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322 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

tudou, porque se não aprendeu senão a responder ás perguntas do jury.

Temos muitas leis que se não executam, e pomposos programmas de ensino com que nos contentâmos.

Da instrucção profissional que tem por fim crear homens uteis, achamo-nos no mais completo esquecimento. Felizmente o paiz tem boa indole, e não póde dar-se aqui o que se observa noutras nações onde ha desequilibrio entre as escolas litterarias e profissionaes; porque se não fôra assim, não faltariam agitadores e homens sem officio, aptos para todas as revoluções, menos para uma - a felicidade dos outros.

Sobre a instrucção primaria escuso de insistir n'este rapido esboço, que forçado pelo tempo tenho levado de corrida. Já tratastes alguma vez da educação da mulher? Não sabeis qual é a influencia que ella póde ter nas sociedades modernas? Não me surprehende que vos esqueçaes de instruil-a, porque nem sequer na educação do homem haveis ainda seriamente pensado.

Citarei o mais eloquente de todos os factos.

Vejo na lei de Passos Manuel, que data de 1842 decretado o ensino obrigatorio em Portugal - obrigatorio e gratuito - duas grandes idéas; mas, pelo ultimo recenseamento verifica-se, que sómente um sexto da população do paiz sabe ler e escrever.

O povo, portanto, ainda não sabe ler nem escrever, e é preciso que saiba ambas as cousas ao mesmo tempo, e quanto antes, embora o ministerio não tenha programma. A reforma do ensino em bases serias é outro capitulo que devem ter bem presente todos os governos, tenham ou não tenham programma.

Ácerca das colonias de que hoje tanto se falia, e pelas quaes julgo que todos se interessam, é minha opinião que estão carecendo de um impulso vigoroso. Houve um homem que teve este pensamento elevado, porem, como a politica partidaria se intromette na administração colonial da mesma fórma que se envolve na questão de fazenda e no recrutamento, o sou pensamento não tem sido desenvolvido seguidamente. E n'uma questão tão difficil, e que carece de tantos recursos pecuniarios e de tempo, não havendo pensamento seguido, como ha em Inglaterra, tarde se tornam os resultados palpaveis.

As colonias que, para mim, são as unicas minas que restam a Portugal, e que, pela sua natureza de minas, nunca darão rendimento se não forem larga e sabiamente exploradas, não podem deixar de resentir-se do estado de perturbação constante em que vemos a metropole no tocante aos pontos esboçados. Se a administração da metropole é má, a das colonias é peior. Se a justiça nem sempre impera no continente, a injustiça e as extorsões têem sido regra quasi sempre geral nos dominios de alem mar. Se as eleições têem causado na metropole os mais desastrosos effeitos, nas colonias as eleições têem sido um foco de intriga permanente, que paralysa todas as actividades, destroe os melhores planos, levanta os maiores attritos entre os funccionarios e quebra a lei na mão de todas as auctoridades. Vi só uma, a mais gloriosa, por sem duvida, e a mais civilisada, mas essa mesma que vi, e terei occasião de voltar a este assumpto, me dá uma idéa perfeitissima do que se passa nas outras. O estado de abandono é completo, a miseria geral. Mas nós não podemos prescindir de lançar mão d'ellas, como o nosso ultimo recurso, e, portanto, fazei leis para as colonias differentes das da metropole e adequadas á Índole especial de cada uma, embora vos falte programma.

A solução de todos os problemas apontados valia bem que se podesse ter chegado, sr. presidente, a formar um ministerio de conciliação com os homens principaes de todos os partidos. Nada mais natural do que uma tentativa neste sentido; e ninguem tem o direito de duvidar da efficacia de simiihante tentativa, sem havermos feito a experiencia primeiro. Não succedeu; porém, assim. Pretendeu-se um ministerio de conciliação constituido sob outras bases. Queria-se dois principiantes do meu partido, quando hoje n'aquellas cadeiras deviamos ver os homens mais conhecedores dos negocios publicos. A falta de governo forte e duradouro, temos outro que, sobre as questões da actualidade e que promoveram a crise, ainda não possue opiniões assentes. Declaro francamente, que se estivesse n'aquellas cadeiras e me tivessem perguntado qual era a minha opinião sobre o tratado de Lourenço Marques ou sobre o imposto de rendimento, não hesitaria um segundo em manifestal-a. Mas para isto é necessario ter programma, caso que não succede aos srs. ministros. Ha muitos modos de ter programma sem se perder de vista a modéstia. Ninguem pede milagres aos srs. ministros, mas não terem opinião sobre os assumptos que os trouxeram áquelles logares, isso é que é na realidade um phenomeno incomprehensivel!

Agora as reformas politicas. N'este ponto é que o governo actual tem convicções arreigadas. Não quer reformas politicas. E tanto bastava que se dissesse para ser impossivel conciliar-se comnosco. O partido que me fez a honra de trazer-me pela primeira vez ao parlamento considera, que alem das reformas de administração e outras já enumeradas, são necessarias tambem reformas politicas. Os meus amigos politicos entendem, que havendo ministros revolucionarios, se evitam todas as revoluções, e eu accrescento, para tornar mais frisante este nosso pensamento, que em Portugal a revolução deve sempre declarar-se no governo.

As reformas politicas que entendemos precisas não hão de assustar a monarchia, nem tão pouco, está entendido, se emprehenderão para vexar o povo. Tanto havemos de insistir por ellas que alguma vez as veremos realisadas. Este programma póde ser posto em pratica por qualquer partido monarchico, porque eu declaro ao paiz e a todos os meus illustres collegas que me escutam, que sou monarchico; acrescentando mais, que a instituição monarchica n'este paiz está intimamente ligada á sua independencia. Isto não é uma simples opinião politica, é tambem, se quizerem, uma opinião philosophica que partilho e aprendi com o nosso grande pensador Alexandre Herculano.

A manutenção da liberdade dos povos e o futuro das sociedades está na monarchia constitucional. Eu não nego que a republica contenha muitas excellencias, mas não acho que se torne necessaria n'um paiz onde haja um rei com uma constituição que se não opponha á acquisição de todas as liberdades. Nem ha liberdade que não possamos ter dada pela constituição,[embora haja rei. Demais a mais as nossas condições peculiares poderiam com a republica conduzir-nos á escravidão. A historia mostra o exemplo de muitas republicas sem liberdade; e povos ha que só se lembram de republica para absorverem os mais fracos!

Queremos reformas politicas apesar de monarchicos, e queremol-as mesmo por isso, para ir de encontro ás aspirações exaltadas dos partidos radicaes, que, pregando reformas impossiveis, só conseguiram até hoje na pratica o mais cruei dos despotismos. Não desejamos, porem, o estacionamento da sociedade, e pretendemos acompanhal-a na sua evolução em todos os progressos. Comprehendemos perfeitamente as necessidades da epocha.

Taes idéas estão no polo opposto da idéa velha a cuja sombra nos quizeram adormecer.

Por ultimo, sr. presidente, declaro a v. exa. e á camara que nem eu nem os meus amigos politicos desejam ser ministros. Considero o ser ministro o maior encargo que o homem politico d'este paiz póde tomar sobre os seus hombros, e julgo mais que não vale a pena ser ministro para rasgar o programma feito na opposição, ou para nos apresentarmos ao paiz sem programma. Até hoje ainda não acceitei nenhum cargo publico sem reflectir primeiro se o podia desempenhar. Ser ministro é o maior sacrificio que se póde