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opinião que se deva vir a estabelecer, ha de montar uma fabrica roais barata e com melhores machinas.» Tudo mudou de 1854 para cá. Não só a régie se tornou um systema absurdo; mas a propria fabrica que era má passou a ser óptima, e já não é possivel estabelecer nenhuma em melhores condições. Já não ha melhores machinas do que as que a fabrica possue, e que são as mesmas de 1854, e porque as não ha melhores nem tão boas, expropriem se em nome da utilidade publica!

Não me surprehende a contradicção. São frequentes entre nós nos homens que têem largo tirocinio de vida publica. Nem é necessario justifica-las com a consideração de que entre uma e outra das opiniões oppostas passou o periodo de longos annos, que n'esse periodo se modificaram as circumstancias, e que segundo ellas se modificou a opinião. Taes considerações são inuteis perante os factos que hoje presenciamos. A instabilidade de opinião sobre um dado assumpto encontra-se, não só de anno para anno, mas de dia para dia. Hontem era absurda a régie, hoje é aceitavel. Hontem a arrematação era pessima, hoje pro-põe-se que se arremate de novo. Hontem era fatal o praso marcado para se estabelecer entre nós a liberdade do tabaco, hoje aceita-se a prorogação desse praso! E no meio d'esta instabilidade de opiniões, que muito era que eu perguntasse ao sr. ministro de que disposições do projecto fazia e. ex.ª questão ministerial! Mas s. ex.ª não respondeu, nem podia responder, nem sabia responder. Quem assegura a s. ex.ª que não seja obrigado a negar ámanhã a opinião que hoje sustenta? Por isso o unico expediente de que s. ex.ª podia lançar mão, foi aquelle de que se aproveitou. Não respondeu, e voltando-se para a maioria, exclamou: «Olhae, a opposição deseja saber em que ponto o governo colloca a questão politica, para dirigir sobre esse ponto os seus ataques». Este serviço tinha-o eu prestado ao governo, sem consciencia d'isso, e pagou-m'o o illustre ministro com aquelle sorriso de campaixão que aos capitães da expedição europea na Ásia mereceu ha poucos annos a ingenuidade do inimigo que tentava sobre elles uma sortida nocturna, levando accesas as lanternas nas pontas das lanças.

Sr. presidente, o illustre ministro não disse de que disposições do projecto fazia s. ex.ª questão ministerial; e como o havia de dizer, se todo o empenho de s. ex.ª foi o provar no seu discurso que nenhuma rasão tinha para aceitar as modificações e alterações que á proposta original do governo propozeram as commissões reunidas? A camara tem de certo presentes ao seu espirito as considerações com que o illustre ministro pretendeu provar que não havia rasão alguma para que o governo cedesse da sua opinião aceitando o pensamento das nossas commissões reunidas. Ora, se o sr. ministro tem, como se prova, por esse facto tão pouca consideração pelas disposições do projecto que discutimos, que muito é que lhes não dê a importancia de considerar questão politica a approvação dessas disposições! Ouçamos as considerações do illustre ministro e vejamos como ellas se oppõem ás que apresentou o illustre relator da commissão.

Disse o nobre relator da commissão que convertida em lei a proposta original do governo, se constituia na mão dos actuaes contratadores o monopolio de facto, monopolio de que de certo aufeririam avultadíssimos lucros; e que ao contrario, aceita a transição proposta pelas commissões, esses lucros reverteriam para o thesouro, porque o preço da nova arrematação havia da subir na proporção das vantagens da liquidação do monopolio. Que respondeu a isto o illustre ministro? Respondeu que não acreditava em taes lucros. Mas se não acreditava para que transigiu com a idéa de que taes lucros se davam? Se não acreditava em taes lucros para que vera declarar á camara que aceitava a substituição da commissão para que se não dissesse que pretendia proteger os interesses dos contratadores? Mas não basta dizer não acredito, é necessario dizer em que rasões se funda para não acreditar. As rasões apresentadas pela maioria da commissão era necessario oppor outras rasões. O illustre ministro argumenta nos com a sua convicção, mas não baeta isso. È necessario que nos diga em que rasões essa convicção se funda; e é isso o que o sr. ministro nos não tem dito.

Com referencia á receita que o estado deve cobrar pelos generos existentes no fim do actual contrato, diz o relatorio da commissão que essa receita se deve calcular em réis 1.500:000$000 a 1.600:000$000 réis; mas esse calculo declarou o illustre relator da commissão que era hypothetico, e o ministro que não combateu tal asserção no seio da commissão, vem declarar agora perante a camara que tem elementos seguros em que possa fundar os seus calculos; que sabe ao certo a importancia do tabaco em ser que existe no contrato, calculando essa importancia em 2.700:000 arráteis ou 1.239:300 kilogrammas.

Ora, se o illustre ministro da fazenda tinha esses dados, porque não os apresentou? Se tinha todos esses documentos que justificavam os seus calculos, porque não os submetteu ao exame da commissão? Se os tem n'esta conjunctura e não os tinha ha dias, como se diz que esta questão estava estudada? Como se póde assegurar isso quando ainda durante esta discussão estava s. ex.ª recebendo os esclarecimentos fornecidos por uma commissão que s. ex.ª nomeou depois de apresentada á consideração do parlamento a proposta original do governo? Se o illustre ministro julgava taes esclarecimentos indispensaveis para a discussão dá proposta que apresentou á camara, como os pode dispensar quando elaborou essa proposta? E de passagem direi, com referencia ao calculo do sr. ministro, com relação ao tabaco em ser, que tal calculo nada esclarece a discussão, quando mesmo seja rigorosamente exacto, como eu não creio que seja. É provavel que a quantidade desse tabaco suba a uma cifra maior do que aquella que o illustre ministro nos apresentou; mas quando mesmo não exceda ou quando lhe fosse inferior, não sei que desse facto se possa deduzir qualquer rasão a favor da proposta original do governo. O que é facto, cuja verdade taes calculos não destroem, é que os contratadores actuaes na justa previsão de que fosse convertida em lei a proposta original do governo, haviam trabalhado por tornar o mais importante que possivel fosse o monopolio de facto que a lei depunha nas suas mãos, e que para esse fim eram meios seguros os grandes depositos do tabaco e a grande manipulação d'elle, convertendo-o em generos de que o mercado se não poderia abastecer desde logo. 1

Mas, sr. presidente, voltando á importancia dos dados apresentados pelo illustre ministro, pergunto que fé nos podem elles merecer? Não ouviu a camara o illustre relator da commissão declarar já que taes calculos eram falsos; pois se o illustre relator da commissão os accusa de falsos...

O sr. Eugenio de Almeida: — Perdão, de inexactos. O Orador: — De inexactos, embora; para o argumento vale o mesmo, e se o illustre ministro modificou a sua opinião transigindo com a do digno par, não valem de certo mais as rasões do relator que as do ministro?

O sr. Eugenio de Almeida: — Eu disse que os calculos eram exagerados.

O Orador: — Bem, que sejam exagerados, importa ainda o mesmo para a questão.

Fallou ainda o illustre ministro na ementa; mas aceitará tambem b. ex.ª a ementa como base segura para os seus calculos? Não sabemos todos o que é a ementa? Eu tenho aqui presente e podia lêr á camara um mappa que prova bem o que é a ementa. Não o leio porque d'essa leitura nenhuma luz viria á discussão, lerei só uma nota para esclarecimento do texto, e essa vale alguma cousa (leu).

Quer dizer que a cada doença doa empregados escrivães da ementa corresponde uma lacuna nos documentos que elles nos podiam fornecer, e como esses empregados, ao que ouvi, de avançada idade nem sempre estão de saude, e já a velhice é doença, suceede que a lacuna que n'este mappa se dá com relação ao mez de junho, se póde dar repetidas vezes com detrimento da verdade dos calculos quando por todas as outras rasões devêssemos confiar n'elles.

Sr. presidente, a verdade é que não dispomos dos necessarios elementos para um estudo consciencioso da questão que se discute. Não argumento com a minha ignorancia, confesso-a, e não me envergonho d'ella; de homens cuja competencia se nos tornaria insuspeita ouviu a camara já a confissão sincera de que não conheciam a questão e votavam pelo inquerito. E esta confissão em nada deprime o seu merecimento; não sabem porque não podem saber, porque lhes faltam os elementos de estudo. Do que se tem passado lá fóra têem elles pleno conhecimento; sabemos todos como esta questão tem sido tratada na Europa, é até esta uma erudição facil, tantos são os elementos de que o espirito póde dispor para se illustrar; saíndo porém dos dominios da theoria e da historia, pratica do que se tem feito em outros paizes, entrados em Portugal, começa o reino das trevas que nenhum raio de luz dissipa. Estranha contradicção, mas frequente contradicção do nosso espirito. Inquirimos para não resolver, e resolvemos com pressa, com precipitação mesmo para não inquirir. Em Portugal um longo inquerito sobre qualquer questão significa adiamento indefinido d'essa questão. Inquire-se para não resolver; ao contrario quando se não deve resolver sem inquerir, resolve-se arriscada e precipitadamente só para tirar a rasão ao inquerito, e para dar por escusado o estudo!

Voltando porém á apreciação das considerações apresentadas pelo illustre ministro, continuo insistindo sobre a idéa de que s. ex.ª parece haver-se imposto a obrigação de confutar as razões com que a commissão justificava as alterações por ella feitas na proposta original do governo. Em vista d'isso não pareceria mais logico que o governo se recusasse a aceitar a substituição que a commissão lhe propoz, e que o governo sem rasão plausivel aceitou?

A unica rasão que foi apresentada pelo illustre ministro para a aceitação da substituição apresentada pela commissão (insisto em chamar lhe substituição porque este projecto que estamos discutindo em nada se parece com a proposta originaria do governo), foi a da não querer que no publico se suspeitasse que o governo insistia sobre a proposta primitiva para proteger os lucros exagerados que por ella se concediam aos actuaes contratadores. Estranha rasão, que nem eu, nem a camara podemos de certo aceitar. Esta rasão, repito, não se póde admittir, é necessario rebate-la com toda a energia; é uma proposição herética, que eu nunca quereria ver avançar nas casas do parlamento, e muito menos quando é um membro do gabinete quem a apresenta. Tal proposição é uma injuria feita á dignidade da camara e á dignidade do governo.

Pois os poderes publicos d'esta terra já se acham tão faltos de dignidade propria, tão pouco conscios dos seus deveres que se possam julgar assoberbados pelo monopolio do tabaco; que possam receiar a calumnia qualquer que seja o modo porque ella se apresente?

Pois se o sr. ministro da fazenda se julga hoje assoberbado pela influencia do contrato, não poderá ámanhã julgar-se assoberbado tambem pela influencia do banco, passado ámanhã pela influencia de qualquer companhia, depois ainda pela de qualquer poderoso argentario? Onde está, que a não sinto, a força de tal rasão, e o peso de tal argumento? A calumnia!... a calumnia despreze a, cumpra com o que todo o homem publico deve á consciencia do seu dever, e ao respeito pela sua propria consciencia.

Não começou o illustre ministro o seu discurso declarando que tinha visto sempre caír lhe aos pés a calumnia? Pois deixe a a seus pés e não a levante. O contrato assoberba os poderes publicos, morra o contrato!... Pelo amor de Deus, proposições destas não podem saír nunca d'aquelle logar. «Transigi com a commissão para que se não dissesse que transigia com os interesses do contrato,» Onde nos leva este principio de constante transacção com a calumnia? Não sabe o illustre ministro o que a respeito da arrematação dos bens de Arouca disse de s. ex.ª com toda a Bem rasão a imprensa? Com a maior será rasão, repito, porque devo á verdade e aos sentimentos do illustre ministro esta sincera homenagem de respeito.

Mas por este facto julgar-se-ia 8. ex.ª obrigado a não mandar proceder a novas arrematações?

E o que digo com relação aos bens de Arouca digo-o tambem com relação a outras accusações que se levantaram na imprensa, que são infundadas, e com que o espirito faccioso especulou; mas sobre as quaes deve recaír a indifferença dos homens publicos. Pois o governo póde porventura determinar os teus actos pela influencia da calumnia? Pois qualquer homem publico póde com dignidade transigir com tal influencia? E falla em - coragem o illustre ministro (apoiados); a verdadeira coragem está em obedecer apenas ao impulso da sua convicção e á consciencia doa seus deveres (apoiados). E depois d'esta declaração concluiu o illustre ministro dizendo, que o governo cumprira moral e politicamente o seu dever! Não o podia dizer. Não cumpriu nem moral nem politicamente o seu dever; não o cumpriu politicamente, porque deixou de sustentar as idéas que na outra casa do parlamento tinha defendido e sustentado com o concurso da maioria que o apoia; não cumpriu moralmente o seu dever, porque n'essa instabilidade de opinião, n'essa contradicção de idéas, n'essa incerteza de principios está a quebra do primeiro dever moral do homem publico que é o ter convicção e sustenta la com firmeza.

Continuando na apreciação das considerações apresentadas pelo illustre ministro, referir-me hei ao que r,. ex.ª disse com respeito á estipulação do minimo marcado pelo sr. conde d'Avila para a futura arrematação. O illustre ministro surprehendeu-se de que o digno par podesse apresentar o calculo que apresentou, e sobre essa. apresentação formulou um dilemma fatal. Ou a questão, dizia o illustre ministro, não está estudada, e n'esse caso não tendes os elementos para formar o vosso calculo, ou está estudada e não deveis votar pelo inquerito. O illustre ministro fingiu ignorar que póde haver, como ha, elementos para firmar o preço provavel da arrematação, sem que por esse facto te signifique que a questão do tabaco está convenientemente estudada em todas as suas relações. Com effeito o digno par o sr. conde d'Avila não necessitava do inquerito para poder fixar o minimo do preço pelo qual se devia effectuar a nova arrematação. Pois em quanto calculou o digno par esse minimo? Em 1.800:000$000 réis. Qual é o rendimento do actual contrato? É o de 1.748:000$000 réis, incluindo no preço da arrematação a importancia dos direitos recebidos nas alfandegas; logo, attenta a circumstancia do consumo crescente, o calculo do digno par não era exagerado, e era facil de fazer. Mas eu creio mesmo que o digno par podia ter ido mais longe, que podia ter elevado a mais de 1.800:000$000 réis o minimo do preço da nova arrematação, e para isso bastava apenas que aceitasse o principio estabelecido no relatorio da commissão, de que as vantagens da liquidação do monopolio deviam ter um preço real e importante na praça a favor do thesouro.

E porém notavel, sr. presidente, que o nobre ministro estranhasse que o sr. conde d'Avila tenha apresentado o minimo do preço da futura arrematação, não tendo para isso, na opinião de s. ex.ª, os dados necessarios, quando s. ex.ª diz que os tem, e que eu creio que os terá, têm toda a duvida em declarar perante a camara qual é esse minimo. Não comprehendo a rasão dessa hesitação, pois não seria esse um dado importante para a discussão? Creio que sim.

Combatendo o systema de arrematação, com que aliàs s. ex.ª transigiu, aceitando a substituição da commissão, disse s. ex.ª que = o regimen do monopolio pela arremação, era de todos os systemas o que promettia menos ao thesouro auferir uma maior receita =. Esta proposição está em diametral opposição com os factos que a historia economica dos paizes em que os diversos systemas se tem applicado, nos apresentam na questão.

Tomei nota da preposição apresentada por s. ex.ª, e conservo lhe até a redacção da phrase, porque o meu espirito hesitara em attribuir ao illustrado espirito de s. ex.ª um tal paradoxo. Pois o systema da liberdade não renderá muitissimo menos? Pois nos paizes onde vigora o systema da liberdade, não da liberdade que estabelece este projecto, mas da verdadeira liberdade, onde o tabaco entra no direito commum, não dará elle uma muito menor receita para o thesouro, do que nos paizes onde vigora o systema do monopolio? Pois a Dinamarca, pois a Belgica, a Hollanda a Russia ou o Zolwerein tiram do tabaco, nem absoluta, nem relativamente uma fonte de receita igual á que nós tiramos? O Zolwerein com a sua população de perto de trinta milhões de habitantes, tira apenas do rendimento do tabaco 1.300:000$000 réis, menos quasi uma terça parte do que nós auferimos com o systema do monopolio pela arrematação.

Em vista d'isto pois poderá o sr. ministro sustentar a sua proposição? Não é possivel. Houve de certo equivoco da parte de s. ex.ª

Outra rasão apresentada contra o systema de, monopolio pela arrematação foi a de que o nosso paiz era na Europa o unico onde esse systema se sustentava. Não comprehendi a força do argumento, mas sem que eu saiba o porquê, vi que tinha prendido por algum tempo a attenção de s. ex.ª, tirando d'elle conclusões que me pareceu prestarem um fraco auxilio á argumentação de s. ex.ª Pois o que s. ex.ª disse com relação á arrematação não se poderá dizer tambem com relação ao systema inglez que s. ex.ª copiou?