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N.º 45

SESSÃO DE 17 DE JULHO DE 1890

Presidencia do exmo. sr. Antonio Telles Pereira de Vasconcellos Pimentel

Secretarios—os exmos. srs.

Conde d´Avila
Sousa Avides

SUMMARIO

Leitura e approvação da acta

Ordem do dia (primeira parte): é approvado sem discussão o projecto n.° 13, sobre a aposentação dos parochos.— A requerimento do sr. Pequito é dispensado o regimento e entra em discussão o parecer n.° 60, relativo á admissão do sr. marquez das Minas a tomar assento na camara por direito de successão. Foi approvado sem discussão por 19 espheras brancas.— O sr. Sousa Avides pede a abolição ou, pelo menos, a reducção do direito de portagem que se paga, na ponte de D. Luiz no Porto.- Responde-lhe o sr. ministro da instrucção publica.

Ordem do dia (segunda parte): continúa a discussão do projecto que cria o ministerio da instrucção publica.— Usam da palavra o sr. Jayme Moniz e o sr. ministro da instrucção publica.— O sr. José Luciano, ao ouvir marcar a ordem do dia para a seguinte sessão pergunta se entra mais algum parecer em ordem do dia ale do n.° 57. — O sr. presidente responde que entra tambem o n.º 64.

Ás duas horas e trinta e cinco minutos da tarda, achando-se presentes 19 dignos pares, abriu-se a sessão.

Foi lida e approvada a acta da sessão antecedente.

Não houve correspondencia.

O sr. Presidente: — Tem a palavra o sr. Sousa Avides.

O sr. Sousa Avides: — Como não está presente nenhum membro do governo, peco a v. exa. que me reserve a palavra para quando comparecer algum dos srs. ministros.

O sr. Presidente: — Fica v. exa. com a palavra reservada.

PRIMEIRA PARTE DA ORDEM DO DIA

Discussão do parecer n.° 53, relativo a aposentação dos parochos

O sr. Presidente: — Vamos entrar na primeira parte da ordem do dia.

Vae ler-se o parecer n.° 53 sobre o projecto de lei n.° 13.

Leu-se na mesa e é do teor seguinte:

PARECER N.° 53

Senhores.— Á vossa commissão de negocios ecclesiasticos foi presente o projecto de lei n.° 13, vindo da camara dos senhores deputados, e que tem por fim conceder a aposentação aos parochos canonicamente instituidos nas igrejas parochiaes do continente do reino e ilhas adjacentes.

Difficilmente se poderá contestar a justiça do pensamento fundamental do projecto.

N´um paiz, em que quasi todos os empregados e funccionarios do estado gosam ha muito da segurança, de que no fim de largo tempo de serviço, chegados os tristes dias da velhice, alquebradas as forças physicas ou a energia moral pelos annos, ou pelas enfermidades, não se encontrarão na dura necessidade de soffrerem privações ou de estenderem a mão á caridade, porque o direito á aposentação lhes garantirá os meios de subsistencia; que rasão legitima se poderá invocar para negar igual beneficio ao clero parochial?

Serão menos dignas de consideração dos poderes publicos as funcções que desempenham os ministros do altar?

Não exigirá a robustez, ou pelo menos a não invalidez do corpo e do espirito, o exercicio do ministerio parochial, ás vezes tão arduo, porque o parocho tem de desprezar as intemperies do tempo e o cansaço das distancias, quando é mister levar as consolações da religião ao leito do enfermo, ou as bençãos da igreja á sepultura de um morto? Porque é santa a sua missão, não estarão os parochos sujeitos á condição humana, que no ultimo quartel da vida a todos condemna, com raras excepções, ao enfraquecimento das forças, á inaptidão para um trabalho penoso, á necessidade do descanso?

Seria ocioso responder a taes interrogações. Ainda quando os poderes publicos não ligassem o devido apreço ás exigencias espirituaes da religião, mas só considerassem os valiosissimos interesses, que dependem de uma boa organização do registo parochial, a aposentação concedida aos parochos, alem de todas as rasões de justiça absoluta e relativa que a justificara, corresponderia a uma verdadeira necessidade publica.

Só considerações economicas a terão de certo differido por tão largo tempo. Mas o projecto submettido ao exame da vossa commissão, traduzindo a applicação de uma medida de tão grande alcance, consegue realisal-a sem nenhum novo encargo para o orçamento do estado.

Para fazer face ás despezas da aposentação do clero parochial é creado na caixa das aposentações, com escripturação propria e independente, um fundo especial, composto das quotas com que contribuirem os parochos; dos minimos do producto dos bens desamortisados que não tenham podido ser convertidos em inscripções; e finalmente do juro de 1.300:000$000 réis nominaes de inscripções de 3 por cento, que, esse fundo especial serão averbadas pelo ministerio da fazenda, provenientes dos bens das corporações religiosas extinctas ou supprimidas.

A lei de 4 de abril de 1861 já tinha determinado que fossem applicados á sustentação do culto e clero os bens que constituissem propriedade ou dotação dos conventos supprimidos, e identica applicação prescreveu o decreto com força de lei de 1 de dezembro de 1869 para os bens das collegiadas que se supprimissem.

Destinar uma parte d´esses bens para, com os seus rendimentos, constituir a fonte principal do fundo especial da aposentação dos parochos, é respeitar ainda o espirito d´aqullas disposições legaes, porque a aposentação é uma das primeiras necessidades da sustentação do culto e do clero.

Subordinada nos seus preceitos geraes ao systema da lei n.° 1 de 17 de julho de 1886, que regulou a aposentação para os empregados e funccionarios civis, a aposentação dos parochos fica sujeita a prescripções especiaes que circumstancias peculiares, e sobretudo a falta de uma lei geral de dotação do clero, sufficientemente justificam.

Para os empregados e funccionarios civis o ordenado serve de base para o calculo das pensões da aposentação.

O arbitramento das congruas feito provisoriamente pela

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lei de 20 de julho de 1839, mas que tem alcançado a longa duração entre nós destinada a quasi tudo que é provisorio, mal poderia, pela sua irregularidade e insufficiencia, ser tomado como base para o calculo das pensões da aposentação dos parochos.

A este inconveniente procurou remediar a commissão dos negocios ecclesianticos da camara dos senhores deputados, indo buscar para o calculo das pensões a lotação dos rendimentos parochiaes feita no ministerio da fazenda para o pagamento dos direitos de mercê, em vez de tornar-se simplesmente a importancia da congrua.

De uma emenda approvada durante a discussão na camara dos senhores deputados ao § 4.° do artigo 1.°, resultou o accentuar-se mais o pensamento do projecto de approximar quanto possivel a pensão da inhabiiidade á importancia dos rendimentos que o parocho obtem do exercicio do seu ministerio, como succede para as classes civis.

Não resulta maior encargo de serem mais largamente dotadas as pensões da aposentação, porque a totalidade d´ellas não poderá exceder o rendimento do fundo especial, ficando sujeitas a cabimento as pensões que tiverem de ser decretadas depois de attingido esse limite.

E, pelo contrario, da nova lotação a que será mister proceder para se computar no calculo dos rendimentos que servem de base ao pagamento dos direitos de mercê, os vencimentos do pé de altar e quaesquer outros rendimentos que constem de documentos publicos e authenticos, resultará para o thesouro um beneficio sensivel no augmento do producto d´aquelles direitos.

Os parochos, para gosarem dos beneficios da aposentação, têem de contribuir com quotas, variaveis segundo o idade, para a caixa das aposentações. Para alguns parachos, porém, são tão minguados os recursos que auferem da sua parochia, que reduzil-os com a obrigação do pagamento da quota, embora com a esperança de uma longinqua aposentação, seria aggravar as suas penosas circumstancias.

São portanto justificadas a isenção do pagamento de qualquer quota para os parochos cujos rendimentos não forem lotados em quantia superior a 180$000 réis e as benções parciaes prescriptas no § 3.° do artigo 1.° para as congruas inferiores a 400$000 réis.

Do mesmo modo se estabeleceu que a pensão de aposentação ordinaria nunca possa ser inferior a 180$000 réis.

Taes são as principaes divergencias entre as disposições que terão de regular a aposentação dos parochos e as prescriptas na legislação vigente para a aposentação dos funccionarios e empregados civis.

Outras disposições encerra o projecto que na sua maior parte apenas representam a explanação das idéas expostas.

Para uma, pela sua importancia, chamará porém a commissão a vossa esclarecida attenção.

O § 22.° do artigo 1.° confere ao governo auctorisação, não só para decretar as providencias que julgar necessarias para a execução da lei, mas ainda para a regularisação e melhoramento do serviço do registo parochial, para rever e alterar as tabellas dos emolumentos parochiaes e respectivos usos e regular o serviço das pompas funebres e o das thesourarias ecclesiasticas.

São assumptos importantes, que ha muito estavam reclamando providencias especiaes para a sua devida regularisação.

Pelos motivos expostos é a vossa commissão de parecer que deve merecer a vossa approvação para subir á sancção real o referido projecto de lei.

Sala das sessões da commissão dos negocios ecclesiasticos da camara dos dignos pares, 7 de julho de 1890. = A. Sarros e Sá = Thomás, bispo da Guarda = Antonio, arcebispo = bispo do Algarve = Jeronymo Pereira da Silva Baima de Bastos = Agostinho de Ornellas = Augusto Neves dos Santos Carneiro = José Maria Rodrigues de Carvalho = José de Sande Magalhães Mexia Salema = Alberto Antonio de Moraes Carvalho, relator.

PARECER N.° 53-A

Senhores.— A vossa commissão de fazenda concorda com o parecer da commissão dos negocios ecclesiasticos, relativo ao projecto de lei n.° 13, que tem por fim conceder a aposentação aos parochos.

Sala da commissão de fazenda, em 7 de julho de 1890.= Augusto Cesar Can da Costa = Visconde da Azarujinha = Moraes Carvalho = José Antonio Gomes Lages = Antonio José Teixeira = Antonio de Sousa Pinto de Magalhães = Conde de Gouveia.

Projecto de lei n.° 13

Artigo 1.° O direito de aposentação concedido aos empregados e funccionarios civis, pelo decreto com força de lei, n.° 1.°, de 17 de julho de 1886, é, nos mesmos termos, ampliado aos parochos canonicamente instituidos nas igrejas parochiaes do continente do reino e das ilhas adjacentes; salvas, porém, as declarações e alterações prescriptas aos paragraphos seguintes.

§ 1.° É facultada a aposentação ordinaria:

a) Aos parochos que tiverem completado setenta annos de idade.

b) parochos que, contando mais de sessenta annos de idade e trinta de serviço effectivo, se mostrarem completamente impossibilitados, physica ou intelectualmente, de continuarem no exercido do ministerio parochial.

c) Se os parochos, que estiverem nas condições da alinea d), ou nas da alinea a) acrescendo a circumstancia da absoluta impossibilidade physica ou intellectual de continuarem no exercicio do seu ministerio, não solicitarem a aposentação, poderá o governo determinal-a sobre parecer ou proposta do prelado da respectiva diocese.

d) A aposentação, nos precisos termos da alinea a), só póde ser concedida a requerimento dos parochos, acompanhado de boa informação dos prelados respectivos.

§ 2.° Os parochos, cujas congruas não tiverem sido lotadas, nos termos do § 4.° d´este artigo, em quantia superior a 180$000 réis, ficam dispensados do contribuir com qualquer quota para a caixa de aposentação, sem que por este facto deixem de ter igual direito a serem aposentados, quando reunirem as outras condições indispensaveis para a aposentação ordinaria ou extraordinaria.

§ 3.° Os parochos, cujas congruas não tiverem sido lotadas, segundo o disposto no paragrapho seguinte em quantia superior a 300$000 réis, pagarão para a caixa de aposentação a quota correspondente sómente ao excesso da lotação sobre 180$000 réis. Aquelles, cujas congruas tiverem sido lotadas, segundo o disposto no § 4.°, em quantia superior a 300$000 réis, e inferior a 400$000 réis, pagarão a quota correspondente ao excesso da lotação sobre 100$000 réis. Os que tiverem congruas lotadas em quantia superior a 400$000 réis, pagarão a quota correspondente á totalidade da lotação.

§ 4.° As pensões de aposentação ordinaria concedidas aos parochos serão iguaes á totalidade das suas congruas, segundo a lotação feita para o pagamento dos direitos de mercê, computando-se n´ella os rendimentos do pé de altar, devidamente calculados pela media dos ultimos cinco annos, anteriores á publicação d´esta lei, conforme constar do registo parochial e respectiva tabella, ou, quando não haja tabella, segundo os usos da freguezia e bem assim, qualquer outros rendimentos parochiaes, que constem de documentos publicos e authenticos.

a) As pensões de aposentação extraordinaria serão fixadas proporcionalmente á importancia das congruas, segundo a lotação fixada n´este paragrapho quando attingirem, ou excederem, 180$000 réis, porque, sendo de quantia inferior, o cômputo da pensão referir-se-ha sempre a esta importancia de 180$000 réis.

b) Em caso algum, porém, a pensão de aposentação, quer ordinaria, quer extraordinaria, poderá ser superior a

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1:000$000 réis, nem a pensão da aposentação ordinaria poderá ser inferior a 180$000 réis, seja qual for a lotação das congruas.

§ 5.° A congrua, que serve de base á pensão de aposentação, é a arbitrada á igreja em que o parocho estiver collado quando tiver de aposentar-se, se a sua collação n´essa igreja tiver durado por mais de cinco annos. De contrario, servirá de base, para a determinação da pensão, a congrua arbitrada á igreja, em que anteriormente tenha servido. Esta disposição não é applicavel á aposentação extraordinaria, para a qual servirá de base a congrua e lotação da igreja em que o parocho estiver collado, independentemente do tempo da collação

§ 6.° Nenhuma aposentação poderá ser concedida, com excepção do disposto no § 2.º, sem que o parocho tenha contribuido para a caixa de aposentação, nos termos d´esta lei, pelo menos durante cinco annos.

§ 7.° Os parochos, que á data da publicação d´esta lei estiverem nos casos das alineas a) e b) do § 1.°, poderão adquirir de prompto o direito á sua aposentação, pagando as respectivas quotas para a caixa de aposentação relativas a cinco annos, ou por uma só vez, ou em cinco prestações annuaes, á sua escolha, devendo, no segundo caso, o pagamento effeituar-se por deducção na pensão de aposentação.

§ 8.° Os parochos, a quem, á data da publicação d´esta lei, faltarem para reunirem as condições das alineas a) e 5) do § 1.° d´este artigo, idade ou tempo de serviço, inferior a cinco annos, podem adquirir o direito á aposentação, logo que completem esse tempo ou essa idade, se, emquanto não completarem um ou outra contribuirem para a caixa de aposentação com as quotas devidas e relativas ao tempo decorrido desde a data da publicação da mesma lei, e se, depois de completa a idade ou tempo de serviço, pagarem o que faltar para a contribuição de cinco annos de quotas, ou por uma só vez, ou annualmente, á sua escolha, devendo, no segundo caso, o pagamento fazer-se por deducção na pensão de aposentação.

§ 9.° São applicaveis as disposições dos dois paragraphos antecedentes á aposentação prevista na alinea c) do mesmo § 1.° d´este artigo, não sómente durante os primeiros cinco annos da vigencia d´esta lei, mas permanentemente, para os parochos que tiverem ficado isentos de contribuir para a caixa de aposentação, por não quererem gosar d´este direito, como lhe é permittido pelo § 21.°, porém n´este caso; deverão contribuir para a caixa de aposentação com a quoto correspondente ao periodo de dez annos.

$ 10.º Os soccorros provisorios que, por mero titulo de renda vitalicia, tiverem sido concedidos aos parochos aposentados, cessam logo que elles comecem, a receber a pensão de aposentação.

§ 11.° A impossibilidade physica ou intellectual será, em regra, verificada, nas sédes das dioceses, por tres facultivos para esse fim nomeados pelo ordinario, o qual depois enviará os respectivos processos de aposentação, com o seu parecer, ao ministerio dos negocios ecclesiasticos de justiça, para seguirem os devidos termos.

a) Quando a aposentação não tiver sido requerida pelo parocho, será elle sempre mandado ouvir no processo, e ser lhe-na permittido recorrer do parecer dos facultativos, que o tiverem julgado incapaz, para uma nova junta medica composta a dois facultativos nomeados pelo governo, e dois nomeados, por elle d´entre os professores de qualquer das escolas medicas do paiz? presidida pelo presidente do tribunal da relação de Lisboa. Se esta junta confirmar o primeiro parecer serão pagos pelo recorrente os honorarios dos facultativos que a compozerem.

b) Quando se de o recurso previsto no paragrapho anterior, se o parocho recorrente pertencer a alguma das dioceses do continente, a junta de revisão reunir-se-ha em Lisboa; se porém, o parocho, for de alguma das dioceses das ilhas adjacentes, a junta reunir-se-ha na séde do districto, a que pertencer o parocho, será presidida pelo juiz de direito da comarca da cabeça do districto, e os medicos nomeados por elle serão dos que houver na localidade.

c) Quando se mostrar que o parocho não póde comparecer na séde da diocese ou do districto, por motivo justo, poderá o primeiro exame medico verificar-se na parochia da sua residencia.

§ 12.° Cessando a impossibilidade, e verificado este facto pela fórma estabelecida no artigo antecedente, se o parocho não tiver renunciado o seu beneficio, ou se, tendo feito a renuncia, o beneficio se achar ainda vago, a elle será logo reconduzido. Se, porém, o beneficio estiver já provido, será apresentado e collado, na primeira opportunidade, em qualquer outra igreja, beneficio ou emprego.

Em qualquer d´estes casos o pagamento das pensões de aposentação só terminará quando os parochos forem investidos no seu cargo.

§ 13.º Para o effeito da aposentação não será coutado o tempo, em que os parochos estiverem suspensos das ordens sacras, ou do exercicio do seu ministerio, nem aquelle em que deixarem de residir em seus beneficios sem legitimo impedimento ou auctorisação competente. Será, porém, levado em conta todo o tempo de serviço no exercicio das funcções parochiaes, como collado, encommendado, cura ou coadjuctor, e o que tiverem prestado em qualquer beneficio simples ou curado, ainda que não tenha havido collação, bem como no exercicio do magisterio ou de qualquer emprego nos seminarios e todos os demais em alguma commissão de serviço publico devidamente auctorisada.

§ 14.° Decretada a aposentação, ou por determinação regia, ou por solicitação do parocho, não poderá, comtudo, tornar-se effectiva, nem se pagará a pensão concedida, emquanto se não satisfizerem as condições seguintes:

l.ª Ser o processo remettido á direcção geral da contabilidade publica, para verificar se ha, ou não, cabimento dentro do fundo de que trata o § 18.°, e para os effeitos do § 7.° do artigo 1.° da lei de 19 de junho de 1889.

2.ª Apresentar o parocho a certidão, a que se refere o § unico do artigo 11.° do decreto de 14 de outubro de 1886, quando tenha pago as quotas para a caixa de aposentação, nos termos d´esta lei, devendo vir esta certidão junta ao processo, quando for remettido á direcção geral da contabilidade publica.

3.ª Apresentar o parocho certidão do termo de renuncia do seu beneficio, ou, na hypothese do paragrapho seguinte, participação official do prelado diocesano de ter sido removido o parocho do exercicio do ministerio parochial, em que estava.

4.ª Cumprimento do preceituado nos §§ 2.° e 3.° do artigo 10.° do decreto com força de lei, n.° 1.°, de 17 de julho de 1886, devendo a remessa do processo para o tribunal de contas ser feita por intermedio da direcção geral da contabilidade publica.

§ 15.° Quando o parocho aposentado se recuse a renunciar voluntariamente o seu beneficio, ou não possa, por qualquer circumstancia, verificar a renuncia, o prelado diocesano o removerá do exercicio do ministerio parochial, e nomeará para o substituir um encommendado, percebendo este a congrua arbitrada á respectiva igreja, e aquelle a pensão que lhe tiver sido concedida. O parocho encommendado não perceberá congrua por inteiro, em quanto ao aposentado não for mandada pagar a pensão de aposentação, porque neste caso aquelle só receberá metade da congrua.

§ 16.° O pagamento das quotas, com que contribuirem os parochos das freguezias do continente para a caixa de aposentação, será feito nas recebedorias das comarcas respectivas, e a importancia d´ellas será remettida por estas repartições á sobredita caixa, pela qual serão satisfeitas as pensões aos parochos aposentados.

As quotas dos parochos das dioceses das ilhas adjacentes serão descontadas nas folhas das congruas, pagas dire-

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ctamente pelo estado, e a sua importancia será tambem remettida á caixa de aposentação.

§ 17.° Em tudo o mais, que se referir ao pagamento de quotas, ficam os parochos sujeitos ao disposto, para a aposentação da funccionarios civis, nos artigos 4.° a 7.° do decreto de 14 do outubro de 1886.

§ 18.º É creado, na caixa de aposentação, com escripturação propria e independente, um funda especial, unicamente destinado á aposentação do clero parochial, nos termos desta lei, composto das seguintes verbas:

l.ª Do juro de 1.300:000$000 réis nominaes de inscripções de 3 por cento, com o coupon do 1.° de julho de 1890, proveniente dos rendimentos dos bens das corporações religiosas extinctas ou supprimidas, que serão, pelo ministerio da fazenda, averbadas ao dito fundo especial;

2.ª Das quotas com que contribuirem os parochos para a caixa de aposentação;

3.ª Dos minimos do producto dos bens desamortizados, que não podérem ter sido convertidos em inscripções.

§ 19.° São applicaveis ao fundo especial, de que trata o paragrapho antecedente, as disposições dos artigos 17.° e 18.° do decreto n.º 1.° de 17 de julho de 1886.

§ 20.° As quotas, com que os parochos têem de contribuir para a caixa de aposentação, são as fixadas nos numeros seguintes, conforme as suas idades:

1.° — Até trinta annos................... 3 por cento

2.° — De trinta a quarenta annos.......... 4 »

3.° — De quarenta a cincoenta annos....... 5 »

4.º — De cincoenta annos em diante....... 6 »

§ 21.° O parodio, que não quizer gosar do direito de aposentação, deverá participal-o ao ministerio dos negocios ecclesiasticos e da justiça, por intermedio do seu prelado, em requerimento por elle feito e assignado, com a assignatura devidamente reconhecida por tabellião, a fim de ficar isento de pagar as quotas estabelecidas para a caixa de aposentação.

§ 22.° A aposentação extraordinaria só póde verificar-se a requerimento do parodio ou por determinação do governo, sobre parecer ou proposta do prelado da diocese respectiva.

§ 23.° O governo decretará as providencias, que julgar necessarias para a execução da presente lei, e bem assim para a regularisação e melhoramento do serviço do registo parochial, podendo rever e alterar as tabellas dos emolumentos parochiaes e respectivos usos e regular os serviços funebres e o serviço das thesourarias ecclesiasticas.

Art. 2.° Ficam por esta fórma ampliadas e modificadas, com relação ao clero parochial, as disposições do decreto com força de lei, n.° 1.°, de 17 de julho de 1886, e demais legislação respeitante á aposentação dos funccionarios civis, e revogada a legislação contraria a esta.

Palacio das côrtes, em 5 de julho de ]890. = Pedro Augusto da Carvalho, deputado presidente = José Joaquim de Sousa Cavalheiro, deputado secretario = Antonio Teixeira de Sousa, deputado secretario.

O sr. Presidente: — Está em discussão na sua generalidade.

Como ninguem pede a palavra vae votar-se.

Os dignos pares que approvam o projecto de lei n.º 13 na sua generalidade tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O sr. Presidente: — Vae ler-se o artigo 1.°

Leu-se na mesa e posto á votação foi approvado sem discussão, bem como todos os outros artigos do projecto.

O sr. Rodrigo Pequito: — Peço a v. exa. que consulte a camara sobre se dispensa o regimento para entrar desde já em discussão o parecer n.° 60.

O sr. Presidente: — O digno par o sr. Rodrigo Pequito pede a dispensa do regimento para poder entrar immediatamente em discussão o parecer n.° 60, sobre o requerimento do sr. marquez das Minas, pedindo para tomar assento na camara como successor de seu pae.

Os dignos pares que approvam o requerimento do digno par o ar Pequito, tenham a bondade de se levantar.

Foi approvado.

O sr. Presidente: — Vae ler-se o parecer n.° 60.

Leu-se na mesa e é do teor seguinte:

PARECER N.° 60

Senhores.— A vossa primeira commissão de verificação de poderes examinou com a devida attenção os documentos com que o marquez das Minas, D. Alexandre da Silveira e Lorena fundamenta o requerimento em que pede ser admittido a tomar assento n´esta camara, como successor de seu pae, o marquez D. Braz da Silveira e Lorena, par do reino, já fallecido.

Provam os referidos documentos que o requerente é filho legitimo, varão unico sobrevivo do dito par do reino marquez das Minas, documento n.° 1, que seu pae prestou juramento e tomou assento n´esta camara, documento n.° 2.

Que o dito seu pae falleceu antes da promulgação da lei de 1878, documento n.° 3, pelo que são applicaveis ao requerente as condições da legislação anterior sobre a successão ao pariato;

Que estas condições se verificam na pessoa do requerente, documentos n.°s 1 e seguintes, pois é maior de vinte e cinco annos, está habilitado com um curso de instrucção superior e tem mais de 1:600$000 réis de rendimento, possuindo tambem moralidade e bom comportamento.

Por estas rasões é a vossa commissão de parecer que o actual marquez das Minas, D. Alexandre da Silveira e Lorena, seja admittido a prestar juramento e tomar assento n´esta camara como successor de seu pae.

Sala das sessões da commissão, 12 de julho de 1890.= Conde de Gouveia = Conde do Bomfim = Conde de Thomar = Augusto Cesar Cau da Costa = Bernardo de Serpa Pimentel = José de Mello Gouveia = A. de Ornellas, relator.

Illmo. e exmo. sr. — Diz o marquez das Minas D. Alexandre da Silveira e Lorena, que, pretendendo tomar assento na camara dos dignos pares por direito hereditario, vem apresentar a exposição constante do presente requerimento e exhibir os documentos com que prova a providencia da mesma pretensão.

O supplicante é legitimo descendente por varonidi do marquez das Minas, D. Braz da Silveira, na linha recta de successão como seu filho legitimo (documento n.° 1).

O marquez das Minas D. Braz da Silveira prestou Juramento e tomou assento na camara na qualidade de Par do reino, como se prova pelo documento n.° 2.

O direito de succeder no pariato já se achava adquirido por morte do seu antecessor ao tempo da promulgação da lei de 3 de maio de 1878, como se prova pelo documento n.° 3, devendo por isso ser admittido era conformidade das disposições da legislação anterior, que, alem das que ficam satisfeitas com a juncção dos documentos n.ºs 1 e 2, Prescrevem mais outras condições que o supplicante mostra cumpridas, como passa a expor.

O supplicante tem mais de trinta annos de idade, como prova pelo referido documento n.° l, acha-se no pleno goso dos seus direitos politicos, e possue alem d´isso moralidade e boa conducta, como prova Pelos documentos n.°s 4, 5, 6 e 7.

O supplicante completou o curso da escola nacional de minas de París, estabelecimento Publico de instrucção superior, e foi nomeado engenheiro de minas como tudo se vê dos documentos n.ºs 8 e 9.

O supplicante exerce actualmente o logar de director de obras publicas da provincia de Angola, para que foi no-

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meado por decreto de 28 de outubro de 1886 (documento n.° 10), que se acha publicado no Diario do governo n.° 250 de 3 de novembro do mesmo anno, e n´esta qualidade tem um rendimento superior a l:600$000 réis, como se vê do decreto de 23 de dezembro de 1880, o da tabella da receita e despeza das provincias ultramarinas para o anno de 1888-1889 (documento n.° 11).

Exposto assim o direito do supplicante, nos termos do regimento da camara dos dignos pares, não quer elle deixar de se referir a um facto a seu respeito occorrido, o mostrar que isso de modo algum póde invalidar a sua pretensão.

O marquez das Minas, pae do supplicante, deixou por sua morte mais dois filhos varões, mais velhos do que este, como se vê dos documentos n.ºs 12 e 13. Estes dois irmãos do supplicante morreram, porém, um em 1868 e outro em 1870, e ambos sem terem completado vinte e cinco annos de idade, como tudo se vê (documento n.° 14).

É certo que a lei de 11 de abril de 1845 dispõe no seu artigo 3.°, que se por morte de algum par dois dos seus immediatos successores morrerem consecutivamente sem se habilitarem provando os requisitos do artigo 2.°, fica extincta a successão do pariato. Não é menos certo, porém, que ainda quando se considerar rigorosamente applicavel tal disposição ao caso, ella de modo algum affecta o direito do supplicante.

Com effeito, a comminação da perda do pariato no caso sujeito só se poderia dar quando os irmãos do supplicante, tendo podido habilitar-se e tomar assento como pares do reino, o não tivessem querido fazer. Injusto e absurdo seria perder alguem um direito, e, ainda mais, fazel-o perder a outrem, só porque d´elle não fez uso, quando a esse uso obstava uma impossibilidade absoluta. Ad impossibilia nemo tenetur, e d´este axioma juridico decorre a conclusão do se ter por nulla a condição cujo cumprimento é impossivel. Os irmãos do supplicante nunca attingiram a idade legal em que poderiam habilitar-se e tomar assento como pares do reino, e por isso não podiam fazer perder esse direito, que nem lhes era possivel prejudicar, por nem lhes ter chegado a pertencer, nem d´elle tiveram a faculdade de usar ou hão. E por isto o supplicante succede, não no direito que pertencesse aos irmãos, mas sim ao pae, de quem é legitimo descendente por varonia.

Tambem não é menos certo que o artigo 1.º § 2.° da mesma lei de 1845 dispõe que, extincta inteiramente, em vida do pae fallecido, a linha do primogenito, torne o seu logar a linha descendente immediata que existir ao tempo do seu fallecimento.

Esta prescripção, porém, tambem não invalida o direito successorio do supplicante, não só por a sua simples letra mostrar que ella não é applicavel ao seu caso, em que nunca existiram linhas, por seus irmãos terem morrido solteiros, e depois de seu pae, mas tambem porque ainda quando se quizesse regular a hypothese pelo espirito da mesma disposição, ella seria de todo o ponto favoravel ao supplicante, por ser o descendente immediato de seu pae, a quem, como ficou provado, elle exclusivamente succede.

Nos expostos termos, o supplicante — P. a v. exa. se sirva mandar á commissão de verificação de poderes o presente requerimento com os documentos juntos, a fim de que se sigam os termos necessarios para o supplicante tomar assento na camara como par do reino.— E. R. M.cê Marquez das Minas.

N.° 1

Antonio Dias Ferreira de Vasconcellos, prior collado na igreja de S. Mamede de Lisboa.

Certifico que no livro 7.° dos baptismos, a fl. 37 v. está o assento seguinte:

«No dia 19 de setembro de 1847, n´esta parochial de S. Mamede, baptisei solemnemente a Alexandre Maria Francisco de Assis de Paula Xavier de Salles Filomeno Ignacio Pedro de Arbués Januario, que nasceu em 17 de setembro, filho do exmo. marquez das Minas, D. Braz da Silveira, e da exma. marqueza do mesmo titulo, D. Eugenia de Sousa Holstein, recebidos na freguezia de Nossa Senhora da Encarnação, neto paterno do exmo. D. Nuno da Silveira e da exma. D. Anna da Camara, e materno do exmo. duque de Palmella D. Pedro de Sousa Holstein e da, exma. marqueza do mesmo titulo, D. Eugenia Telles da Gama. Foi padrinho o exmo. D. Luiz da Silveira Lorena, tio do baptisado, da freguezia de Santos o Velho, madrinha a exma. marqueza do Faial, D. Maria Luiza de Noronha e Sampaio, d´esta freguezia. = O prior, Antonio Teixeira Salgueiro.»

Nada mais se continha no dito assento, a que me reporto.

Parochial de S. Mamede, 20 de junho de 1890. = O prior, Antonio Dias Ferreira de Vasconcelos.

N.º 2

Illmo. e exmo. sr. — Diz o marquez das Minas, que elle pretende que a secretaria da camara dos dignos pares do reino, lhe passe por certidão, em como seu fallecido pae o marquez do mesmo titulo prestou juramento e tomou assento na mesma camara como par do reino e por isso — P. a v. exa., como digno presidente da mesma camara, se sirva mandar passar a referida certidão.— E. R. M.cê = Marquez das Minas.

Deferido em termos.

Lisboa, 18 de junho de 1890. = Telles de Vasconcellos.

Joaquim Hemeterio Luiz de Sequeira, do conselho de Sua Magestade, commendador da ordem militar de Nossa Senhora da Conceição de Villa Viçosa o director geral da secretaria da camara dos dignos pares do reino

Em observancia do despacho de s. exa. o sr. presidente, certifico que, revendo o registo das cartas regias de nomearão de, dignos pares, n´elle a fl. 19 se acha registada a que, sob data de 3 de maio de 1842 eleva á dignidade de par do reino o exmo. sr. marquez das Minas; e revendo outro sim o registo das actas do mesmo anno, menciona a de n.° 2 que o nomeado prestou juramento e tomou posse no dia 12 de julho. Para firmeza do que, e constar onde convier, mandei passar esta, que vae por mim assignada e sellada com o sêllo da camara.

Direcção geral da secretaria da camara dos dignos pares do reino, em 18 de junho de 1890.= Joaquim Hemeterio Luiz de Sequeira.

N.°3

Domingos da Silva, prior da freguezia de Santos, o Velho, de Lisboa etc.

Certifico que a fl. 202 do livro 20 dos obitos d´esta freguezia, se encontra, o termo seguinte:

«Aos 16 dias do mez de janeiro do anno de 1867, ás onze horas da manhã, em seu palacio e casa de sua residencia, n.° 6, sita na rua Direita de S. Francisco de Paula, d´esta freguezia de Santos o Velho, bairro de Alcantara, concelho e diocese de Lisboa, falleceu com todos os sacramentos um individuo do sexo masculino, por nome o illmo. e exmo. sr. D. Braz Maria José Balthasar da Piedade da Silveira e Lorena, marquez das Minas e par do reino, natural d´esta freguezia de Santos, onde e morador no sobredito seu palacio, casado com a exma. sr.ª marqueza das Minas, D. Eugenia de Sousa Holstein, sendo o excellentissimo fallecido de idade de cincoenta e dois annos e filho do exmo. sr. D. Nuno Maria José Balthasar da Silveira, proprietario; natural d´esta freguezia de Santos e do

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DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO 642

Exmo. Srª Anna José da Camara, natural da freguezia de S. Bartholomeu do Beato, concelho dos Olivaes, diocese de Lisboa; não fez testamento e deixou seis filhos menores e foi sepultado de caixão á cova no cemiterio publico de Nossa Senhora dos Prazeres, para onde foi conduzido decentemente em um coche e ali ficou encerrado em jazigo. E para constar lavrei em duplicado este assento, que assigno. En ut supra.— O prior, João dos Santos da Mata. »

Está conforme. Santos o Velho, 25 de junho de 1890.= Prior, Domingos da Silva.

N.° 4

Comarca de Lisboa. — 1.° districto criminal. — Certificado.— Attesto que dos boletins archivados no registo criminal d´esta comarca de Lisboa nada consta contra o marquez das Minas, filho de D. Braz da Silveira e de D. Eugenia de Sousa Holsteins, natural de Lisboa, concelho de Lisboa, districto de Lisboa.

Registo criminal da comarca de Lisboa, 1.° districto criminal, em 25 de junho de 1890.= Pelo escrivão encarregado do registo, o escrivão do terceiro officio, Henrique Maria Nobre. = (Segue o reconhecimento.)

N.° 5

Comarca de Lisboa. — 2.° districto criminal. — Certificado.— Attesto que dos boletins archivados no registo criminal d´esta comarca de Lisboa nada consta contra o marquez das Minas, filho de D. Braz da Silveira e de D. Eugenia de Sousa Holstein, natural de Lisboa.

Registo criminal da comarca de Lisboa, em 25 de junho de 1890. = Pelo escrivão encarregado do registo, o escrivão interino, Luiz Antonio Dias Pereira. — (Segue o reconhecimento.)

N.°6

Comarca de Lisboa.— 3.° districto criminal. — Certificado.— Attesto que dos boletins archivados no registo criminal d´esta comarca de Lisboa nada consta contra Alexandre da Silveira e Lorena, marquez das Minas, filho de D. Braz da Silveira e de Eugenia de Sousa Holstein, natural d´esta cidade.

Registo criminal da comarca de Lisboa, 23 de junho de 1890. = O escrivão encarregado do registo, Accacio Joaquim de Abreu Coelho. = (Segue o reconhecimento.)

N.° 7

Attestâmos que o exmo. marquez das Minas tem sempre tido moralidade e boa conducta.

Lisboa, 20 de junho de 1890.= Conde das Alcaçovas = Francisco Joaquim da Costa e Silva = José de Castro Guimarães.

N.° 8

Senhor.— Marquez das Minas, engenheiro subalterno do quadro de minas do ministerio das obras publicas, precisando, para mostrar onde lhe convier, copia da carta do Curso de engenheiro que fez na escola de minas de Paris, e se acha archivada na repartição de minas do mesmo ministerio, respeitosamente P. a Vossa Magestade haja por bem mandar que lhe seja passada a referida copia.— E. R. M.cê

Lisboa, 16 de junho de 1890. = Marquez das Minas.

Deferido.— Lisboa, 16 de junho de 1890.= Bento Fortunato de Almeida Eça, director geral.

Severiano Augusto da Fonseca Monteiro, engenheiro subalterno de minas, chefe da segunda secção da repartição de minas do ministerio das obras publicas, commercio e industria, servindo de chefe da mesma repartição, etc., etc.

Certifico, em virtude do despacho retro, que no archivo d´esta repartição existe o original do documento datado de 11 de junho de 1875, assignado por A. Daubrée e devidamente legalisado, pelo qual o requerente, marquez das Minas (D. Alexandre da Silveira) provou ter frequentado a escola nacional de minas de Paris, cujo curso seguiu com zêlo e assiduidade, tendo satisfeito a todas as provas exigidas e tendo obido nas respectivas disciplinas as seguintes qualificações:

Exploração de minas e machinas, 108 valores; mineralurgia, 88 valores; docimasia, 98 valores; mineralogia, 111 valores; geologia e paleontologia, 117 valores, exploração e material dos caminhos de ferro, construcções industriaes, 75 valores; economia e legislação de minas, 119 valores; drenagem, 125 valores; lingua ingleza, 125 valores; desenho, 127 valores; levantamento de plantas, 79 valores; analyses de concurso e trabalhos de laboratorio, 119 valores; concurso de exploração, 138 valores; concurso de mineralurgia, 129 valores; viagens e relatorios, 111 valores.

E, por ser verdade, se passou a presente certidão, que vae por mim assignada e sellada com o sêllo d´esta repartição.

Repartição de minas, em 17 de junho de 1890.= severiano Augusto da Fonseca Monteiro.

Pagou 1$060 réis de emolumentos e imposto addicional, como consta da guia n.° 78, da serie de 1890.= E. Marcelly Pereira.

N.9

Tendo em visto o artigo 8.° da reorganisação da secretaria d´estado dos negocios das obras publicas, commercio e industria, de 28 de julho de 1886, approvada pelo decreto com força de lei da mesma data, e attendendo ao disposto nos artigos 82.°, 83 e 85.° do referido decreto: hei por bem ordenar que os engenheiros e conductores de minas, constantes das duas relações, que fazem parte d´este decreto, e com elle baixam assignadas pelo ministro e secretario d´estado dos negocios das obras publicas, commercio e industria, tenham nos respectivos quadros as categorias, collocações e antiguidade relativa, que nas ditas relações lhes são conferidas.

O mesmo ministro e secretario d´estado assim o tenha entendido e faça executar. Paço em 21 de outubro de 1886. = REI. = Emygdio Julio Navarro.

Relação dos engenheiros de minas, a que se refere o decreto d´esta data, que passam a ler no quadro estabelecido nos termos do artigo 8.° da reorganisação da secretaria d´estado dos negocios das obras publicas; commercio e industria, de 28 de julho de 1886, as categorias, collocação e antiguidade relativa, abaixo designadas.

Inspector, José Augusto Cesar das Neves Cabral.

Inspector addido, Joaquim Filippe Nery da Encarnação Delgado.

Engenheiros chefes:

Lourenço Augusto Pereira Malheiro.

Pedro Victor da Costa Sequeira.

Francisco Ferreira Roquette.

Engenheiros subalternos:

Frederico de Albuquerque d´Orey.

Marquez das Minas.

Alfredo Ben-Saude.

Severiano Augusto da Fonseca Monteiro.

Augusto Ferreira.

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SESSÃO DE 17 DE JULHO DE 1890 643

Engenheiros subalternos addidos:

Alfredo Augusto Freire de Andrade.

José Maria do Rego Lima.

Constantino Alvim de Vasconcellos Leite Pereira.

Francisco de Paula Oliveira.

Paço, em 21 de outubro de l886. = Emyggdio Julio Navarro.

N.° 10

Attendendo ás circumstancias que concorrem no marquez das Minas, D. Alexandre da Silveira e Lorena, engenheiro de minas pela escola de Paris e subalterno do quadro dos engenheiros de minas no ministerio das obras publicas, commercio e industria: hei por bem nomeal-o director das obras publicas da provincia de Angola.

O ministro e secretario d´estado dos negocios da marinha e ultramar assim o tenha entendido e faça executar.

Paço, aos 28 de outubro de 1886.— REI. — Henrique de Macedo.

Está conforme. — Francisco Joaquim da Costa e Silva.

Pagou 80 réis de sêllo. — Lisboa, 1 de julho de 1890. = Bandeira Carneiro.

N.° 11

Extracto da tabella da despeza das provincias ultramarinas para o anno economico de 1888-1889

CAPITULO 1.°

ARTIGO 13.º

Obras publicas

SECÇÃO 1.ª

1 engenheiro director:

Ordenado 720$000

Gratificação 2:880$000 3:600$000

2 engenheiros:

Ordenad, a 720$000 réis 1:440$000

Gratificação, a 2:400$000 réis 4:800$000 6:240$000

5 conductores de 1 .ª classe:

Ordenado, a 6000000 réis 3:000$000

Gratificação, a 1:320$000 6:600$000 9:600$000

5 conductores de 2.ª classe:

Ordenado, a 480$000 réis 2:400$000

Gratificação, a 720$000 réis 3:600$000 6:000$000

7 conductores auxiliares:

Ordenado, a 360$000 réis 2:520$000

Gratificação, a 240$000 réis 4:200$000

1 desenhador:

Ordenado 360$000

Gratificação 360$000 720$000 30:360$000

N.° 12

Domingos da Silva, prior da freguesia de Santos o Velho, de Lisboa, etc.

Certifico que a fl. 160 do livro 40 dos baptismos d´esta freguezia, se encontra o termo seguinte:

«Aos 12 dias do mez de setembro de 1843, em virtude de um despacho de sua eminencia o senhor patriarcha, datado de 10 de maio d´este anno, no oratorio do palacio do exmo. marquez das Minas, ás Janellas Verdes, d´esta parochial de Santos o Velho, baptizei solemnemente e puz os santos oleos a Nuno Maria Pedro Francisco de Assis de Paula de Salles de Borja Xavier da Luz, que nasceu no dia 11 d´este mez e anno, filho de D. Braz da Silveira, baptisado n´esta freguezia de Santos e da exma. sr.ª D. Eugenia de Sousa Holstein, baptisada na de S. Pedro em Alcantara, recebidos na da Encarnação e moradores ás Janellas Verdes, d´esta de Santos. Foi padrinho D. Luiz Gonçalves da Camara e madrinha sua mulher a exma. sr.ª D. Madra Noronha, moradores em S. Francisco de Paula d´esta de Santos. E para constar, fiz e assignei este assento. Era supra. — O coadjutor, Francisco José Affonso.»

Está conforme. Santos o Velho, 20 de junho de 1890. = [...], Domingos da Silva.

Domingos da Silva, prior da freguezia de Santos o Velho, de Lisboa, etc.

Certifico que a fl. 200 do livro 21 dos baptismos, d´esta freguezia, se encontra o termo seguinte:

«Aos 26 dias do mez de janeiro do anno de 1846, em o oratorio do palacio de residencia do illmo. e exmo. marquez das Minas, sito na rua de S. Francisco de Paula, districto d´esta freguezia, ahi por uma provisão do emmo. e revmo. sr. patriarcha D. Guilherme I, datada do mesmo dia, puz os Santos Oleos ao illmo. e exmo. sr. D. Pedro Maria José Paulo Francisco de Assis Xavier de Borja de Paula Affonso Estanislau Luiz Gonzaga Polycarpo da Silveira e Lorena, que foi baptisado in penculo vitae, pelo reverendo padre Luiz de Ascensão Costa, capellão da exma. marqueza do Faial, o qual menino nasceu em o dia 25 do mesmo mez e anno, filho legitimo do illmo. e exmo. marquez das Minas, D. Braz da Silveira, baptisado n´esta freguezia, e da illma. e exma. marqueza do mesmo titulo, D. Eugenia de Sousa, baptisada na freguezia de S. Pedro em Alcantara, recebidos na dos Martyres, e moradores nesta de Santos; foi padrinho o illmo. e exmo. duque de Palmella, D. Pedro de Sousa Holstein, avô do menino, morador em

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644 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

S. Mamede, e madrinha a illma. e exma. D. Anna da Camara, avó do dito; e para constar mandei fazer este assento, dia, mez, era ut supra. — O prior, Pedro Antonio de Sousa Gomes.»

Está conformo. Santos o Velho, 20 de junho de 1890.= O prior, Domingos da Silva.

N.° 14

José Lopes Pinheiro escrivão interino, servindo por nomeação da presidencia do tribunal da relação do districto de Lisboa o segundo offficio na terceira vara de que é proprietario o bacharel em mathematica pela universidade de Coimbra, official de academia em França por serviços prestados á instrucção publica, socio da academia real das sciencias de Lisboa e official da ordem de S. Thiago, do merito scientifico, Guilherme Augusto de Vasconcellos Abreu.

Certifico que em meu poder e cartorio a meu cargo existem uns autos civeis de inventario dos bens que ficaram por fallecimento do inventariado exmo. marquez das Minas, e dos mesmos autos me foram apontadas para extrahir por certidão as peças que são do teor seguinte:

Auto do juramento. — Juramento do inventariante e mais declarações preparatorias do inventario. — Anno do nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de 1867, aos 26 de janeiro n´esta cidade de Lisboa e tribunal da Boa Hora aonde eu escrivão vim, presente o dr. José de Sande Magalhães Mexia Salema, juiz de direito da terceira vara da comarca judicial de Lisboa e orphãos, presente José Manuel da Silva, procurador bastante da exma. sr.ª D. Eugenia de Sousa Holstein, marqueza das Minas, com procuração bastante nos autos, que dou fé ser o proprio, para o effeito de se lhe tomar o juramento na qualidade que representa de procurador da
inventariante e as declarações precitas para os termos d´este inventario do fallecido o exmo. marquez das Minas, esposo que foi da supplicante, e logo elle juiz lhe deferiu o juramento dos Santos Evangelhos em um livro dVilles e lhe encarregou que sem dolo, ou malicia, em nome da sua constituinte, fizesse inventario por fallecimento do dito inventariado, declarando primeiramente o dia, mez e anno em que o mesmo falleceu, se fez testamento ou outra alguma disposição, os nomes e idades de todos os seus filhos ou herdeiros que lhe ficaram, os quatro parente ou amigos dos menores que devem firmar o conselho de familia, e disse depois a cargo do mesmo inventario todos os bens que ficavam no casal do dito fallecido, assim moveis, como semoventes, suas importancias, dinheiros em ser, poças de oiro e prata, ou joias, dividas activas e passivas, papeis de credito, direitos e acções e tudo o mais que pertencer no menino inventario sem omittir cousa alguma, debaixo das penas de sonegados, e outrosim apresentasse todos os titulos pertencentes ao mesmo casal, na conformidade da lei, e acceito pelo referido procurador o mesmo juramento assim o prometteu fazer.

E logo disse declarar que o inventariado havia fallecido no dia 16 do corrente mez e anno e sem testamento, que do fallecimento do inventariado ficaram os filhos seguintes:

D. Nuno da Silveira Lorena, conde do Prado, de vinte e tres annos de idade, solteiro; D. Pedro da Silveira de Lorena, vinte e um annos; D. Alexandre da Silveira de Lorena, dezenove annos; D. Luiz da Silveira de Lorena, treze annos; D. Eugenia da Silveira de Lorena, doze annos; D. Anna da Silveira de Lorena, dez annos.

Mais declarou que eram casados por escriptura, e mais declarou o dito procurador que os parentes dos menores são os seguintes:

Exmo. conde da Taipa, tio do fallecido; D. José da Camara, dito; exmo. marquez de Cesimbra, cunhado do dito; e o marquez de Sousa, dito.

E para de tudo assim constar fiz esse auto, que elle juiz assigna, confirmando a nomeação dos vogaes, e assigna o referido procurador. — Francisco de Sousa Monteiro, o escrevi e assigno. — Mexia Salema — José Nunes da Silva — Francisco de Sousa Monteiro.

Documento fl. 397.

Jorge Filippe Cosmelli, socio effectivo da associação dos tubelliães de Lisboa, perito em paleographia e tabellião publico de notas encartado em um dos officios d´esta cidade e comarca de Lisboa, por Sua Magestade Fidelissima El-Rei, que Deus guarde, etc.

Certifico que me foi apresentado um documento escripto na maior parte no idioma francez o qual se me pede em publica fórma no idioma portuguez, e para esse fim o fiz traduzir, e seu teor é o seguinte:

«Logar de um sêllo que diz o seguinte: Sêllo imperial.— 1 franco.— 50 centimos.—Logar de outro sêllo em branco. — Da Silveira. — D.— 9:155.— 146.— Quinta feira. — U. —244. — 20. — 416. —Prefeitura do departamento do Sena.— Certidão do registo das declarações dos obitos do anno de 1868.— Setimo districto.—Declaração do obito de 4 de março de 1868 ás tres horas e meia da tarde. — No dia de hoje á meia hora depois do meio dia, falleceu em seu domicilio, rua da Universidade, n.° 28, Nuno da Silveira, conde do Prado, proprietario, idade vinte e quatro annos e meio, nascido em Lisboa (Portugal), solteiro, filho da Braz da Silveira, marquez das Minas, conde do Prado e de Eugenia de Sousa Holstein.

O fallecimento foi certificado segundo a lei por nós Maria José Raymond, marquez de Villeneuve Bargencon, chefe do corpo municipal do setimo districto de Paris, official da Legião de Honra o presente auto redigido sobre declaração de Henrique Theret, de trinta e um annos de idade e da Carlos Brouillet, de trinta e quatro annos de idade, ambos empregados rua de Grenelle, n.° 10, os quaes assignam comnosco depois de feita a leitura.

Estão assignados, Theret, Brouillet e de Villeneuve.

Certifico estar conforme do registo e entregue por nós chefe do corpo municipal do setimo districto de París a 9 de novembro de 1868.— Hertest.

(Logar de um sêllo).

Conta civil. Deve-se pela presente certidão, a saber:

sêllo 1 franco, 50 centimos. Direito de copia, 75 centimos. Total, 2 francos, 25 centimos.

Nota.— A legalisação custa 25 centimos sobre a despeza acima.

Visto por legalisação da assignatura do sr. Hertest posta, sobre este documento por nós juiz por impedimento do sr. presidente do tribunal de primeira instancia do Sena.

Paris, 13 de novembro de 1868.—S. Orville Cote.

(Logar do sêllo.)

Visto por legalisação da assignatura do sr. Orville posta no verso.

Paris, 16 de novembro de 1868.— Por delegação do chauceller mór, ministro da justiça e dos cultos. — O chefe da secretaria, Cureyraes.

(Logar do sêllo.)

O ministro dos negocios estrangeiros certifica ser verdadeira a assignatura do sr. Cureyraes.

Paris, 18 de novembro de 1868. — Por auctorisação do ministro. — Por ... da chancellaria, Dubers.

(Logar do sêllo.)

O consul de Portugal em París certifica que a assignatura supra à a propria e verdadeira de Dubers.

Paris, em 20 de novembro de 1868. — O consul, Heito Gittou.

(Logar do sêllo do consulado de Portugal em Paris.)

(Logar do sêllo da causa publica.)

Pagou 60 réis de sêllo.

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SESSÃO DE 17 DE JULHO DE 1890 645

Lisboa, 10 de dezembro de 1863. — N.° 74.— Vinha.— Rocha.— N.° 1:462.

Certifico que a assignatura supra é a propria e verdadeira de Heitor Gittou, consul de Portugal em Paris.

Secretaria d´estado dos negocios estrangeiros, 10 de dezembro de 1868.— Emilio Achilles Monteverde.

Logar do sêllo do ministerio dos negocios estrangeiros.

N.° 1:462. — Pagou 1$000 réis de emolumentos. — Pato Infante.»

Nada mais se continha no dito documento, que assim fica traduzido e reduzido a publica fórma, ao qual me reporto e conJunctamente com esta entreguei ao representante.

Lisboa, 11 de dezembro de 1878.

E declaro que as reticencias que vão na 15.ª linha da lauda retro supprem palavras inintelligiveis no original.

Lisboa, ut supra. E eu, Jorge Filippe Cosmelli, tabellião publico de notas n´esta cidade e comarca de Lisboa, a numerei, rubrique, subscrevi e assigno em publico e raso. -(Logar do signal publico.)— O tabellião, Jorge Filippe Cosmelli.

Documento fl. 641.

Francisco Pereira de Almeida, parodio na parochial igreja de Santos o Velho de Lisboa.

Certifico que no livro 21 dos obitos d´esta freguezia, a fl. 97, se acha o assento do teor seguinte:

Aos 2 dias do mez de julho do anno de 1870, pelas onze horas da noite, na casa n.° 6 da rua Direita de S. Francisco de Paula, onde era morador, d´esta freguezia de Santos o Velho, cidade e diocese de Lisboa, falleceu tendo recebido todos os sacramentos, um individuo do sexo masculino por nome o exmo. sr. marquez das Minas, D. Podro da Silveira Lorena, natural d´esta freguezia, solteiro, estudante, de idade de vinte e quatro annos, filho legitimo do exmo. sr. marquez das Minas, D. Braz da Silveira Lorena, proprietario, natural d´esta freguezia de Santos, e da exma. sr. marqueza do mesmo titulo D. Eugenia de Sousa Holstein, natural da freguezia de S. Pedro em Alcantara, não fez testamento, e foi sepultado no cemiterio occidental em jazigo.

E para constar mandei lavrar em duplicado este assento, que assignei. Era ut supra. — O parodio Francisco Pereira de Almeida.

E nada mais se continha no supra dito assento, que para aqui fielmente copiei do proprio livro a que me reporto.

Parochial de Santos o Velho de Lisboa, 8 de agosto de 1871.

Sobre uma estampilha do imposto do sêllo da taxa de 60 réis devidamente collada e inutilizada o seguinte: 8-8-1871.— O parodio, Francisco Pereira de Almeida.

Reconheço o signal supra. Lisboa, 12 de agosto de 1871. Logar do signal publico. — O tabellião, Pedro Ricardo Cosmelli.

Nada mais se contém nas ditas peças que me foram apontadas para extrahir por certidão, a qual é a presente, que vae sem cousa que duvida faça e havendo-a aos proprios autos me reporto, a qual fiz passar era Lisboa e cartorio a meu cargo, aos 23 de junho do anno do nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de 1890.

Pagar-se-ha de feitio d´esta, rubricas, papel sellado e contagem o que á margem for contado pelo respectivo contador d´este juizo.

E eu, José Lopes Pinheiro, escrivão interino, a subscrevi, rubrico e as signo. = José Lopes Pinheiro.

O sr. Presidente: — Está em discussão.

Como ninguem pede a palavra vae votar-se.

Fez se a chamada e correu-se o escrutinio.

O sr. Presidente: — O parecer foi approvado por 19 espheras brancas.

Tem a palavra o digno par o sr. Sousa Avides.

O sr. Sousa Avides: — Não vejo presente o sr. ministro da fazenda, a quem desejava dirigir-me; todavia não deixarei de formular uma pergunta e apresentar algumas reflexões sobre um assumpto que julgo importante, esperando que o sr. ministro da instrucção publica as transmittirá ao seu collega da fazenda.

Sr. presidente, não é a primeira vez que nesta e na outra casa do parlamento se tem fallado sobre a reducção da portagem na ponte de D. Luiz, na cidade do Porto.

Tem-se pedido muitas vezes a sua abolição; mas todos os governos têem fechado os ouvidos a este pedido, e é exactamente a abolição da portagem ou a sua reducção que venho solicitar.

Eu bem sei, sr. presidente, que a epocha não corre propicia para se fazerem reducções nas receitas publicas; comtudo eu estou convencido que da abolição da portagem ou da sua reducção resultaria grande desenvolvimento das relações commerciaes, entre o Porto e Gaia, e por consequencia augmento de receita.

A portagem, na minha opinião, tolhe consideravelmente as relações commerciaes entre os dois povos da cidade do Porto e Villa Nova de Gaia, com manifesto prejuizo para o estado.

A reducção, pois, da portagem, não só augmentaria esta receita, mas outras, com grandes vantagens para o estado.

O sr. ministro da fazenda para fazer esta reducção não carecia de auctorisação parlamentar.

A lei de 19 de maio de 1880 diz o seguinte:

(Leu.)

O sr. ministro da fazenda tem mostrado muito zêlo e interesse por todos os negocios que estão confiados á sua gerencia, e Citou convencido de que prestará a este assumpto toda a sua attenção, e que, não podendo abolir a portagem, a reduzirá a proporções taes, que ella deixe de ser um estorvo para o commercio entre a cidade do Porto e Villa Nova de Gaia.

Ahi fica o meu pedido; espero que elle merecerá attenção ao nobre ministro.

(O digno par não reviu.)

O sr. Ministro da Instrucção Publica (Arroyo): — Sr. presidente, ouvi com toda a attenção as considerações feitas pelo sr. Sousa Avides, ácerca da portagem que se cobra actualmente na ponte que liga a cidade do Porto com Villa Nova de Gaia.

Direi mesmo ao digno par que tenho conhecimento especial d´este assumpto, porque, alem de ter a honra de ser filho d´aquella cidade, eu mesmo me tenho occupado d´elle por mais de uma vez.

O que é preciso é ver se é possivel conciliar os interesses dos novos da cidade do Porto e de Villa Nova de Gaia com as circumstancias do thesouro.

Transmittirei, com toda a satisfação, ao meu collega da fazenda as considerações do digno par, pedindo-lhe que preste ao assumpto toda a attenção que elle merece.

SEGUNDA PARTE DA ORDEM DO DIA

Continuação da discussão do parecer n.° 56 relativo á organisação do ministerio da instrucção publica

O sr. Presidente: — Vamos passar á segunda parte da ordem do dia, que é a continuação da discussão do parecer n.° 46.

Tem a palavra o digno par o sr. Jayme Moniz.

O sr. Jayme Moniz: — Sr. presidente, permitia v. exa. e conceda a camara que eu
principie endereçando um agradecimento e fazendo um pedido. Por differentes vezes tenho occupado um logar n´esta casa e sempre o devi á obsequiosa deferencia, á gentil liberalidade dos corpos docentes que constituem o collegio eleitoral scientifico. Recentemente, porém, foi em tanta maneira completo o favor

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com que elles me honraram, foi tão captivante e obrigativo o modo por que me outorgaram entrada a esta camara, que antes de tudo me corre o dever de apresentar-lhes aqui, no seio da representação nacional, perante o paiz, o testemunho solemne do indelevel reconhecimento em que lhes estou. Que se dignem, pois, de o receber, verdadeiro o sincero, como eu folgo de o prestar. Este é o agradecimento, ( Vozes: — Muito bem.)

Agora o pedido. A direcção especial que desde muito tempo tenho dado aos meus estudos, a regencia da cadeira em que professo, e tambem os trabalhos do conselho a que presido, compellindo-me a exercicios de espirito mais consagrados ao serviço das idéas do que ao culto da expressão, e afastando-me das praticas parlamentares para que só habituam as lides politicas aturadas e continuas, fazem que a minha sensibilidade desperte, alanceada e constrangida, á só lembrança de que devo usar da palavra na assembléa politica.

Alguma facilidade de dizer que possuí, ainda assim inferior á distincção que a voz publica lhe conferia, está quebrada e diminuida pelos annos e pelas lucubrações.

Receio até que o enunciado de meus pensamentos haja de envergonhar-se de escuras manchas de solecismo. Non omnes omnia possumus. E todavia a rigorosa exactidão da sentença não me consola de sua amarga verdade porque bem escreve o altissimo poeta, que ninguem na miseria se recorda, sem a maior dor, dos tempos felizes.

Em tal conjunctura, apenas resta um meio de que aproveitar-me. Consiste em interpor, com os fundamentos expostos, respeitoso recurso perante a benevolencia da camara; consiste em supplicar-lhe com instancia, filha da profunda convicção da necessidade, esta immerecida mas indispensavel benevolencia. É o que pratico, certissimo de que não faltará generoso deferimento ao ousado pedido. (Vozes:— Muito bem.)

Sr. presidente, não venho a defender nem accusar o governo; a defeza foi incumbida a quem brilhante e galhardamente se desempenhou do encargo; para a accusação nem vejo agora motivo nem o descubro. Venho justificar a assignatura que dei ao projecto; venho expor o que penso ácerca do novo ministerio e do assumpto que se discute.

Venho desacompanhado de interesse pessoal, sem sentimento occulto, sem preconceito partidario. Livre sou e livre falto. Diante de mim não está nenhum objectivo diverso do interesse do ensino; (Apoiados. — Vozes: — Muito bem.) a meu lado não me convida ao debate nenhuma pretensão particular. (Vozes:—Muito bem.)

Creia-me a camara. Da obscuridade em que desejo persistir e a que só posso aspirar, desvio-me um instante, obrigado pela posição especial que occupo, movido unicamente do amor que consagro ao progresso intellectual e moral do paiz a que pertenço.

Sr. presidente, os negocios do ensino, em nossa terra, começam de attrahir a attenção geral; e todavia não é permittido asseverar que lhes andem ligados conceito e desvelo equivalentes a seu importantissimo alcance. (Apoiados.) Em outra nação, hoje elevada a modelo, contava um dos que mais a illustraram, referindo-se a tempos antigos, que o mesmo era dispersar ali um meeting que annunciar-lhe qualquer discurso sobre fins educativos. O momento em Portugal não é identico; mas as letras e sciencias merecem-nos minguado auxilio; (Apoiados.) a confiança que depositâmos na cultura do espirito padeço de extrema fraqueza; vemos ainda com certo desdem os ministros do ensino mais elementar e não dispensamos grande estima aos do ensino do maior grau; por lunaticos ou theoricos de confraria alguma vez temos os que se devotam á causa dos melhoramentos immateriaes. (Vozes: — Muito bem.) Dedicâmos pouco de nossa fazenda, pouco de nossa energia, pouco de nosso zêlo a esta nobre causa, (Apoiados.) e a final, não raro, cobrimos de censuras e ironias, indifferentemente, as más e as boas disposições que em nossas leis e regulamentos lhe dizem relação, ou desencadeamos s, invectiva e a objurgatoria contra as melhores instituições que em meio de nossa regateada e morosa protecção, por ella insistem e pugnara. (Apoiados.— Vozes: — Muito bem.)

Abriu o exame do projecto, sr. presidente, a palavra de um digno par, cujo talento vigoroso, cuja dialectica cerrada, defendem sempre com prodigiosa facilidade, muita vez com igual exito, a verdade ou o paradoxo, e ganham para logo, e alcançam de prompto a admiração de quantos o ouvem. Combatido de profunda dor, maltratado da morte que lhe arrebatou um filho querido, s. exa. referiu-nos em phrase interrompida pela amargura, que a desventurada creança, impellida do capricho — de nobre estimulo direi eu. — quizera vencer toda a doutrina de um programma de ensino primario e viera a acabar os seus dias sacrificada ás excessivas exigencias da moderna instrucção. De numerosas culpas vão carregados todos os programmas, nacionaes e estrangeiros, sr. presidente.

Perdoe-me, porém, o digno par e meu amigo visconde de Moreira de Rey, e consinta que eu com toda a antiga amisade que lhe voto, com todo o respeito devido á desgraça que o enluta, compartilhe do desgosto que o afflige, sem o acompanhar ha sua aggressão! (Vozes: — Muito bem.)

Longe de mim a idéa de que o documento a que o digno par alludiu não careça de emenda ou correcção; longe de mim a idéa de o suppor isento de macula ou do defeito; mas a causa do desastre que todos lastimâmos não se encontra no papel accusado: veiu de origem mais levantada, procedeu de muito mais alto.

O nobre moço, encanto do digno par, quiz, a poder de talento e esforço, caminhar mais rapido do que ainda assim cumpria, e pagou com a vida o preço de sua valerosa vontade! (Vozes: — Muito bem.)

Diante da sepultura d´esse glorioso pequenino inclino-me reverente, porque abriga a porção corporea de uma existencia, em flor, immolada por acto espontaneo á santa paixão do, saber, não a qualquer programma. (Vozes: — Muito bem.) É uma interpretação mais justa para o ensino, mais verdadeira e honrosa para uma memoria abençoada, mais consolativa para o saudoso coração do maguado pae! (Apoiados — Vozes: — Muito bem.)

Não me cabe a honra, sr. presidente, de fazer parte do corpo docente da universidade, mas devo levantar desde já o duro julgamento aqui proferido a seu respeito por um cavalheiro cujos dotes pessoaes certamente prézo. S. exa. que é um homem ainda novo, s. exa. que e filho d´aquelle instituto, solicitou com insistente empenho a reforma de nossa instrucção, e sobretudo a de alguma faculdade de onde os aluirmos correm grave risco de saír idiotas se não fecharem ouvidos ás prelecções de muitos professores. Protesto, sr. presidente, contra estas palavras, desculpe-me o digno par (Apoiados.); e não protesto só por effeito do natural amor á escola de que descendo, por effeito do justo convencimento de carencia de auctoridade para dar o meu voto á gravissima censura irrogada; mas em nome da justiça, que não tolera taes accusações, taes aggravos, contra a sabia corporação incumbida, com attestada vantagem, de manter e continuar em Coimbra as seculares tradições do nosso primeiro instituto de ensino superior. (Muitos apoiados.) As universidades, as academias não fazem idiotas: nem as más licções os perdem, nem as boas os salvam.

Em regra o idiota nasce e não tem cura! Vozes: — Muito bem.

Doloroso ainda foi dizer-nos o digno par de quem primeiro fallei, que ao deixar aquelle estabelecimento, onde nunca obtivera reputação condigna de seu merito, saíra sabendo menos do que no tempo em que principiara de frequental-o e carecera de aprender, depois, como se lavrava qualquer requerimento.

O primeiro facto deve pertencer todo á responsabilidade do digno par que indisputavelmente não aproveitou então os grandes recursos de seu bello talento. O segundo, com

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inteira franqueza, nada prova. Os estudos superiores habilitara, sim, para a vida profissional, mas antes de tudo, não o olvidemos, são estudos superiores: nem supprem nem dispensam a pratica. (Apoiados.)

O maior damno provém, sr. presidente, como ha pouco affirmei, da nossa falta de fé no valor da educação, o maior mal promana do nosso acanhado apreço de seus effeitos. As nossas esperanças de regeneração nacional, de felicidade publica, do aperfeiçoamento popular, tão coradas, promettedoras e robustas a respeito de outras provincias de administração, porventura menos compensadoras, arrastam-se timidas, sem alento, esvaecidas, sobre quanto se allia aos interesses da cultura moral!

Não intento Livrar aqui, não ouso tecer n´este logar o elogio anal, o panegyrico trivial de um ramo de serviços cuja poderosa influição nos destinos sociaes já se illumina com a luz da irresistivel verdade. (Apoiados. — Vozes: — Muito bem.) Mas seja-me permittido relembrar que a affirmação de sua opulentissima productividade tambem já passou das objecções do debate para o enunciado aphoristico.

Hoje, sr. presidente, pouco se acredita na intervenção extraordinaria de um poder superior, apostado por sua misericordia, omnipotencia e sabedoria, a salvar os povos nos dias de provação ou a soccorrel-os o guial-os em seu caminho, substituindo-os escondido nas regiões sublimes de onde impera soberano! Toda a natureza está cheia de força mysteriosa, toda a natureza nos aponta para o eterno desconhecido, proclamado antes de tudo pelo imperativo moral na consciencia humana, mas tambem quanto existe, sem excepção, anda adstricto a leis, a principios immutaveis, insensiveis, com que unicamente têem de contar homens e nações para a acertada solução dos problemas de sua vida individual e collectiva. Os povos hão de ser do que valerem as unidades sociaes que os compõem, hão de ser do que valerem os poderes d´estas unidades! Cultival-as pela educação, desenvolvel-as e utilisal-as para o combate pela existencia, para as lides do trabalho, para todo o proveito, emfim, que possam derivar de seu meio physico e social, é cousa que a um tempo sobreleva ao maximo encarecimento e se demonstra a principalissima das obrigações!

Por isso a cada passo encontrâmos nos discursos dos estadistas, nos escriptos dos pensadores mais celebres, nas obras dos publicistas mais afamados, a expressão assertiva do valor da educação sob todos os aspectos da abundante relatividade que a enaltece. (Vozes: - Muito bem.)

Trata-se de seu logar na politica? Diz-se que a primeira parte da politica é a educação, que a segunda parte da politica é a educação, que a terceira parte da politica é a educação.

Trata-se de seu alcance para o porvir nacional? Diz-se que o possuidor da escola segura em suas mãos o dia de ámanhã. Entregae-me a educação, darvos-hei tudo o mais.

O que pretendeis que seja um povo ensinae o primeiro.

Trata-se de seu prestimo para o organismo politico? Diz-se que a educação se antepõe a todas as constituições.

Trata-se de seu influxo para a pratica do dever civico?

Diz-se que só a sociedade culta o sabe livremente cumprir.

Para o uso do direito? Diz se que só ella o sabe largamente exercitar.

Trata-se de seu vinculo com a justiça? Diz-se que a abertura de uma escola contém a possibilidade do encerramento de um carcere. (Apoiados.) Diz se que por libra despendida em educação se poupam cinco em processos, em prisões, em estações penaes. (Apoiados.—Vozes: Muito bem.)

Trata se de seu nexo com a administração? Diz-se que no regimen educativo se fórma o agente habil incumbido de o promover no legislativo, no judicial, no militar, no executivo... Diz-se que o maximo de educação é o minimo do governo.

Trata-se de seu laço com a moralidade? Diz-se que por virtude da educação se formam, se transmittem as idéas suggestivas, se avigoram e fortalecem os sentimentos elevados, que inclinam ao bem. (Vozes: — Muito bem.)

Trata-se de seu vigor para o aperfeiçoamento individual? Diz-se que a educação acrescenta, duplica, augmenta a capacidade mental, esthetica e moral.

Trata-se do seu effeito sobre a raça? Diz-se que a educação altera, emenda, enriquece a herança existente em beneficio de subsequente herança mais additada e favorecida.

Trata-se de seu poder conservador? Diz-se que a educação defende, arrecada e transmitte as tradições, os costumes proficuos: diz-se que lega as verdades a principio restrictas ao peculio de poucos, sob fórma cada vez mais geral, no processo dos annos, para thesouro commum!

Trata-se, emfim, de seu poder selectivo? Diz-se que allumiando todos os espiritos, abre praça á intelligencia e faz caminho ao genio — matriz fecundissima, de cujo seio rebentará avergado de bençãos o progresso do futuro! (Vozes repetidas: — Muito bem.)

Firmam estas proposições, que traslado muita vez quasi pelos mesmos termos de seus auctores, os nomes respeitados de Washington, Jeffersen, Wilson, Leibnitz, Michelet, Laveleye, Guyau, Fouillée, Cobden, Macaulay e outros varões não menos illustres!

Por excessiva que pareça a esperança que transluz do contexto de cada uma, sempre é certo que irradia de seu intimo grande conteudo de positiva conformidade com os factos. Acceitemos, pois, sem perigo de erro, sr. presidente, o parallelismo já hoje tão proclamado entre a educação e o valor moral de um povo. É uma realidade indeclinavel, é uma lei. (Vozes: — Muito bem.)

Depois do abatimento porque no principio do seculo passou a Prussia, annunciava Frederico Guilherme ao paiz estas memorandas palavras: «perdemos territorio, poder e prestigio mas ha meio de rehavel-os: dê a instrucção á alma allemã a energia precisa para sacudir a oppressão». De como os prussianos as receberam dá noticia 1870! Unser Schullelirer haben die Siege von Sadowa und Sedan ermngen. Os nossos mestres de escola venceram em Sadowa e Sedan. E se deve objectar-se que o genio dos generaes, a perfeição do armamento, a intelligencia dos officiaes, a disciplina do exercito e ainda outras causas foram muitissimo para a victoria, não padece duvida, como attestam eruditos escriptores e estadistas, que ainda sobra consideravel remanescente ao prodigioso ensino germanico, desde a escola primaria, a Volkschuh, luminoso centro de educação, ás universidades, maravilhosas fabricas de saber, institutos todos intencionalmente ajustados a levantar o nivel nacional, até por meio do mais acrisolado patriotismo. Unser Vaterland!

Não foi testemunho esquecido por quem ha de parecer insuspeito: não foi lição desprezada pelos vencidos, sr. presidente.

Gambetta, o incansavel patriota, soltou o grito «Aux écoles!»

Jules Simon, a um tempo illustração das letras e insigne pedagogista advertiu: La France est á refaire par 1´education. Le peuple qui a les meilleures écoles est le premier peuple.

Renan, gloria resplandecente do mundo litterrario e scientifico escreveu: Dans la lutte qui vient de fanir l´inferiorité de la France a été surtout intellectuelle: Ce qui nous a manqué ce n´est pas le coeur c´est la tête.

Porque tudo isto? Porque a educação em seu triplice aspecto de governo, instrucção e disciplina, contem a efficacissima virtude de preparar para as graves e arduas funcções sociaes, as collectividades chamadas a exercel-as! Porque supposto ella não seja o unico alimento de que a vida

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humana tira nutrição, se enumera entre os meios indispensaveis e insubstituiveis para converter um agglomerado de seres humanos em nação digna do nome, capaz de ter, capaz de luctar, capaz de resistir, habil para assumir um papel na historia, culta para prover aos interesses da civilisação - sem o que a inflexivel dureza de severas, mas justasl eis naturaes ha de a final cortar o fio de seus dias! (Apoiados)— Vozes: — Muito bem.

Aos Estados Unidos da America, prophetisou Macaulay que a republica viria a desatar na anarchia. Sabe a camara como ácerca do tremendo vaticinio pensava o illustre presidente Garfield? Ou a educação ou o desastre, «disastrous failure»!

Mais recentemente Huxley, tão notavel pelas prendas do engenho, como admirado pela vastidão dos conhecimentos, alludindo ao maior ensaio politico que povo algum ainda buscou realisar, dizia aos americanos:

«Grande será a vossa honra, grande será a vossa posição se resolveis o problema com justeza e honestidade; grande a vossa vergonha, e miseria se falhaes! Permitti, porém, que vos manifeste a profundissima convicção em que estou, de que a chave para o exito, a condição para o successo toda consiste na lucidez da intelligencia e no valor moral do cidadão individual — that it rests entirely upon intellectual clearness, and upon the moral worth of the individual citizen. A educação não póde dar esta lucidez, não póde dar esta dignidade, mas póde desvelar-se por ambas e fazel-as subir a seu posto preeminente!» Tal o merito que lhe conferem ainda os que menos lhe concedem!

Das palavras passemos ás obras.

É grandioso, é esplendido o exemplo offerecido ao mundo pelas nações mais adiantadas. Sobre-excede a quanto se imagine o zêlo ardente, o fervoroso amor com que todos á porfia se empregam na alevantada empreza da funcção educativa.

A Franca, para fallarmos primeiro do que nos anda mais proximo, não se poupa a este effeito. Desde o illustre Duruy até ao presente, que de melhoramentos?!

Dota com successivas e avisadas leis o ensino mais elementar, e sem descanso o procura diffundir a todas as classes!

Chama a conselho, a commissões, a congressos, em prol do ensino secundario, os homens mais importantes, e passo a passo o aperfeiçoa, cuidadosa em aviventar os diversos ramos que elle vae bracejando sob a influencia do meio social, mas vigilante em manter-lhe as preciosas qualidades que tanto têem cooperado para a nobreza e fulgor do espirito francez! (Vozes: — Muito bem.)

Põe peito á remodelação do ensino superior, e engrandece os quadros e cultiva novas disciplinas e abre laboratorios e renova o antigo e franqueia vida ao moderno, e tudo isto com a mais preclara consagração, com a mais regenerativa solicitude!

D´ella se dirá, com um do seus genios, que o ensino em todos os graus lhe foi, na actual quadra e através das luctas dos partidos, constante e primacial pensamento.

A Belgica, de continuo tomada para norma de paires pequeno, prosegue com largueza o proposito de acompanhar o movimento geral. Cito o que ella se paga dos fructos da instrucção primaria. Cito a maneira vantajosa como consorcia a acção particular com a do estado. Cito o numero proporcionalmente elevado das escolas, dos arheneus, das universidades, livres e officiaes, que ali avultam; demonstrativas revelações do abundante tributo com que seus partidos politicos, seus estadistas, sua população toda activa, galardoam a cultura intellectual e moral!

Restringindo-me apenas aos derradeiros annos, e tão só ao ensino medio e ao superior, que de esforços intelligentes, que de estudos perseverantes postos ao serviço de ambos? Quanto ao primeiro, seja qual for o juizo que se forme das secções fundamentaes em que se reparte, basta recordar as consultas, as discussões elucidativas, as leis, os regulamentos, os programmas que a partir do diploma de 1881 até á reforma de 1888 com elle se alliançam; quanto ao segundo basta ler os documentos concernentes á revisão da lei de 1876 e os ultimos decretos sobre os graus academicos.

A Hollanda, a porfiadora Hollanda, instituo o ensino do grau mais elevado em tanta maneira consoante ás requisições do progresso, que o estrangeiro abalisado o louva e admira. A Suecia e Noruega forcejam, do extremo norte, por seguir o caminho traçado pelos paizes da Europa central, como podo ver-se de Klinghardt.
A Italia opera uma verdadeira renascença em materia de instrucção, e no cultivo de muitas disciplinas se revela sabia mestra. A Allemanha, cuja supremacia universalmente apregoada em negocios de ensino dispensa citações, a Allemanha, patria acclamada das sciencias e da pedagogia, duplica, triplica em breve tempo as receitas que lhes largueia. Emfim, os Estados Unidos, como transluz do Report of the commissioner of education, a que brilhantemente se liga o nome do chorado general Eaton, derramam em favor do ensino, a toda a força de assombrosa riqueza, a toda a rapidez do colossal liberdade, por todos os pontos de um vastissimo territorio, os prodigios deslumbrantes de sua estupenda iniciativa! Uma verdadeira maravilha! (Repetidas vozes: — Muito bem.)

Da Suissa, da Inglaterra, da Hungria e ainda de outras nações, se póde dizer muito em justo elogio da insistencia com que propugnam pela mesma causa!

Em todo o paiz civilisado as festas da educação, as festas da instrucção, tomam dianteira ás demais solemnidades; (Apoiados.) em todo o paiz civilisado acorrem hoje a celebral-as não só com a presença, mas vencidos de religiosa consciencia do dever, nacionaes o estrangeiros, professores, alumnos, soberanos, governos, auctoridades e até as multidões! (Apoiados.— Vozes: — Muito bem.)

Afóra as vantagens communs inherentes a tão util ramo de serviço, alem do proveito mais immediato e evidente do desenvolvimento educativo, permitta-se-me que eu particularise algumas vantagens, a meu aviso envolvidas em seu progresso para beneficio da terra portugueza.

Quasi com exclusivo predominio tem medrado a olhos vistos, e anno a anno se arroja a novos commettimentos, o progresso material da sociedade cujos filhos somos. Se o impulso imprimido aos melhoramentos d´esta especie foi sempre o mais conveniente, ou padeceu de defeitos, é assumpto que não discuto agora. A debilidade do cuidado publica pelos negocios da nossa agricultura, mereceu severas phrases ao digno par que deu começo ao debate, e certamente eu nunca recusaria o meu apoio á creação de um ministerio em especial adstricto á promoção dos interesses agricolas. Por outro lado não desconheço inteiramente como se enlaçam com os fins de que me occupo, aquelles aperfeiçoamentos; pela estrada que facilita o trato passa o mestre, o discipulo, a escola. Mas o facto fica de pé; fica sempre innegavel que ás relações da existencia material temos dedicado o mais vivo e vigoroso da nossa energia, do nosso cabedal, ao mesmo tempo que dobrados ao gravame de encanes despezas, só a espaços e com mesquinho obolo nos lembrâmos da vida intellectual e moral da nação. D´aqui um desequilibrio que já redunda em nocivos effeitos, d´aqui um desaccordo que já prejudica o regular andamento nacional.

As direcções do nosso espirito como que tambem, e talvez conseguintemente, se vão materialisando. (Apoiados.)

O egoismo não se rebuça, impera altivo; em tudo o que póde felicitar o eu, principiam do afundir-se as mais elevadas considerações, os propositos mais nobres. É exactamente ao inverso do que reclama o momento historico actual, que sem prejuizo dos justos interesses do individuo, tão uteis dentro do seus naturaes limites como damnosos em seus excessos á felicidade publica, requer a es-

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clarecida e combinada acção de todos para que vingue e prospere a colectividade. (Apoiados.— Vozes:— Muito bem.)

Não menos ruim lavra, extenso e intenso, por muita de nossa população de todos os matizes, o indifferentismo politico. Sob fórmas de governo, inspiradas na expectativa da fiscalisação geral, esta mortifera doença é simplesmente digna de lastima, simplesmente deploravel, e porventura hade acarrear males tanto maiores, quanto mais as leis se prometterem da commum diligencia. Em paizes de não minguado suffragio, se do maior numero uns se engolfam no seio da imperturbavel indolencia, e outros seguem de grado e ás cegas, para aonde qualquer os conduz, constituirá uma situação cheia de ameaças que ha de atemorisar ainda aos mais confiantes no favor dos destinos! Releva combater a prostração do espirito publico, por todos os meios que o esclareçam, o animem e fortaleçam; releva fazer-lhe sentir, com um grande pensador, que hoje não póde entregar-se a politica, sem consideravel perigo, unicamente aos politicos! (Vozes: — Muito bem.)

Na apreciação dos homens e das cousas, frequentemente carecemos, mais do que é licito admittir-se e perdoar se, do sentimento de equidade e de justiça, de juizo independente e illustrado, para formarmos conceito por nossa conta em meio da discussão contradictoria dos partidos; e assim alguma vez condemnamos com a maxima promptidão as mesmas pessoas, os mesmos factos que pouco depois exaltaremos com igual presteza. Importa pois alumiar a consciencia publica, a fim de que na constancia de um regimen, a cujo exercicio a opinião é obrigada a desempenhar utilissimo papel, esta não seja como diz um engenhoso membro da camara, unicamente a que se publica.

Do patriotismo portuguez, nos instantes mais dolorosos de nossa vida social, nos experimentados dias de angustia, quanto possa dizer-se, e é muitissimo, não exclue a continua urgencia de o nutrir e robustecer com a saudavel lição, a todos, da grandiosa historia patria, com a memoria viva dos heroicos feitos, a tanto custo praticados para nossa existencia de nação, para a conquista do imperecivel nome que a tradicção sempre apontará respeitosa a toda a redondeza da terra, e que nos cumpre acrescentar, acompanhando as vicissitude do tempo como operarios activos da civilisação moderna, bem accordados para nosso salvamento, não adormecidos á sombra de um passado, ácerca do qual é preciso repetir, que o herdámos, não o fizemos! (Vozes: - Muito bem.)

Entre as categorias do trabalho social, vem a sobresaír como uma das mais nobres, a que se refere ao adiantamento das sciencias em todo o extensissimo e variadissimo ambito que ella abrange. Aqui não resplendem os productos do abundantissimo talento que a natureza com extraordinaria profusão outorgou aos filhos do nosso abençoado paiz!

Aqui infelizmente e a meu parecer sobretudo por imperfeição e pobreza do ensino superior, não avulta como aliás bem podia, a intelligencia, até pregoada por estranhos, de nossos mestres e alumnos.

Sem duvida, a penuria em que laborâmos não é tão completa que um ou outro zeloso cultor lhe não quebre a continuidade; a regra nunca é tão absoluta que negue sempre entrada á excepção. Proximo do meu logar me está ouvindo (referindo-se ao sr. dr. Bocage) quem dia a dia nobremente a infringe. Sinto verdadeiro orgulho de compatriota quando vejo o nome do sabio portuguez citado pelo estrangeiro competente no apreço dos trabalhos com que s. exa. vae enriquecendo o ramo de estudos de sua eleição. (Muitos apoiados) Sim, manda a justiça declarar que no instituto onde professo e em alguns outros podem ainda apon1 tar-se novos e nobres exemplos da mesma dedicação. Com alegria e enthusiasmo os confesso. Mas os thesouros acumulados nos escriptos d´estes zelosissimos apostolos do saber não indeminisam da pobreza geral. Diz-se, e diz-se bem: na cadeira transmittimos o que aprendemos do fóra, no gabinete de estudo somos apenas consumidores! (Apoiados. — Vozes: — Muito bem.)

Sr. presidente. Atrevo-me a affiançar que o benefico influxo da educação, do ensino, da instrucção, desde a mais elementar á mais elevada, cortará muito da origem de todos os males que em termos resumidos acabo de expor á camara; atrevome a assegurar que o remedio proposto, se não é exclusivo ou unico, porque os defeitos sociaes procedem de complexas e variadas causas, ha de infallivelmente contar se no numero dos primeiros. (Apoiados repetidos)

A grande obra do presente para todo o homem que entende melhorar as condições sociaes, escreve Henry George, é a obra da educação, da propagação das idéas.

«As instituições livres têem apenas um objecto, escreve um dos mais conhecidos publicistas francezes; consiste no accordo dos sentimentos e das vontades entre os cidadãos.

Para obtel-o existe unicamente um meio: fazer imperar na medida do possivel a verdade em todos os espiritos e a justiça em todos os corações.»

Ou quanto fica dito é uma fabula, sr. presidente, ou as considerações expostas expressam a verdade, e n´este caso maravilha que um grupo de serviços tão valioso com os do ensino já uma vez decaísse da repartição que lhe foi momentaneamente consagrada e só honteni viesse a possuir casa propria em nossa administração. (Apoiados. — Vozes: — Muito bem.)

Em contrario objectou-se a falta de oportunidade! O argumento conta annos. Estou cansado de ouvil-o por minha desgraça: fatigadissimo de assistir a sua multiplice e variada applicação.

É um sophisma de adiamento que é de uso empregar quando nada se quer fazer; (Apoiadas.) que se enfeita de mil curiosas rasões para nos demonstrar que os tempos ainda não chegaram! Tem o unico merito da respeitabilidade da velhice. Iria salvo por diante e não mo deixaria ver, nem sequer á hora da morte, ajudando-me Deus os olhos, a creação do ministerio, se o acaso não saísse violentamente a embargar-lhe o passo.

Objectou-se o estado das finanças. Este é um obstaculo mais grave: traz melhor fundamento: falla ao contribuinte e pretende pôr-lhe medo. Quasi todos os melhoramentos do paiz o têem encontrado na frente a combatel os. Articulado com innegavel sinceridade por muitos, nem por isso esta circumstancia lhe acrescenta os quilates de merecimento. Não posso fazer referencias, não posso dar intenção occulta ao que vou responder, mas quantas vezes o lembrâmos contra alguma cousa verdadeiramente vantajosa e o esquecemos na approvação de alguma outra sem maior utilidade? (Muitos apoiados.) Quantas vezes os mesmos que primeiro o aproveitámos, depois o pormos de parte na proposição e votação de quantias destinadas a pompas que não ascendem ao valor de mais uma escola aberta a maior numero de creancinhas! (Muitos apoiados.— Vozes:— Muito bem.) Digo a verdade ainda que esteja incurso na culpa, sem intento de desatar censura sobre ninguem, sem temor de não fazer cumprimento seja a quem for. A despeza relativamente pequena que votámos será, quero acredital-o, bem compensada, e certamente não arruinará o thesouro. (Apoiados.)

Objectou-se a final que a8 dictaduras crearam o ministerio, não por amor do ensino, não em proveito da instrucção, mas para obviar a questões internas do gabinete, com o fim de abrir um logar ao illustre ministro, para confiar-lhe uma pasta, e muitas cousas mais em que não entre e Deus me livre de querer entrar. Pois bem, como o resultado foi bom, já me contento. Se o governo escreveu direito por linhas tortas não hei de eu censural-o pela similhança que buscou. (Riso. — Apoiados.)

Procederei agora, sr. presidente, á rapida analyse dos motivos em que se decompõe a necessidade da persistencia do ministerio.

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Sr. presidente, o que existia, não se justificava, sem embargo das reflexões apresentadas pelo meu antigo e talentoso amigo o sr. José Luciano de Castro.

Permitta-me s. exa. a quem presto voluntario testemunho do seu esclarecido zêlo, principalmente pelo ensino primario, que eu discrepe da opinião que ha dias defendeu n´esta casa.

O nobre estadista declarou que durante os periodos em que a pasta do reino estivera a seu cargo, elle e o incansavel director geral o sr. conselheiro Antonio Maria de Amorim, acudiram, sem difficuldade, a todos os negocios occorrentes da administração do ensino.

O facto foi esse; foi, sem a menor duvida, perfeitamente esse; e no emtanto não foi menos certo que esta administração para ser verdadeiramente proficua ha de abalançar-se a muito mais do que ao simples despacho do expediente ou ao decretamento ou proposta de alguma esquiva ou ineluctavel reforma. (Apoiados.) Está dito, provado e escripto: o ministro do reino, embora animado das melhores intenções, não dispõe de tempo bastante, a entender por estudo proprio e em justa medida nos altos negocios da instrucção, (Apoiados.) a decidir por si nas questões mais complicadas que a pedagogia ha de constantemente submetter á sua decisão, a assistir ás sessões dos corpos consultivos, a eleger entre alvitres, muita vez diversos, não raro oppostos ou contrarios. (Vozes: — Muito bem.)

As qualidades requeridas para o melhor exercicio da pasta do reino, as mesmas rasões que determinam a escolha de quem deve sobraçal-a, conciliam-se mal, e frequentemente andam em lucta com os requisitos exigiveis para o mais sincero e justo governo dos assumptos do ensino. (Apoiados.) As habilidades politicas, o cuidado punctilioso de certas conveniencias, ajustam-se menos bem aos inflexiveis e severos dictames de uma gerencia em que a verdade pura deve ser attendida acima de tudo na maioria das hypotheses.

Mas o mal, em regra, ainda se aggrava se os chefes de situação, como de ordinario acontece, desempenhara aquelle difficil lugar. N´este caso a falta de tempo ganha proporções mais amplas, o que facil se comprehende: a actividade do ministro, já mui sobrecarregada, tem de dividir-se e dispender-se pelo exame incessante das especies mais delicadas das outras pastas; a funcção dirigente impera, com toda a força da sua importancia enorme, com todo o peso da sua responsabilidade gravissima; emfim, o empenho pela victoria partidaria faz-se mais vivamente sentir.

Temos então os eleitores, as pressões locaes, os paes de familia ordenando a organisação dos quadros das disciplinas, prescrevendo os prasos de estudo, ditando a redacção dos programmas!

Oh! os eleitores e os paes de familia! Ninguem venera mais do que eu suas opiniões sensatas, seus verdadeiros interesses. Para seus filhos se instituiram as escolas, se fundaram os lyceus e se crearam as universidades. Porém, quando o fim a que miram unicamente se resume em obter-lhes a approvação, no menor periodo, sem os conhecimentos indispensaveis, dá-me tentações de responder-lhes como replicava a um illustre viajante francez um distincto professor americano: « We dont care of them: não os attendemos.»

Allega-se que a politica, usada a palavra no mau sentido, ha de subir pelas escadas do novo ministerio com a mesma rapidez com que entrava aos andares do antigo. Respondo, sr. presidente, que o ministro do reino attenderá sempre com maior deferencia ás instancias dos interesses de partido, encontrará sempre na indole do logar que exerce dificuldade para vencel-as. Respondo que o ministro da instrucção terá, pelo contrario, noa deveres da situação especial, em que se acha, melhor escudo a que lançar mão; descobrirá sempre na defensão de seu posto maior força e facilidade para resistir. (Apoiados.)

Sr. presidente. Todas as categorias de lavor social tendem a differençar, por meio de especial consagração, o seu objecto, a particularisar successivamente as materias que comprehendem. O mesmo com o ensino.

A pedagogia cingida em tempos que não distara a uma serio mal ordenada de preceitos ou conselhos, ergue-se agora á altura de uma verdadeira sciencia, que se complica de importantissimas investigações, desde seus fundamentos psychologicos até sua realisação pratica. Os methodos, os processos nem se fixam nem crystalisam; aperfeiçoam-se, multiplicam-se, progridem tambem. A disciplina que hontem se professava como simples unidade já hoje desentranha de seu seio outras que demandam attenções especiaes e distinctas.

É preciso possuir vista educada para discernir no intimo de tudo isto; é preciso possuir saber para acompanhar este movimento, competencia technica em uma palavra, ou pelo menos não carecer de tempo bastante para a exclusiva applicação do talento ao assumpto.

As sociedades tambem não param e a educação inventou-se em seu proveito. O ajustamento do ensino ás crescentes necessidades do meio social em progresso, constitue um dos mais arduos problemas entre quantos o estadista encontra em sua banca de trabalho. Aqui o juizo, illustrado pela sciencia que primeiro tem a palavra para a solução, ha de soccorrer-se á analyse esclarecida das novas exigencias, á ponderação, desapaixonada, da justiça de seus requerimentos, do que importa manter, do que cumpre innovar, sem quebra dos interesses intellectuaes e moraes do presente e do futuro. Ha pouco ainda escrevia o illustre professor Welldon, na Fortnightly Revue, «que o problema educativo é perpetuo, que nunca foi nem talvez será resolvido, porque consiste na accommodação da disciplina intellectual e moral ás condições caracteristicas do tempo e estas condições são excessivamente variaveis». Não será tarefa inferior a uma intelligencia.

Mais do que nenhuma outra, sr. presidente, a administração scientifica e litteraria está solicitando o efficiente patrocinio que só póde dimanar de um pensamento fundamental; representado, sim, por successivos agentes, como resulta, para o bem nacional, da rotação dos partidos nos paizes livres, mas tambem resgatado das extraordinarias e contradictorias alternativas em que se baldam ou mallogram nobres e patrioticos empenhos, dignos de muito melhor sorte. (Vozes: — Muito bem.)

A urgencia inadiavel, de introduzir na direcção de nosso ensino, sequencia de direcção, unidade de plano, continuidade de acção, falla de si mesma tão eloquentemente que me esquivo a adduzir argumentos em seu favor. Só ha de olhar por ella uma repartição competentemente organisada, especialmente adaptada ao intento. (Apoiados.)

Se observarmos as leis, os regulamentos, as disposições que em nossa collecção official presidem ao regimen educativo, depararemos para logo a lastimosa falta de nexo que estou submettendo ao conhecimento da camara, tomar-nos hão de improviso a incrivel presteza, o desconcerto superior a toda a narrativa, com que em curtissimo praso successivas reformas saem a nosso encontro no estadio de algum ramo de instrucção, cada qual traduzindo uma idéa de que a seguinte seria apenas a expressão contraria se tambem não fosse quando estranhas causas decretam, cousa peor!

Fiscalisação e responsabilidade devem abundar no systema que nos rege.

Lamentâmos que a respeito de differentes negocios a primeira deixa de exercitar-se ao justo alcance, e a segunda não pese com a gravidade devida. Que diremos se as procurarmos na administração do ensino? Muita vez tenho estranhado a pessoas conspicuas o resguardo com que as discussões no parlamento em regra se desviam dos negocios da instrução, a circumstancia curiosa de só muito contra vontade e frisadas a demandarem. Explicam-me sempre o

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facto, de maneira até certo ponto satisfactoria. Que havemos de esperar do ministro do reino, dizem, afundado em negocios que a nós, ao publico, e a elle tambem, offerecem importancia muito mais visivel? Por energico e vehemente que se ateie o desejo de fazer opposição, ha um certo sentimento de justiça e conveniencia que é preciso não es candalisar visto como produz effeito contraproducente. Ai circumstancias por emquanto compellem-nos a trazer recatadas n´um canto da secretaria do reino as cousas do ensino. É sem duvida necessario que haja signal de sua existencia, por exemplo, no exame de alguma proposta, mas no presente a pugna parlamentar ha de travar-se em outro terreno onde as condições do triumpho valioso se revelem mais propicias.

Pois bem existe o ministerio e espero que a camara lhe concederá sempre mais do que o voto que já lhe outorgou, o seu applauso. (Apoiados.) Agora ficará aberto um logar para onde as attenções hão de convergir, ficará formado um objectivo a que hão de endereçar-se muita intelligencia, muita applicação, muito estudo, até hoje transvertidos ou transviados, escondidos ou affrouxados pela ordem das cousas á falta de meio em que vivam e se desenvolvam. A mesma ambição de servir a patria, e não será o menor argumento em favor da subsistencia da nova fundação, vae operar na analyse, no exame, no debate dos negocios do ensino saudaveis transformações. Estou já de meu esconderijo a vel-a armando para o combate os futuros luctadores.

Que saiam todos a estacada e sejam bem vindos. A pasta estará ali, sempre com o seu responsavel; pertencerá ao mais digno.

Adduzirei o exemplo estrangeiro trazido para tanta outra cousa como suprema rasão? Ninguem o desconhece.

Póde organisar-se uma longa lista com o nome dos povos que possuem ministerio de instrucção publica. Até nos paizes onde a iniciativa particular, a autonomia local, as qualidades de raça, dispensam muito da acção central, anno a anno, se sente mais viva a conveniencia de o instituir. Cito unicamente a Gran-Bretanha. Reclamam-no por indispensavel sir John Pakingtou, o conde Russell, lord Hampton, o illustre Galloway, e entre outros homens publicos, mais recentemente sir Lyon Playfair.

«Estamos abaixo de estados pequenos, dizia o distincto presidente da associação britannica, emquanto respeita a fiscalisação do ensino pelo estado. A Grecia, Portugal (gracioso), o Egypto, o Japão, têem ministros de instrucção publica; têem-nos as nossas colonias de Victoria e Nova Zelandia. Na Inglaterra todos os dias se vão colligindo dados para seu estabelecimento... Nutro a esperança firme de que a nova legislatura o fundará para servir de centro a todos os elementos da educação nacional.»

Eis os principaes motivos por que louvo o acto dictatorial do governo com inteira sinceridade; com profundo convencimento de que importa reter afastados da pasta do reino, ou de qualquer outra em que sempre viriam a caír em logar subordinado e secundario, os negocios do ensino publico. Que a nova fundação se mantenha atravez das tempestades da politica é desejo que em mim só corre par a par com os votos intensos que faço por sua utilidade. E ouso a esperar que as situações chamadas a succeder á actual o conservarão e que o illustre presidente do conselho do governo transacto lhe não recusará a força do seu valiosissimo auxilio.

O sr. José Luciano de Castro: — A nada me comprometto.

O Orador: — Por isso mesmo; porque não se compromette a extinguil-o é que eu acredito já que ha de salval-o. (Apoiados.)

Em seu partido explendem notabilissimas intelligencias que poderão com vantagem vir a exercital-o; aplane-lhes v. exa. o caminho e fará relevante serviço. Se coubesse dentro da possibilidade trocar a posição de digno par em outra menos obrigada ao conselho politico, eu estimaria ver um dia a nova repartição entregue a seus talentos, estudos e cuidados... e que a dirigisse por muitos annos.

Sr. presidente, entrarei agora no assumpto mais privativo do debate.

Do projecto que discutimos, tão lucida e sabiamente defendido no primoroso relatorio com que o brindou o meu illustre collega e amigo o sr. dr Teixeira, destaca-se principalmente o pedido de auctorisação para reunir no recente ministerio todo o ensino primario official, para organisar o conselho superior de instrucção publica, e, emfim, para trasladar ao mesmo ministerio o serviço do ensino industrial e profissional.

Muitos teem estranhado que o nobre ministro se satisfizesse com isto e o pouco mais a que o projecto aspira. Quereriam que seu pensamento se houvesse abalançado a trazer aqui a reorganisação geral e completa de nosso ensino.

Eu inteiramente ao contrario felicito a s. exa. por haver seguido diverso caminho, demorando a mais profundo estudo de que o tempo agora consente, a obra successiva a que seu ministerio tem de acudir.

As reformas precipitadas não grangeiam existencia duradoura e quasi sempre se accusam de diminuto valor. (Apoiados.)

O problema distingue-se por extraordinaria complexão: só ha de censurar que o não resolvamos de uma assentada quem conhecer menos o assumpto ou suppozer que os melhores desejos da alma, se acompanham para sua realisação, da mesma facilidade com que o sentimento os elabora.

Peço até ao intelligentissimo ministro, visto como as circumstancias impedem que se comece do mais elevado para o inferior, que se de por mui contente de apresentar ás camaras na seguinte sessão a proposta bem reflectida, bem ponderada, de reconstituição do ensino primario; e terá que fazer.

Supplico-lhe que sem poupar trabalhos, no sentido de dotar o paiz com uma reforma do ensino medio na medida das justas pretensões da sociedade de hoje e da sciencia da educação, deixe lograr mais algum anno aos decretos que regem o assumpto, para que o juizo publico, se convença quanto possivel, das profundas alterações que é mister introduzir-lhes. (Apoiados.)

Em fim ainda lhe rogo, que sem omissão de quaesquer providencias mais urgentes, e sem prejuizo de investigações a que deve desde já dar principio, não intente reformar de uma vez a nossa instrucção superior. (Apoiados.)

Todos estes propositos, sobre dispendiosos, exigem analyse minuciosa, prolongada, e hão de parecer á intelligencia amestrada obra para muitos governos. A utilidade das indagações feitas não se perderá como ao uso anterior. Teremos para defendel-a o fio tradicional e o impulso adquirido.

Em paizes mais adiantados, onde os negocios do ensino se orgulham de numerosos cultores, assim se procede; ganhando sempre caminho para diante, porém com firmeza e segurança; e o processo não impede que se progrida muito como ainda ha pouco me coube a honra de expor.

A ultima reformação do programma secundario francez, fructo da intelligencia, zêlo e sabedoria de uma commissão composta de numerosas illustrações, não se organisou em poucos dias.

Segui de perto estes magnificos trabalhos, com o favor de alguns amigos e o obsequio de um illustre estadista e diplomata que sinto não ver presente, o sr. conde de Valbom, a quem agora agradeço cordialmente a fineza, e felicito, aproveitando o ensejo, pela distinctissima intelligencia de quem representa condignamente o seu nome na outra casa do parlamento.

O ensino primario, sr. presidente, e sobretudo o ensino primario do primeiro grau, é em toda a instrucção o mais extensivo. Na expressão usual e consagrada é o que ha de prendar a intelligencia com o conhecimento que não é permittido ignorar, o que ha de ministrar o strictamente in-

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dispensavel, o que ha de estabelecer o preliminar universal para os trabalhos de espirito, o que ha de assegurar a todas as classes a educação moral, intellectual, religiosa e nacional, emfim o que ha de fazer do homem o cidadão e da collectivade humana a sociedade policiada. (Vozes: — Muito bem.)

Por sua natureza, seu fim, seu alcance, sua importancia obteve e continuará a obter dos governos livres o emprego, cada vez mais robustecido, da desvellada solicitude. O que têem Feito os nossos legisladores em seu beneficio?

Respondem dentro do periodo mais modernos as datas de 1835, 1836, ]844, 1878.

Devo occupar-me da lei decretada n´este ultimo anno.

E antes de tudo permitta-me v. exa., permitta-me a camara, uma declaração. Direi, em perfeita sinceridade, que collaborei para este documento, e acrescentarei que não foi sem pesar que lhe prestei o meu fraco auxilio. Induzia de factos do meu conhecimento para a certeza das provações do periodo transitorio, que se me afigurou, sobre muito mais longo do que se conjecturava, carregado de graves prejuizos, talvez irremediaveis. Ha d´isto testemunha viva.

No emtanto, como em regra nos inclinamos a dobrar o pensamento proprio ao voto geral, desconfiei do meu modo de ver e devotadamente me consagrei a suggerir ao ministro alguns alvitres, a meu parecer, credores de attenção. Tive por assiduo companheiro nas lides d´esses dias o sr. Antonio Maria de Amorim.

Exercia a administração dos negocios do reino Antonio Rodrigues Sampaio. Da crença que elle depositava, e era grande e firme, na desconcentração do serviço do ensino primario para as localidades, posso eu, podem quantos privaram com o chorado ministro, dar solemne testemunho. (Muitos apoiados.) Mas a acção de outras caudas não teve menor parte na, organisação da proposta.

Uma theoria recente adopta por base, sr. presidente, o principio de que todo o pensamento tende a realisar-se com tanto maior vigor quanto mais energicamente vae dominando no espirito, até que, volvido o instante em que seu poder equivale a ser, se effectua inevitavelmente. Por conjuncto de circumstancias que andara na memoria da camara, a sociedade portugueza de 1878 dava exclusiva preferencia, entre ás cogitações de governo, a duas idéas que a pratica da administração sem duvida nunca deve esquecer, mas que então exerciam um imperio irresistivel, absoluto, cego, um imperio que em todos os modos e fórmas pretendia assignalar-se, um imperio que não tolerava nem sequer a contradição das reflexões justas, até sobre o modo mais conveniente e conciliavel por que elle melhor poderia vingar: a economia como fim, a descentralisação como meio.

Foi sob a influição d´estas idéas que se propoz e votou a lei de 1878. Foram tambem estas idéas - forças que venceram. (Vozes: — Muito bem.)

E assim se operou a transformação. Em que consistiu sabem-no todos; deve porém advertir-se que ella contava para o regular exercicio do systema da lei, com alguma cousa importantissima que presuppunha existente: o amor das localidades ao ensino, o interesse pelas instituições escolares, o zêlo em promover o melhoramento da educação, o respeito pelo professorado, o espirito de iniciativa, a obediencia aos preceitos legaes, certa quantidade de pessoal illustrado, e se não tudo isto no grau do bom, pelo menos na medida do sufficiente.

Como respondeu a realidade á espectactiva? Resalvadas poucas, embora honrosas excepções, negativamente! (Apoiados.) E não maravilha! Dizia-se que muitos destes predicados escasseiavam nos pontos mais culminantes do estado!

Pois se não se avolumavam em cima como haviam de abundar em baixo?! (Apoiados.)

Não me delibero a desenrolar aqui em prolongado estendal os factos que attestam a verdade do que affirmo e que mais ou menos se acha asseverada em numerosissimos documentos; nas informações dos inspectores, nos relatorios dos respectivos vogaes eleitos ao conselho superior de instrucção publica e em particular no apontamento da repartição central que preside ao ensino primario, preguem o que quizerem, toda ella por seus intelligentes funccionarios esforçada, quanto o consentiram as condições do meio social e politico a que se achava adstricta, no reformativo empenho de fazer cumprir a lei.

Direi quasi pelo mesmo testemunho d´essa repartição, proximo á qual me traz o logar que occupo no conselho.

As commissões de beneficencia e ensino que o ministro encarecia firmado na proverbial caridade portugueza, tantissimas vezes nobilissimamente exercida, as commissões de beneficencia, cuja organisação incumbe ás camaras, e se desunam, com especialidade, a facilitar ás creancinhas desvalidas o pão para o espirito e o vestuario para o corpo, nunca se instituiram na quasi totalidade dos concelhos! (Apoiados.)

Os delegados parochiaes que deviam principalmente fiscalisar as operações do recenseamento escolar e pôr os meios que os regulamentos lhe entregam a beneficio da frequencia, em regra não correspondem aos intuitos do legislador, e só numero de vezes póde dizer-se, com justiça, que sua acção se demonstra inutil, em não poucas póde affirmar-se que pecca por nociva!

As juncas escolares, creadas com o fim de prestarem auxilio ás camaras e aos inspectores, investidas em muitas attribuições de grande alcance para a difusão do ensino, em geral só apresentam signaes de sua existencia se o caso é de prover cadeiras ou applicar penas; quando não empregam a actividade em luctas com aquellas corporações, ou na inteira subserviencia a seus dictames e caprichos! (Apoiados.)

O recenseamento dos alumnos, base indispensavel para a compulsão á frequencia da escola, em muitas localidades falta por completo, (Apoiados.) em outras dista infinito da realidade, em todas se arrasta vencido da repugnancia local! Confiado ás juntas de parochia, que entre ás demais corporações pareceu a melhor habilitada a organisal o, deu estes tristes effeitos. (Vozes: — Muito bem.)

O imperativo categorico da lei, a obrigatoriedade do ensino, já combatido da deficiencia ou dos defeitos do recenseamento, affrouxa-se até em pontos onde menos desherdada e mais solicita a escola se abre aos filhos do povo, e lemata por succumbir, no esquecimento dos preceitos legaes que o defendem, inteiramente desfavorecido da mais trivial diligencia, inteiramente desamparado da saneção penal que a lei comminou em sua observancia.

A nomeação do professorado, parte importantissima nó ensino, exhibe nutrido assumpto a uma curiosa historia, ainda na tolerancia dos nossos costumes! (Apoiados.)

Esta é a funcção ambicionada e querida, a funcção estimada e appetecida, o ideal em uma palavra. Sobrelevam a toda a narrativa os expedientes inventados pela subtileza da sagacidade municipal para exercital-a no sentido do patronato, (Apoiados.) na recompensa de serviços que em cousa alguma favorecem a instrucção, (Apoiados) na offensa, ao merito, com assombrosa sophisticação das leis e regulamentos, sem contrariedade proveitosa nos recursos para os tribunaes! (Apoiados.)

A perseguição contra os professores decaídos da graça fabrica documentos para os quaes a justiça só tem palavras da maior indignação. Recommendam-se por si estes productos!

Quanto as funcções locaes podem requerer na materia conheço-o do estudo dos factos. Exemplificarei apenas, sr. presidente. De uma vez veiu a parar a minhas mãos um processo instaurado contra certo professor. Pouco depois de entrada a obra á secretaria surgiu a patrocinal-a o principal procurador, um influente politico, já se sabe.

O ministro chamou-me e inquiriu-me ácerca do negocio.

Respondi-lhe que tudo me convencia da iniquidade do pe-

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dido. Conformando-se communicou a resolução ao interessado. Em breve praso apertavam instancias de fóra do ministerio junto de mim: tambem é claro que a todas me recusei. A final bem convencido de que nada obtinha por intermedio de terceiros, o illustre solicitador deu-se ao incommodo de vir supplicar-me para o que elle, em termos de grande afflicção, denominava uma exigencia indeclinavel da sua localidade! Respondi-lhe que tudo se effeituaria, se o ministro assim o deliberasse, mas juntamente com a minha exoneração e mandei-o saír do meu gabinete! O facto, de que ha testemunha viva, não interessa ao meu elogio: o contrario do que pratiquei haveria sido uma acção deshonesta e por este motivo o conto. Mas agora o argumento. Isto passava se quando ao governo competia decidir da applicação de todas as penas disciplinares aos professores, imagine v. exa., sr. presidente, o que será hoje quando as localidades põem e dispõem. (Apoiados.)

Do plano das escolas, das commissões de exames, dos cursos dominicaes, da concessão de licenças, das aposentações, da mobilia escolar, existe muito para dizer-se e não distinge nem desbota da côr geral de tudo o mais; mas o que se refere aos vencimentos dos professores sobreexcedeu a quanto podiamos suppor os que ainda antes de estreada a lei já nos estavamos predispondo para o tedioso espectaculo de muitas de suas consequencias! Uma vergonha! (Apoiados.)

Conta-se com prazer que o mal está remediado; conta-se com fundamento. E todavia a este effeito se consagraram os annos decorridos de 1881 a 1888, datas de duas leis que fazem grande honra ao sr. conselheiro José Luciano de Castro e são os extremos de uma serie de cuidados por parte do poder publico, dignos do maior louvor.

A segunda, porém, a de 9 de agosto, demonstra á evidencia por seu contexto o que em negocios de instrucção póde aguardar-se do desvelo e pontualidade da maioria das corporações administrativas.

Raciocinemos um pouco. Se na presença da desgraça immerecida, em tão longo periodo, apenas se conseguiu, ao revez do insistente intuito, enfeixar as resistencias locaes dedicadas a recusarem, não a esmola ou a liberalidade, mas o pão de cada dia a quem o adquirira pelo trabalho, se foi mister descondensal-as de sobre a miseria a poder, de uma lei quasi violenta perante o espirito da reforma, onde ha de entreluzir a esperança para a cultura de outros interesses que supposto valiosissimos, ou nunca erguem a voz ou não bradam tão alto! O que terá sido do ensino em meio de tudo isto? (Apoiados.)

Mas a inspecção? Sucumbe, e por optima que venha a ser, sempre na constancia do novo regimen succumbirá, impellida das localidades ao poder central, do poder central ás localidades! Uma irrisão!

E os governos que fizeram? Por que rasão cruzaram os braços? Descentralisámos bem desconfiados d´elles, e agora depois de lhes havermos consentido apenas uma interferencia indirecta — condição essencial da transformação — pretendemos soccorrer-nos de seu valimento cortado das insuperaveis difficuldades que lhe atravessámos no caminho. (Apoiados.)

Não, os governos, é preciso dizel-o, não descansaram, mas sem embargo de seus bons desejos estavam inhibidos de assumir o papel das corporações locaes e se a occultas o houvessem tentado e conseguido, por si e por suas auctoridades, haver-nos-ím dado a centralização disfarçada, menos franca, mas sempre centralisação! (Apoiados.)

O argumento filiado na idéa aliás sincera de que os damnos apontados e ainda outros muitos viriam a desapparecer, pouco a pouco, andados tempos, implica na hypothese o abandono para o ensino e uma inintencional crueza com o magisterio primario. A mais vulgar sociologia ensina que a acção das leis contrarias ás condições do meio social se traduz sempre em alguma cousa peior do que o desprezo.

Toda a historia da lei de 1878 mostra que a reforma, bem longe de encontrar acolhimento intelligente, comprehensão do dever, interesse pelo levantamento do nosso nivel intellectual tem sido em regra sustentada a poder de força: força do poder executivo para evitar quanto coube em seu alcance a sophisticação das disposições legaes; força do poder legislativo para impedir que em nosso paiz continuasse o facto sem nome de morrerem á fome os professores! (Apoiados.)

Sr. presidente, chega o momento de averiguar o que perdem as camaras com a reunião dos serviços do ensino primario no ministerio recente. Respondeu-nos que ficam privados do direito de nomeação. Eis porque se peleja, eis a causa principal do combate. (Muitos apoiados.) E que lhes faz isso? Dizem-nos que assim não saírá de seus cofres um real a mais em prol da instrucção. Visto o uso que em regra fizeram d´aquella faculdade ficâmos então sabendo que tudo desfecha no proveito da afilhadagem e do compadrio municipal. (Apoiados.)

Mas o dever de contribuir não envolve o direito de nomear, sr. presidente, e a escolha do magisterio primario é alguma cousa que por seu transcendente valor o poder publico ha de ter de sua mão. (Apoiados.) Olhemos para a França:

(Leu diversos artigos de leis.)

«Nada mais avisado, escreve um dos homens illustres d´aquelle paiz, do que chamar a intervir os poderes locaes na vigilancia pelo ensino primario; mas está longe de ser bom que intervenham só elles. Se quizermos que o mestre de escola seja util, convem que o façamos respeitar, e para que venha a ser respeitavel cumpre que lhe demos o caracter de um funccionario do estado, sob a vigia sem duvida do poder communal, mas fóra do seu dominio exclusivo e dependente de uma auctoridade mais geral.»

É contra o estreito espirito da localidade, é contra as miserias do espirito local que me insurjo, sr. presidente.

O sr. conselheiro José Luciano de Castro, no seu primoroso discurso, appellou para a memoria de Antonio Rodrigues Sampaio.

Sr. presidente, desappareceu bem cedo esse bom e honrado velho, cujo amigo devotado e reconhecido eu fui! Desappareceu! Não póde vir aqui a extinguir a immorredora saudade de todos os que o amavamos! (Vozes: — Muito bem.

Não póde vir aqui a dar-nos o testemunho de que não saberia sacrificar a estimules de orgulho, elle o grande patriota, os sagrados interesses da sua patria! (Vozes repetidas: — Muito bem.)

Sr. presidente, não privo com o illustre ministro, nem pretendo de s. exa. favor algum. Os assumptos da minha cadeira de professor e os do ensino continuarão a formar o meu ideal. Mas devo reconhecer o seu grande talento, (Apoiados) as suas indisputaveis qualidades de homem de trabalho; (Apoiados) e se não me cabe tecer-lhe o elogio, que s. exa. recusaria, de uma competencia technica experimentada, é dever de consciencia asseverar á camara que sua extraordinaria e incontestavel aptidão se manifesta já nos negocios a seu cargo, mui esclarecida e promettedora. (Muitos apoiados.)

Perguntarei agora. Está s. exa. resolvido a empregar todos os meios, toda a diligencia para libertar dos defeitos accusados, o ensino primario? para organisar a parte economica, destinada a secundal-o, na proporção exigivel? para assegurar a obrigatoriedade da instrucção? para fazer acatado o professor e affiançar ao merito a nomeação?

Sr. presidente, estou summamente cansado e facil me convenço de que a camara tambem já se sente fatigada.

Vozes: Não, não.

O projecto traz do ministerio das obras publicas á nova repartição o serviço do ensino industrial e profissional. Nem me alegra nem me entristece. Ninguem com maior sinceridade confessa o valor d´este ensino e o respeita; ninguem

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mais do que eu o deseja ver promovido á altissima funcção que em nossa terra tudo o convida a exercitar; ninguem mais do que eu espera muito de suas vantagens para o progresso nacional, e por isso quanto se encaminhe a felicital-o ha de sempre obter a minha viva adhesão. Mas outro é o assumpto de que trato.

Perguntarei: a transferencia traduz sómente a admittida necessidade de concentrar no mesmo ministerio diversos ramos de instrucção, ou quer significar qualquer intento no sentido de preferir em toda a linha as instituições de liberdade pratica immediata ás que se destinam á cultura do espirito?

Ha um ensino que sob diversas fórmas a este ultimo effeito se consagra. Seu fim na phrase vulgar é desenvolver harmonicamente as faculdades para o bem, para a verdade e para o bello, é como ainda ha pouco escrevia a commissão franceza incumbida de propor os melhoramentos convenientes ao regimen do ensino secundario, dar a educação formal pelo estudo das linguas, a educação intellectual e moral pelo estudo das litteraturas, da historia e da philosophia, a educação scientifica e positiva pelo estudo das sciencias.

Em vez de tudo isto teremos só a educação utilitaria?

Se assim é, sr. ministro, conte com a minha guerra.

E não se imagine, sr. presidente, que sou cego partidario das linguas antigas, não se supponha que sou cego apaixonado de seu valor, aliás incontestavel, embora saiba que se alliançam com os tempos a que ellas pertencem, as origens historicas de nossa nação, embora conheça que ao grande e farto mercado da antiguidade têem vindo pedir, alimento e ha de continuar a pedil-o na prospera e na adversa fortuna a cultura de todos os paizes civilisados.

Mas se não conceitúo de unico esse estudo, nem por isso deixarei de solicitar energicamente que o mantenhamos porque é indispensavel. (Apoiados.) Na rapidez vertiginosa com que seguimos para a sua decadencia, apenas combatida por algum zeloso cultor desprotegido de amparo, corremos risco de vir a mendigar ao estrangeiro a traducção de qualquer texto grego ou latino! (Apoiados.) No dia em que falleceu Antonio José Viale acabou tambem o mais distincto conhecedor das letras classicas em Portugal.

Não, sr. presidente, é preciso sustentar o cultivo litterario para elevação do espirito e sentimento de nossa mocidade!

«Affirma-se que os estudos litterarios com exclusão das sciencias preparam um povo de rhetoricos, dizia Paulo Bert no parlamento francez: pois bem, cautela que os estudos scientificos não preparem uma nação de contra-mestres.»

O testemunho não póde ser mais insuspeito! (Vozes: — Muito bem.)

Sr. presidente, no projecto o ministro pede auctorisação para reorganisar o conselho superior de instrucção publica. Infelizmente, não posso acompanhar em seus desejos, aqui manifestados hontem, a proposito d´este capitulo, o meu illustre collega o sr. dr. Bernardino Machado, a quem agradeço as immerecidas expressões que me endereçou, continuação de outras que estou habituado a receber de s. exa.

Todos sabem que trabalhei para a lei organica do conselho, a meu aviso ainda agora no essencial a mais adaptada ás circumstancias, e tudo me admoesta a passar com rapidez pelo assumpto.

Ha no emtanto n´esta lei algumas disposições que eu muito folgaria de ver subsistentes.

Perguntarei: Tenciona o sr. ministro extinguir a secção electiva a qual tão honrosamente se tem desempenhado das attribuições commettidas ao seu saber e desvello?

Tenciona S. exa. conservar-lhe a iniciativa com que a brindou o notabilissimo estadista a quem ella deve origem.

Tenciona respeitar a necessidade de consulta da secção permanente nas hypotheses já estabelecidas?

Eis o que pretendo saber.

Vou concluir, sr. presidente.

Ao nobre ministro peço que justifique na gerencia dos altissimos interesses que lhe foram confiados as fundadas esperanças que em seu talento, em sua actividade, em sua applicação depositam quantos o conhecem e prezam.
(Muitos apoiados.) Sirva a patria e enobreça o seu nome.

(Vozez: — Muito bem.)

De mim confessarei á camara que me sinto profundamente commovido pela generosa benevolencia com que se dignou de ouvir-me.

Tenho dito.

Vozes geraes: — Muito bem, muito bem.

(Todos os membros da camara foram abraçar e felicitar o orador.)

O sr. Ministro da Instrucção Publica (Arroyo): — Antes de responder ás perguntas que acaba de dirigir-lhe o digno par, o sr. conselheiro Jayme Moniz, julgando interpretar e sentimento de todos os membros d´esta casa do pagamento, seja-lhe licito protestar contra um facto cuja responsabilidade, aliás grave, pertence inteira áquelle digno par.

Protesta pois com a critica mais acerba, com toda a vehemencia da sua palavra, contra o peccaminoso silencio a que s. exa. tão abstinadamente se condemna, abstendo-se de tomar a parte mais brilhante e gloriosa nos debates parlamentares e privando o parlamento e o paiz do encanto e da lição da sua palavra subjugadora e fulgurantissima nas manifestações da sua intelligencia privilegiada.

Todos quantos ouviram o digno par podem attestar que n´estas palavras lhe não está simplesmente rendendo lisonjas, mas sim a mais justa homenagem aos seus superiores merecimentos.

O sr. Jayme Moniz devia pôr de parte os seus melindres e tomar parte em todos os debates, porque para todos tem competencia, não se limitando a vir só de tempos a tempos, quando algum assumpto pela sua especialidade mais se impõe ás suas sympathias, deslumbrar-nos só então com os primores da sua palavra eloquente.

Em referencia á creação do ministerio e ao desenvolvimento da instrucção publica, n´este momento nada dirá, porque dizer alguma cousa seria praticar um verdadeiro sacrilegio, poderia mesmo parecer assomo de orgulho e de vaidade.

Importaria um sacrilegio ir o orador com a sua voz apagar no espirito de quantos o escutam o effeito profundo e agradabilissimo da palavra do digno par.

Seria orgulho e vaidade o suppor que podesse existir no seu espirito força, ou no sen temperamento parlamentar energia de qualquer valia para acrescentar rasões poderosas, áquellas que foram expostas pelo digno par n´uma manifestação de eloquencia tão brilhante como poucas vezes tem o orador tido occasião de ouvir.

Fslicita-se, por ver que s. exa., longe de censurar, concordou, na apreciação do projecto que se discute, com a abstenção absoluta da exhibiçào de qualquer plano completo de reforma.

Adhere absolutamente ao modo de ver de s. exa. quanto á necessidade de se fazer um trabalho reflectido, meditado em ordem a remediar os males a que se procura pôr termo, começando pela creação da nova secretaria d´estado nas condições de poder corresponder ao que se espera da sua creação.

Quanto á lei de 1878. absolutamente nada podia acrescentar. O digno par fez uma demonstração historica, proficientissima, fez o exame completo do assumpto e observou não só os resultados da descentralisação, desde que principiou a executar-se, mas d´ahi deduziu com inexcedivel clareza a necessidade incontestavel de se substituir com urgencia o pensamento dominante da reforma de 1877.

S. exa. formulara algumas perguntas sobre a passagem do ensino industrial para o novo ministerio, sobre a reforma do conselho superior de instrucção publica e sobre

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SESSÃO DE 17 DE JULHO DE 1890 650

a reforma de instrucção primaria, e aqui alludiu s. exa. a um ponto ao qual se tinha tambem referido o sr. José Luciano de Castro, apontando o bom resultado que poderá colher-se da conjugação dos esforços da actividade local com os da iniciativa energica do poder central.

É sua intenção afastar da politica local ou de qualquer intervenção partidaria esse serviço, pondo-o unicamente em relação com o poder central de onde deve partir toda a remodelação necessaria ao conseguimento do fim que se tem em vista.

Quanto á parte economica tambem lhe parece conveniente unir o poder central com as diversas corporações administrativas no esforço commum de produzir um regimen financeiro que se não preste a sophismas de qualidade alguma.

Fez o orador ainda varias considerações ácerca da instrucção primaria, mostrando o seu desejo de dar remedio ás faltas mais reconhecidas procurando as melhores garantias para que, tanto nos seus pontos capitaes como nos seus lineamentos menos importantes o serviço seja convenientemente melhorado.

Quanto ao ensino obrigatorio ha de a este respeito opportunamente tomar providencias, mas é sua intenção ouvir previamente todas as auctoridades na materia e consultar todas as competencias, e confia que com tal auxilio as providencias serão as mais uteis e convenientes para o incitamento e desenvolvimento do estudo.

Relativamente á questão do ensino industrial, fizera o digno par considerações de ordem tão elevada que não póde o orador deixar de fazer-lhe uma referencia especial.

Quanto ao receio manifestado pelo digno par de qualquer predominio d´esse sobre os outros ramos de ensino, dirá a s. exa. que tambem não é partidario do utilitarismo como tambem o não é da absorpção de uns pelos outros ramos de ensino.

Nenhum dos ramos deve ser absorvente; qualquer que seja o ramo de que se trata, não póde nunca ser exclusivo, porque todo o ensino subordinado a um mesmo principio deve mirar a um ponto de vista commum, com quanto cada um se deva desenvolver no seu raio de acção.

Tambem não tem nenhuma aversão aos estudos classicos.

Não pertence ao numero d´aquelles que se oppõem ao estudo das linguas antigas; pelo contrario; assim como reconhece no estudo do direito romano a fonte mais pura onde se póde ir beber os principios fundamentaes da sciencia juridica, assim comprehende a necessidade de no estudo classico apprendermos onde é que dia a dia devemos ir procurar na tradição em toda a pureza da sua origem, retemperar-nos no nosso viver litterario.

Ainda com relação á transferencia do ensino industrial, deve declarar que o considera como um ramo complementar, qualquer que seja o ministerio a que elle esteja subordinado, e por isso julga conveniente subordinal-o á direcção commum.

Dizia-se que em Franca o ensino industrial está no ministerio de instrucção publica.

É tão inexacto isso, como dizer se que elle está no departamento ou nas communas, porque a verdade é que em França o ensino technico não pertence exclusivamente ao estado, nem aos departamentos, nem ás municipalidades.

Pertence a tudo isso, está em todos esses pontos.

Em Italia parte do ensino industrial está no ministerio da instrucção publica. Em alguns paizes germanicos o ministerio da instrucção publica tem parte do ensino technico especial. A tendencia, porém, da opinião, a corrente mais accentuada principalmente na França, Inglaterra e Allemanha, é para a unificação do ensino technico sob a mesma direcção.

Entende que este ensino deve estar onde estiver a direcção da instrucção publica, e que aquelle serviço carece de ser remodelado talvez mais convenientemente, quando se tratar de alguma reorganisação futura do serviço de engenheria.

Nós temos engenheiros de pontes e calçadas, temos engenheiros navaes, começâmos a ter engenheiros de minas, mas não temos um unico engenheiro industrial, não temos um engenheiro machinista, apenas aquelles que occupam estes logares na respectiva corporação da armada.

Alem d´estes, outro motivo ainda o tinha determinado a trazer para o ministerio da instrucção publica o ensino industrial.

Foi o facto de residir ahi a direcção das bellas artes, junto do qual devia existir o ensino technico, para n´um futuro mais ou menos proximo se tratar a serio e com vantagem da restauração das nossas tradições artisticas, da restauração do que ainda possuimos da antiga arte nacional, esses soberbos modelos architectonicos e de todas as fórmas da antiga arte em Portugal, que ainda nos restam, e que assim muito poderão aproveitar, tanto ao ensino technico como ao propriamente artistico.

Entende que é pela conjugação d´esses processos, d´esses modelos de ensino, é pela bem dirigida diffusão das nossas antigas tradições que poderemos de alguma fórma mirar ao renascimento da nossa antiga architectura e artes correspondentes, e em geral das nossas bellas artes, e ou por este meio isto se realisa, ou então falhou a melhor e unica occasião.

Consagrará especial attenção a tudo o que respeita a ensino profissional, para que os institutos do nosso paiz cheguem a ser o grande repositorio de todos os elementos da educação geral, onde os cidadãos possam ir beber as noções indispensaveis para se poderem consagrar a um trabalho especial.

Pelo que respeita á iniciativa do conselho, crê que não haveria rasão para se alterar as disposições que actualmente a regulam.

Quanto á parte electiva do conselho é tambem seu desejo mantel-a, sobretudo para que sejam experimentados os seus effeitos pelo tempo indispensavel, que ainda não decorreu, para se poder apreciar-lhes o alcance. É certo que a secção electiva até hoje não produziu os resultados que se esperava, mas d´este facto não póde ella ser accusada, nem censurada, e só o poderia ser se não tivesse trabalhado e produzido alguma cousa.

Tudo o que tem feito consta dos relatorios publicados desde 1885 até ao momento presente; se não foram aproveitados os seus trabalhos, esse facto não provem da secção do conselho, mas da impossibilidade de os ministros transformarem em lei os principios fundamentaes das suas indicações.

Ditas estas palavras, crê ter respondido, ainda que summariamente, ás observações e perguntas do digno par.

Concluindo, queria ainda fazer uma declaração.

Respeita extremamente todos os cavalheiros que tanto na outra camara como n´esta, se dignaram assignar os respectivos pareceres.

Em testemunho da mais alta e mais merecida consideração para com o illustre relator n´esta camara, já teve occasião do endereçar elogios, os mais sinceros, como eminente professor e competentissimo parlamentar, ao sr. Antonio José Teixeira.

Dito isto parece-lhe que nenhum dos cavalheiros que se dignaram assignar os pareceres, poderá levar-lhe a mal uma referencia mais especial; e se porventura os melindrar pede que lhe relevem esta falta por completa ausencia de tal intenção.

A referencia especial que deseja fazer é ao sr. Jayme Moniz, é esta e estima que para todos os effeitos ella fique bem claramente consignada nos annaes parlamentares.

O facto de o sr. Jayme Moniz ter coberto, este projeto com o valor do seu nome, de o ter honrado com a sua as-

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656 DIARIO DA CAMARA DOS DIGNOS PARES DO REINO

signatura, é para o orador motivo da mais intima satisfação e do maior orgulho.

Prestando esta tão merecida homenagem ao digno par, não faz se não obedecer a sentimentos que ha muito vivem no seu coração, sentimentos da mais elevada consideração para com o illustre academico, ao mesmo tempo que exprimir a satisfação com que reconhece e tem a certeza de que com tal padrinho o seu projecto necessariamente é bom, é util e da maior justiça.

(O discurso será publicado na integra logo que o sr. ministro o devolva. Durante o discurso foi o orador repetidas vezes interrompido por muitos apoiados, sendo, ao concluil-o, comprimentado por grande numero de dignos pares.)

Q sr. Presidente: — Não ha mais nenhum digno par inscripto, por consequencia vae votar-se o projecto.

Vae ler-se.

Leu-se na mesa.

O sr. Presidente: — Os dignos pares que approvam o artigo 1.° do projecto e seus paragraphos, tenham a bondade de levantar-se.

Foi approvado.

O sr. Presidente: — Vae ler-se o artigo 2.°

Leu-se na mesa.

O sr. Presidente: — Os dignos pares que approvam o artigo 2.° do projecto, têem a bondade de levantar-se.

Foi approvado.

O sr. Presidente: — proxima sessão é ámanhã, e a ordem do dia a discussão do parecer n.° 57.

O sr. José Luciano: — É só o n.° 57, ou mais algum?

O sr. Presidente: — Se a camara quizer, póde entrar em ordem do dia tambem o n.° 64.

Está levantada a sessão.

Eram cinco horas e um quarto da tarde.

Dignos pares presentes na sessão de 17 de julho de 1890

Exmos. srs.: Antonio Telles Pereira de Vasconcellos Pimentel; Marquezes, da Praia e de Monforte, de Vallada; Condes, de Alte, da Arriaga, d´Avila, de Thomar; Bispo de Bethsaida, da Guarda; Viscondes, de Castro e Sola, de Soares Franco, de Valmor; Barão de Almeida Santos; Agostinho de Ornellas, Moraes Carvalho, Sousa e Silva; Antonio José Teixeira, Botelho de Faria, Costa Lobo, Cau da Costa, Augusto Cunha, Neves Carneiro, Bernardino Machado, Bernardo de Serpa, Cypriano Jardim, Firmino João Lopes, Costa e Silva, Barros Gomes, Jayme Moniz, Jeronymo Pimentel, Baima de Bastos, Calça e Pina, Coelho de Carvalho, Gusmão, Gomes Lages, Gama, Bandeira Coelho, José Luciano de Castro, Mello Gouveia, Sá Carneiro, Mexia Salema, Bocage, Julio de Vilhena, Lopo Vaz, Luiz de Lencastre, Camara Leme, Sousa Avides, Vaz Preto, Cunha Monteiro, Rodrigo Pequito.

O redactor = Fernando Caldeira.

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