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SESSÃO DE 7 DE JULHO DE 1887 607

tocollo: e um protocollo, que póde ficar obrigando-nos, porque o approvâmos, mas que não obriga a China? O protocollo não obriga em cousa alguma a China.

O tratado não ha de conter só á doutrina do protocollo, ha de ter muitas outras cousas.

Na parte propriamente commercial ha de trazer a clausulada nação mais favorecida; esta condição já hoje figura em todos os nossos tratados, ha poucos annos ainda a não tinhamos com a Inglaterra, agora, porém, já mesmo no ultimo tratado que se fez com esta potencia esta condição ali está; mas esta clausula que tem de figurar no novo tratado não é a unica, é apenas uma clausula, mas muitas outras figuram nos tratados de commercio e hão de figurar n'este, e não sabemos quaes ellas serão. Na questão da fiscalisação do ópio, tambem sabemos que temos de fazer em Macau o que a Inglaterra fizer em Hong-Kong. O tratado deve conter o artigo que se refere á questão de territorio, deve tratar da questão consular, deve conter por tanto um grande numero de condições e clausulas, que não conhecemos.

O legislador quando escreveu o artigo 10.° da constituição quiz justamente quedas camaras podessem avaliar todas as condições dos tratados, nem outras illações se podem tirar da sua clara disposição,

Sr. presidente, o meu amigo e antigo collega o sr. Bocage pronunciou uma phrase que melindrou o sr. ministro dos negocios estrangeiros; foi quando fallou na mania das dictaduras. Eu tambem creio que a phrase não é applicada com toda a propriedade.

A mania é uma alteração no estado mental e eu creio que as faculdades mentaes de s. exa. e dos collegas no governo, estão no mais perfeito estado. Não é a mania da dictadura, é peior do que isso, do influxo de uma corrente que hoje domina, é o desprezo por tudo que é legalidade. (Apoiados.) Este desprezo pela legalidade já não está só nos senhores ministros, se ella estivesse só no governo era em meia duzia de homens que podiam ser substituidos, mas parece que vae creando escola, e é d'isso que eu tenho receio. (Apoiados).

O sr. ministro dos negocios estrangeiros fez uma concordata e tencionava trazel-a aqui, visto que a lei diz que os tratados e as concordatas não podem ser ratificados senão depois de approvados pelo parlamento.

Mas o nosso embaixador entendeu que não seria conveniente que houvesse demora, e o sr. ministro dos negocios estrangeiros achou logo um subterfugio para ratificar a concordata, declarando que ella não era mais do que o regulamento da concordata anterior. Trata-se agora de uma convenção com a Asia. O sr. ministro dos negocios estrangeiros, ficou satisfeito com o protocollo, entendeu que tinha feito uma cousa muito bem feita, e para se apressar a colher os louros do que julgou um grande triumpho, vem pedir auctorisação para ratificar um tratado que não está feito, mas que ha de conter as clausulas que estão no protocollo. Ainda isto não é mais do que o desprezo pela legalidade. Pela minha parte não tenho senão que louvar o sr. ministro pela maneira intelligente como negociou até á assignatura do protocollo. Mas o protocollo não é o tratado, e nós não sabemos o mais que elle ha de conter.

Eu peço licença para contar uma historia. Uma das vezes que fui ministro e havia poucos dias que tinha tomado a gerencia de uma das pastas, despachava no meu gabinete com um dos empregados superiores do ministerio, e elle apresentou-me diversos negocios, e eu ía despachando conforme as informações, minuciosas e completas que aquelle empregado me ía dando sobre os diversos assumptos.

Chegou-se a um negocio um pouco mais grave, o empregado leu-me os documentos, deu-me todas as informações, e pediu uma decisão.

Eu, como disse, havia poucos dias que tinha entrado para o ministerio, não podia conhecer a legislação que vigorava ácerca de todos os assumptos, e perguntei-lhe muito naturalmente o que dizia a lei áquelle respeito. Elle mostrou-se maravilhado da pergunta, e respondeu- me: "A lei? Ora a lei! A lei não se póde executar." E podia, e executou-se.

Mas isto mostra simplesmente o desprezo pela legalidade. Ora os srs. ministros estão exactamente no caso d'aquelle empregado.

Mas antes de ir a diante direi uma cousa ao sr. ministro dos negocios estrangeiros. Parece-me que s. exa. não tem rasão para receiar de que havendo alguma demora, o governo da China mude de opinião, e não queira ratificar o tratado. É possivel que o tratado se não faça por qualquer motivo superveniente; mas se se fizer, se os chinas chegarem a assignal-o, não será por causa do reconhecimento ou da confirmação dos nossos direitos em Macau que elles deixarão de ratifical-o, uma vez que lhes asseguremos que não cederemos d'aquelles direitos a favor de nenhuma outra potencia.

A China de hoje não é a China de ha trinta annos. O governo chinez sempre teve homens muito intelligentes, e em geral os chinezes são desconfiados mas intelligentes. Porém, até ha pouco tempo tinham uma grande cultura intellectual, mas dentro dos limites do que se sabia na China.

Os chinas sabiam tudo, menos o que se passava fóra da China, e apesar do sr. Costa Lobo nos contar, de que em 1842 os chinas já sabiam que na Europa havia nações pequenas e nações grandes, ignoravam comtudo a importancia verdadeira d'essas nações.

No principio do seculo, quando se tratou de uma questão de que se occupa áquelle livro, a que tambem se referiu o sr. Costa Lobo, e que é o volume 15.° da collecção dos tratados, quando os francezes invadiram Portugal, quando o rei foi para o Brazil, e que nós fizemos alliança com a Inglaterra, os inglezes n'esta occasião, mandaram forças para Macau, para obstarem a qualquer tentativa por parte da França.

Por essa occasião escrevia um mandarim china ao procurador de Macau, pouco mais ou menos, o seguinte:

"É possivel que os pequenos francezes tenham invadido Portugal, mas a que se não atreverão de certo, é a virem cá invadir o imperio chinez."

Mais tarde, porém, os chinas aprenderam á sua custa, que os taes pequenos francezes podiam invadir a China, e chegar até Pekim. Depois disto a China resolveu mandar á Europa os seus diplomatas, e nos ultimos tempos tem mandado alguns dos seus homens mais intelligentissimos e eu tive occasião de conhecer alguns, como por exemplo o ministro que esteve em França, quando houve o conflicto, ha cerca de tres annos, e áquelle celebre Chen-Kin-Tong, que era conselheiro da legação, ou addido militar, que residiu alguns annos em Paris, e que não só assimilou a cultura intellectual da Europa, mas até o espirito francez. Todos sabem que elle escreveu num dos jornaes litterarios mais apreciados da Europa, La Revue des Deux Mondes, um artigo intitulado, se bem recordo, Les chinois peints par eux mêmes, que é cheio de finas observações e de apreciações espirituosas.

Estes homens foram para a China dizer o que tinham observado na Europa, por exemplo, que Portugal valia pouco, que não tinha grande importancia politica na Europa, e de que não havia receio de que invadissemos a China, nem mesmo de que lhe roubassemos alguma provincia; mas ao mesmo tempo ficaram sabendo que havia na Europa nações poderosas, que tinham força para isso.

Portanto, logo que nos compromettemos a não alienar os nossos direitos sobre Macau sem accordo com a China, podemos ter a certeza de que ella, se chegar a combinar nos outros pontos e a assignar o tratado, não é por causa d'este que deixará de o ratificar.

Este desprezo pela legalidade é o facto que caracterisa todos os actos do governo. Começou por fazer dictadura. Depois que o digno par o sr. Bocage fallou na mania da