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414 ANNAES DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

Finalmente, quanto aos recursos, manteem-se os mesmos fixados na legislação vigente, adoptando-se as disposições necessarias para que não resultem inanes as intenções do projecto.

Disse, porem, o Sr. Hintze Ribeiro que a circulação dos periodicos e demais impressos ficava ainda sujeita a duas exigencias: a primeira, a de mandar ao agente do Ministerio Publico um exemplar d'essa publicação; a segunda, a da inserção dos nomes dos responsaveis em cada um dos seus exemplares.

Ora a verdade é que nem uma riem outra de taes exigencias se traduz numa limitação á liberdade de exprimir o pensamento por meio da imprensa e de fazer cada um o programma das suas ideias e das suas doutrinas. Essas exigencias não embaraçam a circulação dos jornaes e teem apenas por fim: a primeira habilitar os magistrados com o conhecimento do que se publica, para procederem contra aquelles que o mereçam; a segunda tende do mesmo modo a fazer conhecer as pessoas a quem semelhante responsabilidade pode ser pedida, reprimindo a imprensa clandestina, que em paiz; algum tem na lei qualquer especie de garantia.

Fica. pois, evidenciado que a primeira modificação á lei de 1898 foi feita no sentido d 2 alargar a liberdade de imprensa.

A segunda modificação consta dos artigos 2.°, 3.° e 4.° do projecto, tendo em vista pôr definitivamente termo ao regimen das apprehensões.

Ao passo que, pela legislação anterior, a apprehensão era permittida em certos casos, como nos de offensas ao Rei ou á Familia Real, offensas á moral, ultrages á religião, etc., o projecto prohibe a terminantemente, excepto para a imprensa clandestina, que, como já disse, em parte alguma tem a protecção das leis, ou na hypothese de offensas a um Chefe de Estado estrangeiro, quando se encontre em Portugal, o que plenamente se justifica, porque entre os deveres de cortesia internacional nenhum ha mais imperioso e sagrado do que o de fazer respeitar, em conjunturas como aquella, os mais altos representantes das outras nações. E tanto assim que foi até um Deputado regenerador quem alludiu a essa hypothese, sendo essa sensata indicação acceita immediatamente pelo Governo.

Ora poderá discutir-se, em these, a legitimidade da apprehensão; o que não pode dizer-se é que o facto de a banir, como faz o projecto, restrinja a liberdade de imprensa.

E quiz o Governo banil-a, em virtude da maneira como ella se praticava e até da forma como se interpretava a lei, dando á apprehensão um caracter accentuado de perseguição politica.

Ainda no tempo do ultimo Gabinete do Sr. Hintze Ribeiro, um jornal chegou a instaurar contra S. Exa., por tal motivo, uma acção judicial, o que demonstra qual era o estado dos espiritos em relação á apprehensão. Com effeito, a apprehensão provoca no espirito publico o favor pelo jornal apprehendido, e dá ao que pode ser uma acção muito legitima e legal do poder executivo, um aspecto de perseguição politica.

Essa impressão desapparecerá quando estiver em vigor a nova lei, que tira ao Governo toda a acção sobre a imprensa, para que no procedimento que contra ella houver se veja, não uma violencia da politica, mas tão somente uma obra imparcial da justiça. Não comprehendo que a liberdade do pensamento se encontre na dependencia 'dos possiveis abusos, arbitrariedades e caprichos do poder executivo.

Outra modificação, que o projecto em debate faz á lei de 1898, é a de acabar com prisão preventiva, que esta permitte em certos casos e o projecto não permitte em caso algum.

Ora será tambem reaccionaria e liberticida essa disposição?

Todos teem que confessar, desde que falem com verdade e boa fé, que, evitando-se aos jornalistas a prisão preventiva e a respectiva fiança, de modo que só depois de julgados começam a ser punidos, se lhes presta um real serviço e uma verdadeira homenagem á liberdade.

Ainda outra modificação, que o projecto estabelece, é á de dispensar a comparencia do réu nos julgamentos por abuso de liberdade de imprensa.

Esta modificação não terá uma vasta importancia; mas tira ao jornalista o incommodo de ir ao tribunal, e, sobretudo, não pode considerar-se limitativa da liberdade.

Segundo o projecto em discussão, tambem o jornalista, sendo chamado pela primeira vez ao tribunal, só pode ser condemnado a pena pecuniaria.

Será isto, igualmente, reaccionario e liberticida? Responda a consciencia de cada um!

Quanto á observação do Digno Par Sr. Medeiros, de que o projecto não estabelece o maximo da multa, observarei que tal não era necessario, visto que o artigo 6.° se refere ao Codigo Penal, onde esse maximo se encontra fixado.

Recapitulando, creio ter já demonstrado que o projecto garante "a publicação de qualquer jornal, independentemente da habilitação e até de uma simples participação á auctoridade respectiva: creio ter demonstrado que o projecto acaba de vez com as apprehensões, a não ser nas hypotheses indicadas e justificadas plenissimamente; creio ter demonstrado que não mais poderão ser invocadas disposições do Codigo Administrativo e que nenhum Governo, emquanto vigorar a lei em debate, poderá estribar-se em qualquer legislação especial para apprehender jornaes.

Fica, pois, cortada cerce qualquer intervenção das auctoridades policiaes nos assumptos de liberdade de imprensa; só o poder judicial terá ingerencia nas questões d'essa natureza.

As disposições do projecto que modificam a lei de 1898, não são, pois, de modo algum, como se pretende fazer ver, limitativas da liberdade de imprensa, nem representam vexame de qualquer especie para os jornalistas. A imprensa fica, approvado o presente projecto, com a maior liberdade e com a maior autonomia, vivendo completamente fora da acção e da esphera da auctoridade do poder executivo ou do arbitrio policial.

Em resumo, pois, de todas as alterações que o projecto introduz na lei vigente e que já analysei, ha as que dão ao exercicio da liberdade de imprensa um ambito mais largo, emquanto outras conferem aos jornalistas regalias e isenções de que elles até agora não gozavam.

Resta-me ver se as restantes disposições do projecto devem considerar-se offensivas do espirito liberal e progressivo das legislações modernas; e espero demonstrar que, do mesmo modo, taes disposições concorrem para converter o projecto n'um diploma que faz honra ao Governo, constituindo uma homenagem á instituição da imprensa e aos principios da liberdade.

N'esta ordem de ideias accentuo:

1.° Que differentemente da lei ainda em vigor, o projecto permitte a circulação dos periodicos e impressos, sem previa habilitação ou mesmo participação á auctoridade;

2.° Que o projecto prohibe decisivamente as apprehensões, excepto n'um caso pleno e incontestavelmente justificado;

3.° Que acaba para os jornalistas a prisão preventiva, a qual existia na lei de 1898;

4.° Que dispensa nos julgamentos a presença do réu, o que ficará constituindo uma apreciavel regalia dos jornalistas;

5.° Que, ainda, pelo projecto, o jornalista não poderá soffrer mais que uma pena pecuniaria, em primeira condemnação.