SESSÃO DE 11 DE JULHO DE 1890 549
O que não é legal nem justo é que as auctoridades abusem da força em prejuizo da opposição.
As auctoridades administrativas exercem principalmente a sua actividade, occupando-se exclusivamente em fazer eleições, e até se póde dizer que o papel principal que desempenham é o de preparar a politica para as eleições, sa-crificando os interesses do paiz aos interesses eleitoraes.
A reforma da parte electiva da camara dos dignos pares feita em dictadura, deve considerar se como um golpe de morte para esta camara. Admittido este precedente, a camara dos pares, que está boje constituida com pares electivos e vitalicios, voltará amanha, por outro acto de dictadura, á sua antiga forma com pares só vitalicios, e não noa devem surprehender mesmo a sua d'ssolução por quaesquer attentados de futuros dictadores.
Que auctoridade póde ter uma camara sujeita a estas alternativas? Hoje estamos completamente annullados, e este antigo baluarte da constituição, que tantos serviços prestou, jaz em completa derrocada.
Mas o que é mais singular e póde considerar-se como pungente ironia, é que em todos estes relatorios o governo presta, ou tinge prestar, o maior respeito pelas instituições. Morde-lhe a consciencia, convencido de que vae trilhando errado caminho. Disfarça o mal que faz com pomposos elogios e referencias lis instituições que são a força da nação e as garantias da liberdade e da boa administração.
Segue-se o decreto de d'ssolução da camara municipal de Lisboa, que o governo substituiu por uma commissão administrativa, o que constituo um dos maiores attentados que se tem commettido contra os foros e privilegios do primeiro municipio do reino; o resultado, apesar do indifferentismo dos eleitores, foi que o corpo eleitoral de Lisboa, justamente indignado, enviou o illustre presidente da municipalidade ao parlamento com mais de 7:000 votos.
Os fundamentos que os dictadores allegam para a d'ssolução da camara municipal são até injuriosos para os cavalheiros que compunham a vereação, e o governo nem ao menos attendeu que alguns dos seus membros eram dos mais conspicuos do partido regenerador, por quem não tiveram a menor contemplação.
Se não houve algum facto desagradavel originado pelo modo por que a camara municipal foi d'ssolvida, é uso devido ao espirito cordato dos cidadãos portuguezes. Se fosse em outra qualquer nação não sei o que succederia.
Fallava-se em resistencia por parte da camara municipal, e julgo até de resistencia por meio de força armada.
Ora, não sei de que forca podia dispor a camara municipal, a não ser a dos bombeiros.
Creio que não fóram estes o motivo da d'ssolução, porém, sim, o de ter assumido papel importante na indignação e tios protestos patrioticos contra a affronta que nos dirigiu a Inglaterra.
O que é singular é que o governo diz no relatorio. (Leu.)
Como se vê, são asserções vagas e de caracter offensivo para a camara municipal.
Mas são passados já tantos mezes, o parlamento está prestes a fechar e o governo ainda não apresentou a reforma administrativa do municipio de Lisboa.
Parece que está á espera que elle feche para depois a decretar em dictadura, usando da auctorisação concedida, e o mais notavel é a indifferença dos representantes do paiz e o torpor em que novamente cairam os municipes de Lisboa, não protestando pela falta do respeito devido á cidade de Lisboa. Talvez em nenhuma capital da Europa o governo podesse proceder d'este modo, sem que houvesse manifestações importantes e energicas da parte dos habitantes.
Diz o governo no seu relatorio que a vereação administrava mal os dinheiros do municipio; mas se ella era prodiga, deviam os vereadores regeneradores declinar a responsabilidade e protestar contra as suas deliberações. Ora, não consta que tivesse havido nenhum protesto. Alem d'isso não admira que se tenha gasto muito, attendendo a realisação de obras que eram geralmente reclamadas e são de incontestavel utilidade, o que de certo não é prova de que se tenha administrado tão mal como dizem os dictadores.
Segue-se depois o decreto que diz respeito á extincção do concelho do Sobral de Monie Agraço, dividindo-o em dois, o que o partido regenerador não devia fazer; commettendo assim o feio peccado da ingratidão, pois devia ter presentes os relevantes serviços que por muito mais de um quarto de seculo tem prestado ao paiz e ao proprio partido regenerador o eminente estadista e nosso illustre collega o sr. conde do Casal Ribeiro.
Com referencia á creação do ministerio da instrucção publica, ninguem duvida de que a instrucção publica merece os maiores cuidados.
O que eu contesto é que, apesar dos grandes talentos do &r. conselheiro Arrojo, possa resultar grande melhoria para a instrucção pelo simples facto da creação desse ministerio, que, de mais, e sobretudo, me parece inopportuna, vindo augmentar os encargos do thesouro, n'uma situação financeira que o proprio governo confessa ser grave.
Tambem me parece singular o crear-se o ministerio em dictadura, e fazer-se a organisação das repartições por lei de côrtes.
Era melhor o ter-se creado novo ministerio, ter-se feito tudo de uma vez em dictadura.
Não comprehendo meia dictadura, e esta singular deferencia para com o parlamento.
Seguem-se os decretos relativos ao direito de reunião e á imprensa.
u em questões que prendara com o respeito devido aos altos poderes do estado e á ordem e moralidade, sou conservador, mas desejo tambem que as legitimas liberdades publicas por fórma alguma sejam cerceadas.
Ora, já a lei anterior, no que diz respeito ao direito de reunião, offerecia sufficientes garantias para que a ordem publica não fosse perturbada por reuniões nas praças e nas ruas; havia n'ella a segurança bastante para que nos recintos fechados onde ellas podiam ter logar, a auctoridade podesse d'ssolvel-as logo que saíssem da ordem.
Agora por este decreto, o promotor da reunião é obrigado, sob pena de multa de 100$000 réis, a responsabilisar-se pela ordem, soffrendo durissima pena, caso ella seja perturbada.
Ora, sr. presidente, é muito possivel e muito provavel que alguem mande á reunião, e muito de proposito, perturbadores com o fim de promoverem a desordem, e, n'estas circumstancias, póde dizer se que findou o direito de reunião, porque só as pessoas ricas estarão dispostas a tomar sobre si similhante responsabilidade pecuniaria.
Com o decreto a que me retiro, até uma dissertação academica póde tambem dar logar ao procedimento da auctoridade.
Segue-se agora o decreto estabelecendo a censura previa para o theatro.
Sr. presidente, a epocha actual é toda de critica e não é como a de outros tempos.
Antigamente os funccionarios publicos viviam cercados de uma aureola de supersticioso respeito, mas hoje na imprensa, no livro, no theatro, nos comicios e em toda a parte, os actos dos governantes são justa e injustamente criticados.
De modo nenhum nos podemos eximir á critica dos nossos actos.
Por mais que façamos é absolutamente impossivel.
A'quelle que procede correctamente e que é injustamente criticado, mais tarde a opinião publica ha de fazer-lhe justiça.
Ora, sr. presidente, para as representações immoraes não era preciso estabelecer disposições novas, lá existem no codigo penal.
Quando um espectaculo fosse immoral e offendesee os