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nifestação de uma indisposição pessoal; e estas dão ás vezes causa a successos grandes e graves e estes os contam os diversamente interessados, ou apaixonados, de mui diverso modo. Ainda não ha muito tempo que a mim, e a um D. Par que se assenta á minha direita, foi mostrada uma carta de Coimbra, na qual se diz que os militares foram a causa do successo por suas provocações; que os soldados commetteram muitas violencias; deram golpes, feriram, e atacaram á bayoneta não sei quanta gente. Eu não acreditei o que nesta carta se referia; porque me pareceu vêr nella exaggerações pelo outro lado; e porque mencionava circumstancias omittidas nas demais cartas, de que já fiz menção. Refiro isto para se vêr que eu posso ajuizar mal; porém não se dirá que obro parcialmente. (Apoiados.) O que ajuizei desta carta ajuízo do officio da authoridade: uma e outra correspondencia contém exaggerações: logo não contém a verdade, aquella verdade que deve chegar ao Governo, despida de tudo quanto é paixão: desejo de culpar uns, e de desculpar outros. Ainda se não entendeu que amigos e adversarios devem ser julgados pela mesma Lei, e os seus actos pesados na mesma balança da justiça. Eis aqui o que eu desejo; eis aqui o que a authoridade publica deve praticar. Quando isto repito chamam-me pasteleiro. (Riso.) Assim responde-se a tudo: o que eu quero é que o Governo seja justo.
Peço ao Sr. Presidente do Conselho que acredite que eu não pretendo desde já censurar a authoridade, pois concedo que ella podia ser enganada por informações inexactas, e achar-se debaixo de influencias que lhe impedissem descubrir a verdade. (O Sr. D. Carlos de Mascarenhas — A leste.) Alerta! Alerta devem sempre estar as authoridades. (O Sr. D. Carlos de Mascarenhas — A leste.) A leste! Não sei de que parte; o que sei é, e todos o sabem, que as authoridades devem achar-se a barlavento de paixões malignas, que as pretendem influir; e que quasi sempre se acham a sottavento dellas, o que me parece ter succedido nesta occasião; e o que desgraçadamente succede quasi sempre. Não se tracte este objecto com zombaria. Que bello modo de discutir! Já disse que neguei credito a uma communicação, que me pareceu exaggerada, no sentido opposto ao theor do officio do Governador Civil, e dei por testimunha um D. Par que está presente: tenho direito para pedir que senão faça obra por outra que exaggerou por outro lado. O Sr. Presidente do Conselho não diz que recebeu participação do Prelado da Universidade; e essa é-lhe indispensavel — creio, que quando ella vier, se lhe ha de achar mais placidez e gravidade.
Concluo rogando a S. Ex.ª que exija essa informação, e quantas mais lhe puder dar a Authoridade Publica, ainda a Judicial; e depois proceda como o acontecimento merecer, sem deixar de exigir que os funccionarios, quaesquer que sejam, cumpram os seus deveres.
O Sr. Silva Carvalho — Quando vi o boletim de Coimbra no Diario, acompanhado dos boatos que logo se espalharam, creio que de proposito, quasi que me pareceu que se tinha lá proclamado a republica, depois de uma grande desordem, que houvera nessa occasião. Esperava com muita anciedade o correio de hoje, para me tirar de cuidados, e na verdade as noticias que se deram tranquilisaram me. Dizem as cartas, que eu vi de pessoas mui respeitaveis, e que tiveram não só pessoas desta, e da outra Camara, mas mesmo de fóra, que o caso fóra mui differente, do que o conta o Governador Civil no seu officio, que acaba de lêr o Sr. Presidente do Conselho, o que não passara de uma ordem de prisão, que o official que alli commanda a força deu a um Estudante, que cantava, ou assobiava o hymno da Maria da Fonte; e porque o Estudante senão entregara á prisão, se mandaram soldados para casa do mesmo, a fim de o prenderem, o que não se effectuára, porque o Estudante fechou a porta, e que então, quando os soldados se retiraram, houveram algumas risadas do Estudante, e da gente que alli se ajuntou; que depois fóra preso um outro Estudante mutilado em Torres Novas, o qual fóra solto a pedido dos seus companheiros, e que dada mais houvera. Ouvi tambem, que o Official commandante se portara com tal prudencia e juizo, que ás 6 horas da tarde estava tudo em perfeito socego. Agora vejo, que o Governador Civil pinta o caso de outra maneira: eu peço licença para dizer, que dou inteiro credito ás cartas que vi: póde ser que as pessoas, que as escreveram, estivessem mal informadas; mas tambem póde ser, que o Governador Civil fôsse do mesmo modo mal informado; e tambem o expediente que tomou o Sr. Presidente do Conselho, de mandar informar o Vice Reitor da Universidade é excellente, porque estou certo, que em tão importante objecto, em que está compromettida a honra ds Academia, elle o fará com aquella miudeza, e circumspecção, de que elle é capaz, e que ocaso pede. Quanto a mim fico satisfeito com ouvir ao mesmo Sr. Presidente do Conselho, que o socego está restabelecido.
O Sr. Presidente do Conselho — Sr. Presidente, o D. Par o Sr. Rodrigo da Fonseca Magalhães preconisou a sua imparcialidade, porque não querendo dar todo o credito ao Governador Civil, igualmente declarou que o não tinha dado a uma carta, que em sentido diverso se lhe mostrára (O Sr. Fonseca Magalhães — Sim, senhor); mas para quem o D. Par não foi imparcial, foi para comigo, em quanto gastou tanto tempo á Camara, em mostrar a necessidade que havia, de que o Governo não obrasse sómente pela participação do Governador Civil, parecendo assim querer persuadir-nos, que suppunha ser este o proceder do Governo; mas eu chamo a attenção de S. Ex.ª sobre o que se tem passado, mesmo relativamente á Universidade; porque, é impossivel que S. Ex.ª não tenha conhecimento das instancias, que por muitas vezes, e muitas pessoas me teem feito, para eu mandar fechar a Universidade de Coimbra (Vozes — É verdade): eu com tudo ainda o não fiz, nem farei, porque o Governo considera-se com a força precisa para manter a Lei. (Apoiados.) Que me importa a mim, que os estudantes da Universidade se tenham ajustado para no 1.º de Maio celebrarem as exequias pelos desgraçados, que perderam a vida em Setubal, e que tenham convidado para esse fim os habitantes das immediações de Coimbra, e alguns individuos que foram chefes de guerrilhas? O Governo sabe tudo isto, e direi mais: o Governo já sabia, que no Domingo passado devia ter logar um movimento nas immediações daquella Cidade: entretanto o Governo conservou-se passivel, porque tem a convicção de que ha de sempre, a despeito de quaesquer movimentos, sustentar o throno da Rainha, e a Carta Constitucional (Apoiados): não ha cousa porém que me faça saír da legalidade, e por isso o que fiz em consequencia daquella informação, foi officiar ao Vice-Reitor da Universidade, por cuja resposta espero, para á vista das informações proceder com toda a frieza, e imparcialidade.
O D. Par fallou dos soldados terem dado vivas á Rainha, e da necessidade do silencio. Eu sou, um soldado velho, e nunca consentirei, que o soldado, quando está na fórma, faça outra cousa, que não seja estar com toda a attenção á voz do Commandante. O Governador Civil, o que refere é, que os soldados, quando corriam para ir pegar em armas, davam vivas á Rainha. Isso desejo eu muito que façam, sempre que possam (Apoiados); e assim tambem o mesmo Governador Civil faz os maiores elogios ao Commandante do Batalhão, por que na verdade elle é um Official de todo o merecimento, e consideração (O Sr. C. de Semodães — Apoiado); a eu declaro que estou persuadido, de que elle não ha de poupar meios, com a força que a Lei lhe dér, para acabar alli com a anarchia, todas as vezes que ella lá tente reapparecer.
O Sr. Fonseca Magalhães — Para uma explicação. (O Sr. Presidente — Tem a palavra.) A minha explicação é curta. O Sr. Presidente do Conselho tem toda a authoridade para me dar lições, e eu toda a docilidade para as receber: eu sou demasiado extenso nas minhas observações. Tenho esse defeito, e ás vezes não proferirei mais do que inania verba. Mas agora parece-me que não sou estranhavel por pedir muito e muito ao Sr. Presidente do Conselho que obrasse com prudencia. Não fiz injustiça nenhuma a S. Ex.ª: insistindo tanto, pretendia que senão procedesse com espirito de parcialidade, que tão frequentemente apparece; mas sim com espirito de justiça a fazer de todos, e contra todos. O D. Par o Sr. C. de Semodães ratificou o que eu referi quando citei a carta que tire de Coimbra, alludindo a outra que elle recebeu da mesma Cidade, e de certo escripta por pessoa a quem dá credito. E todas as que se receberam são de pessoas insuspeitas. Nenhuma destas pessoas póde ser tachada de adversa ao Governo ou ao Governador Civil. O conteudo no officio desta authoridade mostra certa paixão, certo preconceito contra os Estudantes da Universidade. Attribue-lhes preparativos de rompimento revolucionario; e isto não o creio eu, nem o receio. Estimarei que o Sr. Presidente do Conselho seja informado pelo Vice Reitor (O Sr. Presidente do Conselho — Apoiado.) e espero que mudará de opinião. Agora a respeito de fechar a Universidade, S. Ex.ª sabe que talvez fosse eu o primeiro, á excepção dos seus collegas, que lhe pedisse que não fechasse a Universidade: isso seria em meu conceito mostrar fraqueza e temor, que nunca ha motivos para ter, principalmente quando se procede com justiça.
O Sr. C. de Semodães — Depois que fallou o Sr. Presidente do Conselho, nada mais tenho a accrescentar. Houve o acontecimento, embora fosse, ou não premeditado; mas as informações que eu tenho, são pela segunda affirmativa, isto é, de que não foi premeditado: felizmente acabou, e ficou tudo socegado, porque o Batalhão alli estacionado portou-se dignamente, o que eu acho que foi muito bom, para que os habitantes daquella Cidade ficassem conhecendo, o que tinham naquelle Batalhão, e avaliassem desde logo qual o valor, com que elle ha de supplantar qualquer commoção, que por ventura possa alli haver: todavia, eu espero que depois daquelle caso, ninguem mais se atreverá a levantar alli a voz, conhecendo já que o espirito daquelle Batalhão é de esmagar os ousados revolucionarios.
O Sr. Leitão — Parece-me dever declarar a V. Ex.ª, que alguns Pareceres ha, que senão poderam discutir no dia immediato ao da sua distribuição, os quaes exigem ser maduramente estudados, como por exemplo aquelle, que hoje aqui se distribuiu, cuja discussão deve ter logar tres dias depois da sua distribuição.
O Sr. Presidente — A seguinte Sessão terá logar na Segunda feira, 1.º de Maio, da qual será Ordem do dia a discussão do Parecer sobre a Proposição de Lei das transferencias dos Juizes, se já tiverem mediado os tres dias estabelecidos entre a distribuição do Parecer, e a sua discussão. Convido os D. Pares, a que funccionem estes dias nas Commissões. A Deputação que no dia 29 se deve apresentar a Sua Magestade ha de compôr-se, além do Presidente, dos D. Pares Pimentel Freire, V. da Granja, V. de Oliveira, V. de Sá, B. de Chancelleiros, B. de Porto de Moz, B. de S. João das Areias, B. da Vargem da Ordem, D. Carlos Mascarenhas, Pereira de Magalhães, Tavares de Almeida, e Sousa Azevedo. — Está fechada a Sessão.
Eram tres horas e meia da tarde.