316 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
que pretendo desenvolver em larga escala a respeito deste objecto?
Alem disso, onde fica a dignidade da camara?
É preciso que esta casa do parlamento tome o logar que lhe compete. Appello para a consciencia de todos os meus collegas, e peço-lhes me digam se é possivel discutirmos estes dois projectos sem a presença do sr. ministro da fazenda, quando ambos os projectos são da sua iniciativa? Parece-me que não.
Nestes termos pois proponho o adiamento delles até estar presente o sr. ministro da fazenda.
Mando para a mesa a minha proposta, que é concebida nestes termos:
"Proponho o adiamento destes dois projectos até estar presente o sr. ministro da fazenda. = Ferrer".
(O orador não reviu as notas dos discursos na presente sessão).
O sr. Presidente do Conselho de Ministros (Marquez de Sá da Bandeira):- Não me parece necessario o adiamento deste projecto até se achar presente o sr. ministro da fazenda; em primeiro logar, porque elle não soffreu alteração alguma na commissão de fazenda; e em segundo, porque é um projecto igual ao que foi votado o anno passado; é um imposto ordinario que tem passado de uns para outros annos, e que tem sido votado quaesquer que tenham sido as administrações que têem estado á frente dos negocios publicos, desde certa epocha. Parece me portanto que a camara faria bem em approvar este parecer, e rejeitar o adiamento apresentado pelo digno par, o sr. Ferrer.
Agora em relação ao que disse o digno par sobre a inconveniencia da moeda insulana, farei algumas brevissimas considerações
Ha duas moedas insulanas differentes: a moeda dos Açores e a da Madeira.- Ora, esta differença de moedas, que existe em algumas das nossas ilhas, já ha muito que devia ter acabado; porque a fallar a verdade é uma perfeita anomalia uma certa moeda ter um valor numa ilha, ter outro valor noutra ilha e ainda differente valor no continente. Eu tenho feito toda a diligencia para que se acabe, para sempre, com esta desigualdade de valores, mas ainda não pude conseguir cousa alguma, apesar de reconhecer que não é cousa muito difficil de verificar. Póde-se fazer como em Cabo Verde. Nesta provincia havia uma moeda fraca que valia menos 6 por cento do que a moeda do reino, e o governo, para acabar com ella, ordenou que os direitos das alfandegas só fossem recebidos em moeda forte ou do reino; que o pagamento aos funccionarios publicos daquella localidade fosse pago em igual moeda e que tambem na referida moeda se cobrassem as contribuições. Em relação aos contratos anteriores deliberou-se que na verificação de qualquer pagamento se fizesse o respectivo desconto, em relação de uma para outra moeda. Apresentou-se alguma repugnancia da parte daquelles povos, como sempre acontece quando se pretende introduzir qualquer innovação, mas essa repugnancia desappareceu em pouco tempo.
Em Moçambique tambem a moeda era mais fraca: por exemplo, um cruzado, 400 réis, correspondiam a l$000 réis; e havia uma outra anomalia maior; um duro hespanhol tinha um certo valor em Moçambique, tinha outro em Lourenço Marques e ainda outro em Quilimane. Hoje a moeda ali é a mesma do reino.
Estas anomalias devem pois acabar em toda a parte mesmo para facilidade e utilidade das transacções commerciaes.
O sr. Conde d'Avila: - Como membro da commissão de fazenda deu algumas explicações, opinando que se podia proseguir na discussão do projecto, que podia ser approvado, no entanto que não estão promptos os trabalhos do congresso monetario que regulará universalmente sobre o assumpto.
(Os discursos do digno par, nesta sessão, serão publicados quando as notas tachygraphicas se devolverem corrigidas.)
O sr. Fernandes Thomás: - Sr. presidente, apenas direi duas palavras.
Nas breves considerações que ha pouco fiz perante a camara apenas me referia ás moedas de prata, e não me referia ás moedas de oiro porque as moedas antigas de oiro que hoje correm são apenas as peças, e parece-me que não haveria inconveniente em legislar que continuassem a circular do mesmo modo. Ellas porem vão desapparecendo, porque pela fundição dellas é que se tem cunhado as novas moedas de oiro. Se se fizesse uma lei neste sentido, parece-me que nada prejudicaria, porque uma lei vigora emquanto outra a não deroga; e se em tempo futuro fosse necessario por qualquer medida monetaria acabar com o curso das antigas moedas de oiro, nenhuma dificuldade haveria então em derogar essa lei. Emquanto ás moedas de prata do antigo cunho, parece-me que ellas não abundam tanto que se não podessem substituir com facilidade; e se as substituissemos pelas modernas, escusariamos de estar todos os annos a votar esta lei. Effectivamente, o que é verdade é que desde que se publicou a lei de 29 de julho de 1854 a circulação principal tem sido quasi exclusivamente de moedas de oiro estrangeiras. E sr. presidente, leis com relação ao meio circulante não se fazem sem muito exame previo, sem muita attenção e sem se calcularem bem os seus resultados. Com effeito, o dinheiro em oiro que hoje quasi exclusivamente corre entre nós são os soberanos, dinheiro estrangeiro, e não é dado aos legisladores, nem a ninguem, o prever nem a sua accumulação nem a sua falta ou escassez na circulação, porque isso só depende dos cambios e das operações commerciaes, e estado dos mercados. No entanto, não obstante ter eu dito a primeira vez que fallei que rejeitava o projecto de lei, não tenho duvida de dizer agora que ainda desta vez o approvarei em vista das explicações que o sr. conde d'Avila acaba de dar perante a camara. Estimarei comtudo que se apresente uma lei definitiva sobre este objecto, que evite que nós para o anno tenhamos outra vez de prorogar os prasos estabelecidos pela lei de 29 de julho de 1854.
O sr. Ferrer (sobre a ordem): - Sr. presidente, tive a honra de mandar ha pouco para a mesa uma proposta de adiamento até ser presente o sr. ministro da fazenda.
A camara admittiu-o á discussão, mas os dignos pares que teem usado da palavra, em vez de se occuparem delle, têem fallado sobre a materia, e eu, de proposito, deixei correr a discussão deste modo, porque dessa propria discussão tiro argumento em favor do adiamento.
Sr. presidente, as considerações apresentadas pelos srs. Fernandes Thomás, e conde d'Avila, são importantes, umas com relação ao que está feito, e outras com relação ao que se ha de fazer; e parece-me de alta importancia que o sr. ministro da fazenda ouça essas considerações, para lhe poder responder ou toma-las na devida conta.
Sinto ir de encontro á opinião do sr. presidente do conselho, mas isto assim não póde ser; não podemos discutir este projecto sem a presença do sr. ministro da fazenda, porquanto o que disseram os srs. Fernandes Thomás, e conde d'Avila deve ser ouvido por s. exa. o sr. ministro, como já demonstrei. Pois havemos de votar dois projectos desta natureza na ausensia ao sr. ministro da fazenda? Se o sr. conde de Samodães não pede vir hoje a esta camara, o melhor será adiarem-se estes negocios, e não se proceder tratando-se delles na sua ausencia. Fallo francamente, pelo muito que prezo a dignidade da camara. Parece-me pois que discutir projectos desta natureza, um dos quaes trata, nada menos, que da contribuição predial de todo o reino, sem a presença do sr. ministro da fazenda, é não tratar a questão com aquella seriedade que comporta. Portanto, peço a v. exa. chame a discussão para a proposta do adiamento, e sobre ella se tome uma deliberação.
O sr. Presidente: - O digno par o sr. Ferrer propoz o adiamento do projecto, e foi admittido pela camara, entrando em discussão com a materia; mas para satisfazer ao