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observou s. ex.ª que havendo rejeitado na outra casa do parlamento a excepção da citada lei de 19 de maio de 1863 com relação á propriedade da serenissima casa de Bragança, não póde inclinar o seu animo a approvar um projecto que tende a desenvolver o vinculo, contra o qual militam todos os argumentos que determinaram a desvinculação da propriedade.

Eu entendo, sr. presidente, que os fundamentos da carta patente de 27 de outubro de 1645 são os mesmos em que se estriba a excepção da lei de 19 de maio de 1863, e os mesmos em que assenta o projecto que n'este momento discutimos. Se foi para manter o lustre e o explendor da elevada posição do herdeiro presumptivo da corôa, que o Senhor Rei D. João IV, pela carta patente que citei, constituiu nos bens da serenissima casa de Bragança o apanagio do Principe D. Thcodosio, mandando que de tal epocha em diante andasse sempre a referida propriedade em posse e fruição do primogenito da mesma serenissima casa; se foi pelo imperio das mesmas considerações que os poderes publicos se moveram a consignar em 1863 a excepção a que alludi do principio desvinculador, parece-me que as mesmas considerações militam na hypothese presente, para não -embaraçar, antes promover, que os bens em que se acha constituido o apanagio de Sua Alteza o Principe Real possam ter, nos termos de direito, a conservação e o grangeio (o que desenvolvimento é), necessarios para satisfazer o fim que um tal instituto se propõe (apoiados).

Direi finalmente que me não parece exacta a proposição enunciada, de que os mesmos argumentos que militaram contra a vinculação devem militar contra as disposições do projecto que se discute, pois, se bem me lembro, um dos argumentos que então se produziram, argumento impreterivel na impugnação dos morgados, foi a deficiencia da cultura e do grangeio dos predios na mão dos respectivos administradores, que muitas vezes por falta de capitaes deixavam de fomentar e de secundar as forças productivas do solo; e eu creio, sr. presidente, que este argumento, um dos principaes com que se tem invectivado a instituição vincular, com a qual eu tambem não sympathiso, é todavia, attento o alcance do projecto, argumento que milita a favor de suas disposições, porque é justamente para activar o grangeio da propriedade que se pretende auctorisar o emprestimo em questão.

Julgo, sr. presidente, haver respondido ás considerações apresentadas por parte da impugnação; se outras se offerecerem, novamente usarei da. palavra.

O sr. Visconde de Fonte Arcada: — Sr. presidente, o sr. visconde de Algés referiu-se ao direito portuguez que tinha imitado o francez; mas eu quando vejo nas nossas leis actuaes disposições contrarias ao que estava estabelecido sobre qualquer objecto, nas leis antigas, sigo as actuaes e não me importam as outras, porque estão derogadas por estas; nem, emquanto temos leis nossas me soccorro ás estrangeiras, como subsidiarias das nossas que actualmente se seguem; não me parece pois que o digno par destruisse os fundamentos da minha opinião.

Agora, quanto ao artigo que li da reforma judiciaria, perdôe-me o digno par, mas não é o que s. ex.ª diz, que é só no caso de que a mãe já tivesse morrido; e eu torno a ter o artigo 395.°:

«O pae póde designar as pessoas que hão de compor o conselho de familia, preferindo as da sua confiança á mãe ou aos parentes dos menores.»

Se o pae póde nomear as pessoas de sua confiança, note-se bem, e se as póde preferir á mãe, é porque ella esta viva e não morta.

O sr. Visconde de Algés: — Isso esta mal copiado. O Orador: — Não esta mal copiado, afianço ao digno par; e póde-se mandar buscar a reforma judiciaria, e ver-se-ha que é isto que lá vem.

Sr. presidente, esta lei não é uma lei geral, é uma lei especial, e eu tenho sempre toda a duvida em votar leis especiaes que venham revogar o que já esta estabelecido em outras leis geraes, porque a politica mette-se em tudo; e muitas vezes leis feitas em consequencia da politica do momento, vem revogar o que estava estabelecido já em outras leis que consignam direitos e estabelecem deveres; leis que foram bem pensadas, discutidas, e avaliadas pausadamente, sem attenção á politica do momento.

Tenho sempre duvida, repito, em votar estas leis especiaes, porque por esta fórma não ha ninguem que possa dizer que tem os seus direitos seguros, porque por politica ou por interesse do momento póde vir uma lei que vá de encontro a todos os principios estabelecidos na nossa legislação, e aos direitos do cidadão. E esta mais uma rasão para que eu vote contra esta lei.

O sr. Ferrão: — Sr. presidente, a questão é muito grave (apoiados), quando se queira ter na devida consideração a indole e natureza especialissima d'esta instituição, destinada a servir de patrimonio ou apanagio do principe successor da corôa. Especialissima, porque se funda em disposições do direito heroico, o que lhe dá o caracter de instituição politica; portanto é preciso que eu diga algumas palavras a este respeito.

E isto por dois motivos: o primeiro com relação ao digno par o sr. conde de Cavalleiros, porque se elle nos disse que lhe repugnou fazer uma excepção em favor da serenissima casa de Bragança, quando se tratou da lei que aboliu os morgados, eu pelo contrario aceitei esta excepção, e aceitei-a por. considerações especialissimas, fóra do alcance das quaes estão completamente os vinculos que foram abolidos. O segundo motivo deriva-se de haver eu, por um especial estudo, fixado as minhas opiniões com relação á serenissima casa de Bragança, como se vê de um tratado que foi impresso em 1852, e que tenho aqui, e em que sustentei, como continuo a sustentar, que a serenissima casa de Bragança ficou sendo uma instituição politica desde que ao throno foi elevado o Senhor D. João IV.

Pela carta patente d'este monarcha se prova que nas côrtes celebradas em Lisboa em 1641, o estado ecclesiastico, entre as propostas que offerecêra, comprehendeu a da conservação da serenissima casa de Bragança, como patrimonio ou apanagio do principe real presumptivo successor da corôa.

Ahi se pondera que não tendo os predecessores do monarcha estabelecido patrimonio particular aos seus primogénitos, como se praticava em outros reinos; e sendo para desejar que a serenissima casa de Bragança ficasse perpetuada, e do que era digna por tantas recordações gloriosas; e ao mesmo tempo sendo certo que a nação se não achava então com cabedal sufficiente para constituir uma dotação permanente aos principes successores do throno; convinha que essa constituição se verificasse na serenissima casa de Bragança, sem que por isso perdesse o caracter e natureza de propriedade particular, e sempre de tal modo e condição que nunca podesse incorporar-se nos proprios da corôa.

Ordenou por isso o Senhor D. João IV que seu filho o principe D. Tbeodosio e todos os primogénitos dos reis tivessem para o futuro o titulo de principes do Brazil e de duques de Bragança; e que quando faltasse o principe ou este não tivesse casa governassem os reis a mesma serenissima casa.

Em vista d'esta disposição, a casa de Bragança ficou considerada instituição politica, çonservando-se-lhe todavia o direito de morgado em tudo quanto se achava vinculado como tal.

N'esta situação os reis, na falta de principe real, e ainda mesmo durante a sua menoridade, nunca foram considerados administradores da serenissima casa de Bragança, mas seus governadores; e como fideicommissarios, ou antes depositarios, obrigados á restituição e fiel entrega.

Esta doutrina acha se expressa em differentes diplomas, entre elles no decreto de D. Pedro II de 1700, no alvará de 9 de janeiro de 1817, e na carta de lei de 11 de julho de 1821, artigo 15.°, onde se lêem estas palavras:

«Logo que Sua Alteza regressar a estes reinos lhe será entregue a sua administração.»

Não são portanto administradores da casa de Bragança os nossos monarchas, mas sim o Principe Real, se o ha; e se não ha principe real ou este é menor, os reis são governadores.

Administradores só são os principes reaes quando existam, e desde que nascem.

Durante a menoridade dos mesmos principes os reis sómente regem os negocios da serenissima casa, na qualidade inviolavel e sagrada de tutores e naturaes defensores da pessoa e bens do seu primogenito, mas nunca de administradores no sentido juridico relativo a morgado, porque o administrador é sempre e unicamente o Principe Real.

Eu, sr. presidente, tinha pedido a palavra sobre o artigo 1.°, porque, em vista das idéas que acabo de expor, não posso de fórma alguma conformar-me com a redacção do artigo na parte em que diz:

«Serenissima casa de Bragança, legitimamente representada pelo seu administrador geral.»

Quem é este administrador de que se falla? Que caracter legal tem elle?.

Pois a serenissima casa de Bragança póde ser representada legitimamente por um administrador que não é o Principe Real?

Affirma-lo assim, seria desconhecer toda a legislação que acabo de indicar.

Ninguem desconhece a legitimidade da intervenção de El-Rei, o Senhor D. Luiz, ou como governador da serenissima casa de Bragança, ou como tutor e natural defensor da pessoa e bens de seu filho; mas administrador, qualidade que em sentido legal só compete ao senhor da casa, só é o Principe Real o Senhor D. Carlos; não conheço de direito outro senão elle.

Portanto desejaria ver eliminadas as palavras do artigo 1.° «legitimamente representada pelo seu administrador geral.

Que significam essas palavras? Respeito muito o cavalheiro, a quem se dá o pomposo titulo de administrador geral da serenissima casa de Bragança, mas ainda mais respeito os direitos do principe real.

Esse cavalheiro, aliás muito digno, não é mais que um mero procurador ou mandatario, auctorisado por El-Rei, o Senhor D. Luiz I, na qualidade de governador da serenissima casa de Bragança.

E esta a minha opinião, que já emitti no tratado a que me referi, e declaro que ainda não me arrependi do que ahi escrevi, com relação á organisação e administração da serenissima casa de Bragança, e á sua passada grandeza e recordações gloriosas, e ao dever nacional de a robustecer e restaurar.

N'este sentido, e quanto a hypothecas, que V. ex.ª saber o que eu escrevi em 1852?

«Toda a casta de alienação perpetua, ou de hypotheca, que prejudicasse a serenissima casa de Bragança, é absurda e de impossivel existencia, juridicamente fallando; pois que as regras de direito inhibem esses actos a respeito de bens que têem por sua natureza uma applicação especial e permanente por utilidade publica.

f D'onde é consequente a nullidade de qualquer alienação ou hypotheca, por isso que estes desvios ou encargos deterioram a cousa fiduciaria. »

E em verdade, se é a utilidade publica, a conveniencia politica, o que sustenta o apanagio do Principe Real; e não podendo a hypotheca tornar-se uma garantia util para o credor, senão pela venda ou adjudicação forçada dos bens, seria destructiva da essencia do mesmo apanagio.

Os reis, governadores ' da casa de Bragança, carecendo de meios para fazer face a grandes despezas publicas, como nas obras do edificio de Mafra, onde se despenderam consideraveis sommas, como em occasiões de crise em que a nação se achou, tiveram de recorrer a empenhos contrahidos sobre os bens da mesma serenissima casa.

Emittiram-se então padrões com assentamento nos diversos almoxarifados, cujos juros a serenissima casa de Bragança se tem recusado pagar, e com algum fundamento, dizendo aos seus possuidores que os vão exigir do estado, que do seu pagamento se constituiu responsavel, desde que dos empenhos não resultou proveito algum senão á nação.

E não só por esta rasão, mas tambem porque se a serenissima casa fosse obrigada a pagar os juros d'esses padrões, esse pagamento absorveria todo o seu rendimento, porque os juros subiam a 20:000$000 réis, que era a renda annual da mesma casa antes dos melhoramentos e bemfeitorias, que depois uma providente applicação tem feito acrescer.

Ora, sr. presidente, aqui antolha-se-me uma grande difficuldade, um grande escrupulo, sobre a generalidade do projecto, pelo qual desaffrontadamente votarei, se a applicação das sommas, que se pretendem levantar com hypotheca, for restricta e fiel, como a lei deseja, sendo só com esta condição que o parlamento auctorisa a concessão.

E quaes são as garantias que a lei estabelece para tornar effectiva essa applicação?

Não as vejo devidamente formuladas.

Declara-se, é verdade, que a administração fica responsavel por essa applicação.

Mas quem é a pessoa responsavel?

Será o administrador geral, que a lei diz legitimamente representar a casa de Bragança?,

Se assim é, esse homem, pelo seu credito pessoal, como um dos cavalheiros mais honrados d'esta terra, é uma garantia moral, excellente.

Mas eu, como legislador, não a posso admittir.

Será Sua Magestade El-Rei, o Senhor D. Luiz I, quem fica responsavel?

De modo nenhum, porque o tornar Sua Magestade responsavel pela execução da lei é constitucionalmente impossivel.

Quem deve pois ficar responsavel? É a serenissima casa de Bragança tomada em abstracto; a qual todavia deve passar livra de encargos ao Principe Real, destinada a seu apanagio, com o qual, emquanto a nação não desmanchar o pacto nacional e politico, a que generosamente prestou força e auctoridade o Senhor D. João IV, e tem sido confirmado por seus successores, é incompativel a alienação, 6 portanto a hypotheca.

Quanto á applicação para compra de propriedades, como esta significa o engrandecimento da vinculação da serenissima casa de Bragança, não me opponho; e sabe V. ex.ª por que neste ponto eu não tenho grandes difficuldades? É porque assignei quatro consultas a respeito da casa de Bragança, tendentes a demonstrar o direito que ella tem a fazer-se indemnisar do estado de decadencia e de perdas a que chegou, em resultado de medidas geraes, de que não foi exceptuada.

Quando estes negocios da serenissima casa de Bragança forem trazidos ao parlamento, eu hei de dar-lhes o devido desenvolvimento.

Se eu pois tivesse a certeza juridica de que este emprestimo havia da ser applicado exclusivamente á compra de bens que, longe de diminuírem, augmentassem o patrimonio do Principe Real, nenhuma duvida teria; mormente porque entre os morgados pertencentes ao Senhor Duque de Bragança, ha um que tem a clausula de annexação progressiva em certo e determinado valor de rendimento annual, que o administrador é obrigado a fazer; a que satisfez o Senhor D. João IV, por disposição posterior á sua carta patente de 27 de outubro de 1841; mas a que o extincto erario não satisfez, tendo, pelo contrario, absorvido a totalidade dos rendimentos da serenissima casa de Bragança durante uma serie de annos em que deviam ter logar taes annexações.

O sr. Conde de Cavalleiros: — Deixando aos jurisconsultos a que tão de se dever chamar á pessoa do rei administrador ou governador dos bens da casa de Bragança, por isso que essa questão é muito superior á minha intelligencio, direi todavia que o rei, tendo filhos, ha de necessariamente ser administrador por elles, e pela lei commum ha de dispor do rendimento, como qualquer de nós pode dispor do rendimento dos nossos filhos. Mas outra cousa, sr. presidente, me impressiona mais, e é a disposição que muita gente não conhece, de que — quando não existe successor á corôa, o rei não póde dispor dos rendimentos do apanagio real Não sei de nada d'isto; agora do que eu tenho receio é que a casa de Bragança venha a abranger todo o paiz com as suas acquisições, o que é absurdo auctorisasse.

Disse o digno par, que me precedeu, que a rasão da desamortisação dos vinculos era o estacionamento natural que existia n'esses bens! Isso era mais uma rasão a favor da desvinculação dos morgados. Se os morgados fôssem bem governados, se não estacionassem e augmentassem a propriedade sempre, tornava-se Portugal feudo e propriedade de meia duzia de familias! Então sim, mais rasão havia para a extincção dos vinculos, porque a sua existencia offendia a rasão e a economia politica. Então, sim, é que o digno par devia votar contra elles.

O facto é que, quando qualquer individuo herdava um morgado, perdia metade do juizo; e perdia-o de todo, para os governar, quando herdava dois; e aqui ficava compensado o grande perigo da accumulação de bens.

Isto talvez fosse providencial. O resultado era que em pouco tempo a necessidade de tornar allodiaes esses bens.