334 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO
vidualidade figurará nos annaes da epocha entre os mais dignos.
Este é o seu maior elogio.
Concluindo, proponho:
1.° Que se lance na acta um voto de profundo sentimento pela morte do exmo. duque d'Avila e de Bolama, ultimo presidente d'esta camara;
2.° Que uma copiada acta seja enviada á exma. duqueza sua viuva;
3.° Que se mande collocar o busto do illustre finado, em marmore, na galeria, onde se acham os de seus preclaros antecessores.
Por esta occasião consinta a camara que eu lhe annuncie o fallecimento de tres de nossos honrados collegas, os exmos. srs. conde do Bomfim, conde de Avillez e conde de Cavalleiros. A camara quererá de certo, e assim o proponho, que se lance na acta um voto de profundo sentimento pela perda d'estes dignos pares, e que da mesma acta se remettam, copias ás exmas. viuvas de tão illustres finados.
O sr. Mello Gouveia: - Sr. presidente, a camara já prevê que eu não tomo a palavra para me afastar em sentido algum das propostas que v. exa. acaba de lhe fazer em homenagem á memoria do nosso chorado presidente, o sr. duque d'Avila e de Bolama, ha pouco fallecido, e comprehende de certo que as relações pessoaes com que me honrou o varão illustre, a que as propostas se referem, não me consentem associar-me silenciosamente a esta demonstração de respeito e de sympathia sem proferir algumas palavras de allivio para o meu pezar e para a minha saudade, que eu espero que a camara se dignará ouvir-me com a sua costumada benevolencia.
Sr. presidente, quando as nações perdem os seus homens eminentes, os que ellas consideram na primeira plana da sua veneração e da sua confiança, a elegia expressiva dos finados está no sentimento geral da sua perda e na consciencia universal da falta que elles deixam nos elementos de ordem, de progresso e de paz publica de que eram fiadores.
Nem ha palavras que consigam descrever propriamente a sensibilidade d'essa commoção que affecta as multidões diante do feretro que passa.
Mas os que foram amigos pessoaes d'essas individualidades illustres que desapparecem de entre os vivos, partilhando em subido grau a sensação commum, não podem ver caír a lousa que para sempre as esconde dos seus olhos, sem desafogar a sua dor em palavras sentidas da saudade que lhes recorda o valor dos amigos que perderam e o golpe que soffreram nas suas affeições.
Sirva-me de escusa este sentimento ao levantar a minha voz humilde e soluçante, n'este logar tão cheio das recordações do grande estadista, de quem v. exa. acaba de fazer o merecido elogio, para prestar a homenagem do meu respeito e do meu affecto á memoria veneranda do homem publico eminente, que largos annos me honrou com a sua amisade, e a quem devi grandes provas de estima e de consideração.
Sr. presidente, assim como nos espaços sideraes brilham os astros, que ponderam diversamente no equilibrio do mundo physico, tem a terra tambem os seus luminares n'essas personalidades de eleição, que esclarecem e guiam os povos, cada uma na orbita das applicações do seu espirito, pela vareda difficil e escabrosa do progresso e da civilisação. E se as nações inscrevem na galeria dos illustres o nome dos homens a quem o genio levantou ás altas regiões do ideal, regiões incommensuraveis, de horisontes infinitos, que pela rasão de serem infinitos são horisontes de duvida, e de incerteza, por maioria de rasão põem tambem ao pé d'elles o dos estadistas eminentes, que, batalhando pelo aperfeiçoamento social, tomaram por norte a religião, a moral e o dever, e deram na vida o exemplo d'estas virtudes, que são na terra a verdade e a certeza da felicidade humana.
Foi um d'estes o sr. Antonio José de Avila, duque de Avila e de Bolama, que foi n'esse presidente e cuja morte todos deplorâmos.
Espirito esclarecido, alma generosa e intelligencia superior, tinha em si mais do que lhe bastava para se elevar, em lucubrações da sciencia especulativa, a essas espheras luminosas do pensamento, que fascinam as massas pelas miragens fulgurantes da illusão e da chimera, se o seu criterio precoce e a historia da civilisação de todas as idades lhe não revelassem logo na mocidade a realidade pratica da vida social, mostrando-lhe a doutrina de Christo como a ultima palavra da perfectibilidade dos homens.
Inspirado na singela e sublime philosophia do christianismo, fez-se campeão da liberdade e do direito, que em palavras e obras sustentou sempre de vontade resoluta.
Parlamentar de primeira ordem nunca contou os adversarios para saír a campo, pela verdade e pela justiça, em defeza dos seus concidadãos e da auctoridade social. Nos registos d'esta e da outra casa do parlamento deixam um grande rasto de luz os seus vastos conhecimentos das sciencias sociaes.
Funccionario respeitavel, foi chamado aos mais altos cargos da republica, dentro e fóra do paiz, desempenhando-os sempre e a todos com a elevação de um espirito superior.
Ministro em quasi todas as repartições da administração publica, e muitas vezes chefe do gabinete, a sua gerencia foi sempre assignalada por um acrisolado patriotismo, por um respeito inquebrantavel pelas instituições e por uma constante dedicação pelo adiantamento social do seu paiz.
Indole benevola e animo recto e imparcial nunca distinguiu partidos nos actos de governo nem negou protecção a quem d'ella precisava.
Cidadão exemplar, soube conquistar as sympathias e a veneração dos seus contemporaneos pela firmeza e lealdade do seu caracter, pela illustração do seu espirito, pela bondade do seu coração e pela grandeza da sua alma, qualidades que todos lhe conheceram nas suas relações publicas e privadas e que por vezes se manifestaram em rasgos briosos de rara imitação.
Estes dotes de cidadão e de homem publico fizeram do duque d'Avila e de Bolama um dos maiores vultos politicos e sociaes do nosso tempo, geralmente estimado e respeitado, altamente aquilatado no conceito publico; e a sua morte, que enlutou o coração dos seus amigos, é uma grande perda nacional que nenhum arbitrio poderá reparar.
A sua biographia, que póde encher volumes, mostrará os immensos e relevantissimos serviços feitos pelo duque d'Avila e de Bolama ao seu paiz na sua longa carreira administrativa, parlamentar, diplomatica e ministerial; e levará mais um nome ao obituario illustre d'essa geração de benemeritos, que ha de encher as paginas da historia patria dos ultimos cincoenta annos, e que se vae sumindo na eternidade, deixando á geração que lhe succede e que hoje tem em si a força e a vida social, a preciosa herança das liberdades publicas com o nobre e famoso exemplo dos heroismos e das abnegações sem conto que as conquistaram e que todos esperâmos que ella saberá venerar e imitar; considerando e vendo, entre outras, na vida illustre d'este insigne varão a demonstração irrecusavel de que tem nas instituições vigentes o caminho franco para todas as aspirações e que são guias seguros para os mais altos destinos o trabalho e o sentimento do dever.
Concluindo, declaro que voto as propostas apresentadas por v. exa. á camara dos pares, como devida homenagem á memoria veneranda do seu fallecido presidente.
Vozes: - Muito bem.
O sr. Presidente: - Não havendo mais ninguem inscripto sobre este assumpto, vae proceder-se á votação da proposta que tive a honra de apresentar á camara.
Posta á votação a proposta, foi approvada unanimemente.