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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 367

o sr. ministro da fazenda julgou dever modificar ou crear de novo.

Eu creio que se devemos e podemos reduzir de algum modo a protecção á nossa industria, devemos fazer modificando os direitos exorbitantes que o sr. ministro no seu relatorio não duvida chamar quasi prohibitivos, e que, portanto, nenhum resultado podem produzir para o fisco.

Se a industria nacional póde sem prejuizo supportar uma redacção na protecção que todos concordam em conceder-lhe, antes diminuir os direitos protectores em beneficio dos consumidores, e com o augmento da receita publica, do que tributar as materias primas.

Ora, este artigo tributa a, materia prima por excellencia, aquella de que todas as industrias têem necessidade impreterivel, e cada vez mais hão de ter, á medida que se forem desenvolvendo e tomando maior incremento.

Sendo o resultado financeiro d’este imposto sobre o carvão relativamente pequeno, e sendo os inconvenientes que d’elle resultam á industria e á navegação de tão alta importancia, seria mais vantajoso, conforme os bons principios economicos, renunciar a elle.

Os inconvenientes que se dão, e que o sr. ministro da fazenda procurou attenuar no seu discurso, affirmando que não ha que temer em relação aos portos do continente, sobem de ponto com relação ao Funchal, onde ha circumstancias especiaes que tornam este imposto excepcionalmente grave e summamente perigoso.

Não me parece que n’este momento, quando deve brevemente concluir-se o caminho de ferro da Beira, que nos approxima consideravelmente do centro da Europa, quando todos os esforços do governo deviam convergir para dotar o porto de Lisboa com os melhoramentos do que carece para rivalisar com os portos das nações civilsadas, não me parece opportuno que em vez de construir docas, de tornar aqui possiveis as grandes reparações navaes, de dar abrigo ás embarcações, de facilitar o trafico, de tornar pouco dispendioso o abastecimento dos vapores com o combustivel que aqui vem tomar, vamos lançar sobre esse combustivel um pesado o inconveniente imposto.

Difficultamos assim, em vez de o facilitar, que o porto de Lisboa preencha o fim a que o destinam as suas esplendidas condições naturaes que, se não lhe obstarem o desleixo e as erradas medidas dos nossos governos, hão de fazer que seja para a navegação africana e transatlantica, o que é hoje para a navegação do oriente o porto de Brin disi.

Não temos docas, não temos facilidade alguma de embarque e desembarque, cobrâmos pesados direitos de porto, de quarentena, etc., e vamos aggravar todos esses inconvenientes tributando o carvão de pedra! Parece que em vez de querer attrahir a navegação, procurâmos afugental-a, e para obter um mesquinho augmento de receita vamos sacrificar o grandioso futuro de um porto que a natureza fadou para ser um dos primeiros do mundo.

A posição unica que teve o porto de Lisboa, quando era o emporio do commercio do oriente, passou para nunca mais voltar, mas podemos antever, n’um proximo futuro, iguaes proveitos aos que auferiamos de um monopolio transitorio, estabelecendo-se aqui no extremo occidente da Europa o emporio do commercio com a costa occidental de Africa e com a America, do sul. Para isso, repito, é necessario, em vez de crear novos obstaculos á navegação, remover os que ainda existem, e em voz de tornar mais caro o abastecimento das embarcações, tornal-o mais facil, mais rapido e mais barato que em nenhum outro porto vizinho.

É possivel que o imposto que em Hespanha se lança actualmente sobre as materias similares, não permitia que desde já se sintam os funestos resultados d’esta medida, e não deixem tornar contraproducente o imposto sobre o carvão, dando logar a que Vigo supplante o Porto, e Cadiz ou Gibraltar, Lisbos.

Mas deverá suppôr-se fundada em base solida uma medida financeira, que está dependente da conservação de um imposto que existe n’um paiz estrangeiro e rival, não tendo nós, nem podendo ter, garantia alguma de que elle não possa ser modificado do um momento para o outro?

Se acontecer que, poucos mezes depois do approvado este projecto, o governo hespanhol queira diminuir o imposto sobre o carvão, não soffrerá muito com isso a navegação dos nossos portos?

Não seremos obrigados a renunciar immediatamente a este recurso fiscal?

Mas, como dizia: se ao porto de Lisboa não póde presentemente, em virtude da actual legislação hespanhola, fazer concorrencia o porto de Gibraltar, o mesmo não acontece com o do Funchal, que tem por concorrentes como pontos de escala e de abastecimento de navios, os portos de Teneriffe e S. Vicente de Cabo Verde.

Em Teneriffe, que é porto franco, ha tambem um molhe, quando no Funchal nem sequer um cães existe.

Começou-se a construir uma estrada que ligasse o cães da Pontinha, a um kilometro da cidade, com a alfandega, mas quando estavam vencidas as maiores difficuldades da obra, quando parecia que devia proseguir activamente, mandou o governo suspendel-a e os trabalhos interrompidos já soffreram sem defeza os estragos dos ultimos temporaes.

Alem d’isso os fretes do carvão de pedra que de Inglaterra vae para Teneriffe e S. Vicente de Cabo Verde, são os mesmos que para a Madeira, o que prova que não é só a distancia que os determina, senão tambem os fretes de saida e de retorno, as facilidades de embarque e desembarque, as correntes maritimas que favorecem ou difficultam a viagem, o risco de avaria, etc.

Estas informações foram-me fornecidas por pessoas que traiam d’estes negocios. Tenho, portanto, motivo para as julgar exactas.

O frete que actualmente se paga por uma tonelada de carvão de pedra dos portos de Inglaterra para a ilha da Madeira, sobe ali schellings.

As despezas de desembarque, armazenagem, seguro, commissão, orçam por 7 schellings e 6 pence; addicionando 9 sechellings e 6 pence, custo primitivo do carvão, vemos que se não póde vender no Funchal uma tonelada por menos de 28 schellings, sem contar o lucro do negociante.

Ora em Teneriffe vende-se por preço inferior a este, aos navios mercantes e por preço igual aos de guerra.

N’estas circumstancias, todo o addicional que for recair sobre o carvão de pedra faz com que o Funchal fique impossibilitado de concorrer com o seu mais proximo o perigoso rival n’este ramo de commercio.

Desejava acrescentar algumas rasões deduzidas da estatistica do nosso movimento commercial; são, porém, esses dados tão pouco seguros, que só a medo a elles recorro. Julgo, comtudo, que se calcula em 40:000 toneladas o carvão de que annualmente se abastecem os vapores que fazem escala pelos portos do continente e ilhas.

Pagando cada tonelada 150 réis, dá este vexatorio direito para o fisco, como unico resultado financeiro, uma somma de 6:000$000 réis annuaes.

Valerá a pena, por tão pequena somma, correr o risco do afugentar dos nossos portos a navegação a vapor, quando não podemos ter a certeza de a tornar a chamar aos antigos pontos de escala, uma vez estabelecida para outros pontos a corrente da navegação?

E se o direito sobre todo o carvão embarcado em todos os portos do reino apenas dá 6:000$000 annuaes, o que poderá produzir a cobrança d’este imposto no porto do Funchal? Uma quantia insignificante, que não irá engrossar a receita do thesouro e póde concorrer para a ruina de uma provincia importante, que pagas as suas despezas, produz liquidos para o thesouro 130:000$000 réis por anno.