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SESSÃO N.° 45 DE 20 DE AGOSTO DE 1908 5

dos factos, isto é, que só tive conhecimento do projecto no dia em que me foi neste logar apresentado por S. Exa. e não antes d'essa occasião.

O Sr. Ministro da Justiça (Campos Henriques): - O que disse hontem e repito hoje, por ser a exacta expressão da verdade, é o seguinte: "Que o projecto fui apresentado ao Digno Par depois de approvado pelo Conselho de Ministros, porque antes d'essa approvação não havia projecto nenhum; eu fui pessoalmente entregar a S. Exa., no logar que o Digno Par occupa, esse projecto, e não pedi urgencia nem marquei prazo para resposta.

Foi isto que eu declarei; e é esta a expressão da verdade.

O Orador: - Julgo-me absolutamente satisfeito com as declarações do Sr. Ministro da Justiça; foram essas as palavras que eu ouvi.

Não é exacto o extracto dos jornaes. S. Exa. não contestou a verdade dos factos que eu apresentei. S. Exa. não duvidou, não insinuou que por qualquer forma eu tivesse tido conhecimento do projecto antes da sua approvação em Conselho de Ministros, nem antes de me ter sido entregue, por sua mão, aqui mesmo neste logar. S. Exa., por sua conta, acrescentou que não me dera prazo para a entrega, mas neste ponto não houve da parte de S. Exa. ratificação a qualquer declaração minha, pois que eu nunca affirmei o contrario.

É certo que o Sr. Ministro da Justiça não marcou prazo para a entrega, eu é que me julguei constituido na obrigação de immediatamente restituir o projecto que tinha sido já discutido em Conselho de Ministros e estava já preparado com a competente redacção para ser submettido á consideração da Camara.

Sr. Presidente: é preciso, é indispensavel definir claramente a situação.

Eu não fiz observações ao projecto, é certo, mas não as fiz porque, tendo sido discutido e deliberado em Conselho de Ministros e tendo o voto unanime do Conselho, considerei apenas a sua apresentação como uma cortesia, como um acto de delicadeza, e não como um convite ao seu exame.

Eu sei que não podia chamar-se projecto antes de ser approvado em Conselho de Ministros, mas antes do projecto ha uma cousa que se chama o assunto d'elle, e sobre isto é que eu nunca fui ouvido em tempo nenhum pelos Srs. Ministros.

Isto não é uma queixa, não é uma censura, e unicamente a exposição de um facto real e verdadeiro.

Sr. Presidente: eu fui consultado pelo Governo em dois actos importantes da sua vida ministerial, o primeiro foi na redacção da carta de Sua Majestade El-Rei D. Manuel. Eu não concordei com essa redacção e indiquei ao Governo algumas emendas, mas tive depois o desgosto de ver que essas emendas não foram acceitas na redacção da carta. O Sr. Presidente do Conselho participou me tambem a dissolução da Camara dos Senhores Deputados, e eu tive tambem o desgosto de ver que as minhas observações não foram attendidas pelo Governo.

Não podia haver illusões no meu espirito; os desastres que eu soffrera nos dois conselhos que tinha dado anteriormente impelliam-me naturalmente a abster me de apresentar ou indicar ao Governo qualquer emenda que me parecesse conveniente.

Não faria estas declarações na sessão anterior, e nem hoje aproveitaria a occasião de as reproduzir, se ellas não envolvessem a expressão de um pensamento politico que desejo accentuar.

Não é uma queixa nem uma lastimação, nem uma censura a ninguem, não é nada d'isso, é uma exposição real dos factos, mas de onde deriva a consequencia, que eu quero frisar, de que não tenho tido collaboração effectiva nos actos administrativos do Governo, e, por conseguinte, não posso ter responsabilidades que lhe andam politicamente inherentes.

Eu continuo a dar ao Governo um mero apoio politico, e como estou fora d'elle não me pertence a responsabilidade dos seus actos. Quando eu não tenho a iniciativa, ou a partilha directa na collaboração dos seus actos de administração, e quando as minhas consultas, certamente com boas razões, são postas de lado, eu tenho o dever de dizer que declino as responsabilidades que me quiserem attribuir.

Só tenho a responsabilidade politica do apoio que continuo a dar-lhe, apoio leal e desassombrado; mas muitos suppõem o contrario, imaginando que eu disponho do poder, e attribuindo-me em certos factos responsabilidades que mesmo pertencem.

É uma illusão que eu pretendo desfazer, tocando novamente neste assunto; e d'este modo parece-me que fica bem encerrado o incidente.

Sr. Presidente: na sessão passada, fui obrigado a interromper o meu discurso, que já vae demasiadamente longo.

Dizia um critico francês que as longas obras lhe mettiam medo. A mim tambem me mettem medo os longos discursos, quando os faço e quando... os ouço. Mas ás vezes são indispensaveis.

Não quero, nem desejo, que a Camara supponha que eu abuso da sua benevolencia na exposição das minhas ideias. Pelo contrario, bem se viu, na sessão anterior, quanto me esforcei para evitar tornar-me fastidioso.

Nesse intuito, vi-me obrigado a omittir na synthetização da minha oração, e na brevidade com que a fiz, dois pontos interessantes.

Sacrifiquei o que diz respeito á historia das chamadas joias de D. Miguel, a que me referi quando o meu illustre amigo, o Digno Par Sr. Baracho, pediu que fosse feito o inventario dos bens da Coroa. A determinação do estado juridico e legal d'aquelles valores, pondo mesmo de banda a narração curiosa dos incidentes até agora occorridos, não seria fora de proposito no presente debate.

Omitti tambem, sacrificando á brevidade da exposição, a historia municiosa das quatro operações que em 1859, 1860, 1863 e 1876 se effectuaram sobre a venda dos diamantes da Coroa, em que havia pormenores curiosos.

Omitti tudo isso e não me arrependo.

Tenho sempre na lembrança um caso acontecido no Parlamento francês no tempo de Luiz Filippe.

Havia na Camara um orador, Sauzet, que era de tal modo prolixo, alongava de tal arte os discursos, que se tornava o objecto constante dos gracejos e ironias dos seus collegas. Havia tambem na Camara um outro, Delaborde, sarcastico, sempre disposto a zombar das fraquezas do proximo, e que o não poupava com os seus epigrammas. Um dia, diz Coamenin, depois de um d'aquelles largos discursos que deixavam a assembleia cansada, ao sair, suando como um cavallo que sae do hippodromo, Sauzet ouviu esta frase proferida por Delaborde:

Faites place, messieurs, ouviez vos rangs, laisses passer le plus grand oratour de la France qui va changer de chemise.

Uma gargalhada geral resoou em toda a Camara.

Já vê V. Exa. que, contando este facto, que parece ser authentico, eu entro de bom humor no assunto. Bom humor que aliás sempre me acompanha, porque é nelle que eu encontro o principal remedio philosophico para as minhas... amarguras politicas. (Riso}.

Sr. Presidente: eu tinha deixado a questão da legalidade das rendas no seguinte ponto:

Tinha mostrado que Sim Majestade El-Rei D. Carlos, no primeiro anno do seu reinado, em consequencia da pratica de actos de generosidade, como foi a subscrição para a compra de navios de guerra na importancia de réis 40:000$000, e a cedencia de réis 73:000$000 por anno, depois da chamada lei de salvação publica, se vira