DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 317
o novo principio constitucional de se aproveitar das arruaças para fazer caír um governo, notou que este ministerio podia ser considerado como filho das assuadas, concluindo por dizer que neste paiz o que falta é quem diga o que pensa e faça o que deve.
(O discurso de s. exa. será publicado logo que o devolva.)
O sr.. Conde de Rio Maior: - Arredado da politica pelo mau estado da minha saude, tenho ficado alheio aos debates levantados n'esta casa. e raras vezes tenho pronunciado o meu voto. Entendo, todavia, que é dever meu apresentar hoje algumas observações na presença do novo gabinete, e dizer como penso sobre a solução da crise.
Tambem eu, sr. presidente, não hesito em affirmar a minha opinião. Declaro alto e bom som: este ministerio não nasceu dá arruaça, é filho do voto manifestado livremente pela camara dos pares (Apoiados.) e pela opinião publica, que pesava de uma terrivel maneira sobre a administração transacta!
O sr. presidente do conselho occupa o seu elevado cargo pelos grandes e importantes serviços prestados por elle á patria e á liberdade; foi, todos bem o sabemos, um dos soldados mais fortes e valentes no momento em que essas liberdades publicas perigavam! (Muitos apoiados.)
Sr. presidente, o paiz ganhou com o modo por que terminou a crise; com certeza evitámos maiores perigos.
Apoiei no principio o ministerio transacto, é se mais tarde lhe fiz opposição, foi por elle adoptar uma maneira de proceder, que contradiz completamente as promessas do partido progressista, quando este combatia o sr. Fontes. Fui contra o ministerio que se demittiu; comtudo ha dois actos dos ex-minisiros, que approvo. Fez bem o sr. Braamcamp acceitando o veredictum da camara dos pares, e não seguindo os conselhos d'aquelles, que lhe aconselhavam a resistencia.
Louvo s. exa. por isto, como tambem louvei o seu governo, quando entrou aqui pela primeira vez, e antepoz ao programma politico ao partido a conveniencia de tratar primeiro a questão de fazenda. A necessidade de resolver o problema foi a rasão de ser do gabinete progressista, este ponto o paiz exigia que fosse examinado com urgencia.
Vã promessa! Illusão perdida! Quasi depois de dois annos de administração soubemos pelo relatorio do ministro da fazenda que em 30 de junho de 1881 ha um deficit de 6.500:000$00 réis, e d'este desconta o ministro, para nossa consolação, 2.100:000$000 réis de receitas provaveis, systema que s. exa. no seu relatorio anterior condemnou como methodo perigosissimo de apreciar as finanças do estado. (Apoiados.)
Estes factos, sr. presidente, explicam claramente a perda de todas as nossas illusões, e, todavia, esses mesmos factos são inferiores nos algarismos enunciados á verdade inteira!
Não se queixem da camara dos, pares.
Sinto que, apesar da leal coadjuvação d'esta camara, não melhorasse a questão de fazenda. Embora esta assembléa não tivesse profunda symnpathia por todas as propostas tributarias, que examinámos, comtudo o patriotismo dos pares do- reino foi grande, e o ministerio do sr. Braamcamp alcançou no annno passado a approvação dos, novos impostos, julgados necessarios. Que culpa tem esta camara que os impostos, pedidos quasi no fim do anno economico de 1879-1880, e que a camara unicamente acceitou para não se fechar a sessão antes de se augmental a receita na presença de um deficit avultado; que culpa, digo, tem esta camara de se achar o paiz assoberbado com um imposto iniquo, votado pelos srs. deputados, e que ficou mais cruel por um notavel regulamento de 235 artigos?!
Sr. presidente, o imposto de rendimento, alem dos seus naturaes defeitos, possue o grave inconveniente de prejudicar de modo terrivel o serviço todo das contribuições directas. Tambem este ponto convem considerar.
Não gritem contra a camara dos pares.
Quando se discutiu a questão do real de agua, o ministerio passado tinha aqui maioria. Perdeu-a pelo seu procedimento posterior, perdeu-a por causa do contrato de Torres Vedras, e pela minha parte foi depois d'essa discussão na camara dos senhores deputados que me separei do governo. Tambem o sr. Braamcamp perdeu a sua maioria por causa da ultima fornada! Poucos erros politicos têem sido maiores, e é esta a opinião, creio eu, do illustre homem de estado, infelizmente ausente, que costuma presidir aos nossos trabalhos.
Sr. presidente, qual foi a situação creada pelo procedimento do governo?
A camara dos pares teve de declarar solemnemente perante a nação a urgencia de harmonisar a politica com os interesses do paiz. Duas questões obrigavam hontem, e ligam ainda hoje os nossos deveres de patriotas; o imposto de rendimento reclama ser alterado, e o negocio de Lourenço Marques, chamando a attenção de todos os portuguezes, impõe graves deveres áquelles, que são obrigados a dar o seu voto na qualidade de legisladores. .
Não somos facciosos! E já que se põe em duvida ou se discute o direito da camara dos pares de iniciar, pe tratar questões politicas, devo lembrar quando eu e alguns membros desta casa faziamos forte opposição ao gabinete presidido pelo sr. Fontes, os louvores e os applausos, que recebiamos do partido progressista! Vinham os progressistas aqui, e approvavam essa campanha tenaz, que promovia-mos contra aquelle ministerio, que nós aggrediamos, levantando todos os dias questões politicas!
Recordo-me bem, quando se tratou da questão da Zambezia, o que se passou n'esta casa, o modo por que o partido progressista nos congratulou por termos encetado essa questão, dando-lhe excessiva feição politica.
Então não diziam os membros d'esse partido que eramos incompetentes, e que deviamos deixar á outra casa do parlamento o tratar os assumptos de natureza politica, porque só a ella competiam taes materias.
Perguntou-se aqui pela questão eleitoral, e o sr. conde do Casal Ribeiro, na resposta ao discurso da coroa, já depois de approvados todos os diplomas dos deputados, apreciou largamente, individualisando mesmo, o modo por que. se havia effectuado a eleição geral. O partido progressista muito o applaudiu, e ninguem disse que esta camara não tinha direito de tratar assumptos como esse.
Esta era a situação n'aquella epocha, e agora que vemos-? Vemos louvar a opposição d'esta camara, por ter usado do direito de censura politica em 1879, e negar, ou, pelo menos, pôr em duvida em 1881 esse mesmo direito, dizendo se, alem d'isto, que esta camara está mal constituida, a mais mal constituida de todos os senados existentes nos diversos paizes da Europa, e que os pares portuguezes gosam de uma influencia politica, que em direito constitucional lhes não pertence!
Quero responder a este ataque injustissimo; peço aos censores que me digam o modo por que estamos constituidos?
Sr. presidente, estes pares do reino, que estão aqui, são filhos ou do uso da prerogativa real, ou do direito hereditario; mas, se assim é, perguntarei como é que o partido progressista, gritando contra a prerogativa, abusou tanto do exercicio d'essa mesma prerogativa? E n'estas contradicções que está o descredito que muitas vezes soffrem os partidos politicos!
Demais parece-me ingratidão da parte do grupo politico, a que me estou referindo, atacar tambem a camara por ser filha do principio hereditario, quando muitos dos seus mais denodados campeões tem aqui tomado assento em virtude d'esse principio! (Apoiados.)
Agora, quanto á acção politica da camara, nego redondamente que a camara dos dignos pares se tenha imposto alguma vez á camara dos senhores deputados. Sabemos