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CAMARA DOS DIGNOS PARES.

Sessão de 12 de Abril de 1849.Presidiu—O Sr. D. de Palmella, e depois o Sr.

Cardeal Patriarcha. Secretarios — Os Sr.s M. de Ponte do Lima V. de Gouvêa.

(Summario — Ordem do dia, Parecer n.º 112, sobre a proposição de Lei n.º 57, respectiva ás aposentações dos Magistrados: foi deferida a discussão, passando-se á do Parecer n.º 113 sobre o Projecto de Lei n.º 95.)

ABERTA a Sessão pela uma hora e ires quartos da tarde, estando presentes 40 D. Pares, leu-se e approvou-se a Acta da ultima Sessão — Concorreram os Sr.s Ministros dos Negocios do Reino, dos Negocios da Justiça, e dos Negocios da Guerra.

O Sr. C. de Lavradio — O Sr. C. da Ribeira pediu-me, que declarasse á Camara que elle não podia comparecer por estar doente.

(causa.)

O Sr. Presidente — Não estamos em numero.

O Sr. C. de Lavradio — Desejava saber por que se perdeu o costume, adoptado nesta Camara, de lançar na Acta os nomes dos Pares que faltam com causa conhecida, ou sem ella, pois me parece que seria muito conveniente que tal pratica continuasse. Não tracto de propôr nenhuma especie de censura, mas sim que se lancem sempre na Acta os nomes dos que faltam com causa motivada, e dos que faltam sem dar a razão da sua falta.

O Sr. Presidente — O Sr. Secretario é que póde informar, porque se abandonou esta pratica.

O Sr. Secretario V. de Gouvêa — Quando eu tomei posse deste logar achei-a já abandonada.

O Sr. Presidente — A Proposta do Sr. C. de Lavradio é muito digna de se tomar em consideração. Se o D. Par a apresenta por escripto, propô-la-hei; mas talvez fosse melhor deixa la para o Regimento de que se está tractando (Muitos apoiados).

O Sr. C. de Lavradio — Eu convenho, posto não tivesse duvida de apresentar agora a minha Proposta; mas lembrarei, que folheando as Actas das nossas antigas Côrtes, vejo essa pratica estabelecida desde longos seculos, e até nellas se declaravam os motivos que justificavam as faltas.

O Sr. Serpa Machado — O Sr. C. de Semodães encarregou-me de communicar á Camara, que por motivo de doença não vem hoje á Sessão, nem virá a mais algumas, em quanto durar o seu impedimento.

ORDEM do dia.

Parecer n.°112 sobre a Proposição de Lei n.º 57, estabelecendo a aposentação da Magistratura judiciaria.

O Sr. V. de Algés — Parece-me escusada a leitura de todo o Projecto para a generalidade: agora quando fôr na especialidade então se lerá artigo por artigo (Apoiados).

O Sr. Presidente — Então está em discussão a generalidade.

O 9r. Pereira de Magalhães — Sr. Presidente, não posso deixar de fazer algumas observações a este Projecto, pelas quaes espero que a illustre Commissão de Legislação consentirá, que elle lhe volte para o completar, porque o julgo defficiente, e para reconsiderar não só a sua base principal, mas algumas das suas disposições.

Sr. Presidente, tanto dentro desta Camara como fóra della não ha um só Portuguez, que não conheça que nós estamos soffrendo gravissimos males, provenientes da necessidade de uma reorganisação de todos os ramos da Administração do Estado: parece pois que era chegado o tempo de reunirem-se todos os esforços para se dar o necessario remedio a estes males, tratando-se de reorganisar o Serviço publico de modo, que possa promover a prosperidade publica, que é o ponto a que tudo se deve encaminhar; mas, Sr. Presidente, infelizmente não acontece assim; os clamores são na verdade geraes; mas em logar de apparecer o remedio, vão apparecendo pouco a pouco Projectos que tendem a aggravar cada vez mais esses males.

O Poder Judiciario necessita de ser organisado, tem-se dito nesta Camara e diz-se fóra della. É preciso que se faça quanto antes o Código Civil; é necessario que se faça quanto antes o Código Criminal; e que se reveja o reconsidere o Código do processo, porque este ultimo Código, tendo já em si muitos defeitos, as Leis que posteriormente se tem feito e publicado tem augmentado muito estes defeitos. As Leis que dizem respeito ao pessoal do Poder Judiciario necessitam tambem de ser reconsideradas e emendadas; e já que por este Projecto se tracta em parte; deste assumpto, eu desejo que elle se tracte completamente. Não me occuparei agora de demonstrar a necessidade dos Códigos Civil e Criminal, e da revisão do Código do processo; mas sómente da que necessita o pessoal do Poder Judiciario a que diz respeito o Projecto em discussão. A primeira necessidade é a de uma Lei de habilitações, que é por onde devia começar este Projecto.

Sr. Presidente, pela Lei actual um Bacharel formado na Universidade, tendo seis mezes de exercicio de Delegado do Procurador Régio, póde ser Juiz! Esta habilitação não é sufficiente para fazer um bom Juiz. Em Portugal sempre o methodo de fazer Juizes foi mau, nunca se lhes exigiram as habilitações que demanda um cargo tão importante da Sociedade. Antigamente formava-se um Bacharel em Coimbra. exigia-se-lhe pró fórma, um ou dois annos de pratica: nada era mais facil de que obter uma certidão d'um Advogado de Lisboa de como se tinha praticado um ou dois annos no seu escriptorio; e no Desembargo do Paço, nem ao menos se examinava, se o que o Advogado certificava era falso ou verdadeiro; porque, segundo me consta, e o referirei sem responsabilidade minha, acontecia algumas vezes serem despachados Bacharéis juntando certidão de terem praticado um ou dois annos, quando ainda não havia tanto tempo que tinham concluido a formatura: no em tanto eram despachados Juizes de Fora! A respeito dos privilegiados, isto é, daquelles que começavam por Desembargadores do Porto, primeiro Banco, correições, ele, não quero eu fallar.

Sr. Presidente, nem as Universidades, nem as Academias fazem sabios, habilitam sómente o homem para o ser; e os que frequentaram a Universidade conhecem muito bem o que sabiam quando de "lá sahiram, e se estavam sufficientemente habilitados para desempenhar, como convém, as difficeis funcções de Juiz. Não quero dizer qual o resultado do antigo systema que referi: o que digo é, que o actual systema de fazer Juizes, se não é peior é tão mau como o antigo, porque é impossivel que um Bacharel com seis mezes de exercicio em Delegado, esteja habilitado pira ser Juiz de Direito, e em que circumstancias!!

Pela Legislação antiga havia tres graus de jurisdicção, e hoje lemos dois, e bastava esta circumstancia para se exigirem hoje aos Juizes, maiores habilitações do que se exigiam no antigo systema. Além do que, fóra de Lisboa e Porto não póde haver administração de Justiça para todos, porque fóra destas duas Cidades, onde ha Advogados e Procuradores, ninguem que seja de fóra da terra, póde lêr alli demandas. Um homem de Lisboa não póde ter uma demanda, por exemplo, em Alemquer, ou na Azambuja, porque não tem alli nem Procurador nem Advogado; e se quizer mandar de fóra um Procurador e um Advogado, no fim da demanda terá gasto muito mais do que a sua importancia: para isto ninguem tem olhado; e o que digo a respeito de Alemquer póde, applicar-se a quasi todas as Terras do Reino. Este mal que é grande precisa ser remediado. A antiga Legislação remediava-o de algum modo, porque concedia uma multidão de privilegios de Foro, porque poucas eram as pessoas que não gosavam do privilegio do Foro para as suas causas; e as que não tinham privilegio especial, tinham o geral, que era o daquellas que se chamavam poderosas, as quaes podiam ser chamadas a responder perante os Corregedores das Comarcas: hoje não ha esses privilegios, e está a Nação gastando uma somma considerabilissima com os Funccionarios judiciarios, não podendo ninguem que seja de fóra da terra dos demandados, ter demanda nos domicílios destes, por falta de Procuradores e Advogados.

Voltando ao assumpto direi, que com a fraquissima habilitação de seis mezes de exercicio em Delegado do Procurador Régio, não está um Bacharel habilitado para ser Juiz de Direito. Sr. Presidente, nós temos, como já disse, dois graus do jurisdicção, que é o Juiz de Direito de Primeira Instancia, e o de Segunda, porque o Supremo Tribunal não é grau de jurisdicção, posto que o poderia hoje ser pelas Leis de Dezembro de 1813, contra as quaes ha um clamor geral (O Sr. Duarte Leitão — Não é tanto assim.) Nestas circumstancias, as habilitações dos Juizes de Direito necessitam de ser mais latas, porque a profissão de Jurisconsulto é difficilima: é preciso estudar, e não basta uma pequena pratica, são necessarios annos (Apoiados); e só depois de muita theoria e pratica, é que se póde ser um bom Juiz: por tanto, a necessidade absoluta que ha, é a da Lei das habilitações que cabe muito

bem neste Projecto; a segunda necessidade é a Lei das promoções, e dos accessos dos Juizes, a qual se segue naturalmente á das habilitações, devendo as promoções e accessos seguir uma escala gradativa no primeiro grau de jurisdicção, segundo a importancia dos logares: a esta segunda parte segue-se então naturalmente as aposentações de que tracta este Projecto; mas se começarmos por elle, começaremos a edificar pelo telhado, que são as aposentações, e um edificio nunca se principia pelo telhado, é necessario principiar pelos alicerces, que com relação ao assumpto são as habilitações, cuja Lei é de absoluta necessidade, assim como a Lei que regule as promoções e accessos, para então ahi recaír bem a doutrina deste Projecto.

Por estes motivos proponho, que o Projecto volte á Commissão para o addicionar com as provisões necessarias para a habilitação dos Magistrados Judiciarios, e para a promoção e accesso dos Juizes.

O Sr. Presidente — Queira mandar por escripto a sua Proposta, e para não perdermos tempo vou já consultar a Camara para ver se a admitte.

Admittida.

Proposta referida.

Proponho que o Projecto volte á Commissão de Legislação, para lhe addicionar provisões que regulem as habilitações dos candidatos á Magistratura Judiciaria, e as promoções e accessos dos Juizes. = Pereira de Magalhães.

O Sr. V. de Algés — (Sobre a ordem). Esta discussão deve ser muito longa, porque é importantissima (Apoiados); não podem deixar de tomar parte nella o illustre Relator da Commissão, mais alguns Membros da mesma, e todos os D. Pares que quizerem concorrer com as suas luzes sobre tão grave assumpto. Eu vejo presente o Sr. Ministro da Guerra, ha outro Projecto dado para Ordem do dia que demanda a sua presença: se acaso formos agora discutir a generalidade do primeiro Projecto, e a Proposta do Sr. Felix Pereira, póde ser errado o meu juizo, mas penso que o tempo da Sessão não chegará para isso, e então parecia-me melhor passarmos á parte da Ordem do dia, que ficou sendo segunda pela duvida de apparecer a tempo o Sr. Ministro da Guerra, pois assim se evita o interromper— se a discussão do Projecto sobre aposentações, como provavelmente teria de acontecer. (Apoiados.)

O Sr. Presidente — Como não ha quem se opponha ao Requerimento do Sr. V. de Algés, vou pô-lo a votos.

Approvado, que deferida a discussão daquelle Parecer se passasse á do seguinte.

Parecer n.º 113 sobre a PROPOSIÇÃO de Lei n.º 95, auctorisando o Governo para organisar o Exercito em todos os seus ramos.

Parecer n.º 113.

A Commissão de Guerra examinou o Projecto de Lei, approvado na Camara dos Srs. Deputados, pelo qual é o Governo auctorisado a organisar o Exercito em todas as suas partes, e afixar o quadro de todas as Repartições, e Estabelecimentos dependentes do Ministerio da Guerra. Esta auctorisação importa sem duvida um voto de confiança, e a Commissão, apesar de não professar as doutrinas, nem partilhar a opinião dos que negam absolutamente ás Côrtes a faculdade de conceder taes votos, intende comtudo que estes devem ser concedidos com a maior circumspecção, rarissimas vezes, e só quando imperiosas exigencias do Serviço publico, e o bem do Estado justificarem manifestamente a sua urgencia e necessidade. Todas estas circumstancias julga porém a Commissão que se verificam no caso presente, e na materia de que se Irada: por quanto a necessidade de uma boa organisação do Exercito é por todos sentida, e até por alguns Membros desta Camara tem sido mais de uma vez reclamada: a fixação dos quadros das differentes Repartições deste Ministerio, e a melhor distribuição do serviço, é não só necessidade para o mais prompto expediente dos negocios, mas é alem disso uma necessidade essencialmente economica, que muito contribuirá para reduzir, senão desde já, ao menos successivamente, e para o futuro, as avultadas quantias que no Orçamento vem designadas para todos esses estabelecimentos, cuja despeza absorve actualmente uma quarta parte dos rendimentos publicos do Estado. Além disso, esta auctorisação concedida pelo Projecto de Lei acha-se limitada, e circumscripta a certas e determinadas bases que fazem desvanecer qualquer apprehensão, ou desconfiança de abuso que della possa resultar. Sendo pois evidente a necessidade e urgencia das reformas de que se tracta; sendo alem disso difficil, se não impossivel, no estado de adiantamento em que se acha a presente Sessão, discutir todas as innumeraveis disposições que nellas devem ser comprehendidas, sem que as Côrtes ponham de parte outros negocios de igual ou maior interesse publico; e sendo finalmente certo, que a confirmação das projectadas reformas fica sempre, e em ultima instancia, dependente da approvação das Côrtes, a quem o Governo deve, na proxima Sessão, dar conta do uso que houver feito da mesma auctorisação, parece fóra de duvida que esta póde sem hesitação ser concedida, e que o Projecto de Lei deve ser approvado, e nos termos em que se acha submettido á Sancção Real. Sala da Commissão, em '31 de Março de 1849. = D. da Terceira — C. de Santa Maria = V. da Granja = D. de Saldanha.

O Sr. C. de Lavradio — Antes de approvarmos ou rejeitarmos o Projecto que vai entrar em discussão, parece-me de absoluta necessidade examinar duas importantissimas questões que se apresentam: a primeira é de Direito constitucional, e a segunda da conveniencia do Serviço publico.

Parece-me que a illustre Commissão de Guerra considerou do mesmo modo este Projecto, e que tractou de examinar tanto uma como outra questão; mas eu, apesar de respeitar muito as opiniões dos illustres Membros da Commissão, desde já