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612 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

da responsabilidade em que incorreu, violando em circumstancias normaes a lei fundamental do estado, e em seguida votava a minha moção, que como disse, era de principios. Por esta fórma ficava tudo acabado. Mas não aconteceu assim.

Permitta-me, pois, ar camara que eu tire as consequencias da sua votação. É para isso que serve o discutir-se.

A minha moção, sr. presidente, foi rejeitada por 35 votos contra 25. Os dignos pares que votaram contra ella declarara, ipso facto, que não se devia respeitar a constituição do estado!

Quando v. exa. do alto da sua cadeira participava o resultado da votação, eu olhava para um lado da sala e via os bustos do marechal Saldanha, o vencedor de Almoster, do duque de Loulé e de Fontes Pereira de Mello, parecia-me vel-os vacillarem nos seus pedestaes; olhava para o outro lado da sala, e via os bustos do duque da Terceira, o vencedor de Asseiceira, do duque de Palmella, o diplomata illustre que em Londres tão assignalados serviços fez á causa liberal, todos estes bustos parecia-me velos estremecerem e precipitarem-se dos seus pedestaes; e, casualmente olhando para aquella porta, vi o medalhão, onde está o retrato de D. Pedro IV, o Rei Soldado, que implantou a carta constitucional, parecia desengastar-se da parede, por ver que a sua obra era tão mal tratada.

Sr. presidente, permitta-me v. exa. e a camara que eu proteste energicamente contra a apreciação que os dignos pares fizeram da minha moção, chamando-a insidiosa: lógica é que ella é. O procedimento de s. exas. é que não merece esta classificação.

Thiers disse no parlamento francez que os governos só eram fortes, quando eram lógicos. Eu tambem pergunto pela lógica dos dignos pares quando se procedeu á votação da minha moção.

A que ha pouco mandei para a mesa e que, como v. exa. viu, é para que o governo de conta á camara do uso que fez das auctorisações que tomou em decretos dictatoriaes, auctorisações amplissimas, como eu não tenho idéa de ter visto ainda discutir no parlamento, provavelmente terá a, mesma sorte que teve a outra minha moção.

Nunca votei nenhuma auctorisação, nunca dei o meu voto a nenhuma dictadura, e desafio quem quer que seja a apontar uma unica vez que eu approvasse com o meu voto uma infracção da constituição ou quaesquer auctorisações dictatoriaes.

Nem a do sr. Fontes de 1887 eu a votava, e sabe v. exa. porque não vim aqui corabatel-a? É porque n'essa occasião estava doente de cama.

E, se alguma vantagem pude tirar da minha doença, foi não passar pelo dissabor de vir aqui combater essa organisação feita em dictadura, organisação que eu combateria, porque era baseada sobre a remissão a dinheiro e bastava isso para lhe não poder dar o meu apoio. Sei que aquelle nobre caracter e aquelle eminente homem d'estado adoptara este principio que elle proprio tinha combatido na outra casa do parlamento, e adoptára-o por circumstancias economicas e vantagens pelas quaes nós andâmos em discussão ha dois ou tres annos. O resultado foi ficarmos sem soldados e sem dinheiro, porque o thesouro ficou privado talvez de mais de 400:000$000 réis annuaes, e disso tiveram culpa todos os partidos.

Foi aqui que eu combati a remissão a dinheiro dos refractarios, e sabe v. exa. o que aconteceu? Diminuiram a taxa de 480$000 a 180$000 réis, isto tudo por conveniencias de campanario e tricas eleitoraes. Foi um syndicato parlamentar.

Está aqui ao pé de mira um digno par que foi ministro da fazenda, e s. exa. poderá dar testemunho de que é verdadeira esta minha asserção.

A taxa actual da lei do recrutamento não dá nada, e estou persuadido de que se o sr. ministro da guerra mandar examinar quanto ella tem rendido, não encontra 30:000$000

Mas dizia eu que até ao meu illustre amigo de saudosa memoria teria de vir combater a sua dictadura a respeito da organisação do exercito, porque havia um ponto sobre o qual eu não podia transigir, que era a remissão a dinheiro, condemnada em todos os paizes.

O que eu combatia não era a organisação em si, era o seu principio fundamental. A lei do recrutamento.

Já n'uma das legislaturas passadas, disse referindo-me a um illustre general que tinha combatido ardentemente aquella idéa no parlamento francez, que a remissão a dinheiro equivalia á compra de um documento de cobardia.

Passemos adiante: eu toco em todos estes pontos, mas sigo o meu caminho, sempre receioso de encontrar no trajecto alguns amigos particulares, que tenho muitos (Apoiados), para provar á camara e aos dignos pares que me accusam de fazer uma trica parlamentar, que apresentando a minha moção na generalidade, só fui coherente e lógico com os meus principios.

Não foi só porém a dictadura do sr. Fontes que eu combati, porque tenho feito o mesmo a todas as dictaduras, e até a auctorisação concedida ao sr. marquez de Sá da Bandeira em 1863, apesar de ser praxe naquella epocha os governos darem conta ás camaras do uso que faziam das auctorisações que lhes eram concedidas.

O marquez de Sá da Bandeira queria de certo, como o actual sr. presidente do conselho, dotar o paiz com uma organisação militar, em harmonia com os bons principies; mas sabe v. exa. o que aconteceu?

O valente general, que era uma grande illustração, desejava apresentar uma organisação em poucos dias, e para isso consultou diversas auctoridades no assumpto, sendo eu tambem ouvido, apesar da minha insignificancia.

A organisação fez-se, e foi publicada á ultima hora, com o inconveniente de todas, uma grande confusão; tinha até paragraphos sem artigo!

Eu era empregado no ministerio da guerra, sub-chefe de uma repartição, e era tambem deputado; n'esta qualidade tinha de ir para a camara analysar esta organisação como era o meu dever.

Sabe v. exa. o que eu fiz?

Primeiro que tudo fui ter com o ministro da guerra pedir a minha, demissão.

Entrei na secretaria fardado, e elle disse-me:

- Então por cá hoje?

- Venho pedir a v. exa. um favor, qual é o de me exonerar de sub-chefe da terceira repartição.

- Pois ainda outro dia o elogiei numa portaria e já hoje o hei de demittir?

- É porque como deputado tenho de analysar a organição feita por v. exa., e entendo que é proprio da minha delicadeza da minha parte exonerar-me primeiro do meu logar.

Respondeu-me que, se eu commettesse algum erro de officio, então me demittiria.

A organisação tinha produzido uma certa impressão lá fóra, resultados que são sempre maus para a disciplina.

No dia seguinte fui para a camara, e Hz uma proposta que espero os dignos pares não reputarão insidiosa, porque eu tinha procedido com a maior lealdade, pedindo a minha demissão.

A proposta era a seguinte: que a organisação fosse remettida com urgencia á commissão de guerra para ella dar o seu parecer.

A camara votou a urgencia da proposta; no entretanto entrava na sala o sr. marquez de Sá da Bandeira.

Lembro-me muito bem d'estes factos, e até mesmo vou contar um episodio que se deu com o sr. Barros e Sá.

Entrou o sr. marquez de Sá da Bandeira, sentou-se na sua cadeira, e logo que começou a ler o seu relatorio, dando conta á camara do uso que tinha feito da auctorisação con-