DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 315
haviamos de dar a nossa opinião em sessão secreta, e não me recusava a dar a explicação que me pediam se não estivasse em sessão publica. Por conseguinte não posso entender a logica do digno par.
Ainda direi que eu podia responder ao digno par, o sr. Macedo, com as palavras que ha pouco proferiu o sr. Ferrer, e a este digno par podia responder com as palavras proferidas pelo sr. Henrique de Macedo. São os inconvenientes da muita logica. A logica racional, que foi a que eu estudei, não ensinava isso.
Tenho de declarar tambem que no ministerio que começa agora podiam estar representados os diversos grupos que formaram a opposição; eu desejava que isto assim acontecesse, e se estamos aqui exclusivamente regeneradores, a culpa não é nossa.
Eu, sem temer a guerra, prefiro a paz. Ainda não me declararam guerra, mas declararam opposição; isso é uma prova de que não concordam com as nossas idéas, o que é licito e permittido.
Já disse na outra camara que não desejaria ter unanimidade. As vezes, segundo diz o auctor do Espirito das leis, o excesso de virtude é um vicio!
Nós não queremos receber força senão das leis e da constituição, e a confiança que provier dos actos que praticarmos. Não peço que confiem que hei de fazer tudo, e por, isso sou reservado muitas vezes.
Creio que ninguem se sentou aqui, não se senta, nem se sentará, que não deseje fazer o bem; mas acredito tambem que ninguem póde fazer tudo quanto deseja. Não direi que faremos o óptimo, nem o melhor, rnas se fizermos o bom ficamos satisfeitos cumprindo este santo dever, e a patria ha de nos ser agradecida.
Acho tambem bella a theoria da idéa nova, e se nós não tivessemos constituição, se estivessemos no cahos e possuissemos uma força omnipotente, talvez baseariamos as nossas instituições n'outros moldes; mas não estamos nessas circumstancias, estamos n'este planeta, estamos na terra. Muitos têem promettido modificar as instituições, mas não o têem conseguido, porque não acham a occasião opportuna. São opportunistas, apesar de se mostrarem contra o opportunismo, e com isso não praticam mal:
É melhor não promover dissensões, e procurar no meio da tranquillidade e socego publico fazer alguma cousa boa e util para o paiz.
Dizem não querer ninguem associar-se a nós por causa de discordancia nas reformas politicas, e eu entendo que, com as que temos, podemos fazer muito; e acredito pouco em reformas politicas, que todos promettem e que nenhuns executam.
A respeito de outros pontos em que o digno par fallou, os respectivos ministros responderão como poderem e souberem, e creio que se hão de desempenhar facilmente da sua tarefa á vista da logica com que são tratados. Se escapâmos de Scylla, caímos em Charybedes. Haviamos de ser accusados sempre, fosse qual fosse o nosso programma.
Estimo que nos façam guerra, que nos façam opposição. Creio que governariamos peior se não a tivessemos.
Direi poucas palavras sobre a inconstitucionalidade na formação do ministerio.
Queriam que o illustre chefe do partido regenerador viesse sentar se n'estas cadeiras? Queriam, bem o sei; mas não era para o elogiarem, era para o combaterem por elle haver faltado á sua palavra, como arguem alguns dos meus collegas por elles terem um voto differente na outra camara sobre questões que não vieram ainda á discussão.
Não se sabe como resolveremos a, questão do imposto de rendimento. Sabemos só que havemos de procurar acalmar a excitação publica e estabelecer a paz entre o povo. Sobre os meios para conseguir este resultado, se algum de nós tiver opinião divergente, não viremos aqui manifestal-a; e se viermos, tanto melhor para os dignos pares da opposição que nos podem tomar contas d'essas divergencias.
Eu desejo mais administração e menos idéas novas, porque nem sei mesmo onde estão os auctores d'ellas nem o que pretendem. Tudo é novo, e tudo que é novo se faz velho.
Mas tenho-me apartado do ponto, principal em que eu queria tocar.
Direi que a formação do governo foi constitucional.
O alto poder do estado, chamando alguem a formar gabinete, não póde obrigal-o a isso, quando essa pessoa entenda que não deve assumir o governo em tal ou tal occasião.
Queriam que ficássemos sem governo? Creio que não. Visto que já na opposição ha divergencia, uns julgam constitucional a formação do gabinete, outros inconstitucional; por tão diversas theorias em caracteres tão abalisados, não se póde sair d'este embaraço, e tudo isto por força da lógica; mas a logica é uma arte e não uma sciencia.
Eu entendo que nós prestaremos bom serviço ao paiz se podermos encaminhar os negocios a uma solução em harmonia com os interesses e necessidades publicas; e Deus queira que o possamos fazer ou que o possam fazer os nossos successores.
Direi, pois, que prefiro o bem á coherencia, e isto não quer dizer que não sejamos coherentes; mas a nossa coherencia ha de sobretudo consistir, disse-o na outra casa, e repito-o agora nesta, em procurar resolver convenientemente os negocios, á proporção que elles se apresentarem, e pela ordem da sua urgencia.
Não direi mais nada, porque quero dar logar a que os meus collegas respondam sobre o que mais directamente lhes diz respeito, e mesmo porque entendo que é mais tempo de trabalhar do que fatiar.
O sr. Ministro- da Fazenda (Lopo Vaz): - Sr. presidente, cumpre-me responder ás considerações do digno par, o sr. Ferrer, relativas ao imposto de rendimento, mesmo porque vejo que não foi bem comprehendido o que a esse respeito declarei na camara dos senhores deputados; e, visto que estou com a palavra, responderei tambem a uma referencia que foi feita á minha pessoa pelo digno par o sr. Henrique de Macedo.
Quanto á minha declaração a respeito do imposto de rendimento, feita na camara dos senhores deputados, o digno par o sr. Ferrer de certo não me ouviu e foi mal informado.
Eu asseverei á camara dos senhores deputados, e assevero agora á camara dos dignos pares, que procurarei dar a essa questão do imposto de rendimento uma solução a contento da opinião publica e sem prejuizo dos interesses da fazenda.
Ocioso seria expor agora a minha humilde opinião sobre o imposto de rendimento, sob os pontos de vista da sciencia financeira, da economia politica e da justiça na incidencia do imposto. Os financeiros menos versados sobre estes assumptos têem opinião theorica sobre esta materia, e por isso não é de admirar que eu tenha tambem a minha. Não se trata, porem, de expor uma opinião sobre a theoria do imposto de rendimento, o que seria extremamente facil; trata-se, sim, de investigar até que ponto é, ou não, possivel, expurgar a lei e o regulamento sobre o imposto de rendimento das disposições que têem concitado a animadversão da opinião publica. As melhores theorias não são sempre exequiveis, antes, pelo contrario, acontece não raras vezes que a sua execução é incompativel, em uma dada occasião, com os interesses economicos do paiz, com os habitos e costumes dos povos, e até com a tranquillidade publica. Quando se dá este facto é mister modifical-as, ou, só isso não é possivel, pol-as de parte.
Pôr isso eu digo: o governo procurará dar á este assumpto uma solução que mereça o apoio da opinião publica, e que, por outro lado, não prejudique a fazenda; tem, pois que investigar se porventura lhe será, ou não, possivel dar execução ao imposto de rendimento, sem que haja