre escolher o melhor, venha de onde vier. (Apoiados. — Vozes: — Muito bem, muito bem.)

Com este procedimento, de que me honro, estou resolvido a affrontar todos os labéus da contradicção.

Se quizerem contradizer-me, contradigam-me, lembrando que na camara dos senhores deputados propuz uma larga circumscripção e acceitei as circumscripções desiguaes. Porque? Porque attendi primeiro que tudo á ordem publica, que se julgava podia ser de alguma fórma compromettida pela nova divisão territorial.

Cedi com pezar a essa consideração, porque o meu ideal era que em cada comarca houvesse um recebedor, um administrador e um juiz: queria todos estes funccionarios no mesmo local. (Apoiados.) . Não o pude conseguir.

Desgraçado d’aquelle que ve antes de tudo a propria opinião, que póde ser boa, póde ser util, mas precisa sempre de uma condição: ser acceita por todos.

Ainda que eu fosse omnisciente não teria a pretensão de impor o meu voto a todos.

Legislâmos para o povo, legislâmos para nós mesmo, e portanto devemos legislar á vontade de todos. N’esta parte, e por esta rasão, podem notar contradicções entre o que tenho escripto e quaesquer doutrinas sustentadas depois pela necessidade de transigir no bem geral.

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Eu não tenho mais nada a acrescentar, declarando todavia que me tocou profundamente o ser accusado de impaciencia; no emtanto, dadas as explicações necessarias, tudo o que acrescentasse seria prejudicar o projecto, protrahindo uma discussão que é aliás muito agradavel para mim.

Nada mais tenho que dizer.

O sr. Marquez de Vallada: — Não póde prestar o seu apoio á reforma administrativa proposta, porque entre varios inconvenientes que notou n’ella, tambem a considera vexatoria para o povo, o que tratou de demonstrar.

O sr. Marquez de Sabugosa (sobre a ordem): — Sr. presidente, em uma das passadas sessões procurava eu fundamentar as emendas que tinha mandado para a mesa, mas como o meu estado de saude me não permittiu continuar, abreviei quanto pude as considerações que tinha a fazer. Desejo pois continuar agora nas considerações que ainda me restam a fazer, o que hei de fazer em poucas palavras, porque o assumpto está esgotado e a camara satisfeita coro as rasões que se têem apresentado pró e contra e não quero tomar-lhe mais tempo.

Eu pedi a palavra na occasião em que o sr. ministro do reino estava respondendo ao sr. marquez de Vallada.

S. exa. o sr. ministro disse: que não foi buscar á Granja, mas que a Granja é que fora ter com o sr. ministro.

Eu não desejo levantar uma questão politica no meio de uma discussão tão importante; mas duas palavras apenas parece-me que me serão permittidas.

Sr. presidente, a Granja não foi ter com o sr. ministro; mas como a Granja não trata de etiquetas, defendia certas idéas, que são professadas pelo sr. ministro, quando a Granja as julgava convenientes, porque a Granja estima sempre ir para onde ve levantada a bandeira da liberdade e do progresso. Por consequencia não deveria ter s. exa. proferido aquellas palavras.

Eu não direi tambem, quando me ir obrigado a fallar no partido regenerador, o partido da penitenciaria,

O que é certo é que a Granja não é mais do que a reunião dos partidos historico e reformista; e esta juncção teve logar em 1877.

E verdade tambem que o sr. Antonio Rodrigues Sampaio tinha sido em 1869 presidente de uma commissão nomeada para tratar da reforma administrativa, que intentava fazer o partido historico então no poder sob a presidencia do sr. duque de Loulé; o sr. Sampaio foi convidado para esse fim pelo mesmo partido, que via em s. exa. um homem eminentemente liberal que militava nas suas fileiras.

Não fallarei das occasiões em que o partido progressista tem deixado de acompanhar o sr. Sampaio; podem-se até certo ponto registar pelos actos de s. exa.

Disse o sr. ministro do reino que n’este projecto de reforma administrativa ha principios liberaes. Não o contesto, e estou prompto a approvar o que for verdadeiramente doutrina liberal; mas não posso deixar de notar que, estando consignados taes principios na sua proposta, s. exa. parece ter-se esquecido d’esses principios, deixando essa reforma descansar seis annos na outra camara.

O sr. ministro do reino disse tambem com respeito a esta reforma que a Granja é que foi ter com s. exa. Acho que n’esta parte ha uma certa contradicção nas idéas do sr. ministro do reino confrontadas com as do sr. presidente do conselho; porque emquanto o sr. Fontes diz que detesta a Granja, o sr. Sampaio, se não vae ter com ella ou com o seu programma, pelo menos acceita principios n’elle contidos e que s. exa. reconhece serem liberaes.

Não continuarei a tratar d’esta questão incidente. Quiz simplesmente expender estas breves reflexões que acabo de apresentar á camara, os quaes terminarei, declarando que estimei muito ouvir hontem o sr. ministro do reino, quando mostrou recordar-se dos seus tempos antigos em que defendia os foros populares, e disse ao sr. marquez de Vallada que este codigo era a bem do povo, e o povo não havia de abusar d’elle. Repito, estimei muito ouvir estas palavras ao illustre ministro. O que não estimei foi ver o excesso de modestia com que s. exa. concluiu o seu discurso, dizendo que não queria glorias para a si, nem tinha vaidades, e por isso não desejava que se julgasse que com o seu projecto só queria satisfazer o seu amor proprio, quando não tinha em vista senão o bem da patria.

O sr. ministro deixou pois todas as vaidades e glorias para o sr. presidente do conselho, e não sei se fez bem. O que eu desejava era que o antigo tribuno popular, o homem de robusta fé politica podesse dizer, quando sentado n’aquellas cadeiras aonde vejo hoje o sr. Antonio Rodrigues Sampaio, quando chegado ao fastigio do poder, podesse dizer o mesmo que S. Paulo disse a Timotheo.

Desejava que o sr. Sampaio tivesse dito d’ali: Pelejei a grande batalha, a minha carreira está no seu auge, mas conservo sempre a mesma fé.

Desejava ouvir isto.

Sr. presidente, eu já disse em uma das sessões passadas que approvava na generalidade o projecto em discussão, e approvo-o porque me parece que a lei é favoravel tanto aos principios da liberdade, como aos principios da descentralisação administrativa. Tanto uns como outros são convenientes, e por consequencia hão de ser bem acceites pelo paiz.

A descentralisação não é a communa, como muitos julgam; a descentralisação administrativa combinada com a descentralisação politica, não são essas reformas de Belle-ville, que, longe de serem um elemento de ordem, são um elemento de desordem.

Não me alargarei na apreciação d’estas doutrinas, para não cansar a camara, nem mesmo o posso fazer, porque me sinto bastante incommodado.

É pois n’este sentido, sr. presidente, que eu approvo este projecto. Julgo-o um principio descentralisador, e por isso mandei para a mesa algumas emendas por não concordar com alguns dos seus artigos, que estão em contradicção com esse principio descentralisador, que eu entendo que se deve estabelecer n’este codigo.

Permitta-me tambem a camara que lhe diga que considero de grande conveniencia o facto de não ter a camara dos senhores deputados approvado a circumscripção que se propunha. No caso de se querer pôr em execução este codigo, a circumscripção administrativa havia de encontrar grande reluctancia, porque o concelho é uma circumscripção natural, e a principal de todas, e tem creado raizes para os membros d’elle, que se não podem facilmente quebrar.

Parece-me, portanto, que foi de grande utilidade não se ter acccitado a circumscripção administrativa.

Algumas das emendas que tinha mandado para a mesa são no sentido de combinar o facto do governo ter acceitado a circumscripção existente com a conveniencia de se procurar obter um resultado, que tenda a alargar essa circumscripção, tornando-a mais regular. A minha primeira emenda, que eu mandei para a mesa, refere-se ao artigo 3.°, e é para que o governo possa annexar provisoriamente um concelho a outro, quando algum, deixasse de satisfazer durante dois annos os seus encargos obrigatorios. Parece-me que d’este modo, pela juncção de dois concelhos, como propunha o sr. Mártens Ferrão na sua reforma administrativa, se poderá ir realisando parcialmente o que não se póde realisar por meio da circumscripção feita por uma só vez.

Sr. presidente, um dos pontos sobre que mais se tem fallado n’esta discussão é o da conservação ou não dos parochos como presidentes da junta de parochia. A parochia no principio foi, sobretudo, uma circumscripção ecclesiastica, que depois se entendeu dever secularisar-se como se estatuia na reforma do sr. Mártens Ferrão. Entendo que essa secularisação da parochia, embora se conserve, não deve impedir que o parocho tenha intervenção em alguns dos negocios parochiaes em que essa intervenção é indispensavel. Acho, pois, muito bem a emenda que mandou para a mesa o digno prelado de Bragança, com relação á

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parte do projecto que trata das juntas de parochia. Parece-me que s. exa. marcou exactamente as circumstancias em que se devia adoptar a intervenção do ministro do altar, consignando no projecto uma disposição, segundo a qual o parocho, sem entrar nos negocios puramente civis, fosse ouvido em tudo aquillo que dissesse respeito á igreja em que é indispensavel o seu conselho e o seu voto. (Apoiados.)

Querendo-se fazer da parochia uma circumscripção civil ao menos conserve-se á presidencia do parocho.

Parece-me que isto não é zêlo demasiado.

Já ouvi a uns, a respeito d’esta reforma, elogiar o governo porque as juntas geraes ficam sendo eleitas directamente pelo povo, e a outros fazer-lhe censura por isso.

Na carta constitucional está estabelecida a eleição directa para a camara dos senhores deputados, e eu entendo que, por analogia, bom era se estabelecesse tambem no codigo o mesmo modo de eleger para as juntas geraes.

Acceitando o principio da eleição directa e, ainda mais, quando ella seja aperfeiçoada pela representação das minorias, porque esse principio é doutrina do partido liberal, confesso que me associo ás idéas que o sr. Vaz Preto apresentou quanto á eleição indirecta. Effectivamente o meu espirito inclina-se a que a eleição por esta forma seja a expressão mais verdadeira do voto.

O que se deseja na eleição de deputados? Que todos os cidadãos concorram para assegurar que sejam perfeitas as leis de que ha necessidade, e bem fiscalisados os negocios publicos.

Ora, na verdade, nem todos estão habilitados para tanto; porem, o que todos podem é dizer: eu tenho confiança num certo individuo que conheço.

Parece-me, pois, que seria conveniente a eleição directa só até aos cargos municipaes, e que d’ahi para cima fosse indirecta.

O censo da confiança publica era um grande censo para se fazerem as eleições. E quando este systema d’esse mau resultado, o eleitor só tinha a queixar-se de si. E tambem verdade que estamos hoje a gritar contra as demasias do poder, quando deviamos clamar igualmente contra o mau uso que o povo faz do seu voto. De um lado, dizem-lhe que vote em José ou Francisco, que elle não conhece; de outro lado, offerecem-lhe um premio para votar em nome diverso. De sorte que o eleitor só quer saber do premio, e pouco se importa de desconhecer completamente em quem vota, praticando por conseguinte um acto inconsciente.

Eu desejaria que alguns dos artigos que estão n’este projecto fossem eliminados, por não me parecerem conformes com o espirito do codigo.

Um delles é aquelle a que se referiu o sr. marquez de Vallada com relação aos administradores do concelho continuarem a ser juizes nas execuções administrativas.

Eu desejava que essa disposição desapparecesse, bem como as execuções administrativas, pois desejava que na parte que se refere a direitos individuaes a alçada passasse para o judicial.

Eu poderia citar a opinião auctorisada do sr. conde de Valbom, consignada no seu livro de administração com respeito aos impostos municipaes, é escudar-me com essa opinião; mas limito-me a ponderar que o dar tambem esta faculdade as juntas de parochia é conceder a muitos corpos administrativos o direito de tirar do mesmo paciente muitos impostos, o que de certo será muito difficil.

Em todo o caso ainda que se não attenda a outra cousa, deve attender-se ás emendas ao artigo 123.°, e principalmente ás que dizem respeito aos seus dois §§, que estão em contradicção com a lei do real de agua, que se votou aqui ha bem poucos dias.

Sobre este assumpto parece-me que o sr. ministro da fazenda deve dizer alguma cousa.

Na lei do real de agua, que foi apresentada pelo governo transacto, ao qual v. exa. presidia, havia uma disposição para que fizessem declarações os productores do vinho. O governo actual substituiu esse imposto pelo de transito, por julgar inconvenientes essas declarações dos productores.

Ora, se o governo julgou inconvenientes essas declarações e as fez desapparecer do projecto do real de agua, porque as faz resuscitar por este artigo e em peiores condições?

Ha aqui uma contradicção manifesta, sobre a qual me parece conviria que o sr. ministro dissesse o seu modo de ver n’este ponto.

Nada mais acrescentarei, e peco á camara que me desculpe o tempo que lhe tenho tomado.

(O orador não reviu o seu discurso.)

O sr. Presidente: — Vão ler-se oito mensagens que vieram da outra camara.

Leram-se na mesa e são as seguintes:

Oito officios da presidencia da camara dos senhores deputados, remettendo as seguintes propostas de lei:

1.° Approvando a convenção entre Portugal e a Italia para a reciproca extradição de criminosos.

A commissão de negocios externos.

2.° Approvando o tratado de commercio e navegação entre Portugal e a Grecia, em 12 de janeiro de 1877.

A commissão de negocios externos.

3.° Approvando o tratado de commercio e navegação entre Portugal e a Hespanha.

A commissão de negocios externos.

4.° Sobre o orçamento rectificado da receita e despeza do estado no corrente exercicio.

A commissão de fazenda.

5.° Auctorisando o governo a organisar uma escola de cavallaria.

As commissões de guerra e fazenda.

6.° Fixando em 360$000 réis o ordenado do escrivão interprete da estação de saude de Setubal.

A commissão de fazenda.

1° Auctorisando a camara municipal de Alcacer do Sal a applicar a quantia de 3:000$000 réis á construcção de uma ponte e reparação dos caminhos municipaes.

A commissão de obras publicas.

8.° Concedendo ás praças de pret que pertenceram ao exercito libertador e que desembarcaram nas praias do Mindello o beneficio concedido pela lei de 11 abril de 1847.

As commissões de fazenda e guerra.

O sr. Visconde de Bivar: — Requeiro a v. exa. que seja prorogada a sessão até se votar este projecto.

O sr. Presidente: — Vou submetter o requerimento do sr. visconde de Bivar á approvação. da camara.

Consultada a camara, resolveu que fosse prorogada a sessão até se votar o projecto.

O sr. Palmeirim: — Mando para a mesa um parecer da commissão de fazenda.

Lido na mesa foi a impremir.

O sr. Ornellas: — Pedia a palavra simplesmente para mandar para a mesa uma emenda ao artigo 57.° do projecto em discussão, emenda que tive occasião de justificar hontem, mas que não mandei por a não a ter ainda formulado.

Esta emenda refere-se á auctorisação dada ao governo para completar os orçamentos das juntas geraes, o que parece contrario aos principios estabelecidos; comtudo como acabo de ouvir um digno par, que pertence ao partido progressista, tratar de variadissimas pontos do projecto em discussão, sem se referir a este, parece-me que não poderei ser accusado de trop de zèle fazendo esta proposta.

Leu-se e é a seguinte:

Proposta

Proponho a seguinte emenda ao artigo 67.° Depois da palavra «governo» leia-se «deverá propor ás côrtes o augmento do imposto necessario para estabelecer o equi-

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librio do orçamento». Camara, 10 de abril do 1878. = O par do reino, Ornellas

Foi admittida á discussão.

O sr. Marques de Sabugosa: — Peço u palavra para uma pequena explicação.

O sr. Presidente: — Tem v. exa. a palavra.

O sr. Marquez de Sabugosa: — Parece-me que a emenda do digno par se refere ao artigo 67.°, e a esse artigo tambem eu já apresentei uma emenda.

O sr. Ornellas: — Então peço desculpa.

O Orador: — Estimo muito ter-me encontrado com a opinião do digno par.

O sr. Carlos Bento: — Sr. presidente, chegou-me tarde a palavra, e por isso não pude mais cedo manifestar a expressão de uma impressão agradavel.

Creio interpretar os sentimentos de todos os menu collegas, congratulando a camara pela entrada do sr. dr. Joaquim Gonçalves Mamade, (Apoiados.) o qual, depois de ter exercido por muitos annos um cargo que mostrava a plena confiança, que n’elle depositava a camara electiva, mostrou que a inspirava tambem ao poder moderador, pelo que eu o felicito. (Apoiados.)

Sr. presidente, estou persuadido que o sr. ministro do reino, assim como esmerou que na outra, camara se estudasse este projecto, e cedeu do principio da nova circumscripção administrativa, ha de levar tambem a sua condescendencia ao ponto de não se oppor a qualquer modificação que a illustre commissão de administração publica haja de fazer no que diz respeito no systema tributario d’esta reforma: pois me parece que não é na occasião em que o sr. ministro na fazenda faz passar mu projecto relativo ao imposto do consumo, consignando cortas disposições, que nós devemos adoptar outras inteiramente oppostas! Se tal acontecesse provar-se-ia que desejavamos a desordem não só lá fóra, mas aqui doutro, porque o poder legislativo estava votando disposições em desaccordo umas com as outras,

Muito bem alludiu o digno par, sr. marquez de Sabugosa, ao § 2.° do artigo 123.º, na parte que confere aos corpos municipaes o direito do exercerem fiscalisação nos generos consumidos pelos productores, proveniente da sua propria producção.

Esta disposição, que se quer apresentar como um melhoramento, não é mais do que a renovação do um regimento que conta mais de duzentos annos, que data de 1643, com a differença unica de se conceder agora aos corpos municipaes, o que n’aquella epocha se concedia ao poder executivo.

Estou persuadido que o nobre ministro do reino cederá n’este ponto, e em muitos outros que têem relação com a parte financeira do projecto, tanto mais quanto é certo, que a proposta mandada para a mesa pelo nosso illustre collega, sr. Paiva Pereira, dignissimo presidente do tribunal contas, significa a adopção dos principios consignados na legislação dos paizes mais cultos, e mais adiantados n’estes assumptos.

O governo, que tem no seu seio tres dos mais distinctos membros do tribunal de contas, não deixará, certamente, de approvar a proposta apresentada pelo sr. Paiva Pereira.

Se adoptarmos a disposição estabelecida no § 2.° do artigo 123.° do projecto, não só retrogradámos para 1843, mas ficarão as leis que fizemos em manifesta contradicção.

A lei de 10 de julho de 1845 marcava o maximo que poderia elevar-se a taxa sobre as contribuições.

Eu não faço elogios nem ao Rei nem ao povo, porque entendo que o elogio quando não é opportuno é a lisonja, e a lisonja é a hypocrisia do elogio; não direi tão pó aço se o povo póde pagar ou não o imposto local em harmonia com as necessidades do imposto geral para o estado; mus não me vexo em seguir n’esta parte o exemplo da, França, da Belgica e da Hollanda, e quando se aponta o exemplo da França, com as fórmas de governo que têem sustentado os termos limitados do imposto, nada ha de suspeito, imposto que existiu na monarchia, no imperio e na republica; todas as ires formas de governo entenderam que não deviam deixar de marcar os limites na quota.

Se elle fosse moderno, poderia fazer-se que era escoltado pela republica, mas não senhores, como disse já, existiu na monarchia e no imperio.

Eu creio que o nosso imposto será pelo menos mantido como está, e confio que a illustre commissão ha de fazer com que este projecto saia completo e o mais perfeito possivel, e quando digo completo, não quer dizer que saia inteiro tal qual elle se acha, pois carece de ser melhorado n’este ponto financeiro, onde eu entendo que todas as modificações redundarão em melhoramento.

Uni digno par disse que se tratava de uma experiencia, eu peço á camara que tome nota disto, porque não vejo necessidade nenhuma de tal experiencia.

O illustre relator quiz ser modesto; mas eu direi a s. exa. que quando se tem merecimento, e, modestia não é boa conselheira, polo contrario.

Continuando, porém, peço perdão ao digno par para lhe dizer que não se trata de experiencia alguma, trata-se sómente de aggravar o que se tem feito até agora.

S. exa. sabe que a idéa da limitação deixe imposto não é moderna, e em meu reforço ha um documento de 1867, que serviu de modelo para este, e que é propriedade de s. exa., que julga necessario marcar aquelle limite.

O sr. presidente do conselho, em relatorio seu de 1867, deu attenção aos innumeros inconvenientes que havia, dos quaes resulta a necessidade de marcar o limite, e o sr. Mártens Ferrão entendeu, e entendeu muito bem, que havia necessidade de o marcar.

Sr. presidente, eu sinto-me com tanta rasão, que julgo desnecessario insistir mais n’este ponto.

O sr. Vaz Preto (sobre a ordem): — Sr. presidente, a camara resolveu que este projecto não fosse discutido por titulos, e por isso as questões têem sido tratadas confusa e embaraça demente, e isto tudo em resultado da resolução tomada.

Agora a, camara, para acabar mais depressa com a discussão, resolve que se prorogue a sessão até se votar o projecto.

Vejo que a camara tem a sua opinião formada e que não quer que nós nos esclareçamos, nem que se nos de por parte do governo explicações ácerca de um assumpto tão momentoso.

Sr. presidente, eu sei o modo como facilmente responder a esta violencia da camara, e impedir que esta sessão se não votasse hoje, era fallar todo o tempo que a questão durasse, o que não me seria difficil, mas como eu só tenho tomado a palavra para manifestar as minhas idéas e não para embaraçar, e como o meu desejo é que se remedeiem os inconvenientes que resultam d’este codigo, por isso entendo de alta conveniencia larga discussão, e que fossem ouvidos os dignos pares que tiverem duvidas.

V. exa. e a camara ouviram o que disse o digno par o sr. marquez de Sabugosa, e já tinham ouvido tambem o que no mesmo sentido tinha dito o digno par o sr. Carlos Bento. E tudo isto não mostra quanto esta questão é importante?

Sr. presidente, faço esta declaração para que a responsabilidade das suas deliberações vá a quem toque. Voltemos ao assumpto.

O sr. ministro do reino disse-nos que tinha proposto uma circumscripção, que era a base d’este projecto, mas diz tambem que a commissão o convenceu de que ella não era conveniente. Sr. presidente, eu respeito a opinião do sr. ministro; mas permitta-me s. exa. que lhe diga, que os governos têem principios e idéas, e quando esses principios o essas idéas não são bem recebidas largam-se essas cadeiras

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e deixam governar aquelles que têem outras idéas. Pois s. exa. tem principios, que julga bons, e sacrifica-os a outros que julga maus? É o systema das transigencias.

Não devia transigir quando as suas idéas não encontravam acceitação. Isso era muito mais digno, muito mais nobre.

Quando se trata apenas de uma questão de fórma, ainda vá que um ministro ou um politico qualquer transija; mas quando se apresenta uma alteração que destroe um projecto pela sua base, que lhe muda a natureza, não se transige nunca.

S. exa. disse-nos o que se tinha passado, mostrou as difficuldades que tinha encontrado e que o levaram a transigir. Ora, um homem d’estado, um politico, guia-se sempre pelas suas idéas, que devem traçar o programmado governo, e não as sacrificar á conservação no poder.

Cumpre-me agora responder a um outro ponto, em que tocou o sr. ministro do reino» Disse s. exa. que não havia encargos a mais para os municipios senão nos ordenados de 900$000 réis para os conselheiros de districto.

Eu vejo, sr. presidente, que o sr. ministro entende muito pouco o codigo que se está discutindo, apesar de ser obra sua, ou obra por elle adoptada. Pois n’esse codigo não se estabelece quaes são as despezas dás camaras municipaes e das juntas de districto? E n’esse codigo não se diz tambem quaes são as despezas obrigatorias e quaes ás que hão são obrigatorias?

Não sabe s. exa. que a cargo do thesouro hoje existem despezas, que passarão para os districtos e que serão obrigatorias?

Não são obrigatorias, por exemplo, as que se fazem com as casas e mobilia onde funccionam as repartições dos governos civis, a do recenseamento geral da população, etc.? Essas passam conforme a letra d’este projecto para os districtos, e por consequencia ficam sendo encargos obrigatorios a que necessariamente os cofres locaes têem de satisfazer.

N’este presupposto, perguntei eu ao sr. ministro do reino em quanto reputava a somma d’essas despezas que se deslocavam do orçamento do estado para irem figurar nos districtaes e municipaes? S. exa. respondeu-me de uma fórma tal que parece não comprehender bem a minha pergunta.

Tambem alguma cousa disse o sr. relator da commissão com respeito a esta minha pergunta, mas declaro que igualmente não fiquei mais esclarecido que pela resposta do sr. Sampaio.

Emquanto o sr. ministro do reino declara que esses encargos não existem, o sr. Mártens Ferrão diz que elles se não podem calcular, porque para o fazer era preciso conhecer quaes eram as despezas.

Vê-se, pois, que não estão de accordo s. exas., eu por certo não sei combinar as suas asserções. Por consequencia muito estimaria que melhor me elucidassem n’este ponto que me parece importante.

O sr. ministro do reino, para defender a disposição do projecto com relação aos ordenados dos conselheiros de districto, disse que seguiu n’esta parte os exemplos dos seus antecessores, que propozeram reformas administrativas, os quaes haviam tambem apresentado a idéa de remunerar os vogaes do conselho de districto. Não me parece que esta rasão possa auctorisar o procedimento de s. exa. Se outros praticaram mal, segue-se que o sr. ministro os deva imitar,?

A questão não é o que outros ministros fizeram eu propozeram, mas sim se a cousa é boa ou má.

Com relação a este ponto, quer dizer, aos ordenados dos vogaes do conselho de districto, tenho ainda a expor, ou o sr. ministro entende que estes funccionarios são do governo, e então é o poder central que lhes deve pagar, ou são do districto, e n’esse caso compete deixar as juntas geraes livres para fazerem o que entenderem.

Não está claro. Se o governo pelo simples facto de nomear entende que são empregados seus, pague-lhes; se entende o contrario, deixe ás juntas geraes a faculdade de serem ellas quem arbitrem os vencimentos aos conselheiros de districto.

E isto que digo com relação aos vencimentos dos vogaes do conselho de districto, applico da mesma sorte aos ordenados dos membros da commissão districtal.

Esta commissão é eleita pela junta geral do districto, é a sua commissão executiva; compete-lhe unicamente tratar de assumptos districtaes, que não têem nada com o poder central. Logo, as juntas geraes. é que deviam tambem arbitrar a dotação da commissão districtal, e não o governo, que assim vae de algum modo entrar em attribuições que lhe não competem. Na verdade, não posso comprehender este systema que o sr. ministro do reino pretende estabelecer.

O illustre ministro disse tambem que eu o accusava de demasiado descentralisador. Eu não fiz esta accusação. Só tive em vista mostrar a necessidade de separar bem as attribuições do poder central das do poder local, e de, ha ver ao mesmo, tempo um vinculo entre os dois poderes: Aqui é que está a difficuldade da questão este é o problema que temos a resolver, e que o governo não resolve, não definindo bem as suas attribuições e ás dos corpos administrativos. Dar ás juntas geraes certas attribuições, proclamar que se lhes alargam as suas faculdades e por outro lado pôr peias ao exercicio d’essas faculdades, não sei que isto se possa chamar descentralisação.

O sr. ministro póde ter muita gloria em dizer que quer dar aos districtos a descentralisação. Eu creio que todos a querem. Mas a questão está no modo e forma por que ella seja executada. S. exa. sabe que a descentralisação completa é a anarchia e a centralisação o despotismo, e eu não quero nem uma cousa nem outra. Desejo ver conciliado o poder com a liberdade. Esta é que é a resolução do problema, e para isso é que emprego todos os meios.

O sr. ministro do reino combateu a idéa que eu apresentei, de que as reformas devem ser feitas a pouco e pouco. S. exa. entende o contrario, porque o progresso caminha, e de um dia para o outro se carece de novos melhoramentos. Ora, o que s. exa. disse tambem se póde applicar a este codigo, que não é a ultima palavra da perfeição, e que mais tarde ha de precisar de ser reformado. Precisa sel-o.

O que eu disse, é .que as reformas, para poderem ser acceites, é necessario conhecer os costumes dos povos, para assim se irem introduzindo a pouco e pouco. Quando os povos estão preparados para ellas, quando a semente está lançada á terra, quando elles têem a instrucção necessaria, é então que se podem alargar as suas attribuições, e fazerem-se reformas rasoaveis. O que eu não quero é que se proceda da forma por que se procede, sem se attender á possibilidade.

Sr. presidente, vou limitar as minhas considerações, respondendo apenas a uma observação do sr. marquez de Sabugosa. Eu declaro que estou completamente de accordo com s. exa. a respeito das eleições. A eleição directa é a que se póde dizer talvez mais liberal, em absoluto quando o eleitor exerce o seu direito com consciencia, e toma directamente uma parte na gerencia dos negocios publicos. Mas isso depende de que a instrucção dos povos esteja derramada de modo que todos tenham conhecimento dos seus direitos e deveres, para poderem votar com consciencia. Concordo pois plenamente com o sr. marquez de Sabugosa de que este systema de eleição póde ter logar quando os povos exerçam conscientemente o seu direito; mas no caso contrario a eleição directa não deve ter logar, porque não dá a verdade da representação; e só por este meio é que podemos chegar ao fim que desejamos.

Eu quero a eleição indirecta, porque na actualidade só

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350 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

por ella o eleitor votará com conhecimento de causa e com mais alguma independencia.

O sr. Mártens Ferrão: — Depois de algumas ponderações e argumentos deduzidos do que a pratica tem ensinado, observou que a lei não seria uma arma eleitoral, como não podia ter sido concebida com esse intuito.

O sr. Marquez de Vallada: — Reforçou algumas das rasões apresentadas, e quiz assim responder ao sr. Mártens Ferrão.

O sr. Presidente: — Está acabada a inscripção.

Foram mandadas para a mesa diversas emendas ao projecto que se vae votar; por consequencia entendo eu, e vejo que é essa tambem a opinião de quasi todos os dignos pares que tomaram parte n’esta discussão, e do governo, que o mais conveniente é votar o projecto na sua generalidade, sem prejuizo das emendas, que todas hão de ir á commissão, a qual ha de dar um parecer especial sobre ellas.

Quando se discutir esse parecer, os dignos pares, auctores das diversas emendas, terão nova occasião de sustental-as. (Apoiados.)

Agora vou. pôr o projecto á votação, que é só uma, na generalidade e na especialidade.

O sr. Marquez de Vallada: — Requereu votação nominal.

O sr. Presidente: — Eu vou consultar a camara sobre o requerimento do digno par; mas, repito, a votação de que se trata é unicamente da materia do projecto, sem prejuizo das emendas.

Consultada a camara, não concedeu a votação nominal.

Posto o projecto á votação, por levantados e sentados, foi approvado.

O sr. Presidente: — Está evidentemente approvado.

As emendas vão ser mandadas á commissão.

Não podemos deixar de ter sessão amanhã. (Apoiados.) Será, pois, a seguinte sessão ámanhã, 11. A ordem do dia são os pareceres n.ºs 299, 308, 298, 313, 301, 296, 303 e 288.

Está levantada a sessão.

Eram seis horas da tarde.

Dignos pares presentes na sessão de 10 de abril de 1878

Exmos. srs.: Duque d’Avila e de Bolama; Cardeal Patriarcha; Marquezes, de Monfalim, de Sabugosa, de Vallada; Condes, de Cabral, de Cavalleiros, de Linhares, da Ribeira Grande, do Rio Maior, do Bomfim; Viscondes, do Bivar, de Fonte Arcada, dos Olivaes, de Porto Covo, da Praia, da Praia Cirande, do Seisal, da Silva Carvalho, de Soares Franco; D. Affonso de Serpa, Ornellas, Mello e Carvalho, Barros e Sá, D. Antonio de Mello, Paiva Pereira, Serpa Pimentel, Costa Lobo, Barjona de Freitas, Xavier da Silva, Palmeirim, Carlos Bento, Sequeira Pinto, Montufar Barreiros, Larcher, Martens Ferrão, Braamcamp, Pinto Bastos, Vaz Preto, Franzini, Cau da Costa, Fontes Pereira de Mello.

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