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CAMARA DOS DIGNOS PARES.

SESSÃO DE 1 DE MAIO DE 1848.

Presidiu — O Em.mo e R.mo Sr. Cardeal Patriarcha.

Secretarios, os Sr.s V. de Gouvêa.

Margiochi.

Aberta a Sessão depois da uma hora e meia da tarde, estando presentes 32 D. Pares, leu-se approvou-se a Acta da ultima Sessão. Concorreu tambem o Sr. Ministro da Justiça, e Presidente do Conselho de Ministros.

O Sr. PRESIDENTE — A Deputação desta Camara, foi recebida por Sua Magestade com a sua costumada Benevolencia.

O Sr. Secretario V. de GOUVEA — Está na Mesa um Requerimento do Sr. V. de Sá da Bandeira para ter segunda leitura (Vid. pag. 554, col. 4ª.) Tendo-se lido, disse

O Sr. V. de Sá da BANDEIRA — O Requerimento que fiz, teve unicamente por objecto remetter ao Sr. Ministro do Reino aquella Representação, que me foi mandada por um Cidadão de Alverca. Eu não emitto nenhuma opinião sobre os factos contidos na mesma, e só peço que seja remettida ao Governo, para a tomar na consideração que merecer. (O Sr. C. de Thomar — Peço a palavra). Peço tambem a V. Em.ª, que depois de acabado o expediente me dê a palavra.

O Sr. C. DE THOMAR — Sr. Presidente, quando pela primeira vez foi apresentado este objecto á Camara, eu entendi que elle fóra apresentado de uma maneira muito irregular, e ainda hoje estou nesta convicção; e parece-me que a Camara não póde tomar a responsabilidade de remetter ao Governo um papel, a que S. Ex.ª dá o nome de Representação, mas que não póde ser considerado como tal. Os papeis que foram mandados para a Mesa pelo D. Par são um requerimento de Militão Francisco Ribeiro, em que pede por Certidão parte do inventario, que se fez na Villa de Alverca por obito de José Bernardes: este requerimento acha-se defirido por um individuo chamado Costa, a Certidão do Inventario é tirada pelo Escrivão Theophilo de tal, e acha-se conferida por N........Aguiar. — São estes unicos os nomes que figuram neste documento, de modo que não apparece aqui o nome de Domingos de Carvalho, que se diz ser Administrador do Concelho de Alverca, e não se diz uma palavra a respeito dos crimes; que se lhe imputam: appareceu uma folha de papel em fórma de memorial, em que se falla no Administrador do Concelho de Alverca, na qual vêm referidos os factos, de que se deu conhecimento á Camara. Este Memorial está assignado por Militão Francisco Ribeiro. Nesta folha de papel, que não tem direcção á Camara, nem ao Governo, que não é accusado este individuo, que se diz ser Administrador de Alverca, primeiramente de ter mandado Cabos de Policia, como é voz publica alli, para casa de uma viuva, para a proteger contra as exigencias, que lhe fazia um seu entiado, para haver por força propria aquillo que dizia ser seu. A Camara observará, que ainda verificado este facto, o Administrador longe de ser censurado, merece elogio, pois que dando protecção a uma infeliz viuva, contra o entiado que pertendia pagar-se por sua propria authoridade, cumpriu com o seu dever: se tivesse feito o contrario, então sim era criminoso (Apoiados).

O segundo facto é — que consta, tambem por voz publica, que elle levára para sua casa um livro, onde estavam escriptas as dividas que sem deviam a um certo marchante; e o levára para rasgar a verba de uma divida sua. Sr. Presidente, é voz publica, diz aqui este papel: já se vê por tanto, que o accusador não apresenta prova do facto. — Se elle fosse verdadeiro, por certo que o Administrador seria criminoso, mas não compete á Camara, nem ao Governo este objecto: as devidas reclamações, e acções, devem ser intentadas perante os Tribunaes de Justiça: esta Camara é, e deve ser estranha a taes negocios.

O terceiro crime, de que é accusado este Administrador, é que em vez de fazer os recrutamentos com moderação, os faz lançando cães de filla.... (O Sr. V. de Sá riu-se). O D. Par ri-se!

Estes negocios não são para rir, só haveria logar para rir, por haver trazido á Camara taes assumptos, e processados por tal fórma; esta Camara não póde, nem deve tractar senão de objectos serios (Apoiados). Sei que estes negocios são depois desfigurados lá fóra, e apresentados como de grande importancia, e é para este unico fim que são trazidos aqui; mas a Camara com esta explicação acaba de reconhecer que nenhuma importancia tem (Apoiados).

Tambem se diz — que em logar de prender um individuo, que tinha assassinado outro, passando-lhe pela porta, o deixára ir em liberdade, e não tomára as medidas necessarias para elle ser preso. Finalmente diz — que tendo o dito Administrador querido em sua alta sabedoria, que fosse cabo de policia um aprendiz de caixeiro, vindo por isso este aprendiz de caixeiro a deixar de prestar serviços ao Sr. Militão Francisco Ribeiro, (o accusador) que se veria na necessidade de tomar outro (Riso). Eis aqui está quanto a mim, em que consiste todo o negocio. O Administrador do Concelho teve a ousadia de querer, que fosse Cabo de policia o aprendiz de caixeiro do queixoso, e como isto o contrariava e encommodava, julgou que o melhor modo de evitar esse encommodo, era entregar ao D. Par este papel, para que se fizesse aqui menção de todos estes denominados horrorosos crimes, e a Camara mandasse proceder contra o seu auctor! Sr. Presidente, se aqui se apresentasse uma representação contra qualquer authoridade, que tivesse faltado ao seu dever, eu seria o primeiro a votar, que ella fosse remettida ao Governo para proceder contra essa authoridade; mas quando vejo, que se apresenta aqui uma certidão de inventario, sem saber-se para que fim, e um relatorio informe como acabei de mostrar, parece-me que não é digno desta Camara tomar conhecimento de similhante objecto, e que não póde de fórma alguma approvar o requerimento do D. Par.

O Sr. V. de Sá DE BANDEIRA — Tenho a palavra? (O Sr. Presidente — Tem a palavra). Posso fallar?... (Vozes — Falle. Falle.) Principiarei por dizer a V. Em.ª, que eu declarei que não tomava sobre mim asseverar a verdade das asserções, que apresenta o Cidadão Militão Francisco Ribeiro, mas que pedia simplesmente, que este papel fosse remettido ao Governo para lhe dar a consideração que merecesse. Deste modo a Camara não emitte um juizo sobre a exactidão do que este papel refere; mas acho que quando um Cidadão recorre a esta Camara (O Sr. C. de Thomar — Apoiado), porque se considera lesado, é da justiça desta mesma Camara offerecer-lhe os meios das suas queixas serem attendidas; e se elle não tem razão as authoridades o devem mostrar, e nesse caso deve estranhar-se, que dirigisse uma queixa quando não tinha fundamento: para o fazer. É verdade que o D. Par diz — que este papel não vem verdadeiramente em fórma de petição: mas S. Ex.ª podia lêr o periodo final, e nelle veria que recorre a esta Camara. (Leu o alludido periodo.) É claro que é uma petição, e se elle por ignorar as fórmas não deve ser attendido, quantos Cidadãos temos no Reino, que não estejam em estado de fazer um requerimento em fórma, nem mesmo de escrever o seu nome! E haviam de se despresar as suas queixas, por ignorarem os estylos forenses?

Eu de proposito não mencionei á Camara todas as queixas, que se fazem neste papel, e não fallei senão naquella, em que o peticionario diz, que o Administrador do Concelho de Alverca lança os seus cães de fila, para agarrarem os mancebos que elle designa para recrutas. O D. Par porém analysou todas as queixas, uma por uma, com o fundamento de que não se deviam tomar em consideração. Algumas dellas são de muita gravidade, embora o pretendente tenha recurso pelos meios judiciaes; mas o Governo é interessado, em que as suas Authoridades estejam inocentes de imputações, como as que a esta se fazem, e por isso deve o Governo examiná-las: se ellas são mal fundadas, deve conservar o empregado; mas havendo justos fundamentos, e queixas graves, é da conveniencia do Governo Representativo, que pelo menos estes empregados cessem de exercer as suas funcções. Eu não me demoro mais sobre isto, e repito, como já disse, que peço á Camara, que esta petição, ainda que informe, se remetta ao Governo como uma simples remessa, sem que se expresse opinião alguma da Camara a este respeito.

O Sr. C. DE THOMAR — Sr. Presidente em primeiro logar isto não é uma Representação dirigida a esta Camara (Apoiados), e não sendo uma Representação dirigida á Camara, parece-me que não se póde fazer obra alguma por este papel. Se o D. Par visse aqui neste papel direcção para a Camara, devia fallar como fallou, mas não a tem. (O Sr. V. de Sá — Queira lêr o fim.) Eu tambem li o fim, e tambem leio mais neste papel — que um dos crimes que se imputam áquelle Administrador, é por este individuo ter perdido sempre as eleições: até disto se lhe faz um crime! (Riso) (leu). O D. Par reconhece sem duvida, que as provas que se apresentam contra o Administrador, são a certidão do inventario a que já me referi, e no qual nem sequer figura indirectamente o accusado: tudo isto prova o exercicio de uma pequena vingança, e nós não nos devemos occupar de objectos de similhante natureza, quando temos que nos occupar com outros de maior gravidade e seriedade (Apoiados). Eu não quero cançar mais a Camara; veja ella quaes são os inconvenientes que podem resultar, se por ventura tiver de fazer obra por um papel tão irregular como este; e veja que não é por papeis de similhante natureza, que deve estar a fazer recommendações ao Governo. Sr. Presidente, eu não digo mais nada, tenho expendido a minha opinião, e a Camara decida como entender.

O Sr. FONSECA MAGALHÃES — Sr. Presidente, eu entendo que as queixas dos Cidadãos, que são trazidas a esta Camara, merecem attenção, e se as ditas queixas forem do humilde, ou daquelle a quem a fortuna lançou na classe mais infeliz, essas, se algumas devessem ter preferencia na Camara dos Pares, cumpriria que fossem as primeiras attendidas; nem devemos, como disse o Sr. V. de Sá, rejeitar as supplicas de qualquer Cidadão, porque elle, por ignaro ou falto de meios, não seguiu as formulas ordinarias; e não recorreu do inferior para o superior até chegar á Camara dos Pares. Mas não posso deixar de considerar que, ao menos, a direcção a esta Camara deve ser vista, e essa realmente não a vejo aqui. (O Sr. V. de Sá — Veja no fim.) As direcções no fim?!... Decida a Camara o que quizer, mas não entenda Cidadão algum que um objecto qualquer, por menos importante que seja, ha de ser rejeitado nesta Casa (Apoiados). Poderá haver muitas razões e fundamentos desta queixa: esse Administrador poderá ser tudo quanto delle se diz; mas eu declaro já que o não creio, porque me custa a acreditar a atrocidade de caçar recrutas com cães de fila (Riso), como os Hespanhoes caçavam os indios do novo mundo. Ainda não chegámos, creio eu, a esse estado de perfeição administrativa.

Sr. Presidente, eu não digo que o queixume seja totalmente falso, mas parece-me tão exaggerado que não posso acreditar. Em quanto aos outros capitulos de accusações, desconfio que ha razões particulares (Uma voz — Pessoal). A resolução que a Camara tomar deve ser em consequencia de um pedido a ella feito: esse pedido não o vejo: parece-me que se recorreu a um Membro da Camara, e este deu-nos noticia da queixa que lhe foi exigida, e não de um requerimento á Camara dos Pares.

Sr. Presidente, a authoridade publica, com a simples publicidade que tem havido sobre este objecto, verá que é preciso examinar o porte deste Administrador. A parte queixosa devia dirigir-se ao Governador Civil, sem duvida; mas segundo a disposição e fórma destes papeis, a Camara dos Pares não póde tomar conhecimento delles. Isto não é nem approvar, nem rejeitar, é outra cousa.

O Sr. V. DE SÁ DA BANDEIRA — Tome a Camara a deliberação que entender.

O Sr. V. DE FONTE ARCADA — Sr. Presidente, embora siga a opinião do Sr. Fonseca Magalhães, que de algum modo se ligou tambem com a do D. Par, que o tinha precedido, por isso que reconhece, que o papel não vem em fórma para a Camara poder tomar conhecimento delle, entretanto devo ponderar, que ha alli um objecto, que por isso mesmo que é extraordinario, parece-me que ninguem se attreveria a lança-lo em escripto, se elle não fosse verdadeiro, e então parece-me, que se póde tirar proveito desta discussão, posto que não seja pelos meios, que apresentou o D. Par que offereceu o requerimento: conseguintemente lemitar-me-hei, visto que não está presente o Sr. Ministro do Reino, a pedir ao Sr. Ministro da Justiça, que queira participar ao seu collega, que effectivamente a Camara desejava, ou pelo menos tal é o meu desejo, que S. Ex.ª se informasse a respeito do modo, porque aquelle Administrador faz o recrutamento. Se por um lado, quando qualquer pessoa se queixa da uma cousa extraordinaria, isso parece impossivel; por outro lado, por isso mesmo que a cousa não está na regra geral, nem nos costumes ordinarios, parece, ou deve-se talvez crêr, que ninguem se attreveria a queixar-se della se por ventura não existisse: finalmente, o facto a respeito dos cães de fila servindo para agarrar as recrutas é horrivel, e merece pelo menos, que o Sr. Ministro competente indague se elle é verdadeiro: por consequencia concluirei pedindo ao Sr. Ministro da Justiça, que dando conta deste objecto ao Sr. Ministro do Reino, faça com que este tome o negocio na consideração, que effectivamente deve merecer, visto que S. Ex.ª não está presente para se lhe recommendar directamente.

(Vozes — Votos. Votos.)

O Sr. Presidente — Ponho á votação da Camara esta proposição. — A Camara resolve-se a tomar conhecimento deste negocio, segundo o requerimento do D. Par V. de Sá?

Regeitado unanimemente.

O Sr. Secretario MARGIOCHI — Devo participar á Camara, que fui desannojar o Sr. D. de Pal-