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CAMARA DOS DIGNOS PARES

SESSÃO EM 25 DE ABRIL DE 1864

PRESIDÊNCIA DO EXMO. SR. CONDE DE CASTRO

VICE PRESIDENTE

Secretarios, os dignos pares

Conde de Peniche

Conde de Mello

(Assistem os srs. presidente do conselho, e ministros da guerra e da fazenda).

Pelas duas horas e meia da tarde, tendo se verificado a presença de 46 dignos pares, declarou o ex.mo sr. presidente aberta a sessão.

Leu-se a acta da antecedente contra a qual não houve reclamação.

O sr. Secretario (Conde de Peniche): — Deu conta de Um officio do ministerio do reino, participando que no dia 29 de abril corrente, pela uma hora da tarde, haverá recepção em grande gala no paço da Ajuda por ser o anniversario do authorga da carta constitucional.

ORDEM DO DIA

CONTINUAÇÃO DA DISCUSSÃO DO PROJECTO DE LEI ABOLINDO O MONOPÓLIO DO TABACO

O sr. S. J. de Carvalho: — Sr. presidente, sinto que me caiba a palavra em occasião em que não está presente o illustre ministro a quem respondo. Entendia mesmo que a discussão se devia adiar até s. ex.ª chegar, e proporia isto mesmo, se não fosse a consideração de que s. ex.ª proferiu já nesta camara as rasões justificativas do projecto que se discute.

Sr. presidente, sinto porém que o nobre ministro não esteja presente, porque V. ex.ª e a camara, comprehendem que, cabendo me a palavra depois de 8. ex.ª, é claro que o meu fim não póde ser outro senão responder ás considerações que s. ex.ª apresentou nas ultimas sessões.

Começou o illustre ministro o seu discurso na primeira sessão levantando a questão politica, e exaltando com ella os brios um pouco amortecidos da maioria que o acompanha. A emphase com que permittia confutar todos os calculos e argumentos apresentados pelo sr. conde d'Avila, correspondeu á vehemencia da apostrophe com que, dirigindo se á opposição, a accusava por mover, caso estranho, uma guerra politica ao actual gabinete, guerra cujos planos a minha ingenuidade atraiçoara, pondo os a descoberto com as preguntas que na ultima sessão dirigira a s. ex.ª permitta me o illustre ministro que eu acuda a este seu reparo, e que em testemunho da propria ingenuidade que s. ex.ª me reconheceu declare, que assim é, que assim foi, que tentei pôr a descoberto com as minhas preguntas a questão poética, mas que a não levantei, que a não podia levantar mesmo, que não tinha nem auctoridade nem poder para isso, porque as questões politicas não as cria o arbitrio da opposição. As questões politicas impõe-se por sI mesmas como taes, vêem com as circumstancias que as determinam, não ha manejo da opposição que as possa crear, mas tambem não ha evasiva do governo, nem tatica da propria maioria que as possa evitar.

E a questão actual é uma questão politica, nem póde deixar de o ser, porque é uma questão de confiança, e n'esse campo a colocou o illustre ministro no principio do seu discurso, quando apresentou a sua convicção como garantia unica da verdade dos seus calculos. Mas as questões politicas conduzem-nos a conflictos que esta camara não póde levantar, exclama o illustre ministro. Perdoe-me porém s. ex.ª, em nome d'este falso principio ser-nos ía negada a apreciação de todos os actos do governo. As questões politicas são tão consentaneas com a indole dos poderes publicos como as questões litterarias e como as questões scientificas o são com a indole das academias e dos corpos scientificos. «Não levante a camara conflictos»! Conflictos com quem? Com o governo? Para os evitar seria necessario transigir sempre com as suas idéas. Com a outra casa do parlamento? Para os previnir seria necessario que em vez de camara nos convertêssemos em mesa chancella dos actos da outra casa do parlamento. Mas o governo não vive só com o voto e com a opinião da camara dos srs. deputados; vive com o apoio das duas casas do parlamento, com o concurso do voto de ambas, com a sua confiança. Quando a perde, demitte se, e quando se não demitte perdendo-a, quem provoca o conflicto é o governo que sáe fóra da esphera da acção que lhe marcam os principios constitucionaes (apoiados).

Por consequencia não tratemos de saber se a questão é politica ou se deixa de o ser, para que possamos aprecia-la devidamente; nem tão pouco se impressione a camara com a consideração de que a opposição a julga tal, por assim convir aos seus fins politicos.

A tactica empregada pela opposição seria n'este ponto tão legitima como aquella a que se soccorreu o illustre ministro quando exclamou: «Não se deixe surprehender a maioria pelos calculos do sr. conde d'Avila, não se impressione com as previsões atterradoras do digno par; o projecto actual não vae criar um desfalque na receita publica, ao contrario vae augmenta-la, é esta a minha segura convicção; tenho d'isso toda a certeza, ha todas as probabilidades de que assim succeda.» E n'esta certeza provavel estava a rasão da confiança que o illustre ministro queria impor á maioria que o acompanha, e n'essa confiança estava para nós opposição a questão politica.

Mas as questões politicas, disse eu já, impõe-se por si mesmas, e a questão que se debate, questão economica de gravissimo alcance, é pela sua propria importancia uma questão politica; e tanto o é que o governo fez d'ella questão ministerial.

N'este ponto receiando as consequencias de tal declaração, é que o illustre ministro tem por vezes insistido com asserções que não podemos deixar sem reparo.

Disse s. ex.ª que o governo não faz questão do meio porque se realise a transição; que o governo o que pretende é que passe o principio do projecto a que chama principio de liberdade. Mas pergunto eu a s. ex.ª, proclama o governo o principio da liberdade absoluta? Não; proclama a liberdade, mas a liberdade com restrições; logo essas restrições são o que constitue o pensamento do ministro, são as suas idéas, são o seu systema, traduzido e encarnado nas disposições do projecto. Rejeitadas ellas que fica? Modificadas essencialmente como o foram n'esta casa pelas commissões reunidas, onde está a coherencia de idéas e a firmeza de opinião do illustre ministro?

Mas a minha questão é o principio, exclama o illustre ministro; não póde ser, a questão para o governo não é que a camara vote o principio vago e abstracto da liberdade, a questão é o systema pelo qual o governo conciliando os interesses do fisco com a idéa de liberdade, restringe essa liberdade tanto quanto for necessario para garantir ao thesouro uma maior renda. Mas esse systema formula-se nas disposições do projecto rejeitadas. Mas morreu o systema, nada vale a idéa, nada vale o principio porque não póde ter applicação.

Foi por isso que eu na penultima sessão pedi ao illustre ministro explicações a tal respeito. S. ex.ª fingiu-se surprehendido com a minha pergunta, e sorrindo da minha ingenuidade, declarou á camara que eu acabara de revelar a tactica da guerra que a opposição movia ao actual gabinete. É um par novel, dizia s. ex.ª, que menos familiarizado com estas evoluções de tactica parlamentar, nos vem pôr a descuberto o plano do inimigo. Não convindo a s. ex.ª dar perante a camara as explicações que eu lhe pedia, illudiu as preguntas a que estava obrigado a responder, e com a tactica de velho parlamentar encontrou uma evasiva facil na diversão que procurou, contando á camara como é fecunda em bons resultados a ingenuidade dos pares novéis, segundo a qualificação de s. ex.ª, qualificação pela qual gradua a consideração que possam merecer a s. ex.ª as preguntas que lhe dirijam os membros d'esta camara. (Entrou o sr. ministro da fazenda.) Folgo de ver entrar na sala o sr. ministro da fazenda, velho parlamentar, em cuja fronte vejo hoje immurchecidas as coroas que conquistou, pugnando a favor das idéas que hoje combate.

Em 1854 dizia o illustre ministro, quando se discutia na outra casa do parlamento, a que s. ex.ª pertencia, a questão do contrato do tabaco, em referencia ao illustre deputado, o sr. Carlos Bento, que o illustre ministro em uma d'estas imagens pitorescas com que esmalta os seus discursos, punha encarapitado no edificio de Xabregas, o seguinte: «Direi ao illustre deputado, o sr. Carlos Bento, que se o estado tiver de estabelecer a régie, como é minha