470 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
projecto, que deva os direitos a que está sujeita aquella mercadoria, todos se hão de apressar, dentro dos meios de que dispõem, e da medida do seu credito, a realizar fundos para despachar na quantidade maior que poderem o genero que vae soffrer augmento de tributo.
D'aqui resulta que, se estamos muito temporariamente em epocha de vaccas gordas, dentro em pouco tempo os pastos hão de escassear, e as vaccas emmagrecer.
Se agora, por effeitos da antecipação da venda de tabaco, se vae sentir diminuição na divida fluctuante, mais tarde, e sem grande demora, ella crescerá de novo e augmentará o encargo.
Não posso censurar que a companhia de tabacos de Xabregas procurasse fazer para seu lucro uma operarão vantajosa no estrangeiro. Póde esta operação ter sido contraria aos interesses do thesouro; mas a companhia estava no seu direito; nem póde ser censurada por isso.
Eu, porém, estimaria mais que as vantagens de credito que foram obtidas por esta companhia no estrangeiro podessem servir para fins mais uteis ao paiz, por exemplo, á agricultura, á pequena industria, e ao commercio ordinario.
Emquanto a companhia de Xabregas podia realisar no estrangeiro uma grande operação a praso largo, e ao juro de 5 1/2 por cento, o nosso commercio, a nossa industria, a nossa agricultura, para obter dinheiro, tinha de o pagar a 7 por cento no banco de Portugal, que era o unico onde se podiam realisar, e ainda em mesquinhas proporções, para poucos e com difficuldade, operações de desconto. Agora, o juro n'aquelle estabelecimento baixou a 6, e esse facto de certo attenua um pouco a importancia das considerações que estou apresentando. Talvez esta interpellação tenha alguma cousa mais que simples coincidencia n'aquella baixa de juro. Mas, não nos contentemos com isto.
Pela minha parte faço votos para que dentro de um periodo, que não deve ser longo, o juro do nosso primeiro estabelecimento de credito possa baixar a 5, á taxa considerada normal.
E por esta occasião, permitta-me o sr. ministro da fazenda que, sem fazer politica d'este assumpto, lhe lembre, não direi um alvitre, mas uma idéa, que porventura não será praticavel, mas que na sua alta intelligencia e com os seus grandes conhecimentos, o illustre ministro apreciará. Para evitar que no futuro, e mesmo quando possa justificar-se uma nova concessão similhante ao nosso principal estabelecimento de credito, seria conveniente que se estabelecesse uma taxa de juro diversa para as grandes letras sobre praças estrangeiras, da que ficasse regulando para as pequenas letras da terra.
Não me parece impossivel fazer-se isto; e desejava que, mesmo em circumstancias especiaes, houvesse uma differença entre as letras sobre o estrangeiro e as da terra, principalmente as que representam pequenas quantias.
Não é de certo com estas que se tentam as grandes especulações de cambio. É necessario muitas vezes haver excepções, sobretudo a favor d'aquelles que mais favor merecem, que mais nos devem interessar, e a respeito dos quaes não ha perigo que o juro conserve a taxa mais baixa.
E isto que eu digo foi-me suscitado pelas proprias palavras que se encontram n'um, aliás, mui bem elaborado relatorio do banco de Portugal, apresentado na sua ultima reunião da assembléa geral.
Felicito o banco de Portugal e applaudo-o altamente pelo facto de ter baixado a media da importancia das suas letras descontadas.
Convem notar, diz o banco, que a media tem baixado da maneira seguinte:
Tendo sido em 1876 de 1:203$712 réis, desceu em 1877 a 910$903 réis, e foi no anno findo, como acima, de réis 854$295.
Provam estes algarismos ter o banco procurado, quanto em si cabe, vir em auxilio do pequeno commercio, facultando-se o desconto, que a força das circumstancias obrigára a restringir em quasi todos os estabelecimentos bancarios.
Applaudo, sem a menor reserva, este facto, que se acha mencionado no relatorio d'aquella illustre corporação, e por: isso mesmo desejaria que o governo tomasse em consideração este facto importante, se alguma vez se visse nas circumstancias de precisar adoptar uma medida da natureza, d'aquella que adoptou em outubro.
Mas, sr. presidente, se eu faço algum reparo á auctorisação concedida ao banco de Portugal em outubro do anno anno passado, para elevar o juro de 6 a 7 por cento, entendo que o banco procedeu perfeitamente bem.
Em uma epocha em que tantos outros bancos tinham sido favorecidos, não era de notar que o banco de Portugal, que muito tem merecido do paiz, pedisse para si um favor que até certo ponto era uma compensação dos prejuizos soffridos.
Não posso da mesma maneira acceitar, como boas, as rasões que se deram nos considerandos que precedem o decreto de outubro do anno passado, com o fim de fazer similhante concessão.
Esses considerandos não me convencem de que as medidas adoptadas em circumstancias como foram as d'essas epocha servissem para restringir a exportação do oiro, nem tambem para resolver a questão do cobre.
Não repitamos as cousas unicamenee porque ellas se dizem no estrangeiro em circumstancias diversas. Não desconheçamos que a nossa situação não é a situação de Londres.
Ali sim, porque do toda a Europa, e ainda mesmo d'alem do Atlantico, vem ali buscar o capital para a especulação.
Entre nós não acontece o mesmo. Embora tenhamos exportado oiro, principalmente nos ultimos annos, as cousas são outras.
É, porventura, este phenomeno devido aqui á larga especulação? Não de certo.
Fste phenomeno é devido infelizmente a causas inevitaveis, e, senão permanentes, até certo ponto normaes.
Qual é a origem da exportação do oiro entre nós? É o desequilibrio entre a importação e a exportação. E n'esta parte eu applaudo completamente as palavras do nobre ministro da fazenda, e direi que, se nem sempre lucramos com as resoluções que s. exa. toma na sua qualidade de ministro, talvez porque essas resoluções muitas vezes não são inspiradas pelo seu alto conhecimento das materias de que trata, mas pela força das circumstancias, lucramos sempre em ouvir a esclarecida palavra de tão distincto economista, o quando s. exa. fala sobre qualquer assumpto, e lança sobre elle a grande luz do seu espirito e a grande copia dos seus conhecimentos, nós lucrâmos sempre muito em a escutar, e não podemos deixar de a applaudir. (Apoiados.)
N'esta parte, repito, estou completamente de accordo com o que disse o nobre ministro da fazenda.
As causas que determinaram nos ultimos annos o desequilibrio notavel entre a producção e o consumo, e entre a importação e a exportação, são quatro, e vou repetil-as, sem nada diminuir, sem nada acrescentar, como as referiu o nobre ministro da fazenda.
A primeira foi a falta de remessas do Brazil: a segunda foram as más colheitas nas nossas provincias ultramarinas, colheitas que em grande parte alimentam o nosso commercio de exportação; a terceira, a deficiencia das colheitas no reino, que foram de facto diminutissimas, principalmente em vinhos e cereaes; a quarta, a necessidade de importar muito mais em consequencia d'essas mesmas faltas e deficiencias.
Podia acrescentar-se ainda que ha uma outra rasão ou causa para que o desequilibrio se sinta, que é a exportação permanente de dinheiro, que fazemos para satisfazer os encargos da divida externa.