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com inteira sujeição e obediência aos prelados diocesanos? Se é applicavel, o governo é competente para decretar a dissolução da corporação das irmãs da caridade visto não se verificar uma condição legal e indispensável para a continuação da sua existência, a inteira sujeição c obediência ao patriarcha de Lisboa a quem recusam obedecer sem sujeição ao superior do seu instituto. Se não é applicavel, o governo é incompetente, porque subsisto o decreto de 14 de abril de 1819, e só por uma lei pôde a corporação das irmãs deixar de ter a existência legal, que tem por virtude d'clle.

E' em relação a esta questão que eu vou fazer algumas reflexões e apresentar, alguns argumentos que, segundo me parece, mostram que no decreto de 9 de agosto são comprehendidas as irmãs da caridade.

O decreto de 9 de agosto attendendo principalmente a que a instituição dos prelados maiores das ordens militares e monachaes, e de quaesquer outras corporações que vivem congregadas em eommunida.de, é opposta ao espirito do evangelho e á religião catholica, segundo o qual os fieis são súbditos espirituaes dos bispos das respectivas dioceses, ordenou que estes as aceitassem á sua obediência, fazendo-lhes guardar os seus institutos e regras.

O sr. Marquez de Ficalho:—Faça favor de ler o artigo 4.°

O Oraãor: — O artigo 4.°, cujas palavras não posso referir exactamente, porque apenas tenho aqui um extracto, estabelece que as communidades que negarem obediência ao que se acha determinado no artigo antecedente sejam processadas e punidas como rebeldes, e declara que as casas d'essas communidades ficam extinctas, e os bens incorporados na fazenda nacional.

O sr. Marquez ãe Ficalho: — Peço ao sr. ministro da justiça que faça executar este decreto tal qual.

0 Oraãor:—Este decreto é um dos actos da dictadura de Sua Magestade Imperial o Duque de Bragança, e os actos d'esta dictadura que contém disposições legislativas, tem força de leis, e como taes têem sido considerados, e o são hoje, menos na parte em que têem sido competentemente alterados.

- Não é difficil demonstrar que no decreto de 9 de agosto são comprehendidas as corporações que professam o instituto de S. Vicente de Paulo. Estas corporações instituidas para o fim de se empregarem no exercicio de actos de beneficência evangélica, de humanidade e de caridade christã, no serviço dos enfermos, e na instrucção e educação da infância, não podem deixar de ser consideradas como corporações religiosas, ou como congregações cujos membros vivem em commum. Ellas têem o instituto ou regra que lhes deu o santo fundador, e por ella se governam; vivem em communidade, e obedecem segundo as definições d'essa regra a um superior geral. Isto basta para que não possam evadir-se á providencia do artigo 3.° d'aquelle decreto, que é commum a todos os que pela sujeição aos prelados ou superiores da sua respectiva congregação se subtrahem á obediência devida á auctoridade episcopal que o mesmo decreto quer restabelecer.

¦ Em 1834 foram extinctas as ordens religiosas do sexo masculino, e eu que aconselhei a Sua Magestade Imperial o Duque de Bragança esta medida, não me arrependi ainda de ter dado este conselho, e de ter tomado sobre mim a responsabilidade de referendar o decreto de 23 de maio d'aquelle anno.

Estava então convencido de que d'esta medida se seguiam importantes vantagens ao paiz, e de que sem ella seria difficil a sustentação e a consolidação das instituições liberaes.

Entrou então em duvida se n'essa extineção foi compre-hendida a congregação dos padres de S. Filippe Nery. Consultei um prelado illustre pelo seu saber, e pelas suas virtudes, e que depois foi um dos primeiros ornamentos da diocese de Lisboa e d'esta camará.

Eu vou ler o seu parecer na parte, de que pôde tirar-se argumento para por analogia se julgar o instituto de S. Vicente de Paulo, comprehendido no decreto de 9 de agosto, como o dos padres do oratório foi declarado comprehendido no decreto de 28 de maio.

«E para mim fora de duvida que as casas dos padres do oratório de S. Filippe Nery devem ser julgadas incluidas na extineção geral ordenada pelo decreto de 28 de maio.

«Elles professam o instituto de S. Filippe Nery.

«Elles têem particulares estatutos ou regras, por onde se governam, como qualquer outra communidade religiosa. ¦

1 «Elles vivem em communidade debaixo de obediência de prelados, como todas as familias regulares, que havia n'estes reinos.

«Elles, finalmente, se alimentam dos bens e rendas que possuem e administram em commum.

«E á vista d'isto como poderão isentar-se de serem comprehendidos entre os regulares, para se evadirem á providencia, que a lei quiz fazer commum a todos?»

Entre as rasões em que este bem pensado e bem elaborado parecer se funda, é ainda uma a de que nas corporações dos padres de S. Filippe Nery se verifica a isenção ou quasi independência da auctoridade episcopal «isenção summamente nociva ao interesse publico, e não muito conforme á ordem primitiva do estabelecimento da egreja.»

Mas, não faltam nem auctoridades, nem diplomas, e documentos officiaes para mostrar que o decreto de 9 de agosto comprehende na disposição dos artigos 3.° e 4.° as irmãs da caridade.

É verdade que esta applicação se não fez até 1838, antes parece que ellas continuaram a viver em Lisboa, segundo as regras de S. Vicente de Paulo, sujeitas ao superior residente em Paris ou a um delegado; porém isto não mostra que o decreto de 9 de agosto lhes não era applicavel, mostra que não lhes foi effectivamente applicado, e

d'este facto não se conhece senão que não foi executado, como o devia ser.

Porém em 1838 foram as mesmas irmãs da caridade as que reconheceram que o decreto as comprehendia, e requereram ao cardeal patriarcha Silva que tomando-as debaixo da sua obediência, mandasse proceder á eleição de superiora, e lhes desse director, e assim se praticou no tempo d'este prelado, e dos seus successores no longo período do dezenove annos, em conformidade com o decreto de 9 de agosto. A auctoridade de tres prelados tão eminentemente religiosos, e tão distinctos pelo seu saber e pelas suas virtudes, como foram os cardeaes Silva, Saraiva e D. Guilherme, é para mim de muito peso.

A opinião do ultimo é enunciada de um modo positivo, e em termos que não admitem a menor duvida, na informação a que se refere o decreto de 9 de julho de 1845.

«O meu parecer, diz este prelado, é que o instituto das irmãs de caridade está sujeito*immediatamente em Lisboa á auctoridade do patriarcha, e que qualquer outra casa filial que venha a estabelecer-se deve ficar sujeita ao respectivo prelado diocesano, salvo sempre a inspecção e fiscalisação da auctorida administrativa sobre as relações civis e temporaes da communidade, sendo esta a legislação vigente entro nós, expressa no artigo 3.° do decreto de 9 de de agosto de 1833.»

Não leio toda a informação porque é extensa, e não devo abusar da paciência da camará. O governo conformando-se com este parecer, com o do procurador geral da coroa, e com o do governador civil do Porto, permittiu por esse decreto de 1845, que no Porto se estabelecesse o instituto de S. Vicente de Paulo, com a clausula de ser observado o creto de 9 de agosto, sobre a sujeição e obediência ao ordinário da diocese. O decreto de 1845 foi referendado pelo sr. José Bernardo da Silva Cabral, então ministro da justiça, sendo o sr. conde de Thomar ministro do reino. Diz se no decreto, que Sua Magestade attendendo a que o augmento de uma instituição que se emprega com fervoroso zelo e disvélo no exercicio de actos dc caridade christã, merece a sua maternal solicitude, e tendo em vista aquelles pareceres: «ha por bem conceder o rep,io consenso para poder admittir-se e estabelecer-se na cidade do Porto o instituto das irmãs da caridade, segundo as, direcções dadas por S.Vicente de Paulo eficando como em Lisboa sujeito ao respectivo prelaão ãioce,sano (salva a inspecção e fiscalisação da competente auctoridade superior administrativa, sobre as relações civis e temporaes da communidade), nos termos do artigo 3.° do decreto de 9 de agosto de 1833. »

Pôde á vista desta clausula e da referencia feita a este decreto, duvidar-se se elle é applicavel ás irmãs da caridade, e se a obediência ao prelado diocesano, com exclusão da sujeição a um superior estrangeiro é uma condição indispensável para a continuação da existência d'esta instituição em Portugal? Dir-se-ha que o decreto de 1845 manda guardar as direcções dadas ao instituto por S. Vicente de Paulo, e que segundo ellas as irmãs de caridade estão sujeitas ao seu superior geral. Mas não se vê que invocar o decreto de 9 de agosto para concluir que as irmãs de caridade ficam sujeitas a um superior que não é o ordinário, é um absurdo! Não declara o decreto de 1845 que ellas ficam sujeitas ao ordinário como em Lisboa? E como estavam então as irmãs de caridade sujeitas ao patriarcha de Lisboa? Tinham ellas alguma sujeição ao superior da congregação de Paris?

O que o decreto declarou referindo-se ás definições ou á regra de S. Vicente,de Paulo, foi que o instituto admittido no Porto havia de ser regido por ella, mas com sujeição ao bispo da diocese, da mesma forma que é regido a instituto em Lisboa..

Se de se mandar seguir essa regra se seguisse que ella ficava subsistindo na parte relativa á obediência ao superior, que ella estabelece, seguir-se-ia também que o decreto de 9 de agosto, mandando que se ficasse observando os institutos e regras das corporações que eram sujeitas a prelados maiores, mantém esta sujeição ao mesmo tempo que a destroe pela extineção d'elles, e pela sujeição e obediência aos bispos das dioceses.

Até 1857 estiveram sempre as irmãs de caridade na inteira obediência ao prelado diocesano, e foi-lhes applicado o decreto de 9 de agosto sem hesitação alguma. Em junho d'esse anno as irmãs de caridade pediram ao prelado, que então presidia á diocese de Lisboa, para se reunirem ás irmãs de França com sujeição ao superior geral, que então se achava nesta capital, e o prelado concedeu-lh'a, limitan-do-a segundo as prescripçÕes da sua regra, e as leis do reino.

Eu não creio que este prelado, entendendo como elle entendia, que o decreto de 9 de agosto era applicavel ás irmãs de caridade, e que era incompatível com as sus disposições a sujeição aquelle superior, concedesse a licença em termos que por ella deixasse o decreto de ser executado, porque a licença é uma derogação d'essas disposições, ou uma dispensa. Se elle vivera .teria occasião de explicar e»te acto, e de certo o explicaria satisfatoriamente.

Como tem sido entendido e applicado não pôde ser invocado, em taes termos não podia ser concedida a licença sem violação do decreto de 9 de agosto, e por isso só de facto as irmãs de caridade se conservam sujeitas ao seu superior em Paris, e o facto nem destroe o direito, nem o constituo; e este mesmo facto ainda por outra rasão não pôde allegar-se porque suppondo que a licença foi concedida nos termos em que se pretende entende-la, e que o podia ser, ella foi caçada pelo prelado actual.

Para mostrar que as irmãs de caridade existem legalmente, e não poder a corporação ser dissolvida senão por uma lei, traz-se o artigo 13.° do decreto de... de 1851. Este artigo encarrega o conselho geral de beneficência de ligar com as diversas instituições a seu cargo a benemérita cor-

poração das irmãs de caridade, e de fazer que esta instituição se desenvolva e augmente.

Como é quo d'aqui se concluo o reconhecimento da existência legal desta corporação com sujeição ao superior de Paris! Pois na data d'e.sse decreto não estavam as irmãs de caridade sujeitas inteiramente ao patriarcha dc Lisboa! Estavam sem duvida, e neste e-tado concordo em que tenham urna existência legal, porque o decreto de 9 de agosto não extinguiu esta corporação, só declarou quo ficava extincta não se sujeitando á condição necessária para a continuação da sua existência, a inteira sujeição á auctoridade do patriarcha, e em 1851 essa condição verificava-se, e as irmãs de caridade não só se não recusaram a aceita-la, mas foram ellas mesmas, como já disse, que solicitaram que as tomasse debaixo da sua immediata obediência, desligando-se do superior de Paris. Pela ^recusa posterior dc voltarem á obediência do prelado diocesano, a que se tinham subtraindo, fundando-se na licença que obtiveram, e que lhes foi concedida pelo actual patriarcha, é que a corporação foi mandada dissolver em conformidade do artigo 4.° do decreto de 9 de agosto.

O sr. Conde de Thomar:—O artigo diz que serão processadas.

O Oraãor:—É verdade; o decreto ordena que sejam processadas pela desobediência, mas não ó pela desobediência, é por não aceitarem umíi condição sem a qual a lei não as admitte, que as casas das corporações de quo trata esse decreto são declaradas extinctas e os bens incorporados na fazenda publica, como acontece cm similhantes casos, de maneira que a extineção é a consequência de não terem uma existência legal, porque estas corporações não podem existir senão pela lei e com as condições que ella prescreve.

Em conclusão, eu não posso considerar no decreto, que ultimamente determinou a dissolução do instituto de S. Vicente de Paulo em Lisboa, uma usurpação do attribuição do poder legislativo: mas não se julgue que eu approvo a marcha que o governo tem seguido a respeito das irmãs da caridade, e d'este objecto terei occasião de me oceupar mais detidamente.

Agora limito-me a dizer que me parece, que se o governo tinha a consciência, quando publicou a portaria de 5 de março ultimo sobre as irmãs da caridade, de que procedera segundo as leis, c no u-o das suas legitimas attribuições, devia faze-la cumprir por dignidadedo governo, que se houve obstáculos ás irmãs, dentro ou fora do paiz, era necessário que se fizesse patente, que se a medida da dissolução era já ordenada na portaria, como me parece ter já ouvido a algum dos ministros, não havia motivo para o ordenar de novo, embora por um decreto, que, se o governo encontrou difficuldades na execução da portaria, encontrará as mesmas na execução do decreto (o sr. Conãe ãe Thomar:—Apoiado). Que não diminuía essas difficuldades a circumstancia de haver no decreto a assignatura do chefe do estado, porque por isso elle não pôde deixar de ser considerado como um acto puramente ministerial, e pelo qual são responsáveis os ministros (apoiados), que se o governo recciou que este negocio tivesse de ser submettido ao poder judicial, e este não considerasse legal a portaria, o mesmo receio devia ter convertida a portaria no decreto, c finalmente que a minha convicção é que o decreto de 22 de junho ha de ter o mesmo resultado que teve a portaria de 5 de março.

Concluo, pedindo ao governo que du as explicações convenientes sobre este objecto.

O sr. Marquez ãe Vallaãa: — Disse que tinha pedido a palavra para depois de fallar o sr. Avila.

O sr. Presiãente: — V. ex.a está inscripto n'este logar.

O sr. Marquez ãe Vallaãa:—Usando n'csta occasião da palavra, pede-a novamente para depois do sr. ministro da fazenda o sr. Avila.

Elle, orador, acostumado a dar francamente a sua opinião nas matérias mais graves que se têem agitado perante este senado, entende que faltaria a si, que abandonaria uma posição da qual não recua, se n'este momento guardasse silencio, e não levantasse a luva que se lançou, se não tomasse nota das observações apresentadas, se não discutisse algumas das doutrinas que se expenderam, o não acompanhasse com os seus commentarios as observações feitas por alguns oradores que tomaram parte n'esta questão.

Vergando debaixo do peso de aceusações gravíssimas, estão hoje a maior parte dos homens que entendem que as suas convicções os devem levar a defender a liberdade religiosa e a Uberdade da igreja; por um lado se diz que são exclusivistas, por outro, que entendem que sem certas e determinadas instituições não pôde o governo manter-se; que as instituições baqueain; finalmente, alcunham-se de fanáticos! Felizmente a todos estes acabava de amnistiar o sr. Aguiar, quando disse que fazia justiça aos sentimentos dos que defendiam doutrinas oppostas áquellas de s. ex.a; pois as tinha por conscienciosas; mas ainda quando o digno par os não tivesse amnistiado, e com os mais, elle orador, quando s. ex.a com todo o peso da sua eloquência o tivesse querido acabrunhar, teria elle escudo para se defender, e brandiria as mesmas armas que illustravam tantos homens graves, tanto no campo do raciocínio, como nas lides das tribunas, citaria, por exemplo, a lord John Russell, mr. Guizot, o conde de Montalembert, e muitos outros, não só entre os catholicos, mas mesmo entre os protestantes que defenderam a liberdade religiosa, e com tanto mais valor quanto mostravam que o seu enthusiasmo era desinteressado e verdadeiro, por isso que estes últimos não pertenciam ao grémio da nossa religião. Todos que têem conhecimento da historia parlamentar da Inglaterra, todos que têem observado a marcha dos-negócios públicos n'a-quelle paiz clássico da liberdade, admiram o seu nobre