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N.º 42

SESSÃO DE 5 DE JULHO DE 1887

Presidencia do exmo sr. João Chrysostomo de Abreu e Sousa

Secretarios - os dignos pares

Frederico Ressano Garcia
Conde de Paraty

SUMMARIO

Leitura e approvação da acta. - Correspondencia. - O digno par Hintze Ribeiro manda para a mesa um requerimento de um official de engenheria, reclamando contra a ultima reforma do ministerio das obras publicas. Foi remettido á commissão competente. - O mesmo digno par pergunta, á mesa se os documentos por elle requeridos ainda não vieram. O sr. presidente responde a s. exa. - O sr. Hintze insta pela remessa.- O digno par Henrique de Macedo manda para a mesa um parecer da commissão de fazenda. - O digno par o sr. visconde de Moreira de Rey participa que a commissão especial que ha de rever o regimento da camara, quando constituida em tribunal de justiça, já se acha constituida, tendo nomeado para seu presidente o sr. Couto Monteiro, o sr. José Pereira para secretario, e relator a elle participante. - O sr. José Joaquim de Castro participa á camara que, por motivo de doença, não tem podido comparecer ás sessões. - O digno par o sr. Candido de Moraes manda para a mesa um parecer das commissões de fazenda e de agricultura, relativo ao projecto de lei n.° 21. Mandou-se imprimir. - Ordem do dia: leu-se o parecer n.° 62,e, posto á votação, foi approvado. - Leu-se o parecer n.º 63, e, posto á discussão, usaram da palavra os dignos pares Barbosa du Bocage e ministro dos negocios estrangeiros (Barros Gomes). - O digno par eleito Augusto José da Cunha manda para a mesa o parecer da commissão de fazenda, relativo ao projecto sobre o banco emissor. - O digno par o sr. Francisco de Albuquerque manda para a mesa um parecer da commissão de fazenda. Mandou-se imprimir. - O digno par Henrique de Macedo manda para a mesa um parecer da commissão de negocios externos. Mandou-se imprimir. - O digno par Wan Zeller participa á camara que está constituida a commissão de negocios externos, tendo nomeado presidente o digno par Mexia Salema e para secretario a elle digno par. - O sr. visconde de Moreira de Rey usa largamente da palavra. - O sr. presidente observa ao digno par que a hora está a dar e pergunta se s. exa. pretende ficar com a palavra reservada para a proxima sessão. - O sr. visconde de Moreira de Rey acceita a indicação do sr. presidente. - O sr. presidente faz algumas observações ao sr. visconde de Moreira de Rey, que este agradece. - Tendo dado a hora o sr. presidente levanta a sessão, dando para ordem do dia da sessão de amanhã a continuação da de hoje e mais o parecer n.º 66.

Ás duas horas e meia da tarde, estando presentes 26 dignos pares, o sr. presidente declarou aberta a sessão.

Lida a acta da sessão precedente, julgou-se approvada, na conformidade do regimento, por não haver reclamação em contrario.

Mencionou-se a seguinte:

Correspondencia

Um requerimento de um official de engenheria, reclamando contra a ultima reforma do ministerio das obras publicas.

Á commissão competente.

O sr. Hintze Ribeiro: - Mando para a mesa um requerimento de um official de engenheria, reclamando contra a ultima reforma do ministerio das obras publicas. E aproveito a occasião para perguntar a v. exa. se já vieram os documentos que ha longo tempo pedi, pelos ministerios das obras publicas, da fazenda e da guerra.

O sr. Presidente: - Ainda não vieram.

O Orador: - N´esse caso peço a v. exa. se digne instar novamente pela remessa, a fim d´elles chegarem o mais depressa possivel.

O sr. Henrique de Macedo: - Mando para a mesa um parecer da commissão de fazenda, sobre uma proposição de lei vinda da camara dos senhores deputados.

Foi a imprimir.

O sr. Visconde de Moreira de Rey: - Participo a v. exa. e á camara que está constituida á commissão especial que ha de rever o regimento da camara quando constituida em tribunal de justiça, nomeando para seu presidente o sr. Couto Monteiro, secretario o sr. José Pereira e relator a mira participante.

O sr. José Joaquim de Castro: - Participo a v. exa. é á camara que não tenho podido comparecer ás sessões por incommodo de saude.

O sr. Candido de Moraes: - Mando para a mesa um parecer das commissões reunidas de fazenda e de agricultura, relativo ao projecto n.° 21 vindo da camara dos senhores deputados.

Foi a imprimir.

ORDEM DO DIA

O sr. Presidente: - Vamos entrar na ordem do dia.

Vae ler-se o parecer n.° 62.

Leu-se na mesa e é do teor seguinte.

PARECER N.° 62

Senhores. - A vossa commissão de fazenda examinou com escrupulosa attenção o relatorio e as contas da illustre commissão administrativa d´esta camara, relativas ao anno economico de 1885 a 1886, verificando ter sido a receita, comprehendido o saldo do anno economico anterior, de 43:449$340 réis, e a despeza de 42:665$650 réis, passando por conseguinte um saldo de 783$690 réis para o anno economico de 1886-1887, e havendo uma differença de 846$350 réis para menos entre aquella despeza effectiva e a de 43:512$000 réis, que tinha sido votada; e

Attendendo a que as contas estão regulares, tendo tido a devida applicação as verbas auctorisadas; e

Visto terem sido cumpridos os preceitos da lei de 20 de agosto de 1853 e do regimento interno d´esta camará:

É a vossa commissão de parecer que approveis as referidas contas.

Sala da commissão, em 1 de julho de 1887. = A. de Serpa = Manuel Antonio de Seixas = Barros e Sá = Pereira de Miranda = Augusto José da Cunha = Conde de Magalhães = Frederico Ressano Garcia = Hintze Ribeiro- H. de Macedo = Conde de Castro, relator.

Senhores. - A commissão administrativa da camara dos dignos pares do reino, cumprindo a disposição da carta de lei de 20 de agosto de 1853 e o artigo 89.° do regimento interno, tem a honra de vos apresentar as contas da sua gerencia, relativas ao anno economico de 1885-1886.

A receita e a despeza do exercicio do mencionado anno vão descriptas no resumo e no desenvolvimento que acompanham este relatorio, bem como uma nota comparativa, por secções, das verbas votadas e das despendidas.

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Pelo primeiro (documento n.° 1), vê-se que a receita foi de 43:449$340 réis, sendo 1$580 réis provenientes do saldo do anno economico anterior, e 43:447$760 réis das verbas postas pelo ministerio da fazenda á disposição da commissão administrativa.

Pelo segundo (documento n.° 2), demonstra-se ter sido a despeza de 42:665$650 réis, distribuida pela seguinte forma:

Com o pessoal, comprehendido nas secções l.ª, 2.ª, 3.ª e 4.ª a quantia de 31:386$865 réis, e com o material 11:278$785 réis, a saber:

Assignatura do Diario do governo 1:503$000

Diario das sessões da camara e impressões 3:960$150 Despesas de expediente e eventuaes 5:815$635
11:278$785

Comparando a receita com a despeza encontra-se um saldo de 783$690 réis, que passa a fazer parte da receita do anno economico de 1886-1887.

Pela nota comparativa (documento n.° 3), ver-se-ha que

As quantias votadas foram de 43:512$000

E as despendidas de 42:665$650

De que resulta a diferença para menos de 846$350

SECÇÃO 1.ª

Votado 19:960$000

Despendido 18:846$665

Differença para menos 1:413$335

Provenientes de:

Ordenado de um chefe de repartição, não abonado durante quatro mezes e dezanove dias, a

75$0000 réis mensaes 347$500

Vacatura de dois logares de amanuenses, durante o anno economico, a 300$000 réis cada um 600$000

Ordenado de um redactor, não abonado durante dois mezes e treze dias, a 660667 réis

Mensaes 165$835 1:113$335

SECÇÃO 2.ª

Votado 8:492$000

Despendido 8:440$200

Differença para menos 51$800

Differença do ordenado de um correio do quadro antigo para o do moderno, durante o anno economico 50$000

Não abonados tres dias de vencimento a um guarda 10$800 51$800

SECÇÃO 4.ª

Votado 3:700$000

Despendido 4:000$000

Differença para mais 300$000

Pela aposentação concedida a um continuo.

ARTIGO 8.°

Votado 11:260$000

Despendido 11:278$785

Differença para mais 18$785

Diario do governo:

Votado 1:260$000

Despendido 1:503$000

Differença para mais 243$000

Diario das sessões da camara e impressões:

Votado 6:000$000

Despendido:

Diario das sessões da camara 2:805$030

Impressões 1:155$120 3:960$150

Differença para menos 2:039$850

Subtrahindo a differença do Diario do governo, fica para menos 1:796$850

Despezas de expediente e eventuaes:

Votado 4:000$000

Despendido:

Expediente 412$220

Eventuaes 5:403$415 5:815$635

Differença para mais 1:815$635

Abatendo a differença de cima, ficam para mais 18$785

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Recapitulando, temos:

A mais. A menos

Na secção 1.ª 1:113$335

Na secção 2.ª 51$800

Na secção 4.ª 300$000

No Diario do governo 243$000

No Diario das sessões da camara e impressões 2:039$85

Nas despezas de expediente e eventuaes 1:815$635

2:358$635 3:204$985

Differença para menos 846$350

NB. Incluem-se na verba das despezas eventuaes 30$330 réis com encadernações para a bibliotheca das côrtes, por não haver para ella dotação especial.

Palacio das côrtes, em 18 de dezembro de 1886. = A. M. de Fontes P. de Mello = Eduardo Montufar Barreiros = Francisco Simões Margiochi.

N.º 1

Resumo da receita e da despeza do anno economico de 1885-1886

(Ver tabela na imagem)

Palacio das côrtes, em 18 de dezembro de 1886, = Antonio Maria de, Fontes Pereira de Mello = Eduardo Montufar Barreiros = Francisco Simões Margiochi.

N.° 2

Desenvolvimento da despeza effectuada no anno economico de 1885-1886

ARTIGO 7.º

SECÇÃO 1.ª

Direcção geral 1:300$000

Secretaria 6:246$665

Tachygraphia 8:000$000

Redacção 3:300$000

SECÇÃO 2.ª

Pelicia e empregados menores 8:440$200

SECÇÃO 3.ª

Gratificação ao professor da aula de tachygraphia 100$000

SECÇÃO 4.ª

Empregados aposentados 4:000$000 31:386$865

ARTIGO 8.º

Importancia de 167 assignatufas, de anno, do Diario do governo 1:503$000

Diario das sessões da camara 2:805$030

Impressões 1:166$120 3:960$150

Expediente

Expediente proprio da secretaria, e retribuição aos encarregados dos caloriferos e illuminação, ao relojoeiro, ao jardineiro e outros, por serviços indispensaveis e permanentes 1:069$800

Eventuaes

Despezas miudas (12 documentos) 229$685

Trens para funeraes de dignos pares e outros serviços da camara (10 documentos) 45$450

Combustivel e accessorios para os caloriferos (2 documentos) 122$000

A companhia do gaz, pelo aluguer do contador e gaz consumido (22 documentos) 159$940

Ao marceneiro (6 documentos) 347$600

Concertos na canalisação do gaz, da agua e das retretes (7 documentos) 86$215

Concertos nas campainhas electricas (l documento) 2$600

Aluguer do contador da agua (9 documentos) 2$160

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Encadernações (2 documentos) 44$930

Por forrar a papel tres gabinetes da camara e tapetes para os mesmos (2 documentos) 122$540

Concertos no corredor da sala das sessões (2 documentos) 112$330

Por 32 escarradeiras para diversas dependencias da camara (l documento)
7$680

Á companhia concessionaria da rede telephonica (l documento) 33$750

Concertos em tinteiros (l documento) 2$600

o alfaiate por fardas para um correio, dois continuos e modificações na de um, um guarda portão e um guarda (3 documentos) 181$880

Vidraceiro (l documento) 11$200

Relação dos dignos pares por antiguidade de posse (l documento) 23$080

Remuneração de serviços, votada pela camara (l documento) 3:210$195 5:815$635 11:278$785

Palacio das côrtes, em 18 de dezembro de 1886, = Antonio Maria de Fontes Pereira de Mello = Eduardo Montufar Barreiros = Francisco Simões Margiochi.

N.º 3

Nota comparativa das verbas votadas e das despendidas pela camara no anno economico de 1885-1886

(Ver tabela na imagem)

Palacio das côrtes, em 18 de dezembro de 1886. = Barreiros = Francisco Simões Margiochi.

Posto á votação foi approvado sem discussão.

O sr. Presidente: - Vae ler-se o parecer n.° 63.

Leu-se na mesa e é do teor seguinte.

PARECEU N.° 63

Senhores. - Á vossa commissão de negocios externos foi presente o projecto de lei, vindo da camara dos senhores deputados, pelo qual 1.° é approvado o protocollo entre Portugal e a China, assignado em 26 de março de 1887, e 2.° é o governo auctorisado a ratificar o tratado de commercio, que, segundo determina o mesmo protocollo, será concluido entre as duas nações. Alem d´esta provisão relativa ao tratado de commercio, é, n´esse protocollo, confirmada a Portugal a perpetua occupação e governo de Macau e suas dependencias, como possessões portuguezas, obrigando-se por sua parte Portugal a não alienar estes territorios sem accordo com a China, e a cooperar com ella na cobrança do rendimento do opio em Macau pela mesma, forma que a Inglaterra o faz em Hong-Kong. Á vossa commissão foram tambem communicados pelo sr. ministro dos negocios estrangeiros todos os documentos relativos ás negociações que precederam a assignatura do protocollo.

A celebração d´este convenio, e a do tratado de commercio n´elle estipulado, são a realisação de dois propositos, de muito desejados e proseguidos, mas que ainda não fora, possivel conseguir. O direito de Portugal sobre Macau, firmado na occupação ininterrupta por mais de tres seculos, e no reconhecimento d´esse direito praticamente e realmente manifestado pela China, e no reconhecimento expresso das outras nações, titulos que são irrefragaveis perante o direito das. gentes; esse direito não fora todavia nunca consignado em nenhum documento diplomatico, firmado entre Portugal e a China. Apesar da amisade secular, que une estas duas nações, amisade cimentada por um grato intercurso entre os habitantes da China e os de Macau, e por serviços mutuamente prestados, a falta d´este reconhecimento official poderia dar, e de facto tem dado, occasião a discordias e occorrencias lamentaveis, cuja responsabilidade deve ser imputada, não aos desejos da suprema auctoridade, mas aos desmandos dos seus agentes

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subordinados. A este proposito bastará recordar a sempre chorada morte, no dia 2 de agosto de 1849, do intrepido governador, João Maria Ferreira do Amaral.

Essa falta de reconhecimento official tem ainda produzido outro aggravo, muito nocivo aos interesses commerciaes de Portugal, e ás garantias de justiça e segurança dos subditos portugueses em territorio chinez: por isso que tem sido causa de que se não tenha podido concluir nenhum tratado commercial nem convenções consulares e de extradição com a China. O mallogro do tratado, assignado em Tien-Tsin em 13 de agosto de 1862, não teve outro motivo senão as desintelligencias relativas á situação de Macau. E assim tem acontecido que os portuguezes, que foram os primeiros europeus que sulcaram os mares da China, os primeiros que abriram o seu commercio aos povos do occidente, e aquelles que, por effeito destas antigas relações, são talvez os mais bem acceitos ao governo e aos naturaes d´aquelle paiz, não teem até agora podido alcançar as vantagens conseguidas por outras nações.

O protocollo, cuja approvação faz objecto do presente projecto de lei, põe termo a esta situação anomala de Portugal e de Macau nas suas relações com a China. Por elle o direito de Portugal sobre Macau é officialmente reconhecido, e por elle se estatue que será firmado em Pekim um tratado de commercio com a clausula da nação mais favorecida. A unica obrigação effectiva, contrahida por Portugal, é a de cooperar na cobrança do rendimento do ópio em Macau. A importação do opio, out´rora prohibida, é desde 1858 auctorisada pelo governo da China. Mas os elevados direitos, a que com muita rasão está sujeita esta droga de tão facil e pernicioso abuso, constituem um grande incentivo ao seu contrabando. Comprehende se, pois, facilmente o justo empenho do governo chinez em procurar que os territorios independentes de Macau e Hong-Kong não sirvam de entreposto e valhacouto aos infractores das leis fiscaes. Acceitando para Macau sómente aquellas obrigações que a Inglaterra acceitar para Hong-Kong, onde o commercio do opio é incomparavelmente mais activo e importante, Portugal conserva a plena garantia de não se sujeitar a nenhuma restricção desarrasoada ou exorbitante.

Por estas rasões, e considerando que, nas convenções com a China, se deve imitar o exemplo das outras nações, que não insistem na rigida observancia das formulas diplomaticas usuaes no occidente, é a vossa commissão de parecer que o projecto de lei merece a vossa approvação.

Sala da commissão, em 1 de julho de 1887. = A. de Serpa (com declarações) = Marguez de Rio Maior = J. M. Ponte Horta = Visconde de Borges de Castro = J. V. Barbosa du Bocage (com declarações) = C. B. da Silva = H. de Macedo = A. Costa Lobo, relator, - Tem voto do sr. A. de Ornellas.

Projecto de lei n.° 16

Artigo 1.° É approvado o protocollo entre Portugal e o imperio da China, assignado em Lisboa em 26 de marco de 1887.

Art. 2.° Fica o governo auctorisado a ratificar desde logo o tratado de commercio entre Portugal e o imperio da China, que, nos termos do artigo 1.° do mesmo protocollo, será negociado e firmado em Pekin.

Artigo 3.° Fica revogada toda a legislação em contrario.

Palacio das côrtes, em 27 de junho de 1887. = José Maria Rodrigues de Carvalho, presidente = Francisco José de Medeiros deputado secretario = José Maria de Alpoim de Cerqueira Borges Cabral, deputado secretario.

O sr. Bocage: - Sr. presidente, eu assignei com declarações o parecer que está em discussão, e vou dar as rasões por que o fiz.

Não podendo approvar o projecto que está em discussão, preciso, pois, justificar o meu procedimento.

Eu entendo que a camara não póde approvar este projecto.

Terei de occupar por algum tempo a attenção da camara, e, por isso, careço da sua benevolencia, que espero não me será negada mais uma vez.

Folgo muito, sr. presidente, de que seja relator d´este projecto o sr. Costa Lobo, e folgo muito com isso, não só porque sempre é agradavel discutir com um cavalheiro illustrado e cortez, como s. exa., mas ainda por outra rasão.

O sr. Costa Lobo é um austero respeitador da lei, sempre intransigente com as menores infracções do nosso regulamento, admirador consciencioso e enthusiasta da Inglaterra, das leis inglezas e dos costumes inglezes, não admittindo interpretações cerebrinas das leis, combatendo os sophismas e incapaz de transigir com os dictames da consciencia. E, alem de tudo isto, pouco exposto a ceder a suggestões partidarias, pois que se declara independente de todos os partidos e agrupamentos politicos.

E, na verdade, s. exa. não é nem progressista, nem regenerador, nem figura no numero dos amigos politicos do sr. Vaz Preto; é monarchico, e, por isso, comprehendo que, com o maior desassombro, possa seguir sempre os dictames da sua consciencia sem ter de transigir com as conveniencias partidarias.

Com estes predicados, que todos lhe reconhecem, eu atrevo-me a esperar que o digno par venha collocar-se a meu lado, repetindo commigo que o projecto que estamos discutindo não póde merecer a approvação da camara.

Um rapido exame, sr. presidente, um exame superficial d´este projecto de lei, e desgraçadamente todos nós somos obrigados a bem rapidamente examinarmos as questões que nos são submettidas, não basta para se ficar com cabal conhecimento do que elle significa; um mais attento exame é indispensavel para que se comprehenda o que elle é na realidade.

Á primeira vista parece que se trata simplesmente de pedir á camara que auctorise o governo com um voto antecipado a mandar ratificar um tratado completo e definitivo.

Não é isto, é muito mais do que isto o que se pretende.

Não ha ainda tratado; apenas se apresentam as bases incompletas do um tratado que se vae negociar em Pekim, e que pretende-se que a camara auctorise desde já o governo a que o ratifique.

O que se deve responder ao governo é que faça primeiro o tratado, e depois que o traga aqui para ser discutido e approvado.

Isto é que é regular; e se, ao contrario, a camara approvar este parecer, não faz mais do que delegar poderes no governo a fim de que elle continue com a dictadura, moléstia chronica de que está eivado. E n´este momento, e n´estas circumstancias o exercicio de mais esta especie de dictadura, não me parece conveniente, e muito menos me parece conveniente o pedir a um corpo illustrado como este, a uma corporação a que pertencem altas illustrações, e as mais competentes para aconselhar o governo, a pedir-lhes, digo, que considere tratado um protocolo que apenas contem as bases, algumas d´ellas incompletas, de um tratado que se vae negociar, que o approve sem o conhecer por um voto de confiança!

Quando mesmo estivesse nas attribuições do parlamento acquiescer ao pedido do governo, concedendo-lhe a auctorisação que solicita, não poderia fazel-o esta camara sem quebra do seu decoro.

Urna tal acquiescencia, porem, envolveria muito maiores responsabilidades, porque a camara não tem poderes e faculdades para conceder similhante auctorisação.

Para o demonstrar passo a considerar o projecto que se

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discute como elle realmente deve ser considerado, e a apreciação que vou fazer será muitissimo mais severa.

O pedido que se faz á camara não é só inconveniente, extemporaneo e indiscreto; é muito mais do que isso.

Pede-se, ou para melhor dizer, exige-se d´esta camara, um pouco disfarçadamente, que ella sé preste a ser cumplice do governo n´um attentado manifesto, evidente, contra o nosso codigo fundamental.

A minha affirmativa é facil de demonstrar.

O facto de não ter sido principalmente considerado este projecto de lei sob este grave aspecto pelos espiritos esclarecidos que na outra casa do parlamento o combateram, não é para admirar, nem póde ser invocado em sua defeza.

Contra elle se adduziram na camara dos senhores deputados outras rasões, tambem valiosas, e se se não insistiu mais no principal argumento que, a meu ver? o invalida, o implicar a derogação de uma disposição do nosso codigo fundamental, explica-se isso facilmente pela pressa com que correu a discussão, que não tardou muito em ser abafada.

Vejamos o que diz o artigo 2.° do projecto.

(Leu.)

Este artigo declara expressamente que se vae negociar em Pekim um tratado de commercio, e pede que o governo seja auctorisado a ratificar desde logo esse tratado. Pergunto eu. Está o parlamento portuguez auctorisado para o fazer, cabe nas suas attribuições conceder esta auctorisação? Póde o parlamento portuguez dispensar a execução litteral e rigorosa da disposição que determina o modo por que se deve proceder em assumptos d´esta ordem?

Vejamos quaes são as leis que devem regular o nosso procedimento. Quando se negoceia um tratado ha entre a sua assignatura e a ratificação um acto a preencher. Este acto está definido no codigo fundamental do estado.

A carta constitucional e o primeiro acto addicional encerram disposições claras a este respeito. O § 8.° do artigo 75.° da carta constitucional diz o seguinte.

(Leu.)

E o acto addicional no seu artigo 10.°modificou a disposição fundamental que diz respeito ás attribuições do poder executivo, e modificou-a, passando uma parte d´essas attribuições para o poder legislativo.

(Leu.)

D´estas disposições conclue-se que qualquer tratado, convenção ou convenio, não póde ser ratificado sem ser sujeito ao exame e approvação do parlamento.

O projecto que se discute diz-nos que se vae negociar em Pekim um tratado e que esse tratado ha de ser assignado e enviado depois para ser ratificado.

Exige-se da camara, sr. presidente, a approvação de um tratado que não se conhece, que não está feito e que não está ainda nas condições de ser acceito e assignado.

Sr. presidente, a approvação d´esta proposta é evidente e incontestavelmente a revogação do artigo 1.° do acto addicional.

Com relação a este facto particular pede-se ao parlamento a suspensão d´este artigo.

Ora, pergunto eu: póde a camara suspender este artigo do acto addicional ou fazer-lhe qualquer modificação!

Parece-me que não.

Dirijo-me muito especialmente aos distinctos jurisconsultos que temos a honra de contar como collegas n´esta camara, e pergunto-lhes se a minha argumentação é ou não rigorosamente exacta.

Pergunto se não se trata de auctorisar o parlamento a approvar um tratado que não está ainda feito nem negociado, do qual apenas se conhecem algumas das clausulas que ha de conter, que não póde ser por conseguinte devidamente apreciado.

Pergunto, sr. presidente, se a approvação de um tratado n´estas condições, se este voto de confiança não implica um pedido de cumplicidade para a revogação do artigo 10.° do acto addicional?

Pergunto finalmente, se estou em erro quando affirmo que é um artigo constitucional, e se a camara em sessão ordinaria tem poderes expressos e faculdades para derogar artigos constitucionaes?

Se as respostas de s. exas. forem, como supponho que devem ser, que o tratado não está feito, pois vae ainda ser negociado, que não pôde ser apreciado pois que d´elle apenas se conhecem algumas das clausulas que ha de conter, que a sua approvação deve ser feita depois de completo e assignado em obediencia a um preceito constitucional que este parlamento não póde derogar, concluirei, sr. presidente, que este projecto de lei não póde ser approvado.

Repito: se a resposta for, affirmativa, como creio, não restará duvida alguma que a camara não póde approvar a proposta de lei que se discute, e não póde approvar porque não tem poderes para delegar no governo, como seria necessario que delegasse, para prescindir da approvação do projecto de lei que se discute.

Eu sei que o artigo 10.° do acto addicional foi modificado numa das suas disposições, e talvez haja quem deste facto queira menos reflectidamente concluir que este artigo deixou de ser considerado como constitucional, visto ter sido modificado por uma camara que não tinha poderes especiaes.

Não creio que se invoquem a serio taes argumentos, mas sempre é bom consideral-os e rebatel-os desde já.

E verdade que foi modificado o artigo 10.° do acto addicional em relação ao modo por que deve ser approvado qualquer tratado ou convenção.

O artigo 10.° do acto addicional, dizia que fosse em sessão secreta, depois por uma proposta de iniciativa do sr. Carlos Bento e sobre parecer de uma commissão especial composta na maxima parte de distinctos jurisconsultos desta camara, os sr. Carlos Bento, Antonio Augusto de Aguiar, Fernandes Vaz, Barjona de Freitas, Barros e Sá, etc. approvou-se que as convenções e os tratados fossem discutidos antes da ractificação, não em sessão secreta, mas em sessão publica.

A camara permittirá que eu leia alguns trechos do relatorio desta commissão, porque se acham ali consignadas as boas doutrinas.

(Leu.)

Dizia esta commissão que era obrigação imposta ao governo o trazer á discussão do parlamento as convenções ou tratados antes da sua ratificação, e entendia esta commissão composta de eminentes jurisconsultos de todas as parcialidades politicas, que era um verdadeiro principio liberal o que se achava exarado n´aquella proposta e continuava.

(Leu.)

Por conseguinte, a modificação d´este artigo em disposição que dizia apenas respeito a uma questão de forma não é precedente que possa invocar-se contra a constitucionalidade d´elle, nem ha precedentes que justifiquem o procedimento do governo em vir pedir a esta camara a approvação de um tratado que ainda não existe.

Pela proposta do sr. ministro dos negocios estrangeiros o parlamento é privado de um direito de que não póde prescindir; elimina-se esse direito, porque se exige a sua approvação antes da camara ter conhecimento do tratado, quando a lei manda que a camara tenha conhecimento d´elle, o examine e só depois o approve com perfeito conhecimento de causa, para que possa ser ratificado.

Já se vê, pois, que a camara não póde approvar esta proposta de lei, não tem as faculdades nem poderes para derogar um artigo constitucional, e a approvação d´esta proposta implicaria evidentemente a derogação d´esta disposição contitucional.

Sr. presidente, prezo-me de fazer justiça a todos, sobretudo aos meus adversarios politicos; tenho mesmo grande

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satisfação em a fazer ao illustre ministro dos negocios estrangeiros, porque sou amigo de s. exa. e aprecio as suas altas qualidades de intelligencia e caracter.

Poderia suspeitar-se, pela maneira por que é apresentada esta proposta de lei, que havia intento de obter a sua approvação por surpreza, occultando a circumstancia de que a auctorisação que se pede encontra dificuldades invenci-veis num artigo constitucional; mas devo declarar que não lhe dou essa interpretação. Entendo que apenas houve irreflexão; o sr. ministro preoccupou-se demasiado com a demora na ratificação do tratado; preoccupou-se demasiado, e procedeu precipitadamente.

Imaginou o sr. Barros Gomes que os plenipotenciarios partiam de Lisboa, chegavam rapidamente a Pekim, concluiam rapidamente com a China o tratado, sem encontrarem a menor difficuldade em fazerem vingar as clausulas e a redacção mais conveniente aos nossos interesses, devolviam-no assignado a Lisboa, e s. exa. teria então o supremo contentamento de o ratificar. Assim pareceu-lhe que muito áquem do termo d´este praso que vae da sessão actual á proxima sessão legislativa poderia o tratado estar prompto. E n´isto parece-me que se illudiu. Eu não creio que as cousas se passem tão rapidamente como a s. exa. se afigurou.

Estou persuadido que as negociações não podem concluir-se rapidamente; pelo contrario, parece-me que nos devemos ir preparando resignadamente para as ver durar muito tempo; tanto mais que, segundo me consta, ha um periodo largo de interrupção de communicações entre Pekim e os portos de embarque para a Europa, Macau ou outro qualquer.

Segundo li ha poucos dias n´um jornal, o regresso do plenipotenciario francez, mr. Constant, não poderá effectuar-se senão depois de 15 de agosto, por estarem interrompidas as communicações com Pekim. D´onde concluo, que tambem os nossos plenipotenciarios sómente então poderão emprehender a sua viagem.

Com taes demoras, é de suppor que o tratado não se ache concluido antes de estar aberta a immediata sessão legislativa.

Para que é então que se veiu pedir esta auctorisação com manifesta violação da carta, quando se poderia cumprir a lei sem sacrificio algum apreciavel de tempo?

Agora, sr. presidente, entrarei mais circunstanciadamente na analyse do projecto que se discute.

Diz o artigo 1.°:

(Leu.)

O que significa approvar um protocollo?

Um protocollo não é um tratado.

Os protocollos servem para n´elles se consignar o resultado das negociações attinentes aos tratados ou tendentes a explicar ou modificar as disposições de tratados já existentes.

Os protocollos precedem os tratados ou completam-nos, mas são essencialmente distinctos dos tratados, das convenções e dos convenios.

Se o protocollo contem as bases ajustadas para um tratado que se vae negociar, é claro que desapparece logo que o tratado é firmado; porque o protocollo funda-se, para assim dizer, no tratado.

É claro que o protocollo neste caso não tem de ser sujeito á approvação do parlamento, visto que o será mais tarde o tratado. Seria fazer approvar duas vezes um certo numero de clausulas ou disposições.

Os protocollos que teem de ser submettidos á sancção do parlamento são os que contêem disposições accordadas clausulas occultas depois da negociação de um tratado. Taes protocollos completam os tratados e fazem parte integrante d´elles.

Não está evidentemente n´este caso aquelle a que se refere o artigo 1.°, o qual contem apenas algumas das bases, mal definidas, do tratado que se vae negociar.

Pedir, portanto, ao parlamento que approve um protocollo n´estas condições é uma innovação perfeitamente injustificavel.

É notavel que o sr. ministro dos negocios estrangeiros seja tão solicito em pedir á camara approvação de um protocollo que significa apenas a esperança de um tratado, e queira ao mesmo tempo que ella se dispense de examinar p tratado, como lhe cumpre, de o discutir e approvar com conhecimento de causa.

S. exa. quer que nós prescindamos de tudo isto, e que fique só a cargo do governo apreciar as condições do tratado, a sua redacção, e que seja elle o unico que veja se o tratado corresponde, ou não ás necessidades publicas.

Mas (dir-se-ha) o protocollo contem algumas disposições que hão de figurar por força no tratado, e esta parte quer o governo que o parlamento approve.

Mas outras disposições que elle contem são perfeitamente vagas, referem-se a assumptos que devem sempre ser submettidos ao exame e discussão parlamentar.

A negociação que vae iniciar-se em Pekim tem precisamente por objecto definir e. consignar extensamente em tratado o que apenas se acha indicado nas bases inscriptas no protocollo; é do resultado d´esta negociação, é do tratado .que o parlamento terá de occupar-se, conferindo-lhe ou negando-lhe a sua sancção.

Analysemos algumas disposições consignadas no protocollo, segundo se deprehende do artigo 1.° do projecto.

(Leu.)

O protocollo contem, segundo parece, a indicação de quatro bases ajustadas, uma das quaes é um tratado de commercio com a clausula da nação mais favorecida.

Diz assim o protocollo:

(Leu.)

Ora ha, portanto, a notar que no artigo 1.° vem consignada a approvação a esse tratado de commercio e a mais tres bases que devem figurar no futuro tratado; e logo em seguida no artigo 2.° a camara approva novamente o tratado de commercio.

O que significa e como se explica esta dupla approvação ao tratado de commercio?

Pois não se trata aqui de um tratado unico?

N´isto ha uma confusão, uma obscuridade, que realmente me embaraçou.

Examinemos as bases accordadas no protocollo.

A primeira base refere-se ao tratado do commercio.

Ha a objectar-lhe que a clausula da nação mais favorecida não é suifficiente para que se possa apreciar esta parte do futuro tratado.

A base 2.ª diz que a China confirma, etc.

Eu não serei muito austero na apreciação d´este ponto.

Não pertenço a uma certa escola que está constantemente a declamar que não prezamos as glorias dos nossos antepassados e que não sustentamos o verdadeiro esplendor das conquistas por elles effectuadas, e invocando direitos, que não sabe muitas vezes justificar, quer que sejamos intransigentes com as outras nações, embora arrisquemos com a exageração das nossas pretensões a conservação do nosso dominio em muitos pontos onde não temos sabido ou podido manter a nossa auctoridade effectiva.

Não pertenço a essa escola apparatosa e banal, e por isso direi que faço inteira justiça ao illustre ministro e ás pessoas que com elle collaboraram n´esta negociação preliminar, acreditando que se occultaram uma redacção que não contem o expresso reconhecimento de direitos que a China nunca nos quiz reconhecer, é porque lhes não foi possivel conseguir mais.

Fica-nos d´este modo garantida in perpetuum a posse de Macau; e se effectivamente, se reconheceu a impossibilidade de obter mais, não é indecoroso que nos contentemos com o que se alcançou.

Temos agora o n.° 3.°

(Leu.)

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Este n.° 3.°, sr. presidente não contem, na verdade, offensa da dignidade do nosso paiz; mas é uma limitação do nosso direito de propriedade, e para o occultarmos precisâmos recordar-nos que a China é uma nação desconfiada é que nas suas relações com os povos do occidente não deve ser-lhe indifferente que nós possamos ceder Macau a qualquer outra potencia mais poderosa.

Por occasião das negociações com a Inglaterra para o tratado do Zaire, lembro-me perfeitamente que correu na imprensa que nos era hostil ò boato de que íamos ceder Macau á França, boato propalado catão com o fim de nos indispor- com a Inglaterra.

Agora temos ainda o n.° 4.°

(Leu.)

Temos de cooperar com a China na fiscalisação dos direitos do opio, pelo modo que se estabelecer esta cooperação em Hong-Kong.

Mas em que consiste esta cooperação?

Não o sei, nem p sabe mesmo o governo, pois que E o parecer da camara dos senhores deputados se diz que o conselho de Hong-Kong alterara as primeiras condições ajustadas para tal fim. com a Inglaterra.

Temos, pois, que a camara tem de pronunciar-se approvando uma cooperação de que não conhece absolutamente nada, pois que o governo não1 se digna dar-lhe informações algumas a tal respeito, e de mais a mais sabendo que o modo de cooperação ajustado primeiro com a Inglaterra soffreu modificações, que o nosso governo ignora quaes fossem.

E inaudito, sr. presidente, que se queira impor a um parlamento portuguez a approvação de um regulamento ajustado entre dois paizes estrangeiros, sem o menor conhecimento do que seja um tal regulamento.

Quem nos affiança que esta cooperação possa ter logar em Macau, do mesmo modo por que a faz a Inglaterra em Hong-Kong sem graves inconvenientes para nós?

Basta a circumstancia de ser Macau uma peninsula adherente ao territorio chinez e Hong-Kong uma ilha para vermos que até as condições topographicas são differentes. Isto alem de se achar a Inglaterra em relação á China n´uma situação diversissima da nossa.

Esta clausula vaga inscripta no protocollo não tem significação de valor algum, é preciso que venha definida em um tratado, em termos precisos o modo de cooperação fiscal que prestâmos á China para que se possa dizer se esta clausula merece ou não ser approvada.

Eu não posso dizer se o governo faz bem ou mal em acceitar esta clausula, porque não conheço o seu alcance; mas tambem ninguem me póde affirmar de que sejam vãos os meus receios, de que à nossa cooperação fiscal não fique regulada de modo que de futuro aquella nossa possessão não venha a soffrer nos seus interesses.

Nas negociações com a China é preciso hoje muita mais cautela do que n´outro tempo.

A China é um estado poderosissimo, e que de futuro ha de tomar em relação ás nações europêas uma attitude muito differente da que tem tido até hoje.

A nossa cooperação fiscal precisa ser feita de modo que não de logar a conflictos de que possam resultar complicações graves e porventura a perda total d´aquella nossa antiga possessão.

E comtudo, sr. presidente, esta cooperação, de que o proprio governo não tem cabal conhecimento, já está posta em execução em Macau.

A proposito d´esta cooperação se ter tornado desde já effectiva, eu devo dizer que o não acreditaria, se não visse confirmado este facto no parecer da commissão de nego dos externos da camara dos senhores deputados.

N´esse parecer le-se o seguinte:

(Leu.)

Ora, sr. presidente, isto significa que nós damos desde já esta cooperação á China, e que ficâmos á espera que a China nos conceda o que nos promette e está consignado no protocollo.

Mas ha mais, sr. presidente. Macau é um porto franco e n´esta qualidade aufere grandes interesses de quatro ramos importantes de commercio; o commercio do chá, de seda, de ópio e de tabaco.

A cooperação da nossa acção fiscal com a acção fiscal chineza importa portanto na suppressão immediata da franquia commercial com relação a um dos mais valiosos ramos de commercio, o commercio do opio.

No momento em que. se vae cooperar com a China e não fingir que se coopera, no momento em que vamos honradamente, como um povo honesto, evitar que se faça o contrabando, exigir que o opio, antes de sair de Macau para outros portos, passe pelo posto fiscal chinez onde pague o competente direito, cooperâmos effectivamente, impondo o direito de exportação no opio e tornando effectiva a cobrança em favor da potencia amiga. Parece-me que se não devia derogar a lei que estabeleceu porto franco em Macau, parece-me que se não devia com uma antecipação que nada justifica derogar de fórma alguma por um simples aviso, por uma portaria ou por um telegramma, uma situação commercial de que Macau auferiu lucros importantes sem termos ainda nem mesmo a certeza de que obteremos da China as compensações que podem justificar uma tal concessão.

A China entra já no goso das vantagens que lhe assegura o tratado, nós ficamos ainda á espera de que se digne conceder-nos as que figuram apenas no protocolo como uma promessa vaga e sujeita á uma laboriosa negociação.

Não desejo alongar as minhas considerações e, concluindo, direi que o ponto especial a que attendi nas minhas considerações é a completa impossibilidade em que está esta camara de conceder ao governo a approvação antecipada que elle pede, auctorisação que implica a infracção da carta constitucional.

Se, com effeito se dá, como eu acabo de mostrar, um attentado contra a constituição do estado, a camara, approvando o projecto que está em ordem do dia, faltaria ao seu dever, e ao seu decoro, pois que praticaria um acto que não é legal nem moral.

Se ha rasões que possam justificar um tal procedimento, deem-nas os membros d´esta camara mais competentes em taes assumptos, que muito as desejo ouvir e muito folgarei de ser convencido.

Tenho dito.

O sr. Ministro dos Negocios Estrangeiros (Barros Gomes): - Vou começar por onde acabou o digno par. S. exa. fortificado com, as disposições da carta constitucional, - e eu não creio que tanto n´esta como na outra casa do parlamento, alguem se possa amparar a esteio mais solido, -- s. exa., repito, fortificado com as disposições preceituadas na carta constitucional e no primeiro acto addicional, veiu declarar a esta camara, que, a menos que não haja rasões ponderosas, que a sua lucidez não descobriu até este momento, falta esta camara ao seu dever, e não attende a nenhuma consideração legal e moral, approvando o projecto que está em ordem do dia, projecto que é, na opinião de s. exa. a negação de todas as garantias e o desmentimento cabal dos mais solemnes e mais claros preceitos do nosso codigo fundamental.

Parece-me no entanto que .s. exa. dirigiu assim, e sem o querer, uma censura á outra casa do parlamento. Ainda que s. exa. nos disse aqui, querendo pôr assim dizer attenuar a impressão de uma tal accusação, que se teria dado o facto por haver talvez escapado ao espirito perspicaz dos membros da outra casa do parlamento a gravissima importancia do assumpto, parece-me evidente que o digno par lançou sobre a camara dos senhores deputados com essa apreciação uma censura que eu pela minha parte não posso deixar de levantar.

Eu creio que a discussão d´este projecto de lei na outra

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casa do parlamento foi, como é sempre costume e pratica d´aquella casa, conscienciosa e intelligente. Tomou parte n´essa discussão um dos homens mais eminentes do partido regenerador, e que milita como tal nas fileiras da op-posição. Discutiu-se largamente o assumpto durante uma sessão em que discursou por hora e meia ou duas horas um illustre membro d´aquella casa, repito, que não póde ser suspeito para s. exa.?

Ora, n´estas circunistancias imaginar o digno par que podia ter escapado o reconhecimento de um attentado desta ordem, de um attentado que vinha ferir essencialmente as prerogativas parlamentares e as disposições constitucionaes, parece me que foi ir um pouco longe, foi talvez o deixar-se arrastar levado por aquelle estimulo de opposição que o anima, que tantas vezes póde perturbar ainda o espirito mais esclarecido e imparcial.

Parece ao digno par que esta proposta de lei constitue mais uma prova da mania de dictadura de que este governo se acha possuido, e que, a ser assim, demonstraria apenas que tambem nos afflige uma doença de que teriamos todos adoecido successivamente, pois, eu creio que nenhum partido, que nenhum governo, que nenhum ministro póde deixar de ser accusado de ter praticado ou pelo menos arrostado a responsabilidade de actos similhantes de dictadura. E s. exa. menos do que outros póde levantar a pedra, pois foi dictador e dictador por capricho, sem necessidade politica que o justificasse.

As dictaduras podem ser e com effeito são muitas veves justificadas pelas circumstancias politicas que de momento se apresentam, e precisamente aquellas em que se encontrou este ministerio podem bem dizer-se nesse caso, pois, se não fosse a dictadura que assumiu, ter-lhe-ia sido absolutamente impossivel manter-se n´estas cadeiras, e por essa forma ter-se-ia, mais uma vez, affirmado a perpetuidade de um determinado partido no poder e o predominio exclusivo e injustificado de uma certa e determinada situação politica, na gerencia dos negocios publicos, graças ás dictaduras repetidas e desnecessarias de que se tinha lançado mão em outras occasiões.

Isto é indispensavel que se diga uma e muitas vezes.

Por minha parte, francamente o declaro, quando annui ao convite do nobre presidente do conselho para acceitar uma pasta na organisação do novo gabinete, declarei logo a s. exa., e pude assim verificar o accordo das nossas idéas, que nós não deveriamos acceitar o governo sem ter a certeza de poder, em determinadas circumstancias, exercer a dictadura.

E a rasão era que o uso ou antes o abuso das dictaduras tornavam absolutamente impossivel a qualquer situação que não fosse de proveniencia regeneradora o manter-se á frente dos negocios publicos. (Apoiados.)

Eu não posso deixar de afastar de mim uma accusação que me parece injusta, e muito mais a proposito de um projecto de lei que exclue absoluta e completam ente essa mesma accusação, de estarmos constantemente a faltar ás praxes parlamentares e a desacatar o que nos cumpre acatar e respeitar, como o são os preceitos da lei fundamental do estado.

Sr. presidente, o digno par parece-me que baseou toda a sua argumentação, e fundou todas as suas gravissimas accusações contra o governo num artificio de discussão que consiste em formular primeiro enormes incriminações contra o governo, como s. exa. fez quando discutiu com toda a largueza o artigo 2.° do projecto, julgando ter assim morto o governo, para discutir depois mansamente e de passagem o artigo 1.°, sem o qual se torna impossivel e inacceitavel a doutrina do artigo 2.°

Sr. presidente, o facto de vir o governo a esta camara pedir similhante auctorisação é o reconhecimento evidente de que sem a intervenção, não só d´esta camara, mas sem o consentimento parlamentar não podia o governo dar validade ao tratado.

Aqui está definido e comprovado do modo mais terminante o nosso respeito pela lei constitucional.

Mas, sr. presidente, por isso mesmo que é da competencia do poder legislativo intervir nos tratados, é que o governo vem pedir auctorisação para ratificar um tratado e não para o celebrar, pois isso então caberia nas suas faculdades ordinarias.

Pede auctorisação, repito, para ratificar desde já um tratado de commercio com a China, mas declarando já que elle ficará subordinado á clausula da nação mais favorecida.

Pela mesma forma promettendo a cooperação fiscal declara desde logo que o será nas condições em que a Inglaterra as conceder em Hong-Hong.

Com o tratado de commercio irá envolvido um convenio de extradição e uma convenção consular; mas o digno par sabe perfeitamente quaes são as convenções d´essa natureza que regulam na actualidade as relações da China com as principaes nações da Europa e da America, e que todas vão de accordo com o direito internacional acceito pelo Celeste Imperio.

Não é de certo possivel imaginar-se que poderiamos, nós portugueses, negociar com a China em condições mais favoraveis do que o têem feito nações como os Estados Unidos, Allemanha, Inglaterra e França. Portanto as clausulas do nosso tratado, podem dizer-se conhecidas antecipadamente e é por certo uma grande vantagem alcançada o ter obtido da China a promessa ou obrigação de negociações em que sejamos por ella tratados nas condições em que aquelles paizes o teem sido, isto é, nas condições mais favoraveis de quantas se acham até agora exaradas nos tratados que se têem feito com aquelle paiz.

É, pois, n´estas circumstancias e com taes limitações que eu venho pedir que se me confira auctorisação para celebrar um tratado de commercio com a China.

O sr. Vaz Preto: - Tudo isso é muito bom, mas não está contido no artigo 2.°

O Orador: - Diz o digno par que nada disto está contido no artigo 2.°! Está, porem, no protocollo, e o protocollo faz parte d´esta proposta de lei, e por isso eu affirmo que se não deve separar o artigo 1.° do artigo 2.° na discussão.

O digno par o sr. Bocage definiu da maneira mais clara e terminante o que seja um protocollo. O que estamos discutindo representa as bases ou principios essenciaes desde já assentes, que hão de figurar depois definitivamente no tratado, que terá de ser negociado e ratificado mais tarde.

Ora todas estas disposições do protocollo que hão de assim figurar n´esse tratado definitivo são precisamente as que poderam suggerir duvidas para Portugal, pela sua importancia politica.

Tudo o que resta é relativamente secundario. Tratando-se de um convenio com a clausula da nação mais favorecida, as suas disposições existem já bem definidas nos tratados analogos, celebrados com outras potencias, e não podem por isso offerecer duvida na sua definitiva redacção.

Com respeito, porem, ao estado de Macau, permitta-me a camara que eu lhe diga que todos os governos d´esta terra teriam trabalhado par conseguir definir os nossos direitos ali, para isso fez s. exa., o sr. Bocage, diligencias directas e indirectas, e o sr. Serpa tambem por seu lado as realisou, appelando até para as potencias e fortalecendo este appello com a redacção de um memorandum que é um dos documentos mais notaveis que têem saido do nosso ministerio dos negocios estrangeiros.

Antes de s. exa. muitos outros ministros desejaram conseguir o mesmo resultado, mas nunca lhes foi possivel realisar o que intentavam. Considerou-se em tempo uma grande gloria para Por-

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tugal ã circumstancia de ter celebrado o tratado de commercio com a China em 1862.

Deu ella logar a que o sr. visconde da Praia Grande de Macau fosse ali recebido em triumpho ao regressar de Pekim.

´esse tratado estabelecia-se, porem no artigo 2.° unicamente que ficava sem effeito tudo o que se tivesse dito ou escripto anteriormente ácerca de Macau, d´antes situado na provincia de Cantão. N´esta palavra d´antes se queria ver a confirmação indirecta por parte da China da nossa situação em Macau.

Quando, porem, se tratava de trocar as ratificações deste tratado, a China recusou-se a fazel-o, porque affirmou que a tal palavra d´antes não figurava no texto chinez, no qual se dizia unicamente Macau na provinda de Cantão.

Compare a camara o que precede com as affirmações contidas no actual protocollo, e veja qual a differença; e não era a redacção actual a que a principio me foi proposta, novamente o confirmo, e como os documentos relativos a este tratado hão de a seu tempo vir á camara, registem-se desde já as minhas palavras; tomem d´ellas nota os srs. tachygraphos e os dignos pares, para mais tarde se verificar á face d´esses documentos a verdade do que affirmo.

Agora o que eu estranhei é que o sr. Bocage viesse dizer á camara que ignorava promenores que no seio da commissão tinham sido ventilados, tendo eu ali apresensentado todos, os documentos da negociação, sem excepção de um só; similhante ignorancia só a posso attribuir, por certo, ao pouco tempo que s. exa. pôde applicar ao estudo d´esta questão.

O sr. Bocage: - Um dos pontos sobre que eu manifestei duvidas não teve na commissão senão muito insufficiente explicação.

O Orador: - Teve toda a que podia ter. Não possuo ácerca d´elle outros esclarecimentos alem dos que ali apresentei.

O sr. Hintze Ribeiro: - Mas porque não publicou os documentos?

O Orador: - Não o devia fazer. O governo é juiz da opportunidade da publicação de quaesquer documentos diplomaticos.

Se por emquanto não publiquei estes, foi porque julguei inopportuna a sua publicação, visto que poderiam prejudicar as negociações em Pekim.

Os documentos hão de vir todos á camara, repito, mas a seu tempo.

O sr. Hintze Ribeiro: - A boas horas! Depois de approvado o tratado!

O Orador: - Hão de vir; v. exa. e a camara não ignoram que, estando pendentes as negociações para um tratado de commercio com a China, a publicação d´esses documentos daria occasião a que uma certa imprensa europêa, que nos é constantemente adversa, causasse embaraços á conclusão das negociações, e essa imprensa tiraria partido d´esta discussão, para levantar na China difficuldades que fariam perigar as negociações finaes para o tratado de commercio, e portanto o governo, como unico juiz da opportunidade da sua publicação, não quiz acceitar a responsabilidade de a fazer primitivamente. Alem d´isso, o governo não veiu pedir ás suas maiorias, nem ás commissões, que votassem este parecer sem conhecimento de causa. O governo apresentou ás commissões das duas camaras todos os documentos que possue, relativos a esta negociação, e apreseatal-os-ia á camara, se a sessão fosse secreta; mas, como o não é, entendeu não o dever fazer. Em todo o caso, o que não duvido, por minha parte, é confial-os ao digno par ou aos dignos pares que os quizerem examinar; publicai-os é que não faço.

O sr. Hintze Ribeiro: - V. exa. diz que me póde franqueai a mim os documentos, como os franqueou á commissão, e eu desejaria que v. exa. os franqueasse a todos os membros d´esta camara, havendo para isso sessão secreta, se tanto fosse necessario.

O Orador: - Não me parece que seja preciso constituir a camara em sessão secreta, porque eu posso apresentar particularmente ao digno, par, ou aos dignos pares que o desejem, todos os documentos que o governo possue, ácerca d´estas negociações, reservando-me o direito de chamar a attenção de s. exas. sobre os pontos, que o governo entende não deverem ser referidos no debate.

Não me parece, portanto, que seja preciso haver sessão secreta, mesmo porque o que está consignado no protocollo é claro, e a auctorisação que se pede tambem é muito definida e restricta.

Descreve-se aqui claramente a forma como ha de ser inserida no tratado a situação em que Macau fica, em face da China; esta forma, é verdade que não póde agradarão digno par, mas n´esse caso s. exa. rejeite-a. Está no seu direito, mas não deixa de estar perfeitamente esclarecido, mesmo no que respeita ao tratado de commercio, visto que se garante a Portugal o tratamento da nação mais favorecida.

Mas foi porventura o protocollo precedido de uma larga negociação ácerca dos promenores da fiscalisação a que nos, obrigámos. Não foi, nem podia ser.

É este o ponto menos esclarecido da proposta, mas não tão pouco como alguns dignos pares parecem suppor, porque eu já mostrei ás commissões, e não tenho duvida de mostrar a quem deseje conhecel-o, qual é o regulamento que a este respeito foi primeiro negociado para Hong-Kong.

E certo que algumas modificações se teem introduzido posteriormente n´esse projecto de regulamento, mas essas modificações são de certo todas favoraveis para Hong-Kong.

E não se diga que não ha paridade entre as condições de Hong-Kong e de Macau, visto que Hong-Kong é uma ilha e Macau uma peninsula.

Macau póde quasi dizer-se que é uma ilha, tão estreita é a parte de terra que a prende á China e por isso o que sobre este ponto está em vigor e é acceitavel em Hon-Kong póde tambem applicar-se a Macau sem inconveniente nem motivo rasoavel de queixa.

Mas, sr. presidente, o que é mister não esquecer para apreciar com justiça esta clausula é qual fora sempre a situação de Macau em face da China, e quanto convinha, a ter de fazer-se alguma cousa, vel-a equiparada neste ponto a Hong-Kong...

(Interrupção que não se ouviu.)

A situação de Hong-Kong em face da China seria porventura a mesma que a de Macau? De certo que não. Hong-Kong está n´uma situação definida, acceita pela China e imposta a este imperio por um tratado que foi o resultado de uma guerra passada; mas em relação a Macau não se dava o mesmo. A nossa posse tacitamente acceita, nunca fôra reconhecida officialmente.

Ora, sr. presidente, quando n´estas condições nós dizemos que acceitâmos em Macau as mesmas condições que a Inglaterra entender possivel acceitar na sua colonia, julgo, e a meu ver com o melhor fundamento, que não enfraquecemos com isso a nossa dignidade, e portanto, essa mesma clausula, que poderá parecer menos clara, está, a meu ver, assas claramente definida, para que a camara possa, com plena consciencia do que faz, votar a favor d´ella.

Mas, ainda ha mais. O digno par ouviu-me explicar no seio da commissão o que dizia respeito á fiscalisação de Hong-Kong.

Perguntou o digno par onde é que se estabeleciam as alfandegas.

Declarei logo terminantemente, soccorrendo-me dos documentos diplomaticos, e declaro agora á camara de uma maneira franca e explicita, que se estabelece a condição

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formal de não haver no territorio portuguez cousa alguma que se pareça com uma repartição chineza.

Esta circumstancia foi muito accentuada no seio da commissão, e eu declarei então muito terminantemente que dentro de Macau se não consentiria qualquer auctoridade chineza.

Ora, sr. presidente, quando isto se consegue, - e eu peço licença á camara para dizer-lhe que estes esforços só lograram exito no fim de uma lucta prolongada, porque a primitiva idéa, e isto resulta facilmente do estado das negociações, era completamente contraria a este nosso desejo, - quando tudo isto se consegue, repito, creio bem que são menos justas as palavras do digno par a quem estou respondendo.

Depois de uma discussão larga entre mim e o plenipotenciario chinez, repito, estabeleceu-se a condição formal de que qualquer auctoridade chineza ou qualquer repartição chineza seriam necessariamente collocadas fóra da area de Macau.

Aqui tem, pois, a camara as declarações terminantes que eu posso fazer, e os dignos pares, votando o projecto, não faltam assim, nem á sua dignidade, nem a nenhuma consideração legal ou moral. (Apoiados.)

O sr. Hintze Ribeiro: - É uma questão de confiança politica?

O Orador: - Sr. presidente, eu disse na outra camara, e não receio declarar n´esta, que desde o momento em que o governo apresentava um pedido de auctorisação para ratificar um tratado, esse pedido, significava até certo ponto e dentro de certos limites, um voto de confiança; (Apoiados.) mas essa confiança está definida, limitada, circumscripta, em tudo quanto ha de essencial, por este projecto.

As condições relativas á situação de Macau, os termos em que se ha de realisar a fiscalisação, os sitios onde se hão de estabelecer as alfandegas, tudo que póde interessar o paiz, tudo aqui está definido claramente e preceituado, ou tudo é por mim explicado e exposto á camara. Quem desejar conceder o seu voto a este projecto, sabe o que faz.

Do que eu não tenho esperança é de levar a convicção ao animo do digno par o sr. Hintze Ribeiro. Tambem s. exa. nem sempre conseguiu persuadir-me, apesar de dispor de outros recursos, apesar de ter uma intelligencia muito mais vasta e um poder de palavra que sou o primeiro a confessar que não possuo.

Apesar de tudo isso, nunca s. exa. logrou convencer-me que a sua gerencia financeira fosse das mais felizes, nem a mais adequada para levantar o credito nacional. E natural tambem que o digno par procure hoje ver antes o que lhe pareça inconveniente na proposta apresentada pelo governo e não reconheça o que ella consigna em beneficio do paiz. (Apoiados.)

O digno par sr. Bocage, accentuou por todas as formas quanto ficara surprehendido pela revelação que tinha ido descobrir no parecer da commissão de negocios externos da outra camara quando ali se asseverara que a cooperação fiscal estava em vigor em Macau desde 4 do mez passado. " Mas como e onde se consentiu isto? " Exclamava indignado s. exa., " onde estava o governo, quando foi privar-se da unica arma de que dispunha para actuar no animo dos negociadores do imperio da China? "

O digno par, que segue com tanto interesse o andamento dos negocios publicos, devia, porem, ter visto no Diario do governo de 29 de março, epocha posterior á data do protocollo, um decreto firmado pelo meu illustre collega e antecessor na pasta da marinha, o sr. Henrique de Macedo, estabelecendo essa corporação provisoria, accentuando-lhe bem este caracter, e deixando claramente significada a possibilidade de lhe pôr um termo, quando e como nos parecesse conveniente fazel-o.

Não discutiu toda a imprensa este decreto, inclusive a ultramarina, especialmente a de Macau e quasi toda a de Lisboa?

Não se sabe que a idéa do tratado, a esperança de brevemente o realisar, foram muito bem recebidas pela nossa colonia da Asia?

As resoluções do conselho legislativo de Hong-Kong, as idas a Pekim da nossa missão e a Hong-Kong e Macau de sir Robert Hart, são tudo factos notorios e que foram discutidos e mencionados na imprensa.

E vem o digno par admirar-se aqui, depois de tudo isto, que a fiscalisação provisoria já se ache em vigor em Macau?

Ora, eu vou referir mais minuciosamente á camara e ao digno par como esta negociação correu, e ficar-se-ha sabendo assim a historia e a rasão de ser da fiscalisação provisoria.

Esta negociação foi encetada em Macau, e, mais tarde, proseguida em Lisboa de uma fórma sempre officiosa e com um caracter pura e exclusivamente confidencial.

Appareceu aqui um cavalheiro inglez, funccionario do celeste imperio, que me foi apresentado pelo ex-governador de Macau, o sr. Thomás Rosa. Este individuo, o sr. Duncan Campbell, não tinha então representação official; mas a sua competencia foi por mim reconhecida, por ter sido elle que em França havia negociado em 1880 com os srs. Billot e Ferry os preliminares do tratado de paz que a republica celebrou com a China, depois da guerra do Tonkin.

Só esta circumstancia bastaria para despertar em mim a maior confiança no sr. Campbell.

Alem de que as correspondencias e telegrammas recebidos e expedidos para Pekim davam claro indicio de que s. exa. podia fallar em nome do proprio Tsung-li-Yanen.

Hoje as negociações com a China não teem já as difficuldades extraordinarias de outros tempos, pelo menos não exigem um praso indefinido para se conhecer o que quer e pretende, o governo de Pekim.

As negociações realisam-se hoje pelo telegrapho e a China recua tão pouco perante as despezas que envolve este meio rapido de negociar, que, por exemplo, telegrammas expedidos para Pekim em nome do governo portuguez e os de ali recebidos em Lisboa constituem bem um volume de impressão. E foi assim, e pelo telegrapho, que se póde assentar nas bases de um tratado de commercio com a China, que são, como já disse, perfeitamente diversas d´aquellas que se haviam negociado e acceito em 1862, e chegando-se, finalmente, a encontrar uma formula que podia com dignidade ser acceita por Portugal e pela China e que tornava facil a ulterior negociação de um tratado de commercio, vasado nos moldes já, conhecidos das convenções d´este genero, realisadas pelo celeste imperio.

E eu ouvi com grande prazer o sr. Bocage, quando s. exa. se referiu ao artigo do protocollo relativo a Macau. S. exa. não duvidou asseverar claramente que n´este ponto essencialissimo se tinha mantido e sustentado o decoro nacional.

Por minha parte registei a declaração do digno par, e folgo com ella, e com o valor e realce que lhe dá a situação politica de s. exa. n´esta casa, pois o seu applauso é para mim garantia de que me applaudirão tambem os outros membros da opposição.

Eu olho sempre para os meus adversarios, que muitas vezes são intransigentes, e principalmente para o sr. Hintze Ribeiro; folgo por isso com os seus louvores, mas descanse o digno par, cujo gosto de contradicção observo n´este instante, faço sempre para s. exa. uma excepção, no que respeita a louvores que me possam ser tributados.

A camara fará a justiça de reconhecer, salva a maior rapidez da transmissão a que ha pouco alludi, que difficuldade um negociador encontra ao tratar com a China. S. exa. conhece bem, como ministro dos negocios estrangeiros que foi, e todos os membros d´esta camara o apreciarão, como devem ser grandes os embaraços em negociar um tratado d´esta ordem, e não admira que facil-

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583 DIARIO DA CAMARA DOS PARES DO REINO

nente se acredite que a negociação foi protelada, e as propostas primitivas concebidas em termos taes, que, se fossem apresentadas ao parlamento portuguez, elle as rejeitaria in limine.

Debateu-se, pois, a questão palmo a palmo mas fixados por fim Os pontos principaes que diziam respeito á situação de Macau, e que constam do actual portocollo, eu declarei que era preciso dar um caracter official a esta negociação, e adoptar- para isso o systema do sr. Ferry, ficando consignadas as bases já concordadas num protocollo, e devendo essas bases serem mais tarde inseridas e desenvolvidas no tratado definitivo.

Para conceder o que me pediam, a cooperação provisoria, exigi, e foram satisfeitas as minhas exigencias, o que se fizera com a França, isto é, um decreto imperial publicado em Pekim, auctorisando o sr. Campbell a assignar em Lisboa as condições d´este protocollo, e que a noticia da publicação d´esse decreto me fosse confirmada, por intermedio de qualquer governo acreditado em Pekim, pelo representante d´esse governo em Lisboa.

N´esta conjunctura, um distinctissimo homem de estado, lord Salisbury, prestou a Portugal uma cooperação amigavel, de que eu folgo de dar conta á camara.

Foi elle que me participou, por intermedio do representante inglez n´esta côrte, que tivera conhecimento official, pela legação ingleza em Pekim, da publicação do referido decreto imperial.

Obtido, pois, o conhecimento official de tal publicação, eu desejei segurar desde logo as negociações, e fixar as condições primarias do tratado por meio de um protocollo, offerecendo em troca uma cooperação provisoria.

Foi assim que eu concedi a fiscalisação provisoria em Macau, fiscalisação estabelecida por um decreto do Rei de Portugal, e que amanhã póde ser regovado por outro decreto, tudo nos termos do que dispõe e auctorisa o artigo 15.° do primeiro acto addicional.

N´estas condições repito, ficou firmado aquillo em que tinhamos assentado, e ficou garantida tanto quanto é possivel, a certeza de que se firmará o tratado definitivo, porque no dia em que elle soffresse qualquer risco, a cooperação podia cessar, não só em Macau, como tambem, e ipso facto em Hong Kong.

Ora, sr. presidente, isto será zelar mal os interesses do paia, será negociar com pouca habilidade, e os dignos pares que têem occupado esta pasta poderiam talvez ter conseguido muito mais, mas o que eu posso asseverar com franqueza a v. exa. e á camara, é que até esta epocha é o mais que se tem conseguido d´aquelle imperio.

Sr. presidente, o digno par que me precedeu alludiu a que Macau era um porto franco, e que em virtude desta cooperação essa situação ia cessar.

Primeiro que tudo é preciso que eu diga á camara em que consiste esta cooperação.

Como a camara sabe, ha desde muito um arrematante do opio em Macau por conta do governo portuguez, e os que negociavam n´este genero ficavam já sujeitos a uma certa fiscalisação. Essa fiscalisação agora tornar-se-ha mais effectiva. Será prohibida a venda de opio a particulares por mais de um certo peso. Poderão ser visitados os depositos e vistos os elementos de escripturação que accusam o movimento do opio. Todo o navio que vier com opio terá de ir receber do capitão do porto um documento com o qual se apresentará na alfandega chineza, ahi fará as suas declarações e pagará os direitos. Aqui está muito em resumo em que consiste a cooperação que nós damos.

Ora como é que, em face d´esta explicação por mim dada no seio da commissão, póde um cavalheiro, que foi ministro da marinha e dos negocios estrangeiros, dizer que esta fiscalisação importa a alteração das condições de Macau como porto franco? Eu ouvi isto e não o queria acreditar.

O sr. Bocage: - O que eu disse foi que o facto de se executar já esta cooperação acabava com o porto franco, para o opio pelo menos.

O Orador: - Desde o momento em que sujeitamos o commercio do opio a uma severa fiscalisação, acaba, é certo, uma industria florescente em Macau, que se manifestava exteriormente ali pela existencia de grandes caravanas que á luz do dia passavam por baixo das varandas do palacio do governador. Perguntava-se, ao vel-as, o que eram e significavam? Era o contrabando do opio, que seguia para a China.

Mas eu perguntarei se é decoroso que um paiz nas condições em que Portugal está, contribua para cercear por tal fórma o rendimento de um estado que é seu visinho?

O digno par diz-me que acaba essa industria? Respondo-lhe que sim. Tambem acabou a industria dos coolies como acabou por igual a escravatura na Africa.

Mas o commercio do chá, o commercio da seda, em que é que elles padecem por effeito do protocollo?

(Áparte do sr. Bocage.)

A esta objecção opposta pelo digno par que foi ministro dos negocios estrangeiros e ministro da marinha, pondero com admiração que s. exa. parece ter esquecido que existia em Macau desde muito uma cousa a que se chamava estações chinezas fiscaes, que por todas as fórmas nos vexavam e humilhavam, ao passo que de futuro hão de ser estabelecidas nas mesmas condições em que se encontrarem em Hong-Kong, e portanto em condições de não deverem assustar-nos.

Sr. presidente, o que eu desejo é chegar á conclusão de todos os actos diplomaticos que devem preceder a validade de um tratado que tanto interessa a Macau.

Uma missão extraordinaria foi enviada pelo governo á China com o fim de negociar esse tratado de commercio.

Tenha a camara porém a certeza de que se porventura se levantassem quaesquer difficuldades para a realisação d´esse tratado a cooperação fiscal em Macau deixava tambem de existir ipso facto.

Se acaso a missão chegar a concluir em breve o tratado, como eu supponho, que deverá succeder, ser-me-ha enviado logo, podendo então ver-se se foi ou não celebrado em conformidade das condições do protocollo, e das instrucções dadas ao negociador.

Sr. presidente, a ratificação do tratado de commercio e de amisade com a China é, não só um facto de grande importancia para Macau, mas por outro lado faz com que acabe a situação em que nos encontrâmos em face dos outros povos e põe um termo ás desintelligencias que até agora tem havido entre as auctoridades chinezas e os nossos consules.

Essa situação humilhante acaba logo que o tratado seja ratificado e o governo então seria com rasão censurado se não lhe pozesse termo o mais rapidamente possivel.

Ora, sr. presidente, a historia dá-nos a este respeito lições valiosas.

O tratado de 1862 foi discutido e approvado pelas côrtes, a camara usou então de todas as suas prerogativas; mas a esse tratado succedeu o que menos se esperava, isto é foi ratificado pelo governo portuguez não o sendo pela China.

Discutiu-se o tratado, sendo a final approvado, mas a troca das ratificações não se verificou.

Para evitar inconvenientes d´esta ordem, que podem surgir com a demora, é que se me afigurou de vantagem pedir desde já auctorisação á camara para apenas negociado ratificar desde logo o tratado, apreciando assim a final resolução do assumpto, mesmo porque o nosso representante não póde conservar-se indefinidamente em Pekim.

Creio, pois, com o que acabo de dizer ter justificado o procedimento do governo, e é animado de inteira confiança que appello para a final resolução da camara.

O sr. Augusto José da Cunha: - Mando, para a

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SESSÃO DE 5 DE JULHO DE 1887 589

mesa o parecer da commissão de fazenda relativo ao projecto sobre o banco emissor.

O sr. Francisco de Albuquerque: - Mando para a mesa um parecer da commissão de fazenda.

O sr. Henrique de Macedo: - Mando para a mesa um parecer da commissão de negocios externos, sobre o tratado da convenção entre Portugal e a França para a delimitação das possessões na Africa occidental.

O sr. Presidente: - Estes pareceres vão a imprimir.

O sr. Van Zeller: - Participo a v. exa. e á camara que está constituida a commissão de negocios externos, da qual é presidente o sr. Mexia Salema, e eu secretario.

O sr. Visconde de Moreira de Rey: - Disse que, em face do procedimento do governo, é conveniente mandar para a mesa a seguinte substituição:

" Fica o governo auctorisado, emquanto o julgar conveniente, a dispensar a convocação e a reunião das duas camaras legislativas, ficando desde já ratificadas e com força de lei, todas as providencias que o governo publicar em decretos."

Diz que se mostra de bom humor ao encetar as boas reflexões que vae fazer. Disserta sobre as. dictaduras, e considera-as como um acto de ousadia, não dos tempos modernos, mas dos antigos, em que os dictadores, responsaveis pelos seus actos, arriscavam a vida.

(Já tinha dado a hora.)

O sr. Presidente: - Tenho a observar a v. exa. que a hora deu e perguntar-lhe se pretende que lhe reserve a palavra.

O Orador: - Ah! eu concluo; não fico com a palavra para amanhã.

O sr. Presidente: - Permitta-me ainda o digno par que lhe observe que me parece que não devo propor á camara a admissão da sua proposta, porque ella me parece contraria á rhetorica parlamentar, porque este projecto não diz respeito a nenhum acto de dictadura e principalmente porque a substituição apresentada por v. exa. envolve um convite á dictadura, o que é contrario á constituição do estado. (Apoiados.)

O Orador: - Eu respeito sempre e muito a opinião de v. exa. e tenho muito desejo de seguir as suas indicações; mas agora com mais prazer o faço, por ver que v. exa. é apoiado pelo sr. Barros e Sá.

Portanto, retiro a minha substituição.

(O discurso será publicado quando s. exa. o restituir.)

O sr. Presidente: - A seguinte sessão terá logar amanhã; a ordem do dia será a continuação da de hoje e mais o parecer n.º 66.

Está levantada a sessão.

Eram pouco mais de cinco horas.

Dignos pares presentes na sessão de 6 de julho de 1887

Exmos. srs.: João Chrysostomo de Abreu e Sousa; João de Andrade Corvo; condes, de Alte, de Bomfim, de Castro, da Folgosa, de Linhares, de Paraty; viscondes, de Benalcanfor, de Borges de Castro, de Carnide, de Moreira de Rey; barão do Salgueiro; Adriano Machado, Agostinho Lourenço, Braamcamp Freire, Aguiar, Quaresma, Sá Brandão, Silva e Cunha, Antunes Guerreiro, Barros e Sá, Henriques Secco, Couto Monteiro, Serpa Pimentel, Costa Lobo, Telles de Vasconcellos, Cau da Costa, Augusto Cunha, Carlos Testa, Sequeira Pinto, Pinheiro Borges, Hintze Ribeiro, Cardoso de Albuquerque, Van Zeller, Ressano Garcia, Barros Gomes, Henrique de Macedo, Jayme Moniz, Candido de Moraes, Valladas, Vasco Leão, Andrada Pinto, Coelho de Carvalho, Gusmão, Braamcamp, Bandeira Coelho, Baptista de Andrade, Castro, Fernandes Vaz, Lobo d´Avila, Ponte Horta, Mello Gouveia, José Pereira, Mexia Salema, Silvestre Ribeiro, Sampaio e Mello, Bocage, Luiz Bivar Seixas, Pereira Dias, Vaz Preto, Franzini, M. Osorio Cabral, D. Miguel Cominho, Gonçalves de Freitas, Calheiros, Thomás de Carvalho, Barjona de Freitas, Serra e Moura.

Redactor = Carrilho Garcia.

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